Resumos
OBJETIVO: Desenvolver e validar uma versão do Asthma Control Test (ACT, Teste de Controle da Asma) em português para uso no Brasil. MÉTODOS: Foram estudados 290 pacientes ambulatoriais com asma maiores que 12 anos. Os pacientes responderam ao ACT e foram examinados por um pneumologista para avaliar o controle da asma em duas visitas. Na primeira visita, também realizaram prova de função pulmonar. A segunda visita foi realizada ao menos quatro semanas depois da primeira. RESULTADOS: Utilizando-se como ponto de corte um escore de 18 para diferenciar asma controlada de asma não controlada, foram encontradas sensibilidade de 93%, especificidade de 74%, valor preditivo negativo de 86% e valor preditivo positivo de 85%. As razões de verossimilhança positiva e negativa foram, respectivamente, 3,58 e 0,09. O questionário tem grande capacidade de discriminar asma controlada de asma não controlada, com uma área sob a curva ROC de 0,904. Os pacientes que mantiveram os sintomas estáveis na segunda avaliação tiveram pontuação semelhante no questionário, indicando uma boa reprodutibilidade teste-reteste, com um coeficiente de correlação intraclasse de 0,93. Os pacientes que melhoraram os sintomas na segunda avaliação tiveram pontuação do questionário significativamente melhor, indicando uma boa responsividade do questionário para identificar mudanças no controle da doença. CONCLUSÕES: A versão em português do ACT apresentou boa reprodutibilidade teste-reteste e foi capaz de discriminar o nível de controle da asma, assim como detectar mudanças no controle da asma em uma população de baixa escolaridade e renda familiar em um serviço público de saúde no Brasil.
Asma; Questionários; Estudos de validação; Sinais e sintomas
OBJECTIVE: To develop and validate a Portuguese-language version of the Asthma Control Test (ACT) for use in Brazil. METHODS: The study comprised 290 asthma outpatients over 12 years of age. The patients completed the ACT questionnaire and had an appointment with a pulmonologist in order to assess asthma control in two visits. In the first visit, the patients also underwent spirometry. The second visit took place at least four weeks later. RESULTS: We found that a cut-off score of 18 points-to differentiate between subjects with controlled asthma and those with uncontrolled asthma-had a sensitivity of 93%, a specificity of 74%, a negative predictive value of 86% and a positive predictive value of 85%. The positive and negative likelihood ratios were 3.58 and 0.09, respectively. The questionnaire has an outstanding capacity to differentiate uncontrolled asthma from controlled asthma, with an area under the ROC curve of 0.904. The patients whose symptoms remained stable between the two visits had similar scores, demonstrating good test-retest reproducibility, with an intraclass correlation coefficient of 0.93. The patients whose symptoms improved in the second visit had significantly higher scores, demonstrating good responsiveness of the questionnaire in the identification of changes in disease control. CONCLUSIONS: The Portuguese-language version of the ACT showed good test-retest reproducibility and was capable of discriminating the levels of asthma control and detecting changes in asthma control in a population of patients with a low level of education and low family income at a public health facility in Brazil.
Asthma; Questionnaires; Validation studies; Signs and symptoms
ARTIGO ORIGINAL
Validação do Teste de Controle da Asma em português para uso no Brasil*
Jaqueline Petroni Faria RoxoI; Eduardo Vieira PonteII; Daniela Campos Borges RamosIII; Luciana PimentelIV; Argemiro D'Oliveira JúniorV; Álvaro Augusto CruzVI
IFisioterapeuta. Hospital das Clínicas, Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, São Paulo (SP) Brasil
IIMédico Colaborador. Programa de Controle da Asma e Rinite Alérgica na Bahia -ProAR - Faculdade de Medicina da Bahia, Universidade Federal da Bahia - UFBA - Salvador (BA) Brasil
IIIMédica Residente de Clínica Médica. Faculdade de Medicina da Bahia, Universidade Federal da Bahia - UFBA - Salvador (BA) Brasil
IVAcadêmica de Medicina. Faculdade de Medicina da Bahia, Universidade Federal da Bahia - UFBA - Salvador (BA) Brasil
VProfessor Associado. Faculdade de Medicina da Bahia, Universidade Federal da Bahia - UFBA - Salvador (BA) Brasil
VIProfessor Adjunto. Faculdade de Medicina da Bahia, Universidade Federal da Bahia - UFBA - Salvador (BA) Brasil
RESUMO
OBJETIVO: Desenvolver e validar uma versão do Asthma Control Test (ACT, Teste de Controle da Asma) em português para uso no Brasil.
MÉTODOS: Foram estudados 290 pacientes ambulatoriais com asma maiores que 12 anos. Os pacientes responderam ao ACT e foram examinados por um pneumologista para avaliar o controle da asma em duas visitas. Na primeira visita, também realizaram prova de função pulmonar. A segunda visita foi realizada ao menos quatro semanas depois da primeira.
RESULTADOS: Utilizando-se como ponto de corte um escore de 18 para diferenciar asma controlada de asma não controlada, foram encontradas sensibilidade de 93%, especificidade de 74%, valor preditivo negativo de 86% e valor preditivo positivo de 85%. As razões de verossimilhança positiva e negativa foram, respectivamente, 3,58 e 0,09. O questionário tem grande capacidade de discriminar asma controlada de asma não controlada, com uma área sob a curva ROC de 0,904. Os pacientes que mantiveram os sintomas estáveis na segunda avaliação tiveram pontuação semelhante no questionário, indicando uma boa reprodutibilidade teste-reteste, com um coeficiente de correlação intraclasse de 0,93. Os pacientes que melhoraram os sintomas na segunda avaliação tiveram pontuação do questionário significativamente melhor, indicando uma boa responsividade do questionário para identificar mudanças no controle da doença.
CONCLUSÕES: A versão em português do ACT apresentou boa reprodutibilidade teste-reteste e foi capaz de discriminar o nível de controle da asma, assim como detectar mudanças no controle da asma em uma população de baixa escolaridade e renda familiar em um serviço público de saúde no Brasil.
Descritores: Asma; Questionários; Estudos de validação; Sinais e sintomas.
Introdução
A asma é uma das doenças crônicas mais comuns em todas as idades. Caracteriza-se por inflamação crônica das vias aéreas, com limitação variável e reversível das vias aéreas e hiper-reatividade brônquica.(1) Segundo o International Study of Asthma and Allergies in Childhood, que comparou as prevalências de asma e sintomas alérgicos em 155 centros de 56 países, inclusive no Brasil, em dois momentos, com intervalo de 5 anos entre as pesquisas, esses índices continuam aumentando em algumas regiões, mas não em todas. Em Salvador, a prevalência entre crianças de 6 e 7 anos manteve-se estável e, entre adolescentes de 13 e 14 anos, ela aumentou.(2) Há uma tendência de maior prevalência da doença nos países desenvolvidos. No Brasil, algumas regiões acompanham esse padrão, embora sejamos um país em desenvolvimento. O que mais preocupa em relação à asma é a sua alta morbidade. Dados de 2005 indicam que as hospitalizações por asma corresponderam a 18,7% daquelas por causas respiratórias e a 2,6% de todas as internações pelo Sistema Único de Saúde no Brasil.(1) Segundo as diretrizes da Global Initiative for Asthma,(3) o objetivo primário do tratamento é obter um controle ótimo da doença, com sintomas diurnos e noturnos mínimos ou ausentes, ausência de limitação à atividade física, necessidade mínima do uso de medicação para o alívio de sintomas, função pulmonar normal ou com valor próximo do normal e ausência de exacerbações. Tudo isso deve ser obtido com o emprego da menor quantidade possível de medicação, de acordo com um plano escalonado que leva em consideração o controle e a gravidade da doença.(1,4,5)
Embora as recomendações internacionais preconizem o controle total dos sintomas da asma, há grandes dificuldades em se atingir esse objetivo, em parte devido a limitações na avaliação do paciente com asma.(6) Diversos estudos têm demonstrado que médicos e pacientes discordam quanto ao estado de controle da asma(7) e subestimam a gravidade dos sintomas.(8-10) Há evidências de que cerca de 50% dos pacientes que referiram sintomas persistentes graves consideraram que sua doença estava bem controlada.(11,12) Recentemente, uma publicação do nosso grupo demonstrou que a frequência de pacientes com asma com percepção inadequada do controle dos sintomas é elevada, principalmente entre pacientes com maior idade e com asma persistente leve.(13) Essespacientes, que não reconhecem ou não percebem a gravidade dos sintomas, podem apresentar maiores riscos de exacerbações e de morte por asma.
A má percepção do controle da asma pelo paciente pode levar à avaliação inadequada da asma pelo médico e, consequentemente, ao tratamento insuficiente ou excessivo.(5-7) Para suprir essa deficiência no gerenciamento do controle da asma, são necessários questionários para a avaliação de sintomas que reflitam a natureza multidimensional da doença e que sejam facilmente administrados e interpretados.(14,15) Esses questionários são úteis na prática clínica e em protocolos de pesquisa, por permitirem a padronização, a uniformização e a reprodução das medidas propostas a um baixo custo.(14-17)
Recentemente, Nathan et al. desenvolveram um questionário denominado Asthma Control Test (ACT, Teste de Controle da Asma).(18) O questionário pode ser autoaplicável e possui cinco itens que dizem respeito aos sintomas, uso de medicação de alívio e efeito da asma nas atividades diárias sem a necessidade de medidas de função pulmonar.(18,19) Esse instrumento foi avaliado em pacientes de países de língua inglesa, sendo reconhecido como reprodutível, válido, com consistência interna e responsivo às mudanças clínicas.(18,19) A validação desse questionário para uso no Brasil é importante para que tenhamos acesso a uma ferramenta simples de avaliação dos pacientes ambulatoriais no país. O objetivo deste trabalho foi validar o questionário ACT, traduzido para o português, para seu uso no Brasil. Para tanto, foi avaliada a capacidade do ACT em discriminar asma controlada de asma não controlada, bem como a reprodutibilidade e a responsividade do questionário.
Métodos
Em uma primeira etapa, foi realizada a tradução com validação linguística do questionário. O ACT foi traduzido da língua inglesa para a língua portuguesa por dois médicos com proficiência nas línguas inglesa e portuguesa, experiência em tradução de questionários e que conheciam os objetivos do estudo e os conceitos nele envolvidos. Os dois tradutores e o investigador principal debateram as diferenças entre as traduções e elaboraram o instrumento.(20-22)
Posteriormente, essa versão foi traduzida, do português para o inglês, por outro médico com proficiência nas duas línguas e que não tinha conhecimento dos objetivos do questionário. Os tradutores e o investigador principal debateram as diferenças entre a versão original em inglês e a retrotradução para o inglês.(20-22) Foram realizados os ajustes necessários, procurando assegurar as equivalências semânticas, idiomáticas, culturais e conceituais do ACT.
Em uma segunda etapa, foi avaliada a capacidade da versão em português do questionário em discriminar o controle da asma. A reprodutibilidade teste-reteste e a responsividade também foram avaliadas.
Utilizando-se uma amostra de conveniência, foram entrevistados consecutivamente 290 pacientes ambulatoriais com diagnóstico de asma, maiores de 12 anos de idade, acompanhados no Serviço de Pneumologia do Hospital Universitário Professor Edgard Santos e no Programa de Controle da Asma e Rinite Alérgica na Bahia,(23) da Faculdade de Medicina da Bahia, Universidade Federal da Bahia, e que concordassem em assinar o termo de consentimento livre e esclarecido. Foram excluídos pacientes com comorbidades respiratórias e pacientes com déficit cognitivo. Este estudo foi aprovado por Comitê de Ética em Pesquisa Humana da Faculdade de Medicina da Bahia, Universidade Federal da Bahia.
Os pacientes incluídos realizaram duas visitas, denominadas aqui visita 1 e visita 2, com um intervalo de 4-5 semanas. Na visita 1, os pacientes responderam ao questionário ACT e realizaram espirometria e consulta com um único médico pneumologista. Na visita 2, os pacientes responderam ao ACT e realizaram consulta com o mesmo especialista.
O questionário ACT foi aplicado sob a forma de entrevista, devido baixo índice de escolaridade da população estudada. Os entrevistadores foram orientados a não interpretar as perguntas ou influenciar as respostas dos entrevistados. O paciente foi solicitado a recordar as suas experiências com a asma nas últimas 4 semanas e a responder as perguntas do questionário. Depois, o paciente foi encaminhado para a realização de prova de função pulmonar. Foi utilizado um espirômetro (Koko; PDS Instrumentation Inc., Louisville, CO, EUA), segundo o protocolo da American Thoracic Society de 1994(24) e os padrões de normalidade para a população brasileira.(25) A variável VEF1, expressa em percentual do previsto, foi utilizada como parâmetro de avaliação do grau de obstrução das vias aéreas.
A última etapa da visita 1 foi a avaliação do médico pneumologista, que não estava ciente das respostas dadas pelos pacientes no ACT. Entretanto, esse médico teve acesso aos resultados da prova de função pulmonar para a complementação da avaliação médica, visto que a prova de função pulmonar é adotada como o nosso padrão ouro para o controle da asma. O paciente foi submetido a um exame clínico para a confirmação do diagnóstico de asma, assim como para a avaliação da sua gravidade e do controle da doença. O diagnóstico de asma foi baseado em episódios recorrentes de sibilância, dispneia, opressão torácica e tosse, particularmente à noite ou ao amanhecer, em pacientes com imagem radiográfica de tórax normal e espirometria compatível. A gravidade da asma foi classificada em intermitente, persistente leve, moderada e grave de acordo com os critérios do III Consenso Brasileiro no Manejo da Asma de 2002.(26) Para determinar o controle da asma nas últimas 4 semanas, o médico avaliou o grau de adesão aos objetivos do tratamento da asma, segundo o consenso acima citado. Utilizou-se de informações obtidas com a história do paciente, o exame clínico e a espirometria, e classificou-se a asma em não controlada (sintomas persistentes graves), pobremente controlada (sintomas persistentes moderados), parcialmente controlada (sintomas persistentes moderados e leves), bem controlada (sintomas persistentes leves) ou totalmente controlada (assintomáticos).(3) No final, os participantes foram reagrupados em controlados e não controlados. Aqueles que haviam sido classificados pelo médico como totalmente controlados e bem controlados foram agrupados e definidos como controlados. Foram denominados não controlados aqueles classificados como parcialmente controlados, pobremente controlados e não controlados.
Na visita 2, foram utilizados os mesmos passos para a classificação do controle da asma. Para a análise da reprodutibilidade, foram considerados estáveis os pacientes que mantiveram a mesma classificação, dentre as cinco possíveis (não controlada, pobremente controlada, parcialmente controlada, bem controlada ou totalmente controlada) de controle da asma entre a visita 1 e a visita 2. Para avaliar a responsividade em um grupo com melhora dos sintomas, foram selecionados os pacientes com incremento de pelo menos dois níveis de controle da asma na visita 2 em relação à classificação da visita 1.
Para a análise estatística, os pacientes foram classificados em controlados ou não controlados de acordo com o escore do questionário, que varia de 5 a 25 pontos.(18,19) Para avaliar a capacidade do questionário em discriminar o controle da asma, foram utilizadas medidas de validade dos testes diagnósticos para cada um dos escores obtidos, como sensibilidade, especificidade, razão de probabilidade do teste diagnóstico ou razão de verossimilhança, valor preditivo positivo e valor preditivo negativo. O balanço entre sensibilidade e especificidade foi demonstrado através da curva ROC, utilizada para calcular a proporção de pacientes corretamente classificados. Para avaliar a reprodutibilidade, foi utilizado o coeficiente de correlação intraclasse. Para avaliar a responsividade, foi utilizado o teste de Wilcoxon no sentido de identificar variações estatisticamente significantes nos escores do ACT. As análises estatísticas foram realizadas através do programa Statistical Package for the Social Sciences (SPSS Inc., Chicago, IL, EUA). Adotou-se como nível de significância estatística um erro α < 0,05.
Resultados
Após as etapas de adaptação transcultural, o questionário final, em português, ficou constituído da forma como está apresentado no Quadro 1.
A mediana de idade foi de 45 anos (variação: 32-56 anos), sendo 75 homens (26%) e 216 mulheres (74%). Com relação ao nível educacional, 167 pacientes (58%) estudaram até o ensino fundamental, 92 (32%) completaram o ensino médio, apenas 10 (3%) tinham ensino superior completo, e 21 (7%) não eram alfabetizados. Com relação à renda familiar, 186 pacientes (65%) referiam renda inferior a um salário mínimo. Quanto à função pulmonar, 36% dos pacientes apresentavam VEF1 < 60% do valor predito, 38% apresentavam VEF1 de 60-79% do predito, e 26% apresentavam VEF1> 80% do predito. Na avaliação de gravidade da asma, 80 pacientes (28%) apresentavam sintomas intermitentes, 41 (14%) tinham asma leve, 43 (15%) tinham asma moderada, e 126 (43%) tinham asma grave. De acordo com a avaliação médica, 181 pacientes (63%) estavam com asma não controlada na primeira avaliação.
A Tabela 1 demonstra os valores de sensibilidade, especificidade, valores preditivos, razões de verossimilhança e a porcentagem de pacientes que foram corretamente classificados para os diversos escores do ACT. No ponto de corte de 18 pontos, a porcentagem de pacientes que foram corretamente classificados foi maior (86%), os valores de sensibilidade (93%) e especificidade (74%) foram elevados, assim como o valor preditivo negativo (86%) e o valor preditivo positivo (85%). A razão de verossimilhança positiva foi de 3,58 e a negativa foi de 0,09. A área sob a curva ROC foi 0,904 (IC95%: 0,869-0,939; Figura 1).
Para o cálculo da reprodutibilidade, foram utilizados os dados dos 52 pacientes que se mantiveram estáveis entre as visitas 1 e 2. O coeficiente de correlação intraclasse demonstrou um valor α = 0,93, indicando uma boa reprodutibilidade do questionário. Na avaliação da responsividade, foram analisados os questionários de 45 pacientes com melhora dos sintomas na visita 2, de acordo com a avaliação médica. A mediana do escore do ACT foi de 9 pontos (variação: 5-23) e 20 pontos (variação: 12-25) na visita 1 e na visita 2, respectivamente (p < 0,001), demonstrando a capacidade do questionário em identificar a mudança clínica do paciente (Figura 2).
Discussão
Os resultados apresentados neste estudo demonstram que o ACT, traduzido para o português, teve boa capacidade de discriminar asma controlada de asma não controlada neste grupo de pacientes no Brasil. A sensibilidade (93%) indica a proporção dos pacientes com asma não controlada que tiveram o teste positivo (de acordo com o ponto de corte pré-estabelecido). Testes sensíveis são úteis em programas de rastreamento do controle da asma na prática clínica ou em pesquisa para identificar pacientes que necessitam de uma melhor atenção em relação à sua doença, devendo ser investigados quanto às causas do descontrole da asma. A especificidade foi alta (74%) neste estudo, indicando a proporção de pacientes com asma controlada que foram identificados por um teste negativo (escore abaixo do ponto de corte).
A curva ROC é um meio didático de representar a relação entre sensibilidade e especificidade. Quanto maior a proximidade da curva com o ângulo superior esquerdo do gráfico, melhor é a acurácia do teste, visto que o percentual de verdadeiros positivos se aproxima de um, e o percentual de falsos positivos se aproxima de zero.(27) Através da curva ROC pode-se calcular a proporção de pacientes que foram corretamente classificados pelo teste. Neste estudo, o ponto de corte foi definido em 18 pontos, porque foi o escore que permitiu maior acurácia (Tabela 1). Esse escore está muito próximo daquele definido pelo autor do questionário original em inglês,(18) assim como do ponto de corte escolhido nas versões em chinês(28) e em espanhol.(29) Nesses estudos, os pacientes que apresentaram escore > 20 receberam a classificação da asma controlada.
Resultados elevados em valores preditivos positivos e negativos indicam o bom desempenho de um teste na população estudada. Se o teste é positivo e indica asma não controlada, o valor preditivo positivo de 85%, encontrado neste estudo, significa que o individuo apresenta 85% de chance de apresentar de fato asma não controlada. Se o teste é negativo e indica asma controlada, um valor preditivo negativo de 86% significa que o individuo apresenta 86% de chance de ter de fato asma controlada. Os valores preditivos são influenciados pela prevalência do evento na população estudada. Como este estudo não teve base populacional, tendo sido realizado em uma amostra de pacientes ambulatoriais, as razões de verossimilhança se tornam informações importantes, pois independem da prevalência do evento estudado. A razão de verossimilhança positiva observada (3,58) revela que a probabilidade do ACT em considerar a asma não controlada é 3,5 vezes maior em pacientes que foram identificados pelo padrão ouro como não controlados. A razão de verossimilhança negativa (0,09) reforça a confiabilidade do teste, pois revela que a probabilidade do ACT indicar asma controlada é maior em pacientes com asma controlada na avaliação médica.
A reprodutibilidade teste-reteste teve um resultado muito satisfatório, com valor superior ao da versão original(18,19) e da versão em espanhol.(29) A forma como o instrumento da versão em português foi aplicado pode ter influenciado o resultado, já que, neste estudo, o questionário foi aplicado por entrevistadores treinados enquanto, nos estudos com a versão original em inglês e em espanhol, os mesmos foram autoaplicáveis. A literatura descreve algumas vantagens e desvantagens da utilização de questionários aplicados por entrevistadores. As vantagens são a certeza de que é o próprio entrevistado o respondedor das questões e de que ele está disposto a colaborar com a entrevista, além de eliminar as dificuldades de leitura de pessoas com baixo nível de escolaridade.(30) Vale ressaltar que os entrevistadores foram devidamente treinados, seguindo normas para a aplicação de questionários. Contudo, não foi avaliada a reprodutibilidade interobservador no presente estudo. Não foram encontradas na literatura referências com relação à discrepância de resultados de validade de instrumentos ao se comparar as formas autoaplicáveis e por meio de entrevista.
A avaliação da responsividade demonstrou que o teste foi capaz de identificar mudanças no controle da doença associada ao tratamento, na avaliação dos pacientes com melhora clínica. Um resultado semelhante foi também descrito pelos autores da versão do ACT em espanhol, os quais descreveram a correlação entre o número de exacerbações e o escore do ACT.(29)
Como os pacientes foram selecionados a partir de ambulatórios de um hospital terciário, os resultados devem ser interpretados com cautela quando o questionário for utilizado em clientelas de serviço de atenção primária, com sintomas mais esporádicos e menor familiaridade com a doença. Por outro lado, os resultados favoráveis foram obtidos em uma população de baixa escolaridade, demonstrando a aplicabilidade do questionário em pacientes do Sistema Único de Saúde.
Estes resultados são relevantes, pois favorecem o uso deste instrumento de avaliação do controle da asma em pesquisas clínicas, na prática diária e em programas de saúde pública. Por ser um instrumento com poucas questões e poucas opções de resposta, e cujo escore é obtido através de simples soma, o ACT permite uma avaliação rápida e objetiva do controle da asma mesmo na ausência de medidas de função pulmonar, facilitando grandes estudos em localidades onde essa medida não esteja disponível. Em conclusão, o ACT traduzido para o português e aplicado por entrevistador treinado se mostrou um questionário válido, reprodutível e sensível para a avaliação do controle da asma em uma amostra de pacientes ambulatoriais no Brasil, com baixa escolaridade e atendida em um hospital terciário do Sistema Único de Saúde.
Recebido para publicação em 31/7/2009
Aprovado, após revisão, em 17/11/2009
Apoio financeiro: Este estudo recebeu apoio financeiro da Fundação de Amparo a Pesquisa no Estado da Bahia (FAPESB) e do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq)
Referências bibliográficas
- 1. Sociedade Brasileira de Pneumologia e Tisiologia. IV Diretrizes Brasileiras para o Manejo da Asma. J Bras Pneumol. 2006;32(Suppl 7):S447-S474.
- 2. Asher MI, Montefort S, Björkstén B, Lai CK, Strachan DP, Weiland SK, et al. Worldwide time trends in the prevalence of symptoms of asthma, allergic rhinoconjunctivitis, and eczema in childhood: ISAAC Phases One and Three repeat multicountry cross-sectional surveys. Lancet. 2006;368(9537):733-43. Erratum in: Lancet. 2007;370(9593):1128.
-
3 Global Initiative for Asthma - GINA [homepage on the Internet]. Bethesda: National Heart, Lung and Blood Institute. National Institutes of Health, US Department of Health and Human Services. [cited 2007 Aug 9]. Global Strategy for Asthma Management and Prevention, Global Initiative for Asthma (GINA) 2006. Available from: http://www.ginasthma.
» link - 4. Bateman ED, Bousquet J, Braunstein GL. Is overall asthma control being achieved? A hypothesis-generating study. Eur Respir J. 2001;17(4):589-95.
- 5. Boulet LP, Boulet V, Milot J. How should we quantify asthma control? A proposal. Chest. 2002;122(6):2217-23.
- 6. Barnes PJ. Achieving asthma control. Curr Med Res Opin. 2005;21 Suppl 4:S5-9.
- 7. Gaga M, Papageorgiou N, Zervas E, Gioulekas D, Konstantopoulos S. Control of asthma under specialist care: is it achieved? Chest. 2005;128(1):78-84.
- 8. Wolfenden LL, Diette GB, Krishnan JA, Skinner EA, Steinwachs DM, Wu AW. Lower physician estimate of underlying asthma severity leads to undertreatment. Arch Intern Med. 2003;163(2):231-6.
- 9. Fuhlbrigge AL, Adams RJ, Guilbert TW, Grant E, Lozano P, Janson SL, et al. The burden of asthma in the United States: level and distribution are dependent on interpretation of the national asthma education and prevention program guidelines. Am J Respir Crit Care Med. 2002;166(8):1044-9.
- 10. van Schayck CP, van Der Heijden FM, van Den Boom G, Tirimanna PR, van Herwaarden CL. Underdiagnosis of asthma: is the doctor or the patient to blame? The DIMCA project. Thorax. 2000;55(7):562-5.
- 11. Watson L, Kerstjens HA, Rabe KF, Kiri V, Visick GT, Postma DS. Obtaining optimal control in mild asthma: theory and practice. Fam Pract. 2005;22(3):305-10.
- 12. Rabe KF, Vermeire PA, Soriano JB, Maier WC. Clinical management of asthma in 1999: the Asthma Insights and Reality in Europe (AIRE) study. Eur Respir J. 2000;16(5):802-7.
- 13. Ponte EV, Petroni J, Ramos DC, Pimentel L, Freitas DN, Cruz AA. Perception of asthma control in asthma patients. J Bras Pneumol. 2007;33(6):635-40.
- 14. Schatz M, Mosen D, Apter AJ, Zeiger RS, Vollmer WM, Stibolt TB, et al. Relationships among quality of life, severity, and control measures in asthma: an evaluation using factor analysis. J Allergy Clin Immunol. 2005;115(5):1049-55.
- 15. Kips JC, Pauwels RA. Asthma control: where do we fail? Eur Respir J. 2000;16(5):797-8.
- 16. Juniper EF, O'Byrne PM, Ferrie PJ, King DR, Roberts JN. Measuring asthma control. Clinic questionnaire or daily diary? Am J Respir Crit Care Med. 2000;162(4 Pt 1):1330-4.
- 17. Vollmer WM, Markson LE, O'Connor E, Frazier EA, Berger M, Buist AS. Association of asthma control with health care utilization: a prospective evaluation. Am J Respir Crit Care Med. 2002;165(2):195-9.
- 18. Nathan RA, Sorkness CA, Kosinski M, Schatz M, Li JT, Marcus P, et al. Development of the asthma control test: a survey for assessing asthma control. J Allergy Clin Immunol. 2004;113(1):59-65.
- 19. Schatz M, Sorkness CA, Li JT, Marcus P, Murray JJ, Nathan RA, et al. Asthma Control Test: reliability, validity, and responsiveness in patients not previously followed by asthma specialists. J Allergy Clin Immunol. 2006;117(3):549-56.
- 20. Bullinger M, Alonso J, Apolone G, Leplège A, Sullivan M, Wood-Dauphinee S, et al. Translating health status questionnaires and evaluating their quality: the IQOLA Project approach. International Quality of Life Assessment. J Clin Epidemiol. 1998;51(11):913-23.
-
21 MAPI Institute [homepage on the Internet]. Lyon: MAPI Research Institute [cited 2007 Aug 9]. Available from: http://www.mapi-institute.com
» link - 22. Guillemin F, Bombardier C, Beaton D. Cross-cultural adaptation of health-related quality of life measures: literature review and proposed guidelines. J Clin Epidemiol. 1993;46(12):1417-32.
- 23. Ponte E, Souza-Machado A, Franco RA, Sarkis V, Shah K, Souza- Machado C et al. Programa de Controle da asma e da Rinite Alérgica na Bahia (ProAr): um modelo de integração entre assistência, ensino e pesquisa. Rev Baiana Saude Publica. 2004;28(1):124-32.
- 24. Standardization of Spirometry, 1994 Update. American Thoracic Society. Am J Respir Crit Care Med. 1995;152(3):1107-36.
- 25. Pereira CA, Barreto SP, Simões JG, Pereira FW, Gerstler JG, Nakatani J. Valores de referência para espirometria em uma amostra da população brasileira adulta. J Pneumol. 1992;18(1):10-22.
- 26. Sociedade Brasileira de Pneumologia e Tisiologia. III Consenso Brasileiro no Manejo da Asma 2002. J Pneumol. 2002;28(Suppl 1):S1-S58.
- 27. Murphy JM, Berwick DM, Weinstein MC, Borus JF, Budman SH, Klerman GL. Performance of screening and diagnostic tests. Application of receiver operating characteristic analysis. Arch Gen Psychiatry. 1987;44(6):550-5.
- 28. Zhou X, Ding FM, Lin JT, Yin KS, Chen P, He QY, et al. Validity of Asthma Control Test in Chinese patients. Chin Med J (Engl). 2007;120(12):1037-41.
- 29. Vega JM, Badia X, Badiola C, López-Viña A, Olaguíbel JM, Picado C, et al. Validation of the Spanish version of the Asthma Control Test (ACT). J Asthma. 2007;44(10):867-72.
- 30. Streiner DL, Norman GR. Health Measurement Scales: A Practical Guide to Their Development and Use. Oxford Medical Publications. Oxford: Oxford University Press; 1995.
Datas de Publicação
-
Publicação nesta coleção
10 Maio 2010 -
Data do Fascículo
Abr 2010
Histórico
-
Recebido
31 Jul 2009 -
Aceito
17 Nov 2009