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RESENHA DE LIVRO

José Carlos SouzaI; Ericson Makarius BorgesII

IUniversidade Católica Dom Bosco (UCDB)

IIUniversidade Estadual de Londrina (UEL)

Trabalho em turnos e noturno – Na sociedade 24 horas

Frida Marina Fischer, Claudia Roberta de Castro Moreno e Lúcia Rotenberg, Editora Atheneu, 2004

O livro Trabalho em turnos e noturno – Na sociedade 24 horas conta com três organizadores e 13 colaboradores de renomes nacional e internacional. Subdivide-se em quatro partes, com um total de 13 capítulos. Consiste em uma referência obrigatória para alunos, professores e pesquisadores dos diversos graus de formação, que estão envolvidos direta ou indiretamente com os estudos relacionados ao trabalho e o trabalhador.

"O trabalho em turnos e noturno não é um fenômeno novo, sendo que a sua história pode ser traçada com a invenção do fogo, há cerca de 7000 a.C.

Conforme a civilização progredia, as necessidades de comunicação e transporte tornaram-se mais importantes, resultando em entregas noturnas de correio, navegação e transporte terrestre. As profissões de segurança e manutenção da lei, padarias e hospitais exigiam cobertura em tempo integral para sociedades em crescimento.

O crescimento do trabalho em turnos e noturno deteve-se temporariamente na Idade Média, por duas razões principais: primeiro, porque a divisão de grandes populações citadinas em estados feudais rurais diminuiu a necessidade de comércio e, segundo, porque o desenvolvimento de regulamentos para artesãos e demais profissões exigiu que atividades comerciais funcionassem apenas durante o dia.

Em 1879, Thomas Edison inventou a lâmpada elétrica, possibilitando um pouco mais tarde, 1882, uma fonte confiável de força/energia, sendo este o maior evento isolado e relevante na história para o crescimento do trabalho em turnos e noturno, já que permitiria a utilização de equipamentos em tempo integral e a oferta de bens e serviços, sem interrupção, por 24 horas."

A industrialização e, paulatinamente, a tecnologização avançaram os limites da saúde humana, principalmente o sono dos trabalhadores. Este é um fenômeno biológico, universal e de sobrevivência, haja vista que um adulto-jovem passa um terço de sua vida dormindo. Além disso, durante o sono, o cérebro consome 16% a mais de glicose e oxigênio do que em vigília. A desorganização do ritmo circadiano do sono, por conta do trabalho em turnos e noturno, pode levar a sérios comprometimentos do funcionamento cerebral.

Estes e outros tópicos são discutidos com maestria no livro em questão. Na parte I, Aspectos históricos, conceituais e legislativos, os professores Frida Fischer e Peter Knauth abordam, em dois capítulos, aspectos da história da evolução do trabalho em turnos no mundo, o caso da Europa e a legislação brasileira. Esta última nem sempre é cumprida nem por empregador, nem por empregados.

A parte II, A tolerância ao trabalho em turnos e noturno: um problema multidimensional, subdivide-se em quatro magníficos textos: inicialmente, a "Cronobiologia humana", em que professor Luiz Menna Barreto aborda os ritmos biológicos do ser humano, incluindo aqui o sono, entre outros. A seguir, especificamente o "Sono e estratégias relativas ao sono para lidar com os horários de trabalho", em que Claudia Roberta de Castro Moreno discute o fenômeno do dormir, já muito estudado, porém com muito ainda a ser compreendido. Destaca os reflexos cognitivos, de tomada de decisões e de riscos no trabalho, em virtude da desorganização do ritmo normal do sono noturno humano.

No terceiro capítulo da parte II, Lúcia Rotenberg descreve os "Aspectos sociais da tolerância ao trabalho em turnos e noturno, com ênfase nas questões relacionadas ao gênero". Aqui os próprios sujeitos envolvidos, os trabalhadores, comentam as dificuldades e, por vezes, a impossibilidade de se adaptarem ao trabalho em turnos e noturno. As mulheres são as mais comprometidas, em razão, principalmente, do acúmulo de funções domésticas. No quarto capítulo desta parte, professora Frida retrata os "Fatores individuais e condições de trabalho e de vida na tolerância", que, na maioria das vezes, são negligenciados na seleção dos funcionários para o trabalho em turno e noturno. Hoje já existem instrumentos e técnicas suficientes e eficientes para essa seleção.

A parte III, Saúde e segurança dos trabalhadores, subdivide-se em cinco capítulos: no primeiro, Giovanni Costa aborda a "Saúde e trabalho em turnos e noturno"; se o trabalho, de maneira geral, pode ser fonte de saúde ou de doença, o trabalho em turnos ou noturno muito mais; teórica e preventivamente, o trabalho deveria ser uma fonte de melhor qualidade de vida. No segundo capítulo, Maria Alice Altenburg de Assis e Cláudia Moreno abordam a "Nutrição entre trabalhadores em turnos e noturno", aspecto de extrema relevância e nem sempre considerado pelas empresas; no caso do trabalho noturno, convém lembrar que, nesse horário, teórica e biologicamente, o trabalhador estaria dormindo. Então há uma mudança não somente no ritmo do sono, mas também no ritmo alimentar. No terceiro capítulo, Sérgio Colacioppo e Michael H. Smolensky discutem "A importância do estudo da ritmicidade biológica para a higiene e toxicologia ocupacional"; a prevenção e o entendimento da individualidade do trabalhador são tópicos aprofundados para o desenvolvimento da higiene ocupacional. No penúltimo capítulo da parte III, os colaboradores Françoise Verdier, Béatrice Barthe e Yvon Quéinnec abordam a "Organização do trabalho em turnos: concentrandose na análise ergonômica ao longo das 24 horas"; a ergonomia revela grande benefício na prevenção de acidentes de trabalho, qualquer que seja este. A aplicação dos conceitos ergonômicos facilita a diminuição dos efeitos deletérios do trabalho em turno ou noturno. O último capítulo da parte III, escrito por Ildeberto Muniz de Almeida, refere-se ao "Desempenho e segurança no trabalho em turnos e noturno"; hoje está muito em voga a discussão das questões referentes a causa-efeito em relação aos acidentes durante o período de trabalho. Neste capítulo, os acidentados prestam informações valiosas sobre o assunto. As avaliações periciais dos acidentados devem ser sistêmicas e muito aprofundadas, para o esclarecimento dos fatos incidentais ocorridos durante o trabalho em turno ou noturno.

Por fim, a parte IV, Desafios e novas perspectivas, apresenta dois capítulos: "Técnicas para o gerenciamento de escalas de trabalho", escrito por Johannes Gärtner, Karin Hörmein e Michael Janke, e "Medidas de intervenção: abordando a questão do lado dos trabalhadores, empresas e usuários", escrito pela professora Lúcia Rotenberg. No primeiro, os três autores abordam o gerenciamento e planejamento da prática do trabalho em turno ou noturno; aqui, o médico, o técnico em segurança do trabalho, o psicólogo organizacional, entre outros, podem reunir conhecimentos e experiências no intuito de formarem uma equipe multidisciplinar e auxiliarem, direta ou indiretamente, no planejamento e elaboração das escalas de trabalho. No último capítulo do livro, as medidas de intervenção devem, novamente, reunir-se em torno de uma equipe, beneficiando trabalhadores, empregadores e usuários, primando pela qualidade no trabalho e não somente pela qualidade do trabalho.

Assim sendo, este tomo, sem dúvida alguma, despertará o leitor para questões de qualidade e humanismo no trabalho em turno e noturno, que, se bem planejado e gerenciado, não negligenciará o valor do homem perante os avanços da globalização e da tecnologia.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    15 Out 2007
  • Data do Fascículo
    2007
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