Acessibilidade / Reportar erro

Acurácia de concentrações de IgE séricas e de diâmetros de pápulas no diagnóstico de alergia ao leite de vaca Como citar este artigo: Franco JM, Pinheiro AP, Vieira SC, Barreto ÍD, Gurgel RQ, Cocco RR, et al. Accuracy of serum IgE concentrations and papule diameter in the diagnosis of cow's milk allergy. J Pediatr (Rio J). 2018;94:279-85. , ☆☆ ☆☆ Trabalho vinculado à Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), Escola Paulista de Medicina, São Paulo, SP; e Universidade Federal de Sergipe, Aracaju, SE, Brasil.

Resumo

Objetivo

Comparar concentrações séricas de IgE específica e diâmetros médios das pápulas induzidas no teste cutâneo de leitura imediata com leite de vaca e suas frações com resultados do teste de provocação oral e estabelecer pontos de corte, capazes de predizer reatividade clínica ao leite de vaca em pacientes atendidos em um serviço de referência.

Métodos

Cento e vinte e duas crianças (mediana 17 meses), com história de reações imediatas ao leite de vaca e presença de IgE específicas para leite de vaca e/ou frações (testes cutâneos e/ou IgE sérica positivos) foram submetidas ao teste de provocação oral aberto com leite de vaca.

Resultados

O teste de provocação oral foi positivo em 59,8% das crianças, 49% eram do sexo masculino. Os níveis séricos de IgE específica, assim como os diâmetros médios das pápulas para leite de vaca, foram significantemente maiores nos alérgicos (medianas: 3,39kUA/L vs. 1,16 kUA/L; 2,5 mm vs. 0 mm). Os "pontos de corte ótimos" (Índice de Youden) das IgE séricas específicas para o leite de vaca e suas frações capazes de predizer a reatividade ao leite de vaca (teste de provocação oral positivo) foram: 5,17kUA/L para o leite de vaca, 0,95 kUA/L para α-lactoalbumina, 0,82kUA/L para β-lactoglobulina e 0,72kUA/L para caseína e para os diâmetros de pápulas foram 3,5 mm para leite de vaca e 6,5 mm, 9,0 mm e 3,0 mm para as frações α-lactoalbumina, β-lactoglobulina e caseína, respectivamente.

Conclusões

Os níveis de corte capazes de predizer reatividade clínica ao leite de vaca foram: 5,17kUA/L para IgE sérica específica e 3,5 mm para a medida do diâmetro da pápula, valores considerados discriminatórios para o diagnóstico da alergia ao leite de vaca.

PALAVRAS-CHAVE
Hipersensibilidade a leite; Acurácia; Criança; Epidemiologia; Curva ROC

Abstract

Objective

To compare serum concentrations of specific IgE and mean papule diameters induced in the immediate skin reactivity test with cow's milk and its fractions with results of the oral challenge test, and to establish cutoff points capable of predicting clinical reactivity to cow's milk in patients treated at a referral service.

Methods

One hundred and twenty-two children (median of 17 months) with a history of immediate reactions to cow's milk and presence of specific IgE for cow's milk and/or its fractions (positive skin and/or IgE serum tests) were submitted to open oral challenge test with cow's milk.

Results

The oral challenge test was positive in 59.8% of the children, 49% of whom were males. Serum levels of specific IgE, as well as mean cow's milk papule diameters, were significantly higher in allergic patients (medians: 3.39 kUA/L vs. 1.16 kUA/L, 2.5 mm vs. 0 mm). The optimal cutoff points (Youden's index) of serum IgE specific for cow's milk and its fractions capable of predicting cow's milk reactivity (positive oral challenge test) were: 5.17 kUA/L for cow's milk, 0.95 kUA/L for α-lactalbumin, 0.82 kUA/L for β-lactoglobulin, and 0.72 kUA/L for casein, whereas for papule diameters the cutoff points were 3.5 mm for cow's milk and 6.5 mm, 9.0 mm, and 3.0 mm for the α-lactalbumin, β-lactoglobulin, and casein fractions, respectively.

Conclusions

The cutoff points capable of predicting clinical reactivity to cow's milk were: 5.17 kUA/L for serum-specific IgE and 3.5 mm for papule diameter measurement, values considered discriminatory for the diagnosis of cow's milk allergy.

KEYWORDS
Milk hypersensitivity; Accuracy; Child; Epidemiology; ROC curve

Introdução

Alergia à proteína do leite de vaca (APLV) é definida como uma reação adversa imunológica, reprodutível, a uma ou mais proteínas do leite de vaca (LV).11 Eigenmann PA. Mechanisms of food allergy. Pediatr Allergy Immunol. 2009;20:5-11. Envolve a participação de imunoglobulinas do tipo IgE (IgE), de células (linfócitos T) ou de ambas.22 Luyt D, Ball H, Makwana N, Green MR, Bravin K, Nasser SM, et al. BSACI guideline for the diagnosis and management of cow's milk allergy. Clin Exp Allergy. 2014;44:642-72. Acomete 2% a 3% das crianças, é considerada a alergia alimentar mais comum na infância.22 Luyt D, Ball H, Makwana N, Green MR, Bravin K, Nasser SM, et al. BSACI guideline for the diagnosis and management of cow's milk allergy. Clin Exp Allergy. 2014;44:642-72.

Para o diagnóstico da APLV mediada por IgE, história clínica detalhada e detecção de IgE específicas para alérgenos do LV são ferramentas importantes.33 Sicherer SH, Sampson HA. Food allergy. J Allergy Clin Immunol. 2010;125:116-25. Porém, o Teste de Provocação Oral Duplo Cego Placebo Controlado (TPODCPC), que consiste na oferta do alimento sem conhecimento médico e do paciente, continua considerado o padrão- ouro para o diagnóstico da APLV. 44 Fiocchi A, Brozek J, Schunemann HJ, Bahna SL, von Berg A, Beyer K, et al. Diagnosis and rationale for action against cow's milk allergy (DRACMA): a summary report. J Allergy Clin Immunol. 2010;126:1119-28.

5 Bindslev-Jensen C, Ballmer-Weber BK, Bengtsson U, Blanco C, Ebner C, Hourihane J, et al. Standardization of double-blind, placebo-controlled food challenges in patients with immediate reactions to foods - position paper from the European Academy of Allergology and Clinical Immunology. Allergy. 2004;59:690-7.

6 Niggemann B, Beyer K. Diagnosis of food allergy in children: toward a standardization of food challenge. J Pediatr Gastroenterol Nutr. 2007;45:399-404.
-77 Nowak-Wegrzyn A, Assa'ad AH, Bahna SL, Bock SA, Sicherer SH, Teuber SS. Adverse Reactions to Food Committee of American Academy of Allergy, Asthma & Immunology. Work group report: oral food challenge testing. J Allergy Clin Immunol. 2009;123:S365-83. No entanto, apresenta desvantagens relacionadas ao tempo necessário para sua execução, custos envolvidos, necessidade de estrutura física adequada e de equipe multidisciplinar, fatores limitantes para seu amplo uso na prática clínica.77 Nowak-Wegrzyn A, Assa'ad AH, Bahna SL, Bock SA, Sicherer SH, Teuber SS. Adverse Reactions to Food Committee of American Academy of Allergy, Asthma & Immunology. Work group report: oral food challenge testing. J Allergy Clin Immunol. 2009;123:S365-83.

Foram estabelecidos diferentes valores de IgE sérica específica e de diâmetros médios de pápulas do teste cutâneo de leitura imediata (TCLI) a partir dos quais a chance de se ter sintomas, quando da feitura da TPO, seria maior do que 95%, porém os valores encontrados não foram reprodutíveis em distintas populações, admitiram-se diferenças étnicas, de idade, de hábitos alimentares, de fenótipos clínicos e de condições técnicas para feitura do TCLI. 88 Garcia-Ara C, Boyano-Martinez T, Diaz-Pena JM, Martín-Muñoz F, Reche-Frutos M, Martín-Esteban M. Specific IgE levels in the diagnosis of immediate hypersensitivity to cow's milk protein in the infant. Allergy Clin Immunol. 2001;107:185-90.

9 Celik-Bilgili S, Mehl A, Verstege A, Staden U, Nocon M, Beyer K, et al. The predictive value of specific immunoglobulin E levels in serum for the outcome of oral food challenges. Clin Exp Allergy. 2005;35:268-73.

10 van der Gugten AC, den OM, Meijer Y, Pasmans SG, Knulst AC, Hoekstra MO. Usefulness of specific IgE levels in predicting cow's milk allergy. J Allergy Clin Immunol. 2008;121:531-3.

11 Rolinck-Werninghaus C, Niggemann B, Grabenhenrich L, Wahn U, Beyer K. Outcome of oral food challenges in children in relation to symptom-eliciting allergen dose and allergen-specific IgE. Allergy. 2012;67:951-7.

12 Kim J, Kim H, Park M, Choi J, Shim J, Kim M, et al. Diagnostic decision points of specific IgE concentrations in Korean children with egg and cow's milk allergies. Allergy Asthma Immunol Res. 2015;7:332-8.

13 Verstege A, Mehl A, Rolinck-Werninghaus C, Staden U, Nocon M, Beyer K, et al. The predictive value of the skin prick test weal size for the outcome of oral food challenges. Clin Exp Allergy. 2005;35:1220-6.

14 Calvani M, Alessandri C, Frediani T, Lucarelli S, Miceli Sopo S, Panetta V, et al. Correlation between skin prick test using commercial extract of cow's milk protein and fresh milk and food challenges. Pediatr Allergy Immunol. 2007;18:583-8.
-1515 Imai T, Yanagida N, Ogata M, Komata T, Tomikawa M, Ebisawa M. The skin prick test is not useful in the diagnosis of the immediate type food allergy tolerance acquisition. Allergol Int. 2014;63:205-10.

O desejo de minimizar a execução dos TPOs, com seus riscos inerentes, aliado à indisponibilidade de um ponto de corte universal adequado para todas as populações, motivou este estudo, que tem como objetivos: comparar concentrações séricas de IgE específicas e diâmetros médios das pápulas induzidas no TCLI com LV e suas frações com resultados do TPO e estabelecer pontos de corte, capazes de predizer reatividade clínica ao LV em pacientes atendidos em um serviço de referência.

Métodos

Trata-se de um estudo de acurácia diagnóstica, observacional, prospectivo, que incluiu 122 crianças, entre cinco meses e três anos (mediana 17 meses), com suspeita clínica de APLV mediada por IgE e com provas de detecção de IgE específica para LV e/ou frações, na primeira consulta, positivas (critérios de inclusão).

Após aprovação pelo comitê de ética, as crianças admitidas consecutivamente no Serviço de Alergia Alimentar da Universidade Federal de Sergipe (UFS), entre novembro de 2008 e maio de 2014, que preenchiam os critérios de inclusão foram selecionadas. Pais e/ou responsáveis responderam questionário padronizado com história dos sintomas, condições do nascimento, tempo de aleitamento materno, época da primeira introdução do LV, volume desencadeante, intervalo de tempo entre a ingestão e o aparecimento dos sintomas, além do tempo da última reação e dos medicamentos usados.1616 Boyce JA, Assa'ad A, Burks AW, Jones SM, Sampson HA, Wood RA, et al. Guidelines for the diagnosis and management of food allergy in the United States: report of the NIAID-sponsored expert panel. J Allergy Clin Immunol. 2010;126:S1-58.

Foram considerados sintomas objetivos suspeitos de APLV mediada por IgE quaisquer dos descritos para: pele (hiperemia, urticária, urticária de contato e angioedema), trato respiratório (rinorreia, espirros, obstrução nasal, estridor laríngeo, rouquidão, tosse, dispneia e cianose), trato gastrintestinal (hiperemia perioral, edema de língua e/ou úvula, vômitos e diarreia) e sistema cardiovascular (taquicardia, arritmias, hipotonia, prostração e síncope), claramente observados e deflagrados até duas horas após o contato com o alimento. 22 Luyt D, Ball H, Makwana N, Green MR, Bravin K, Nasser SM, et al. BSACI guideline for the diagnosis and management of cow's milk allergy. Clin Exp Allergy. 2014;44:642-72.,33 Sicherer SH, Sampson HA. Food allergy. J Allergy Clin Immunol. 2010;125:116-25.,66 Niggemann B, Beyer K. Diagnosis of food allergy in children: toward a standardization of food challenge. J Pediatr Gastroenterol Nutr. 2007;45:399-404.,1717 Associação Brasileira de Alergia e Imunopatologia e Sociedade Brasileira de Alimentação e Nutrição. Guia prático de diagnóstico e tratamento da alergia às proteínas do leite de vaca mediada pela imunoglobulina E. Rev Bras Alerg Imunopatol. 2012;35:203-33. Como provas positivas para detecção de IgE específica para LV e frações, foram aceitos resultados de TCLI e/ou de concentrações de IgE trazidos pelos responsáveis na primeira consulta.1818 Bernstein IL, Li JT, Bernstein DI, Hamilton R, Spector SL, Tan R, et al. Allergy diagnostic testing: an updated practice parameter. Ann Allergy Asthma Immunol. 2008;100:S1-122.

Após selecionadas, crianças e mães nutrizes foram orientadas a restringir as proteínas do LV e derivados de sua dieta, por duas a quatro semanas, a não usar anti-histamínicos uma semana antes da TPO e a deixar suas crianças em jejum por duas horas antes do procedimento. 77 Nowak-Wegrzyn A, Assa'ad AH, Bahna SL, Bock SA, Sicherer SH, Teuber SS. Adverse Reactions to Food Committee of American Academy of Allergy, Asthma & Immunology. Work group report: oral food challenge testing. J Allergy Clin Immunol. 2009;123:S365-83.,1919 Bock SA, Sampson HA, Atkins FM, Zeiger RS, Lehrer S, Sachs M, et al. Double-blind, placebo-controlled food challenge (DBPCFC) as an official procedure: a manual. J Allergy Clin Immunol. 1988;82:986-97.,2020 Sicherer SH. Food allergy: when and how to perform oral food challenges. Pediatr Allergy Immunol. 1999;10:226-34. Impressos com instruções sobre isenção do LV e sobre leitura cuidadosa de rótulos foram entregues e questionário sobre o cumprimento dessas exigências foi aplicado antes da TPO. Também foram fornecidas orientações sobre riscos e benefícios do TPO e sobre as implicações de um resultado positivo ou negativo aos pais, que conscientizados, assinaram o termo de consentimento livre e esclarecido.2121 Perry TT, Matsui EC, Conover-Walker MK, Wood RA. Risk of oral food challenges. J Allergy Clin Immunol. 2004;114:1164-8.

História recente (inferior a dois anos) de anafilaxia, associada à presença de IgE específica à admissão, persistência de sintomas após período de exclusão do LV, baixa adesão às orientações sobre o preparo para o TPO e presença de processo inflamatório e/ou infeccioso no dia do procedimento foram considerados critérios de exclusão. 55 Bindslev-Jensen C, Ballmer-Weber BK, Bengtsson U, Blanco C, Ebner C, Hourihane J, et al. Standardization of double-blind, placebo-controlled food challenges in patients with immediate reactions to foods - position paper from the European Academy of Allergology and Clinical Immunology. Allergy. 2004;59:690-7.,77 Nowak-Wegrzyn A, Assa'ad AH, Bahna SL, Bock SA, Sicherer SH, Teuber SS. Adverse Reactions to Food Committee of American Academy of Allergy, Asthma & Immunology. Work group report: oral food challenge testing. J Allergy Clin Immunol. 2009;123:S365-83.

No dia da TPO, checado o cumprimento das recomendações, as crianças eram submetidas a exame físico criterioso, seguido pelos seguintes exames: coleta de sangue periférico para determinação da concentração sérica de IgE total e de IgE específicas para o LV e frações e TCLI.

Amostra de sangue periférico foi coletada, centrifugada e o soro estocado e congelado a -20 °C até a análise. Foram determinados os níveis de IgE total e específica a LV total, α-lactoalbumina, β-lactoglobulina e caseína, empregou-se o método ImmunoCAP® (Thermo Fisher Scientific, Brasil).2222 Lieberman JA, Sicherer SH. Diagnosis of food allergy: epicutaneous skin tests, in vitro tests, and oral food challenge. Curr Allergy Asthma Rep. 2011;11:58-64. As determinações dos níveis séricos foram feitas no Laboratório de Pesquisa da Disciplina de Nutrologia do Departamento de Pediatria da Universidade Federal de São Paulo. Os resultados obtidos foram expressos em kUA/L e considerados positivos quando maiores que 0,35 kUA/L.2222 Lieberman JA, Sicherer SH. Diagnosis of food allergy: epicutaneous skin tests, in vitro tests, and oral food challenge. Curr Allergy Asthma Rep. 2011;11:58-64.

Quanto ao TCLI, foram empregados os seguintes extratos: LV total (10 mg/mL), α-lactoalbumina (5%), β-lactoglobulina (5%) e caseína (5%) (IPI-ASAC®, Espanha), além dos controles: negativo (diluente) e positivo (histamina 1 mg/mL). O surgimento de pápula com diâmetro médio maior ou igual a 3 mm em relação ao controle negativo, 15 minutos após o TCLI por puntura, caracterizou o resultado como positivo.2222 Lieberman JA, Sicherer SH. Diagnosis of food allergy: epicutaneous skin tests, in vitro tests, and oral food challenge. Curr Allergy Asthma Rep. 2011;11:58-64.

O TPO aberto, procedimento no qual apenas o médico tem consciência do que é ofertado ao paciente, foi executado em ambiente hospitalar, sob supervisão de equipe multidisciplinar preparada para atender qualquer reação clínica.77 Nowak-Wegrzyn A, Assa'ad AH, Bahna SL, Bock SA, Sicherer SH, Teuber SS. Adverse Reactions to Food Committee of American Academy of Allergy, Asthma & Immunology. Work group report: oral food challenge testing. J Allergy Clin Immunol. 2009;123:S365-83. O TPO aberto foi escolhido pelo fato de, em se tratando de sintomas objetivos, em crianças menores de três anos, permitir estabelecer o diagnóstico, mesmo sem a execução do TPO duplo cego controlado por placebo (TPODCPC).55 Bindslev-Jensen C, Ballmer-Weber BK, Bengtsson U, Blanco C, Ebner C, Hourihane J, et al. Standardization of double-blind, placebo-controlled food challenges in patients with immediate reactions to foods - position paper from the European Academy of Allergology and Clinical Immunology. Allergy. 2004;59:690-7.

Foram ofertados 100 mL de LV (diluição a 13%) administrados em doses crescentes (1, 4, 10, 15, 20, 25 e 25 ml), a intervalos de 15 a 20 minutos, equivalentes a 0,03, 0,14, 0,34, 0,51, 0,68, 0,85 e 0,85 g de proteína do LV, respectivamente. 77 Nowak-Wegrzyn A, Assa'ad AH, Bahna SL, Bock SA, Sicherer SH, Teuber SS. Adverse Reactions to Food Committee of American Academy of Allergy, Asthma & Immunology. Work group report: oral food challenge testing. J Allergy Clin Immunol. 2009;123:S365-83.,88 Garcia-Ara C, Boyano-Martinez T, Diaz-Pena JM, Martín-Muñoz F, Reche-Frutos M, Martín-Esteban M. Specific IgE levels in the diagnosis of immediate hypersensitivity to cow's milk protein in the infant. Allergy Clin Immunol. 2001;107:185-90.,1919 Bock SA, Sampson HA, Atkins FM, Zeiger RS, Lehrer S, Sachs M, et al. Double-blind, placebo-controlled food challenge (DBPCFC) as an official procedure: a manual. J Allergy Clin Immunol. 1988;82:986-97.,2020 Sicherer SH. Food allergy: when and how to perform oral food challenges. Pediatr Allergy Immunol. 1999;10:226-34. Em caso de recusa, usava-se veículo palatável capaz de mascarar o sabor do LV.1919 Bock SA, Sampson HA, Atkins FM, Zeiger RS, Lehrer S, Sachs M, et al. Double-blind, placebo-controlled food challenge (DBPCFC) as an official procedure: a manual. J Allergy Clin Immunol. 1988;82:986-97.

Quando reações clínicas surgiam, o teste era considerado positivo e a criança prontamente atendida, permanecia em observação até o desaparecimento das manifestações.77 Nowak-Wegrzyn A, Assa'ad AH, Bahna SL, Bock SA, Sicherer SH, Teuber SS. Adverse Reactions to Food Committee of American Academy of Allergy, Asthma & Immunology. Work group report: oral food challenge testing. J Allergy Clin Immunol. 2009;123:S365-83. As reações foram classificadas de acordo com a gravidade em leves (apenas sintomas cutâneos e/ou sintomas do trato respiratório superior), moderadas (sintomas do trato gastrointestinal ou associação de sistemas exclusive sintomas do trato respiratório inferior e/ou cardiovascular) e graves (sintomas da laringe, do trato respiratório inferior e/ou sintomas cardiovasculares).2121 Perry TT, Matsui EC, Conover-Walker MK, Wood RA. Risk of oral food challenges. J Allergy Clin Immunol. 2004;114:1164-8.

Se após a ingestão de todo o volume ofertado nenhuma manifestação ocorresse em até duas horas, o teste era considerado negativo, o paciente era excluído do estudo e recebia alta.

Análise dos dados obtidos

Os dados coletados foram analisados com o software estatístico SPSS (Released 2008. SPSS Statistics para Windows, versão 17.0. Chicago, EUA).

Foram calculadas sensibilidade (Se), especificidade (Ep), valor preditivo positivo (VPP), valor preditivo negativo (VPN), razão de verossimilhança positiva e negativa para avaliação da acurácia dos pontos de corte das IgEs séricas específicas para LV total e frações e dos diâmetros médios da pápula do TCLI quando comparados aos resultados do TPO (padrão-ouro).2323 Oliveira GM, Camargo FT, Gonçalves EC, Duarte CV, Guimarães CA. Revisão sistemática da acurácia dos testes diagnósticos: uma revisão narrativa. Rev Col Bras Cir (Rio de Janeiro). 2010;37:153-6.

As curvas ROC (receiver operating characteristic) foram obtidas da relação entre Se e Ep. Com isso, foram definidos "pontos de corte ótimos", com o objetivo de definir alergia. Para tal, foram usados dois métodos: Índice de Youden e maximização da Ep.2424 Devillé WL, Buntinx F, Bouter LM, Montori VM, de Vet HC, Van der Windt DA, et al. Conducting systematic reviews of diagnostic studies: didactic guidelines. BMC Med Res Methodol. 2002;3:2-9.

Foram calculados VPP e VPN para um valor de corte de 0,35 kUA/L, baseados em referências prévias de positividade e para os "pontos de corte ótimos" na curva ROC. Foi calculado o poder amostral para que os pontos de corte apresentassem especificidade igual ou superior a 70% tal como em Champely (2017).2525 Pwr. Basic functions for power analysis. R: package version; 2017. Available from: https://CRAN.R-project.org/package=pwr
https://CRAN.R-project.org/package=pwr...

Para avaliar a concordância entre as frações (α-lactoalbumina, β-lactoglobulina e caseína) e o leite de vaca total, usamos a medida de concordância α de Krippendorf.2626 Hayes AF, Krippendorff K. Answering the call for a standard reliability measure for coding data. Commun Methods Meas. 2007;1:77-89. O valor 1 significa haver concordância perfeita, 0 indica ausência de concordância e valores inferiores a 0 indicam discordância sistemática.

O estudo foi aprovado pelos comitês de ética das Universidades Federais de Sergipe (UFS) e de São Paulo (Unifesp), sob respectivos números CEP/SE No CAAE - 0087.0.107.174-08 e CEP/SP - 1440/11.

Resultados

Entre as 122 crianças submetidas ao TPO, 60 (49%) eram do sexo masculino. O grupo alérgico foi constituído por 73 pacientes (59,8%) e o controle (não alérgicos) por 49 (40,2%).

Os sintomas mais observados durante o TPO aberto foram os cutâneos com 86,3% (63/73), seguidos pelos respiratórios em 23,3% (17/73) e os gastrintestinais em 13,7% (10/73). Não houve sintomas cardiovasculares. Urticária foi a manifestação clínica mais frequente, acometeu 78% das crianças.

Os níveis séricos de IgE específica para LV e sua frações (α-lactoalbumina, β-lactoglobulina e caseína) foram significantemente maiores no grupo dos alérgicos em comparação com os não alérgicos (mediana 3,39 kUA/L vs. 1,16 kUA/L; 0,97 kUA/L vs. 0,09 kUA/L; 1,72 kUA/L vs. 0,44 kUA/L e 0,75 kUA/L vs. 0,36 kUA/L, respectivamente).

A tabela 1 descreve a acurácia de diferentes concentrações de IgE específicas e de diâmetros médios de pápulas para o LV e suas frações segundo os resultados do TPO. Para as concentrações de IgE, quando o valor de 0,35 kUA/L foi estabelecido como ponto de corte para positividade do teste, a Se para o LV total e suas frações variou de 43% a 67%, a Sp de 27% a 39% e o VPN de 25% a 43%.

Tabela 1
Descrição dos valores de sensibilidade (Se), especificidade (Sp), Valores Preditivos Positivos (VPP), Valores Preditivos Negativos (VPN), para as concentrações de IgE específicas para leite de vaca e suas frações e para diâmetros médios de pápulas no teste cutâneo de leitura imediata no Teste de Provocação Oral Aberto, por diferentes critérios

As curvas ROC construídas a partir da relação obtida entre a Se e Sp dos níveis de IgE específica se mostraram discriminatórias, com área sob a curva maior do que 0,6 para o LV e suas frações (fig. 1). De acordo com o critério proposto para o estabelecimento de um "ponto de corte ótimo", o Índice de Youden, a concentração sérica de IgE específica considerada ótima para o LV foi 5,17 kUA/L, bem diferente da obtida com o critério da maximização da Sp (VPP = 100%), com valores de 77,7 kUA/L (tabela 1).

Figura 1
Curvas ROC (receiver operating characteristic) para obtenção dos níveis ótimos de IgE séricas específicas para: (a) leite de vaca total (b) α-lactoalbumina (c) β-lactoglobulina (d) caseína; e para diâmetros médios de pápulas do teste cutâneo de leitura imediata para: (e) leite de vaca total (f) α-lactoalbumina (g) β-lactoglobulina e (h) caseína, no Teste de Provocação Oral Aberto para leite de vaca e suas frações.

Para as frações, segundo o Índice de Youden, foram considerados os valores: 0,95 kUA/L para α-lactoalbumina, 0,82 kUA/L para β-lactoglobulina e 0,72 kUA/L para caseína (tabela 1). Quando avaliadas isoladamente, as Razões de Verossimilhança Positiva (RVP), índice que representa o quanto um resultado positivo aumenta a chance de um indivíduo ser doente, tinham pequenas acurácias diagnósticas (valores entre 2 e 5), eram nulas para β-lactoglobulina (valor entre 1 e 2) e maiores para o LV total. A avaliação das diferentes combinações possíveis demonstrou que qualquer associação tem melhor acurácia do que o LV total isoladamente, principalmente se com a caseína (RVP = 9,53).

Os diâmetros médios das pápulas foram significantemente maiores no grupo dos alérgicos: LV - mediana 2,5 mm vs. 0 mm, α-lactoalbumina: 8,75 mm vs. 5,5 mm, β-lactoglobulina: 9,75 mm vs. 8,0 mm e caseína: 3,5 mm vs. 0 mm. Ao avaliar o desempenho de diferentes diâmetros médios de pápulas, quando o valor de 3 mm foi estabelecido como ponto de corte para positividade do TCLI, a Se para o LV total e suas frações variou de 15% a 46%, a Sp de 15% a 38% e o VPN de 16% a 29% (tabela 1).

As curvas ROC se mostraram adequadas, com área sob a curva maior do que 0,7 para o LV e suas frações, à exceção da caseína, com área de 0,697 (0,607 a 0,787), apenas discriminatória (fig. 1). O "ponto de corte ótimo", empregando-se o Índice de Youden, para o diâmetro médio de pápula do LV foi 3,5 mm. Com a maximização da Sp (VPP = 100%), o ponto de corte para LV foi 5,0 mm, 15,5 mm para α-lactoalbumina, 21,5 mm para β-lactoglobulina e 10 mm para caseína (tabela 1). O uso dos componentes contribuiu para melhorar o diagnóstico dos que tinham TCLI negativo para o LV total (RVN: 0,74).

Foi calculado o poder dos pontos de corte estabelecidos, para apresentarem especificidade igual ou superior a 70%. O poder do ponto de corte da IgE sérica específica e do teste cutâneo para leite de vaca, calculado através do método de Youden, foi de 99,9% em ambos, foi considerado de alto poder.

Discussão

Na prática clínica, novos testes diagnósticos são adotados por diferentes razões: triagem, para melhor informação, para menor custo ou como complemento aos existentes.2323 Oliveira GM, Camargo FT, Gonçalves EC, Duarte CV, Guimarães CA. Revisão sistemática da acurácia dos testes diagnósticos: uma revisão narrativa. Rev Col Bras Cir (Rio de Janeiro). 2010;37:153-6. Testes perfeitos não existem, mas é necessário saber como eles podem diferenciar indivíduos doentes dos saudáveis, o que é denominado acurácia do teste diagnóstico.2424 Devillé WL, Buntinx F, Bouter LM, Montori VM, de Vet HC, Van der Windt DA, et al. Conducting systematic reviews of diagnostic studies: didactic guidelines. BMC Med Res Methodol. 2002;3:2-9.

Este estudo reúne vantagens por ser um estudo de acurácia diagnóstica, transversal e prospectivo que avaliou crianças com até três anos e com sintomas objetivos de APLV, o que permitiu o uso do TPO aberto como método diagnóstico, dispensou o TPODCPC, procedimento menos exequível. 55 Bindslev-Jensen C, Ballmer-Weber BK, Bengtsson U, Blanco C, Ebner C, Hourihane J, et al. Standardization of double-blind, placebo-controlled food challenges in patients with immediate reactions to foods - position paper from the European Academy of Allergology and Clinical Immunology. Allergy. 2004;59:690-7.,66 Niggemann B, Beyer K. Diagnosis of food allergy in children: toward a standardization of food challenge. J Pediatr Gastroenterol Nutr. 2007;45:399-404. Em sua maioria, os estudos incluíam pacientes de faixas etárias distintas, alguns deles com adultos. 88 Garcia-Ara C, Boyano-Martinez T, Diaz-Pena JM, Martín-Muñoz F, Reche-Frutos M, Martín-Esteban M. Specific IgE levels in the diagnosis of immediate hypersensitivity to cow's milk protein in the infant. Allergy Clin Immunol. 2001;107:185-90.

9 Celik-Bilgili S, Mehl A, Verstege A, Staden U, Nocon M, Beyer K, et al. The predictive value of specific immunoglobulin E levels in serum for the outcome of oral food challenges. Clin Exp Allergy. 2005;35:268-73.

10 van der Gugten AC, den OM, Meijer Y, Pasmans SG, Knulst AC, Hoekstra MO. Usefulness of specific IgE levels in predicting cow's milk allergy. J Allergy Clin Immunol. 2008;121:531-3.

11 Rolinck-Werninghaus C, Niggemann B, Grabenhenrich L, Wahn U, Beyer K. Outcome of oral food challenges in children in relation to symptom-eliciting allergen dose and allergen-specific IgE. Allergy. 2012;67:951-7.

12 Kim J, Kim H, Park M, Choi J, Shim J, Kim M, et al. Diagnostic decision points of specific IgE concentrations in Korean children with egg and cow's milk allergies. Allergy Asthma Immunol Res. 2015;7:332-8.

13 Verstege A, Mehl A, Rolinck-Werninghaus C, Staden U, Nocon M, Beyer K, et al. The predictive value of the skin prick test weal size for the outcome of oral food challenges. Clin Exp Allergy. 2005;35:1220-6.

14 Calvani M, Alessandri C, Frediani T, Lucarelli S, Miceli Sopo S, Panetta V, et al. Correlation between skin prick test using commercial extract of cow's milk protein and fresh milk and food challenges. Pediatr Allergy Immunol. 2007;18:583-8.
-1515 Imai T, Yanagida N, Ogata M, Komata T, Tomikawa M, Ebisawa M. The skin prick test is not useful in the diagnosis of the immediate type food allergy tolerance acquisition. Allergol Int. 2014;63:205-10.Todas as crianças fizeram TPO aberto independentemente dos níveis de IgE e dos diâmetros médios de pápulas, minimizou-se viés de seleção. O tempo de dieta de exclusão antes de fazerem o TPO não interferiu nos resultados. O TPO com sintomas foi considerado positivo (alérgico) e sem sintomas, negativo (não alérgicos ou tolerantes). O desempenho apenas discriminatório das curvas ROC se deve à incerteza existente sobre o poder de previsão da alergia e/ou tolerância pelos níveis séricos de IgE específica e do diâmetro médio das pápulas para pacientes na faixa etária estudada, não anafiláticos e de localização distinta.

O ImmunoCAP®, técnica de detecção sérica quantitativa da IgE específica, permitiu aos pesquisadores estabelecer uma relação entre níveis de IgE e diagnóstico de alergia alimentar.33 Sicherer SH, Sampson HA. Food allergy. J Allergy Clin Immunol. 2010;125:116-25. Trabalhos publicados que propuseram e discutiram valores de ponto de corte para diagnóstico da APLV descreveram resultados distintos entre populações estudadas, apontaram para a necessidade de se estabelecerem valores para cada população específica, o que motivou este trabalho (tabela 2). 88 Garcia-Ara C, Boyano-Martinez T, Diaz-Pena JM, Martín-Muñoz F, Reche-Frutos M, Martín-Esteban M. Specific IgE levels in the diagnosis of immediate hypersensitivity to cow's milk protein in the infant. Allergy Clin Immunol. 2001;107:185-90.

9 Celik-Bilgili S, Mehl A, Verstege A, Staden U, Nocon M, Beyer K, et al. The predictive value of specific immunoglobulin E levels in serum for the outcome of oral food challenges. Clin Exp Allergy. 2005;35:268-73.

10 van der Gugten AC, den OM, Meijer Y, Pasmans SG, Knulst AC, Hoekstra MO. Usefulness of specific IgE levels in predicting cow's milk allergy. J Allergy Clin Immunol. 2008;121:531-3.

11 Rolinck-Werninghaus C, Niggemann B, Grabenhenrich L, Wahn U, Beyer K. Outcome of oral food challenges in children in relation to symptom-eliciting allergen dose and allergen-specific IgE. Allergy. 2012;67:951-7.

12 Kim J, Kim H, Park M, Choi J, Shim J, Kim M, et al. Diagnostic decision points of specific IgE concentrations in Korean children with egg and cow's milk allergies. Allergy Asthma Immunol Res. 2015;7:332-8.

13 Verstege A, Mehl A, Rolinck-Werninghaus C, Staden U, Nocon M, Beyer K, et al. The predictive value of the skin prick test weal size for the outcome of oral food challenges. Clin Exp Allergy. 2005;35:1220-6.

14 Calvani M, Alessandri C, Frediani T, Lucarelli S, Miceli Sopo S, Panetta V, et al. Correlation between skin prick test using commercial extract of cow's milk protein and fresh milk and food challenges. Pediatr Allergy Immunol. 2007;18:583-8.
-1515 Imai T, Yanagida N, Ogata M, Komata T, Tomikawa M, Ebisawa M. The skin prick test is not useful in the diagnosis of the immediate type food allergy tolerance acquisition. Allergol Int. 2014;63:205-10.No Brasil, pontos de corte para as concentrações séricas de IgE específica ao LV foram estabelecidos para populações fenotipicamente distintas, em São Paulo, com resultados diferentes: 3,06 kUA/L para anafiláticos2727 Castro AP, Pastorino AC, Gushken AK, Kokron CM, Filho UD, Jacob CM. Establishing a cut-off for serum levels of specific IgE to milk and its components for cow's milk allergy. Results from a specific population. Allergol Immunopathol. 2015;43:67-72. e 11 kUA/L para não anafiláticos.2828 Gushken AK, Castro AB, Pastorinho AC, Ciccione AC, Gonçalves RF, Jacob CM. Establishing a milk specific decision point in IgE mediated cow's milk allergy (CMA) patients from a tertiary pediatric Brazilian center. J Allergy Clin Immunol. 2006;117:176.

Tabela 2
Valores séricos de IgE específicas (ImmunoCAP®) preditivas para o diagnóstico da alergia ao leite de vaca (reproduzido e modificado de Luyt et al.22 Luyt D, Ball H, Makwana N, Green MR, Bravin K, Nasser SM, et al. BSACI guideline for the diagnosis and management of cow's milk allergy. Clin Exp Allergy. 2014;44:642-72.

Por definição, o ponto de corte é considerado bom quando combina VPP e Sp elevados. Em nosso estudo, a curva ROC mostrou que o ponto de corte ótimo para LV (isto é, o ponto em que o peso da Se é igual ao da Sp), com o Índice de Youden, foi de 5,17 kUA/L (Sp: 90% e VPP: 88%). Ao tentarmos encontrar um ponto de corte mais adequado, ou seja, com maior VPP, fixando-se o VPP em 90% ou em 95%, o valor fornecido pela curva foi de 77,7 kUA/L (Sp e VPP de 100%) (tabela 1).

Na prática clínica, o nível mais adequado de IgE específica para se indicar ou não a TPO depende do contexto clínico. Se a provocação pode ser perigosa para o paciente, um ponto de corte baixo seria de interesse, mesmo à custa de rotulá-lo erroneamente como alérgico. Apesar de o valor 5,17 kUA/L não apresentar Sp e VPP tão adequados, aceitar 77 kUA/L seria submeter ao TPO todas as crianças e expor, assim, muitas delas a situações de risco (tabela 1).

Alguns estudos também documentaram a utilidade do TCLI como preditor de positividade no TPO para diagnóstico da APLV. 1313 Verstege A, Mehl A, Rolinck-Werninghaus C, Staden U, Nocon M, Beyer K, et al. The predictive value of the skin prick test weal size for the outcome of oral food challenges. Clin Exp Allergy. 2005;35:1220-6.

14 Calvani M, Alessandri C, Frediani T, Lucarelli S, Miceli Sopo S, Panetta V, et al. Correlation between skin prick test using commercial extract of cow's milk protein and fresh milk and food challenges. Pediatr Allergy Immunol. 2007;18:583-8.
-1515 Imai T, Yanagida N, Ogata M, Komata T, Tomikawa M, Ebisawa M. The skin prick test is not useful in the diagnosis of the immediate type food allergy tolerance acquisition. Allergol Int. 2014;63:205-10. O ponto de corte ótimo estabelecido para o LV no TCLI foi de 3,5 mm (Sp = 90% e VPP = 87%). Ao tentarmos encontrar um ponto de corte mais adequado, fixando-se o VPP em 90% ou em 95%, o valor fornecido pela curva ROC foi de 5,0 mm (especificidade e VPP de 100%) (tabela 1).

Embora não haja restrição de idade para o TCLI, admite-se que pacientes menores de dois anos podem apresentar diâmetros menores, pelo fato de a reatividade cutânea, adquirida durante a infância, atingir seu pico máximo dos 15 aos 25 anos e declinar progressivamente.2929 Heinzerling L, Mari A, Bergmann KC, Bresciani M, Burbach G, Darsow U, et al. The skin prick test - European standards. Clin Transl Allergy. 2013;3:1-10. Por tal motivo, o índice cutâneo no TCLI, razão entre tamanho de pápula e o controle positivo, pode ser usado para predizer resultados dos testes de provocação oral.3030 Ueno H, Yoshioka K, Matsumoto T. Usefulness of the skin index in predicting the outcome of oral challenges in children. J Investig Allergol Clin Immunol. 2007;17:207-10. Ao fixar como positivo valor de 0,6, previamente estabelecido,3030 Ueno H, Yoshioka K, Matsumoto T. Usefulness of the skin index in predicting the outcome of oral challenges in children. J Investig Allergol Clin Immunol. 2007;17:207-10. e comparar a acurácia obtida com as dos pontos de corte estabelecidos pelo índice de Youden e pela maximização da Sp, obtivemos como melhor medida o valor de 3,5 mm (tabela 3). Alguns autores correlacionaram seus resultados do índice cutâneo com os do TPO, no entanto nenhuma utilidade foi encontrada neste estudo. 1313 Verstege A, Mehl A, Rolinck-Werninghaus C, Staden U, Nocon M, Beyer K, et al. The predictive value of the skin prick test weal size for the outcome of oral food challenges. Clin Exp Allergy. 2005;35:1220-6.,1414 Calvani M, Alessandri C, Frediani T, Lucarelli S, Miceli Sopo S, Panetta V, et al. Correlation between skin prick test using commercial extract of cow's milk protein and fresh milk and food challenges. Pediatr Allergy Immunol. 2007;18:583-8.,2929 Heinzerling L, Mari A, Bergmann KC, Bresciani M, Burbach G, Darsow U, et al. The skin prick test - European standards. Clin Transl Allergy. 2013;3:1-10.

Tabela 3
Acurácia dos diferentes pontos de corte do diâmetro médio da pápula para leite de vaca total nos Testes de Provocação Oral Aberto

Se a prevalência da doença na população é alta, os resultados do VPP e do VPN sofrem interferências. Um ajuste da prevalência seria impossível pelo desconhecimento da prevalência da APLV em nossa região e no Brasil, então medidas opcionais de desempenho, como razão de verossimilhança positiva (RVP) e negativa, (RVN) foram aplicadas.

Na avaliação diagnóstica do uso dos componentes associados ao LV na avaliação de crianças com suspeita de APLV, nossos resultados concordariam com os publicados por Castro et al., que demonstraram não haver incremento na avaliação diagnóstica com o uso dos componentes em adição ao LV, isso se as tivéssemos analisado uma a uma.2727 Castro AP, Pastorino AC, Gushken AK, Kokron CM, Filho UD, Jacob CM. Establishing a cut-off for serum levels of specific IgE to milk and its components for cow's milk allergy. Results from a specific population. Allergol Immunopathol. 2015;43:67-72. No entanto, ao avaliar diferentes combinações possíveis, demonstramos que qualquer associação tem melhor acurácia do que o LV total isoladamente. Garcia-Ara et al. também observaram que, na validação dos seus resultados com o TPO, houve vantagem no diagnóstico quando as frações proteicas foram associadas. Além disso, a negatividade das frações excluía a APLV em muitos dos casos, pelo seu elevado VPN.88 Garcia-Ara C, Boyano-Martinez T, Diaz-Pena JM, Martín-Muñoz F, Reche-Frutos M, Martín-Esteban M. Specific IgE levels in the diagnosis of immediate hypersensitivity to cow's milk protein in the infant. Allergy Clin Immunol. 2001;107:185-90.

Para avaliar se os resultados obtidos estavam associados à concordância entre as frações (α-lactoalbumina, β-lactoglobulina e caseína) e o LV, visto que as frações deveriam estar incluídas no componente total do LV, usamos a medida de concordância α de Krippendorf.2626 Hayes AF, Krippendorff K. Answering the call for a standard reliability measure for coding data. Commun Methods Meas. 2007;1:77-89. A observação de níveis discretamente superiores a zero permitiu afirmar que o uso das frações, tanto para dosagens das IgE como para diâmetro da pápula no TCLI, auxilia no diagnóstico da APLV em menores de três anos.

Em conclusão, o nível de corte de IgE específica para LV em crianças de um serviço especializado mostrou-se discriminatório para o diagnóstico de APLV com valor de 5,17 kUA/L, assim como o do diâmetro médio de pápula para LV de 3,5 mm.

  • Como citar este artigo: Franco JM, Pinheiro AP, Vieira SC, Barreto ÍD, Gurgel RQ, Cocco RR, et al. Accuracy of serum IgE concentrations and papule diameter in the diagnosis of cow's milk allergy. J Pediatr (Rio J). 2018;94:279-85.
  • ☆☆
    Trabalho vinculado à Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), Escola Paulista de Medicina, São Paulo, SP; e Universidade Federal de Sergipe, Aracaju, SE, Brasil.

References

  • 1
    Eigenmann PA. Mechanisms of food allergy. Pediatr Allergy Immunol. 2009;20:5-11.
  • 2
    Luyt D, Ball H, Makwana N, Green MR, Bravin K, Nasser SM, et al. BSACI guideline for the diagnosis and management of cow's milk allergy. Clin Exp Allergy. 2014;44:642-72.
  • 3
    Sicherer SH, Sampson HA. Food allergy. J Allergy Clin Immunol. 2010;125:116-25.
  • 4
    Fiocchi A, Brozek J, Schunemann HJ, Bahna SL, von Berg A, Beyer K, et al. Diagnosis and rationale for action against cow's milk allergy (DRACMA): a summary report. J Allergy Clin Immunol. 2010;126:1119-28.
  • 5
    Bindslev-Jensen C, Ballmer-Weber BK, Bengtsson U, Blanco C, Ebner C, Hourihane J, et al. Standardization of double-blind, placebo-controlled food challenges in patients with immediate reactions to foods - position paper from the European Academy of Allergology and Clinical Immunology. Allergy. 2004;59:690-7.
  • 6
    Niggemann B, Beyer K. Diagnosis of food allergy in children: toward a standardization of food challenge. J Pediatr Gastroenterol Nutr. 2007;45:399-404.
  • 7
    Nowak-Wegrzyn A, Assa'ad AH, Bahna SL, Bock SA, Sicherer SH, Teuber SS. Adverse Reactions to Food Committee of American Academy of Allergy, Asthma & Immunology. Work group report: oral food challenge testing. J Allergy Clin Immunol. 2009;123:S365-83.
  • 8
    Garcia-Ara C, Boyano-Martinez T, Diaz-Pena JM, Martín-Muñoz F, Reche-Frutos M, Martín-Esteban M. Specific IgE levels in the diagnosis of immediate hypersensitivity to cow's milk protein in the infant. Allergy Clin Immunol. 2001;107:185-90.
  • 9
    Celik-Bilgili S, Mehl A, Verstege A, Staden U, Nocon M, Beyer K, et al. The predictive value of specific immunoglobulin E levels in serum for the outcome of oral food challenges. Clin Exp Allergy. 2005;35:268-73.
  • 10
    van der Gugten AC, den OM, Meijer Y, Pasmans SG, Knulst AC, Hoekstra MO. Usefulness of specific IgE levels in predicting cow's milk allergy. J Allergy Clin Immunol. 2008;121:531-3.
  • 11
    Rolinck-Werninghaus C, Niggemann B, Grabenhenrich L, Wahn U, Beyer K. Outcome of oral food challenges in children in relation to symptom-eliciting allergen dose and allergen-specific IgE. Allergy. 2012;67:951-7.
  • 12
    Kim J, Kim H, Park M, Choi J, Shim J, Kim M, et al. Diagnostic decision points of specific IgE concentrations in Korean children with egg and cow's milk allergies. Allergy Asthma Immunol Res. 2015;7:332-8.
  • 13
    Verstege A, Mehl A, Rolinck-Werninghaus C, Staden U, Nocon M, Beyer K, et al. The predictive value of the skin prick test weal size for the outcome of oral food challenges. Clin Exp Allergy. 2005;35:1220-6.
  • 14
    Calvani M, Alessandri C, Frediani T, Lucarelli S, Miceli Sopo S, Panetta V, et al. Correlation between skin prick test using commercial extract of cow's milk protein and fresh milk and food challenges. Pediatr Allergy Immunol. 2007;18:583-8.
  • 15
    Imai T, Yanagida N, Ogata M, Komata T, Tomikawa M, Ebisawa M. The skin prick test is not useful in the diagnosis of the immediate type food allergy tolerance acquisition. Allergol Int. 2014;63:205-10.
  • 16
    Boyce JA, Assa'ad A, Burks AW, Jones SM, Sampson HA, Wood RA, et al. Guidelines for the diagnosis and management of food allergy in the United States: report of the NIAID-sponsored expert panel. J Allergy Clin Immunol. 2010;126:S1-58.
  • 17
    Associação Brasileira de Alergia e Imunopatologia e Sociedade Brasileira de Alimentação e Nutrição. Guia prático de diagnóstico e tratamento da alergia às proteínas do leite de vaca mediada pela imunoglobulina E. Rev Bras Alerg Imunopatol. 2012;35:203-33.
  • 18
    Bernstein IL, Li JT, Bernstein DI, Hamilton R, Spector SL, Tan R, et al. Allergy diagnostic testing: an updated practice parameter. Ann Allergy Asthma Immunol. 2008;100:S1-122.
  • 19
    Bock SA, Sampson HA, Atkins FM, Zeiger RS, Lehrer S, Sachs M, et al. Double-blind, placebo-controlled food challenge (DBPCFC) as an official procedure: a manual. J Allergy Clin Immunol. 1988;82:986-97.
  • 20
    Sicherer SH. Food allergy: when and how to perform oral food challenges. Pediatr Allergy Immunol. 1999;10:226-34.
  • 21
    Perry TT, Matsui EC, Conover-Walker MK, Wood RA. Risk of oral food challenges. J Allergy Clin Immunol. 2004;114:1164-8.
  • 22
    Lieberman JA, Sicherer SH. Diagnosis of food allergy: epicutaneous skin tests, in vitro tests, and oral food challenge. Curr Allergy Asthma Rep. 2011;11:58-64.
  • 23
    Oliveira GM, Camargo FT, Gonçalves EC, Duarte CV, Guimarães CA. Revisão sistemática da acurácia dos testes diagnósticos: uma revisão narrativa. Rev Col Bras Cir (Rio de Janeiro). 2010;37:153-6.
  • 24
    Devillé WL, Buntinx F, Bouter LM, Montori VM, de Vet HC, Van der Windt DA, et al. Conducting systematic reviews of diagnostic studies: didactic guidelines. BMC Med Res Methodol. 2002;3:2-9.
  • 25
    Pwr. Basic functions for power analysis. R: package version; 2017. Available from: https://CRAN.R-project.org/package=pwr
    » https://CRAN.R-project.org/package=pwr
  • 26
    Hayes AF, Krippendorff K. Answering the call for a standard reliability measure for coding data. Commun Methods Meas. 2007;1:77-89.
  • 27
    Castro AP, Pastorino AC, Gushken AK, Kokron CM, Filho UD, Jacob CM. Establishing a cut-off for serum levels of specific IgE to milk and its components for cow's milk allergy. Results from a specific population. Allergol Immunopathol. 2015;43:67-72.
  • 28
    Gushken AK, Castro AB, Pastorinho AC, Ciccione AC, Gonçalves RF, Jacob CM. Establishing a milk specific decision point in IgE mediated cow's milk allergy (CMA) patients from a tertiary pediatric Brazilian center. J Allergy Clin Immunol. 2006;117:176.
  • 29
    Heinzerling L, Mari A, Bergmann KC, Bresciani M, Burbach G, Darsow U, et al. The skin prick test - European standards. Clin Transl Allergy. 2013;3:1-10.
  • 30
    Ueno H, Yoshioka K, Matsumoto T. Usefulness of the skin index in predicting the outcome of oral challenges in children. J Investig Allergol Clin Immunol. 2007;17:207-10.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    May-Jun 2018

Histórico

  • Recebido
    19 Jan 2017
  • Aceito
    21 Abr 2017
Sociedade Brasileira de Pediatria Av. Carlos Gomes, 328 cj. 304, 90480-000 Porto Alegre RS Brazil, Tel.: +55 51 3328-9520 - Porto Alegre - RS - Brazil
E-mail: jped@jped.com.br