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Chegou o momento de investir mais na prevenção de infecções associadas às creches em crianças Como citar este artigo: Hojsak I. The time has come to invest more in the prevention of day care-associated infection in children. J Pediatr (Rio J). 2019;95:623-4. , ☆☆ ☆☆ Ver artigo de Oliveira et al. nas páginas 657-66.

A mudança dos cuidados domiciliares para a creche teve um impacto significativo na saúde pediátrica e ainda continua a ser um importante fator de risco de infecções em lactentes e crianças pequenas.11 Enserink R, Lugner A, Suijkerbuijk A, Bruijning-Verhagen P, Smit HA, van Pelt W. Gastrointestinal and respiratory illness in children that do and do not attend child day care centers: a cost-of-illness study. PLOS ONE. 2014;9:e104940. O risco estimado é duas a três vezes maior em crianças que frequentam creches em comparação com crianças que ficam em casa.22 Enserink R, Ypma R, Donker GA, Smit HA, van Pelt W. Infectious disease burden related to child day care in the Netherlands. Pediatr Infect Dis J. 2013;32:e334-40. As crianças pequenas são particularmente suscetíveis a infecções respiratórias e gastrointestinais, as quais, embora sejam geralmente virais, leves e autolimitadas, são altamente contagiosas e se espalham facilmente em ambientes semifechados, como em creches. Outro fator que contribui para a suscetibilidade a infecções é o sistema imunológico ainda em desenvolvimento, especialmente em lactentes e crianças pequenas.33 Simon AK, Hollander GA, McMichael A. Evolution of the immune system in humans from infancy to old age. Proc Biol Sci. 2015;282:20143085.

Diversos estudos demonstraram que o uso da creche pode trazer um gasto econômico substancial não apenas para a família, mas também para a sociedade em geral, devido ao aumento das visitas a unidades de saúde, uso de antibióticos, hospitalizações e perdas de produtividade dos pais devido às licenças médicas para cuidar de doença infantil.11 Enserink R, Lugner A, Suijkerbuijk A, Bruijning-Verhagen P, Smit HA, van Pelt W. Gastrointestinal and respiratory illness in children that do and do not attend child day care centers: a cost-of-illness study. PLOS ONE. 2014;9:e104940.,44 Lambert S, O'Grady KA, Gabriel S, Carter R, Nolan T. The cost of seasonal respiratory illnesses in Australian children: the dominance of patient and family costs and implications for vaccine use. Commun Dis Intell Q Rep. 2004;28:510-6. Tem sido demonstrado que as crianças que são mais propensas a contrair uma infecção são aquelas que entram na creche antes dos dois anos e que a maioria das infecções se desenvolve nos primeiros meses após a sua entrada.55 Laursen RP, Larnkjaer A, Ritz C, Hojsak I, Michaelsen K, Molgaard C. Risks for upper respiratory infections in infants during their first months in day care included environmental and child-related factors. Acta Paediatr. 2018;107:1616-23.

Nesta edição do Jornal de Pediatria, Oliveira et al. apresentam dados transversais interessantes da coorte de nascimento prospectiva em Pelotas, com o objetivo de identificar os fatores de risco para infecções durante os primeiros 12 meses.66 Oliveira PD, Bertoldi AD, Silva BG, Domingues MR, Neumann NA, Silveira MF. Day care attendance during the first 12 months of life and occurrence of infectious morbidities and symptoms. J Pediatr (Rio J). 2019;95:657-66. Os fatores de risco identificados para contrair infecções incluem sexo masculino, filhos de mães mais jovens e domicílios com excesso de pessoas. Da mesma forma, conforme descrito anteriormente, esse estudo identificou que o nascimento prematuro e o tabagismo durante a gestação estão associados a maior risco de infecção do trato respiratório.77 Metzger MJ, Halperin AC, Manhart LE, Hawes SE. Association of maternal smoking during pregnancy with infant hospitalization and mortality due to infectious diseases. Pediatr Infect Dis J. 2013;32:e1-7.

No entanto, o principal (e independente) fator de risco foi a frequência à creche durante o primeiro ano de vida.66 Oliveira PD, Bertoldi AD, Silva BG, Domingues MR, Neumann NA, Silveira MF. Day care attendance during the first 12 months of life and occurrence of infectious morbidities and symptoms. J Pediatr (Rio J). 2019;95:657-66. De toda a coorte, a qual incluiu 4.018 lactentes, 11,7% entraram na creche durante na primeira infância e a maior prevalência de uso de creches foi entre mães mais velhas com maior nível de escolaridade e que amamentaram por mais tempo. Isso reflete a necessidade das mães de fornecer renda para a família e garantir um ambiente seguro para seus filhos.11 Enserink R, Lugner A, Suijkerbuijk A, Bruijning-Verhagen P, Smit HA, van Pelt W. Gastrointestinal and respiratory illness in children that do and do not attend child day care centers: a cost-of-illness study. PLOS ONE. 2014;9:e104940. As crianças foram especialmente propensas a infecções no período em que começaram a frequentar a creche.

Todos esses achados enfatizam ainda mais a necessidade de medidas preventivas adequadas, especialmente no início do uso da creche. Essas medidas devem incluir higiene adequada das mãos, exclusão de crianças infectadas da creche e a possível função dos probióticos. Uma metanálise de 2016 identificou 18 estudos clínicos controlados randomizados em cluster que investigaram o efeito da higienização das mãos nas infecções entre crianças de 3 a 11 anos em contextos escolares e descobriu que as intervenções podem reduzir a ausência das crianças nas creches e a incidência de infecções do trato respiratório.88 Willmott M, Nicholson A, Busse H, MacArthur GJ, Brookes S, Campbell R. Effectiveness of hand hygiene interventions in reducing illness absence among children in educational settings: a systematic review and meta-analysis. Arch Dis Child. 2016;101:42-50. Além disso, os pediatras devem identificar os pacientes com potencial para disseminar facilmente doenças infecciosas e aconselhar sua ausência na creche pelo menos durante a fase contagiosa da doença.66 Oliveira PD, Bertoldi AD, Silva BG, Domingues MR, Neumann NA, Silveira MF. Day care attendance during the first 12 months of life and occurrence of infectious morbidities and symptoms. J Pediatr (Rio J). 2019;95:657-66. Por último, embora as medidas acima mencionadas sejam as mais eficazes, há evidências crescentes de uso de probióticos na prevenção de infecções do trato respiratório. Uma metanálise recente mostrou que algumas cepas probióticas (principalmente LGG) poderiam ter um efeito promissor.99 Laursen RP, Hojsak I. Probiotics for respiratory tract infections in children attending day care centers - a systematic review. Eur J Pediatr. 2018;177:979-94. No entanto, para recomendações mais objetivas, são necessárias maiores evidências. Além disso, demonstrou-se que os bebês cuidados por babás tinham menor probabilidade de contrair uma infecção do trato respiratório superior do que os bebês em instalações maiores integradas à faixa etária, o que pode refletir uma menor aglomeração nas casas com babás.55 Laursen RP, Larnkjaer A, Ritz C, Hojsak I, Michaelsen K, Molgaard C. Risks for upper respiratory infections in infants during their first months in day care included environmental and child-related factors. Acta Paediatr. 2018;107:1616-23.,1010 Louhiala PJ, Jaakkola N, Ruotsalainen R, Jaakkola JJ. Form of day care and respiratory infections among Finnish children. Am J Public Health. 1995;85:1109-12. Portanto, isso poderia ser uma alternativa possível à creche, especialmente para crianças nos primeiros dois anos de vida.

Embora o estudo de Oliveira et al. tenha algumas limitações, principalmente relacionadas ao estudo retrospectivo do diagnóstico médico, bem como o fato do questionário ter sido feito apenas em um momento específico (idade de 12 meses), o estudo confirma fortemente a carga relacionada à saúde para crianças que entram em creches.66 Oliveira PD, Bertoldi AD, Silva BG, Domingues MR, Neumann NA, Silveira MF. Day care attendance during the first 12 months of life and occurrence of infectious morbidities and symptoms. J Pediatr (Rio J). 2019;95:657-66. Portanto, é importante que os profissionais de saúde investiguem e implantem possíveis medidas de prevenção com o objetivo de reduzir significativamente a incidência de doenças. Medidas preventivas bem concebidas poderiam potencialmente levar não apenas à redução da carga clínica, mas também a consideráveis economias para a sociedade, indicam que esse problema não deveria se limitar aos pais e pediatras, mas à sociedade em geral.

  • Como citar este artigo: Hojsak I. The time has come to invest more in the prevention of day care-associated infection in children. J Pediatr (Rio J). 2019;95:623-4.
  • ☆☆
    Ver artigo de Oliveira et al. nas páginas 657-66.

References

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    25 Nov 2019
  • Data do Fascículo
    Nov-Dec 2019
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