Paralelamente a suas funções políticas - e isso em 20 anos - Montaigne escreveu seus Ensaios frequentemente considerados como separados de suas responsabilidades públicas, atualmente relegadas a um segundo plano em relação à sua carreira de escritor. Gostaríamos de argumentar que seus ensaios são inseparáveis de sua vida pública. Certamente, as preocupações literárias e políticas de Montaigne mudam com o seu tempo, mas o que funda a forma do ensaio - a saber, um discurso profundamente inscrito no presente - não permite estabelecer uma diferença teórica entre público e privado, uma vez que os dois são praticamente inseparáveis quando reduzidos à sua unidade mais estrita, a qual se relaciona principalmente com a vida cotidiana, porque no imediato do vivido, o privado e o público são praticamente indissociáveis. Se uma filosofia emerge, sem dúvida, dos Ensaios, ela talvez tenha mais a ver com a manipulação constante realizada por Montaigne entre o particular (vida privada) e o universal (vida pública) do que com o conteúdo de algum preceito moral ou dogma das escolas antigas. A temporalidade da escrita e a dos eventos não estão em sincronia nos Ensaios e Montaigne opera constantemente sobre a imagem de um livro privado (fora de toda temporalidade histórica), enquanto os Ensaios são concebidos como um objeto, permitindo-lhe precisamente o acesso à vida pública. Essa filosofia do cotidiano e do tempo presente que promana dos Ensaios não afasta as considerações públicas e históricas que sempre dão ritmo à escrita de uma vida muito particular.
Montaigne; vida privada; vida pública; cotidiano