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EDUCAÇÃO, SUBJETIVIDADE E DISCURSO CIENTÍFICO SOBRE DEFICIÊNCIA: UMA SAÍDA INTERSECCIONAL

Education, Subjectivity, and Scientific Discourse on Disability: An Intersectional Approach

Educación, subjetividad y discurso científico sobre discapacidad: un enfoque interseccional

Resumo

O artigo explora a concepção de sujeito da modernidade filosófica em sua relação com o discurso científico sobre a deficiência e suas consequências para a inclusão escolar. Perspectivas contemporâneas sobre a educação inclusiva apontam a necessidade de questionar os fundamentos modernos e eurocentrados da exclusão e a desconsideração de aspectos interseccionais na análise dos sujeitos público-alvo das políticas. A persistência de uma compreensão desligada de aspectos culturais, sociais e políticos na consideração da subjetividade de pessoas com deficiência evidencia um campo colonizado por um ideal de sujeito com base moderna iluminista, o que contribui para a perpetuação de discursos estigmatizantes fundamentados na noção de anormalidade.

Palavras-chave:
Deficiência; Filosofia da educação; Discurso Científico; Educação Especial; Educação Inclusiva

Abstract

The article explores the conception of the subject in philosophical modernity in its relation to the scientific discourse on disability and its consequences for school inclusion. Contemporary perspectives on inclusive education point to the need to question the modern and Eurocentric foundations of exclusion and the disregard of intersectional aspects in the analysis of the subjects targeted by policies. The persistence of an understanding disconnected from cultural, social and political aspects in the consideration of the subjectivity of people with disabilities shows a field colonized by an ideal of the subject with a modern Enlightenment basis, which contributes to the perpetuation of stigmatizing discourses based on the notion of abnormality.

Keywords:
Disability; Philosophy of education; Scientific discourse; Special education; Inclusive education

Resumen

El artículo explora la concepción del sujeto en la modernidad filosófica en relación con el discurso científico sobre la discapacidad y sus consecuencias para la inclusión escolar. Las perspectivas contemporáneas de la educación inclusiva apuntan a la necesidad de cuestionar los fundamentos modernos y eurocéntricos de la exclusión y la desatención de los aspectos interseccionales en el análisis de los sujetos a los que se dirigen las políticas. La persistencia de una comprensión desconectada de los aspectos culturales, sociales y políticos a la hora de considerar la subjetividad de las personas con discapacidad muestra un campo colonizado por un ideal de sujeto basado en la Ilustración moderna, que contribuye a la perpetuación de discursos estigmatizadores basados en la noción de anormalidad.

Palabras clave:
Discapacidad; Filosofía de la educación; Discurso científico; Educación especial; Educación inclusiva

1 INTRODUÇÃO

Exploramos neste artigo o modo como uma concepção de sujeito enraizada na modernidade filosófica europeia tem sustentado na produção de conhecimento relacionado à educação de pessoas com deficiência um cenário que contribui para a persistência de discursos excludentes e capacitistas, particularmente em contextos geopoliticamente periféricos, como o brasileiro. Em trabalhos anteriores, nos dirigimos à educação especial, considerando-a domínio privilegiado para essa discussão em virtude de seu alunado, buscando recolocar a pergunta pelo sujeito do campo como procedimento metodológico para uma possível reorientação filosófica dos estudos sobre os fundamentos da área (Mautone; Lima; Vasques, 2021MAUTONE, G.; LIMA, A. L. S.; VASQUES, C. A pergunta esquecida: linguagem, alteridade e sujeito na educação especial. Currículo sem Fronteiras, v. 21, n. 1, p. 52-71, jan./abr. 2021.). Nosso alvo era incidir no entrincheiramento do discurso médico sobre os alunos da educação especial, preeminente em formações de professores e práticas escolares.

Aqui, por outro lado, direcionamos nossa atenção aos fundamentos de uma concepção de subjetividade que parece ser tacitamente aceita nos discursos que estofam a educação especial - porém se estende a todos os campos da ciência que esbarram na questão da deficiência - e é percebida com cada vez mais desconfiança, e mesmo recusa, em um amplo esforço crítico que surge descentrado das tradicionais bases do conhecimento sobre o que se pode dizer sobre esses sujeitos e, por consequência, sobre como educá-los.

Nesse sentido, Plaisance (2015PLAISANCE, E. Da educação especial à educação inclusiva: esclarecendo as palavras para definir as práticas. Educação, Porto Alegre, v. 38, n. 2, p. 230-238, 2015. Disponivel em: https://revistaseletronicas.pucrs.br/ojs/index.php/faced/article/view/20049. Acesso em: 10 dez. 2023.
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) argumentou que a educação especial foi criada com base na ideia de separação, na qual os indivíduos considerados diferentes ou ineducáveis eram designados como “anormais” e destinados a instituições segregadas, distintas das regulares e dos espaços sociais comuns. O propósito dessas instituições especiais era “reabilitar” ou integrar crianças e adolescentes com deficiência a um padrão considerado normal de desenvolvimento linguístico, comportamental e de inserção na cultura.

[...] as instituições para pessoas deficientes, independentemente do tipo de deficiência, seguiram por muito tempo esse modelo de segregação e de isolamento. Em outras palavras, a representação das pessoas como “anormais” acarretou a necessidade de colocá-las em instituições também incomuns. Aprofunda-se essa análise, tomando o exemplo da Educação: nessa área, a atribuição de “especial” indica uma característica negativa das crianças implicadas e, ao mesmo tempo, define um lugar de educação (estabelecimento ou turma), ele próprio definido sob a égide do “especial”, como em um jogo de espelhos (Plaisance, 2015PLAISANCE, E. Da educação especial à educação inclusiva: esclarecendo as palavras para definir as práticas. Educação, Porto Alegre, v. 38, n. 2, p. 230-238, 2015. Disponivel em: https://revistaseletronicas.pucrs.br/ojs/index.php/faced/article/view/20049. Acesso em: 10 dez. 2023.
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, p. 232).

Por esse motivo, quando ligado à Educação, o termo especial passou a ser usado para descrever crianças com características negativas em relação ao que era considerado normal, passando a definir também o ambiente educacional que os recebia como “especial”, num ciclo de definições interligadas. Isso levou à segregação e à rotulagem dessas pessoas, direcionando-as para espaços e serviços específicos. Por meio dessa breve genealogia, entendemos que a palavra especial carrega consigo o peso histórico das designações atribuídas às pessoas percebidas como apresentando déficits intrínsecos e a elas inerentes em aspectos como educação, trabalho e vida cotidiana. Da mesma forma, o anacronismo de termos atualmente pejorativos como “anormal”, “retardado”, “débil” e “incapaz” - antes neutros e tecnicamente precisos - evidencia o contexto estigmatizante em que foram originados.

O estigma, como entendido por Goffman (2008), manifesta-se socialmente por meio da caracterização de um atributo que lança descrédito sobre pessoas ou um grupo, reduzindo-os a uma categoria social cuja presença é indesejável. A distinção entre normais e anormais, segundo Goffman (1980), resulta na exclusão social daqueles que apresentam um estigma, sendo percebidos como não completamente humanos pelos “normais”. Isso leva à produção de discursos e ações que limitam suas oportunidades de vida, reforçando a necessidade de uma atitude benevolente (caritativa), porém aniquiladora da alteridade, e de teorias que justifiquem a classificação do outro na inferioridade social, inclusive racionalizando conflitos decorrentes de outras diferenças, como a de classe.

Perseguindo essa linha de pensamento em nossas pesquisas sobre deficiência e inclusão no campo da educação, deparamo-nos com a perspectiva de Grech e Soldatic (2016GRECH, S.; SOLDATIC, K. Disability in the Global South: The Critical Handbook. Cham, Suíça: Springer, 2016.) que, por suscitar de modo radical o tema da interseccionalidade, parece-nos desbravadora. Eles afirmam de modo contundente que pensar

[...] sobre a deficiência é algo que inevitavelmente suscita pensamentos sobre idade, classe, gênero, sexualidade, etnicidade, raça, indigeneidade [indigeneity] e nacionalidade. Essas considerações interseccionais se encontram no coração daquilo que se denominou estudos críticos da deficiência (Goodley, 2011; Shakespeare, 2013), nos quais a deficiência vincula outras identidades como um momento de reflexão do que Lenny Davis (2002DAVIS, L. J. Bending over Backwards. Disability, dismodernism and other difficult positions. New York: New York UP, 2002., 2006) cunhou como desmodernismo [dismodernism] (Grech; Soldatic, 2016GRECH, S.; SOLDATIC, K. Disability in the Global South: The Critical Handbook. Cham, Suíça: Springer, 2016., p. 69).

Para eles, portanto, o pensamento, a investigação e a análise sobre o fenômeno da deficiência configuram empreendimentos teóricos que não podem prescindir de um modelo interseccional, por meio do qual fazem entrecruzar categorias distintas de análise - como idade, classe social, gênero, raça, etc. -, com o objetivo fundamental de aprimorar nossa compreensão sobre este fenômeno e sobre seu ingresso no contexto educacional. De modo sintético, defendem a ideia de que é impossível pensar a deficiência como algo dissociado de outras categorias que a matizam e complexificam, ou seja, fora de um enquadramento interseccional. Cumpre mencionar também que Grech e Soldatic (2016GRECH, S.; SOLDATIC, K. Disability in the Global South: The Critical Handbook. Cham, Suíça: Springer, 2016.) compreendem que o pensamento sobre a deficiência, quando aprimorado pela perspectiva da interseccionalidade, amplia-se e se vincula à consideração de outras identidades e subjetividades, desmontando, desse modo, algo determinante para essas noções justamente localizado na modernidade - razão pela qual sugerem, a partir de Davis (2002DAVIS, L. J. Bending over Backwards. Disability, dismodernism and other difficult positions. New York: New York UP, 2002.; 2006), um desmodernismo.

Em que consiste, portanto, esse desmodernismo, bem como esse modernismo que ele pretende desmontar? Qual sua relação com a noção de identidade e, sobretudo, de subjetividade? E, por fim, de que modo geram seus impactos nos estudos da deficiência e na educação?

Nossa hipótese é a de que a educação especial, ao fazer perdurar uma concepção de sujeito dependente de teses modernas e, portanto, iluministas, não dá mais conta de problemas contemporâneos derivados das emergências intelectuais inspiradas ou inspiradoras da perspectiva decolonial - incluindo as ideias de interseccionalidade, lugar de fala, epistemicídio, entre outras. Essas perspectivas, que abordamos sobretudo a partir da relação entre modernidade, racionalidade e colonialismo (Mignolo; Walsh, 2018MIGNOLO, W. D.; WALSH, C. E. On Decoloniality: Concepts, Analytics, Praxis. [S.l.]: Duke UP, 2018.; Quijano, 2005QUIJANO, A. A colonialidade do saber: eurocentrismo e ciências sociais. Perspectivas latino-americanas. Buenos Aires: CLACSO, Consejo Latinoamericano de Ciencias Sociales, 2005.; Quijano, 1992), são analiticamente incompatíveis com a concepção de subjetividade oriunda do consórcio filosófico do período moderno, razão pela qual é inevitável revisitá-las - daí sermos instados por Grech e Soldatic (2016GRECH, S.; SOLDATIC, K. Disability in the Global South: The Critical Handbook. Cham, Suíça: Springer, 2016.) a pensar em termos de estudos críticos da deficiência.

2 O LEGADO ILUMINISTA NA EDUCAÇÃO ESPECIAL

Embora o esforço empenhado em produzir a crítica da medicalização1 1 Ao estender sua atuação às escolas, a medicina afirma e é afirmada como competente para prevenir e tratar os problemas escolares antes mesmo que surjam - antes mesmo que haja escola, entendida como direito do cidadão e dever do Estado. Medicaliza-se a educação por meio da transformação de problemas pedagógicos, sociais, políticos e até administrativos em problemas médicos. (Moysés; Collares, 2017). São subentendidas em seu sistema ideias tácitas, pretensamente ateóricas, a respeito de saúde e aprendizagem. Criam-se daí doenças do não aprender e para estas são propostas soluções ministradas em forma de protocolos de intervenção e receituários cujo destino são as farmácias. dos espaços educativos tenha já uma ampla trajetória de pesquisa na educação especial, é praticamente impossível falar da natureza desse campo sem referir conceitos, classificações e normativas que derivam da área médica (Januzzi, 2012). Com efeito, a própria origem da educação especial está atrelada à atuação de médicos pioneiros, circunstância histórica sustentada, entre outros eventos, pela influência que tiveram os relatórios de Jean Itard a respeito da experiência médico-pedagógica que empreendeu junto ao menino conhecido como o Selvagem de Aveyron2 2 Victor de Aveyron (1788-1928) foi um garoto que, por volta dos 9 anos de idade, foi resgatado de uma floresta na região de Aveyron, na França, onde viveu sozinho por, presumivelmente, seis ou sete anos. A partir do trabalho do jovem médico Jean Itard, que lhe deu o nome Victor, tornou-se o caso mais estudado dentre os das muitas crianças “selvagens” abandonadas na Europa. , no início do século XIX (Galvão; Banks-Leite, 2000GALVÃO, I.; BANKS-LEITE, L. A educação de um selvagem: as experiências pedagógicas de Jean Itard. São Paulo: Cortez, 2000.).

Ao descrever uma vertente médico-pedagógica na origem da educação especial, o trabalho historiográfico de Januzzi (2012) interpreta o despertar da medicina para a educação como resposta ao desafio que representavam os casos mais graves e resistentes ao tratamento exclusivamente terapêutico, sendo necessário recorrer não mais só a conhecimentos médicos até então sedimentados, mas também à observação das crianças e seus processos de aprendizagem. Trata-se de um momento em que os conhecimentos médicos a respeito da natureza dos impasses no aprendizado estiveram sob suspeita. Itard, contaminado por concepções filosóficas discordantes das de seu mestre, Philippe Pinel - para o qual o menino Selvagem era um “idiota” inato e, portanto, ineducável -, aposta na possibilidade de recuperá-lo a partir da educação.

Já em 1800, ao ser recebido na Institution Nationale des Sourds-Muets, em Paris, o então menino selvagem era observado como no centro de um importante debate a respeito da existência de ideias inatas. Naquilo que nos interessa aqui, não é irrelevante que, ao tecer justificativas sobre seu trabalho com o menino no segundo relatório enviado ao ministro do interior, Itard refira-se a uma história da filosofia médica. Assim, no segundo relatório são feitas referências explícitas a pensadores do modernismo filosófico dos séculos XVI e XVII, como Condillac (1714-1780) e Locke (1632-1704); empiristas que, embora recusassem o inatismo, desenvolveram concepções psicológicas avant la lettre, baseadas nas sensações e no primado da consciência3 3 Aliás, Condillac já havia estudado, antes de Itard, em seu Ensaio sobre as origens do conhecimento humano, o caso de um menino abandonado que teria vivido entre ursos na Lituânia. Esse fato certamente foi conhecido por Itard, estimulando seu interesse no menino Selvagem de Aveyron quando lhe surgiu tal oportunidade (Condillac, 2011 [1746]). .

Devemos aos trabalhos de Locke e de Condillac terem avaliado a forte influência que a ação isolada e simultânea de nossos sentidos tem sobre a formação e o desenvolvimento de nossas idéias. O abuso que se fez dessa descoberta não lhe destrói nem a verdade nem as aplicações práticas que se pode fazer delas num sistema de educação médica. Foi segundo esses princípios que, quando cumpri as metas principais que de início me propusera, e que expus em minha primeira obra, empreguei todos os meus cuidados em exercitar e em desenvolver separadamente os órgãos dos sentidos do jovem Victor (Itard, [1807] 2000, p. 187, grifo nosso).

A preocupação de Itard com o exercício dos órgãos dos sentidos como meio de formar e desenvolver ideias ‒ ou seja ‒ educar, coaduna-se com a concepção lockiana de pessoa. Locke concebe as noções de pessoa e subjetividade como dependentes, por um lado, de uma materialidade biológica capaz de receber sensações e, por outro, da autorreflexão (consciência) sobre os próprios estados mentais e percepções derivadas dessas sensações. Por esse motivo, ao conceber alguém como pessoa, dotada de subjetividade, referimos

[...] um ser inteligente pensante, que possui raciocínio e reflexão, e que se pode pensar a si próprio como o mesmo ser pensante em diferentes tempos e espaços; é-lhe possível fazer isto devido apenas a essa consciência que é inseparável do pensamento (Locke, [1689, I, cap. XXVII, §11] 2014, p. 442-443).

Portanto, o pensamento de Itard que está na origem do que passamos a entender como educação especial só se configurou na medida em que seu contato com a filosofia moderna de Locke e Condillac aprofundou-se. Em certo sentido, foi o contexto filosófico da modernidade ‒ agora em uma particular distensão positivista já no século XIX, com sua noção robusta de subjetividade enquanto pensamento e consciência ‒ que determinou os fundamentos epistemológicos sobre os quais a educação especial estabeleceu suas práticas.

3 SITUANDO O CONCEITO DE DESMODERNISMO

O desmodernismo [dismodernism] de que falam Grech e Soldatic (2016GRECH, S.; SOLDATIC, K. Disability in the Global South: The Critical Handbook. Cham, Suíça: Springer, 2016.), retomando o trabalho de Lenny Davis (2002DAVIS, L. J. Bending over Backwards. Disability, dismodernism and other difficult positions. New York: New York UP, 2002.; 2006), designa sobretudo um processo de oposição, perturbação e descontinuidade da modernidade. O neologismo criado a partir da prefixação da raiz latina “dis-” (ou “des-”, na tradução para o português)4 4 Sobre os prefixos “dis-” e “des-” na língua portuguesa e sua origem etimológica no latim vulgar, ver: https://www.revistas.usp.br/flp/article/view/165701/167247. , além de sugerir um sentido essencial de negação e contrariedade, poderá igualmente suscitar, agora por associação em nível do significante, o principal fenômeno de estudo de Davis (2006), ou seja, a “disability” [“deficiência”]. E, no português, desmodernismo poderá suscitar, por igual deslizamento significante, os verbos “desfazer”, “desarmar” ou “desmontar”. Assim, cumpre reconhecer no desmodernismo de Davis (2006), muito bem lembrado por Grech e Soldatic (2016), um incontornável processo de desmontagem da modernidade no que diz respeito à compreensão e ao estudo da deficiência.

Mas que modernidade é essa? Que período histórico ela designa? Quais são as especificidades desse tempo? E em que medida ela influencia os discursos sobre a inclusão na educação e sobre deficiência?

A modernidade, contra a qual o desmodernismo de Davis (2006DAVIS, L. J. The end of Identity Politics and the Beginning of Dismodernism: On Disabilityas as Unstable Category. In Davis L. (ed.). The Disability Studies Reader. 2nd ed. New York: Routledge, 2006. p. 231-242) se insurge como projeto crítico, é a modernidade filosófica, situada na passagem do século XVI para o século XVII, iniciada diante do abalo da tradição antiga e escolástica e do surgimento de novos modelos de pensamento, representados, sobretudo, pelo empirismo e pelo racionalismo (Marcondes, 2004). E, em comum entre esses modelos, encontrava-se a nova concepção da subjetividade, capaz de articular a noção de sujeito como o ponto arquimediano desde o qual o próprio conhecimento seria, portanto, explicado. Nesse sentido, a filosofia moderna surgida a partir do século XVI é aquela responsável por efetuar, na história da filosofia, a conhecida viragem epistemológica por meio da qual as investigações filosóficas conferem centralidade às investigações sobre o conhecimento, seus fundamentos e suas condições de possibilidade. O sujeito, instância singular da subjetividade da qual ele é a sua expressão particular, seria tomado aí como a estrutura capaz de contornar o velho problema do ceticismo e do critério de validade universal para a avaliação das pretensões ao conhecimento e de, assim, garantir a fundamentação epistêmica sobre as famosas bases seguras (Marcondes, 2004).

Nesse sentido, o argumento do Cogito em Descartes (2011DESCARTES, R. Meditações Metafísicas. São Paulo: Martins Fontes, 2011. [1641], p. 43) é o paradigma que permitiu dar uma resposta contundente ao problema do ceticismo; pois na medida em que vinculou analiticamente o atributo do pensamento à existência e, na medida em que esse vínculo permitiu explicitar a única resposta (ou resultado) possível diante do cenário cético de aplicação sistemática da dúvida, ele também forneceu uma base segura para a fundamentação epistemológica. O Cogito cartesiano ‒ i.e., o vínculo estreito e necessário entre pensamento e existência ‒ apareceu na filosofia moderna como o único critério de validade universal para a pretensão de conhecimento. E, assim, permitiu fundamentar as subsequentes investigações epistemológicas da modernidade por recurso sempre necessário a uma concepção de subjetividade que instituiu o sujeito como sujeito epistêmico, cognitivo, como um sujeito de saber; ou seja, o próprio protagonista da novela epistemológica da modernidade filosófica.

A afirmação da centralidade do sujeito como marca da filosofia moderna é uma tese comumente aceita na interpretação do surgimento da modernidade [filosófica], assim como a atribuição a Descartes e a seu argumento do cogito [...]. Segundo essa interpretação, o projeto cartesiano consiste na investigação conceitual da possibilidade do conhecimento científico antes (anterioridade lógica) de se empreender a investigação científica [ela mesma]. É nesse sentido que se pode afirmar que o sujeito é definido como sujeito epistêmico. O sujeito cartesiano, enquanto sujeito cognitivo, de acordo com essa tradição [...] tem as seguintes características: reflexividade; imediaticidade; transparência; substancialidade; interioridade; fundamento; racionalidade; universidade. São esses os principais elementos que definem o assim chamado sujeito moderno (Marcondes, 2004, p. 2, 4-5).

Entre os muitos elementos distintivos do sujeito cognitivo da modernidade filosófica estão, sobretudo, os elementos da substancialidade, da racionalidade, da interioridade e da universalidade. O sujeito é substância (res), ou seja, realidade separada do corpo, mas com a mesma importância ontológica que ele e, como ele, igualmente autodeterminado e suficiente. Sua diferença ontológica principal em relação ao corpo e à extensão é o atributo do pensamento; ou seja, enquanto o corpo é res extensa, a subjetividade é res cogitans, coisa pensante. E o pensar é, justamente, a marca da racionalidade, a capacidade de realizar raciocínios lógicos, inferências, demonstrações, operações indispensáveis ao conhecimento. No entanto, o sujeito também é dotado de interioridade, ou seja, a subjetividade se estrutura nesse espaço interior, recluso, imaterial e abstrato. E, por fim, o sujeito cognitivo é universal; isto é, embora seja uma característica particular do que define um indivíduo e, portanto, o ser humano, a subjetividade se aplica universalmente a todos os indivíduos. É, portanto, uma realidade que, embora singular, é por todos compartilhada.

Da concepção moderna da subjetividade, cujos elementos foram acima explicitados, herda-se um conceito de sujeito enquanto unidade interna, necessária, estruturante e autônoma para a explicação dos processos epistêmicos e para o que se chama de cognição: ou seja, os processos “responsáveis pelo conhecimento e pela consciência” como, por exemplo, “o processamento da experiência, da percepção e da memória, assim como o pensamento declaradamente verbal” (Blackburn, 1997BLACKBURN, S. Dicionário Oxford de Filosofia. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1997., p. 62). A cognição, em sua acepção moderna, estaria atrelada de modo necessário à subjetividade, sendo esta a unidade interna capaz de estruturá-la e processá-la. Conclui-se, portanto, que a subjetividade, essa qualidade essencial de quem é sujeito, é tomada na modernidade filosófica como a própria condição de possibilidade ‒ o fundamento ‒ para a explicação da cognição. Dito de outro modo, subjetividade é cognição; pensamento, raciocínio, inferência.

Na medida em que essa concepção moderna de subjetividade circunscreve uma dimensão interna inteiramente autônoma cujas operações e funcionamentos se dão sem nenhum recurso explicativo a outras dimensões a ela externas e, portanto, distintas, então a subjetividade é radicalmente limitada em um nível de análise internalista e cognitivista. Ademais, na medida em que essas operações e funcionamentos são delimitados pelo trabalho da racionalidade, a subjetividade se configura como uma instância inteiramente autônoma e racional; isto é, relacionada necessariamente aos mecanismos da cognição superior como o raciocínio lógico, o pensamento inferencial e demonstrativo. Desdobram-se daí suas consequências principais. Por um lado, a subjetividade poderá ser compreendida sem recurso ao corpo, ao mundo e aos contextos vitais, sociais e culturais nos quais se inserem e com os quais se relaciona sempre de modo marginal. E, por outro lado, a subjetividade, em seu fundamento racional, não poderia ser definida a partir da percepção, da experiência e da intersubjetividade, estando analiticamente blindada a esses elementos em sua conceituação. Essas consequências filosóficas da concepção moderna de subjetividade legam à filosofia contemporânea uma noção de sujeito, ao mesmo tempo, desencarnada e descontextualizada.

Na passagem do século XVIII para o XIX, essa concepção de subjetividade tipicamente moderna não passa imune às críticas, muito menos ao largo de tentativas de reparação filosófica. G. W. F. Hegel (1770-1831) foi um dos primeiros pensadores a revisitar criticamente as heranças modernas do cartesianismo por meio da filosofia de Immanuel Kant (1724-1804), na qual a concepção de subjetividade como estrutura autônoma e transcendental (sub specie aeternitatis) da cognição ou do pensamento se manteve mais ou menos intacta. O “eu penso” de Kant (2012, p. 71)5 5 Crítica da Razão Pura (Doutrina Transcendental dos Elementos, Estética Transcendental, B33-B36). será essa instância da consciência, determinante na definição da subjetividade, que estrutura as próprias condições de possibilidade mais fundamentais para o pensamento e para a experiência. Hegel irá, justamente, recusar a concepção autônoma da consciência (subjetividade) como algo em si mesmo garantido e autossuficiente, entendendo seu desenvolvimento como necessariamente atrelado ao desenrolar histórico e contextual, onde sociedade e cultura desempenham papel determinante.

A filosofia contemporânea, contudo, abre-se de modo diverso a esse legado da filosofia moderna, tanto conservando-o e o reiterando, como contestando-o. Entre os primeiros, que conservam a concepção de subjetividade como unidade interior, estruturante, autônoma e determinante para a estipulação da cognição estão Noam Chomsky, com sua tese das estruturas sintáticas como gramática inata (Chomsky, 1957); Daniel Dennet, com sua tese cerebrista na qual a mente e a cognição estão necessariamente reduzidas aos limites da caixa intracraniana (Dennet, 1991); e, por fim, Jean Piaget, com sua acomodação das noções de schemas e estruturas mentais na explicação biológica da aprendizagem (Piaget, 1952; 1957). E entre os segundos, que procuram criticar esse legado moderno por compreenderem a subjetividade não como algo inteiramente autônomo e a cognição como diretamente determinada também pelo corpo e pelo contexto, estão Merleau-Ponty (1945), John Dewey (1929DEWEY, J. Experience & Nature. Londres: George Allen & Unwin, 1929.;1981), Wittgenstein (1953) e os recentes pensadores da filosofia da cognição (ou filosofia das ciências cognitivas) como Lakoff e Johnson (1999LAKOFF, G.; JOHNSON, M. Philosophy in the Flesh: The Embodied Mind and Its Challenge to Western Thought. Nova Iorque: Basic Book; Perseus, 1999.).

Herdamos da modernidade filosófica, portanto, uma forma de descrever a subjetividade como sendo definida exclusivamente em termos de cognição, cognição esta que se dá de modo estruturado e autônomo num espaço de interioridade. É justamente essa imagem que a filosofia contemporânea da cognição, mediante a retomada crítica dessa tradição e o renovado interesse por pensadores como Merleau-Ponty, Dewey e Wittgenstein, pretende problematizar e, por fim, abandonar. Leporace (2019LEPORACE, C. Espelhos do mundo? Uma perspectiva da percepção humana a partir de ideias da mente enativa e da mente estendida. In LEPORACE, C.; BANNELL, R. et al. (org.). A mente humana para além do cérebro. Coimbra: Instituto de Psicologia Cognitiva, Desenvolvimento Humano e Social da Universidade, 2019.), aponta que no escopo da filosofia da cognição estariam albergadas quatro teses centrais sobre a natureza da cognição e, portanto, sobre a natureza da subjetividade, capazes de contestar as concepções herdadas do modernismo filosófico. São elas: a cognição situada (embedded), a cognição corporificada (embodied), a cognição enativa (enactive) e a cognição estendida (extended). Afirma Leporace (2019, p. 37):

As quatro teses conhecidas como os 4E’s da cognição - embedded, embodied, enactive e extended - têm, naturalmente, características em comum que as levaram a ser assim agrupadas. São abordagens que, de um modo geral, reagem ao dualismo cartesiano, pretendendo superar a separação mente-corpo e, em alguns casos, corpo-mundo. Essas teses procuram abrir as perspectivas acerca da concepção da mente humana buscando outros elementos e até mesmo tecnologias, seja de forma constitutiva ou como apoios importantes.

Juntas, as quatro teses sobre a natureza da cognição sugerem contundentemente que o campo do mental e das operações cognitivas está situado em certos contextos ‒ sociais, culturais, linguísticos, políticos ‒ com os quais estabelece uma profunda relação de imbricação, sendo deles dependente e os modificando retroativamente. Do mesmo modo, a situação (ou situacionalidade) nesses contextos pressupõe a existência de um corpo, localizado espaçotemporalmente, um corpo capaz de ter as mais variadas formas de experiência e de, inclusive, trocar com outros corpos ao nível da intersubjetividade. Ademais, este corpo se movimenta, se situa e se adapta ao ambiente por meio de trocas que ele mesmo agencia e ativa a partir de competências que podem ser aprimoradas e desenvolvidas, não sendo em relação a esse campo da experiência simplesmente um polo passivo. E, por fim, é um corpo situado e ativo no qual as cognições de modo amplo (experiências, sensações, pensamentos, inferências, trocas, etc.) se dão de modo ampliado ou estendido, com a ajuda de artefatos e tecnologias diversas com as quais se acopla e que lhe facilitam a cognição.

Nota-se, portanto, que a concepção contemporânea da cognição apresentada pela filosofia das ciências cognitivas, por meio de seu consórcio multidisciplinar de pesquisa e por meio de suas investigações sobre a natureza da cognição, ao mesmo tempo que problematiza a concepção moderna de mente e de subjetividade, também as amplia de modo significativo. Sobretudo porque abre a estrutura recôndita da subjetividade para as dinâmicas recíprocas que ela estabelece com as “externalidades”. Sobrepõe-se à imagem moderna da estruturação de um núcleo inflexível da subjetividade outra imagem contemporânea ‒ a de uma unidade porosa, constantemente permeável às dinâmicas que ativa com outras unidades de seu próprio organismo, com outros organismos, com o ambiente e o contexto, sendo também capaz de facilitar suas ações por meio do acoplamento aos artefatos e tecnologias.

Que essas concepções contemporâneas interessadas numa revisitação do legado moderno sobre as noções de subjetividade (sujeito), pensamento, mente e cognição acarretem implicações substanciais para o estatuto filosófico do conhecimento e para o estudo das suas condições de possibilidade analíticas, isso é evidente. Na medida em que se ampliam as determinações da subjetividade e dos processos que ela envolve para além de unidade substancial interna e racional herdada do cartesianismo (Marcondes, 2004), o conhecimento igualmente se amplia no sentido de albergar a experiência e a dimensão corporal, mas também a dimensão contextual.

Essa ampliação sobre o estatuto do conhecimento e dos modos de conhecer indica, na contemporaneidade, o desmodernismo de Davis (2006DAVIS, L. J. The end of Identity Politics and the Beginning of Dismodernism: On Disabilityas as Unstable Category. In Davis L. (ed.). The Disability Studies Reader. 2nd ed. New York: Routledge, 2006. p. 231-242), mencionado por Grech e Soldatic (2016GRECH, S.; SOLDATIC, K. Disability in the Global South: The Critical Handbook. Cham, Suíça: Springer, 2016.), e um processo contemporâneo de valorização de filosofias não mais subordinadas ao cenário europeu do desenvolvimento filosófico do iluminismo dos séculos XVI, XVII e XVIII ou aos liames das heranças cartesianas. O conhecimento e a ciência, diante de seu forte entrincheiramento no pensamento moderno, ampliam-se, portanto, para além de seus tradicionais limites epistemológicos euro-norte-americanos e redescobrem epistemologias alternativas nas racionalidades específicas das culturas dominadas (Quijano, 1992QUIJANO, A. Colonialidad y modernidad/racionalidad. Perú indígena, Lima, v. 13, n. 29, 1992, p. 11-20.).

De que maneiras divergem as epistemologias decoloniais das euro-norte-americanas? Quais conceitos as articulam de modo diferente? Como empregam esses conceitos?

4 EPISTEMOLOGIAS DECOLONIAIS NA TRILHA DA FILOSOFIA CONTEMPORÂNEA DA COGNIÇÃO

Considerando a questão de uma subjetividade porosa como ponto de partida para pensar a construção do conhecimento, o pensador argentino Enrique Dussel (1934-2023) aprofunda sua crítica ao colonialismo por meio da análise da concepção cartesiana de sujeito como matriz para o pensamento produzido no Sul do mundo. Em sua compreensão, o surgimento de uma metafísica do sujeito temporalmente concorrente ao domínio imperial europeu, após a conquista das Américas, opera uma reinterpretação da substancialidade tradicional como subjetividade (ego cogito cartesiano), reduzindo a amplitude da transcendência desse corpo no mundo (Dussel, 1994).

Por sua vez, o corpo, enquanto dotado de sentidos, implica o fenômeno da experiência como condição necessária para a construção do conhecimento. Por que razão, então, as epistemologias europeias teriam dado tão pouca atenção à experiência? Nas filosofias do Norte do mundo não cabe pensar uma subjetividade definida, analiticamente, por recurso à experiência e aos dados dos sentidos. Contudo, da perspectiva decolonial,

Pensar a partir da e com a experiência vivida da colonialidade e sua matriz de poder que atravessa praticamente todos os aspectos da vida, inclusive os domínios da subjetividade, do conhecimento, do ser, da sexualidade, da espiritualidade (incluindo alma-corpo, espírito-mente e relação com os ancestrais) e da natureza (entendida inter-relacionalmente como Pachamama), oferece uma perspectiva e uma análise que desafiam muitos dos pressupostos do conhecimento e do pensamento ocidentais. Esse pensamento, para muitos, é considerado perigoso e herético. Em grande parte, isso se deve ao fato de trazer à tona o “outro” decolonial, suas insurgências sociais, políticas, epistêmicas e baseadas na existência cósmica, suas pedagogias, pedagogizações e práxis, um “outro” que se opõe ao “mito racista que inaugurou a modernidade e o monólogo da razão ocidental moderna”. Além disso, é considerado perigoso e herético porque afirma, alinha e conecta aquilo que a modernidade/colonialidade/heteropatriarcado/capitalismo trabalhou para desmembrar. (Mignolo; Walsh, 2018MIGNOLO, W. D.; WALSH, C. E. On Decoloniality: Concepts, Analytics, Praxis. [S.l.]: Duke UP, 2018., p. 90, tradução nossa).

Essa perspectiva dialoga, nesse sentido, com o monumental trabalho de Lakoff e Johnson (1999LAKOFF, G.; JOHNSON, M. Philosophy in the Flesh: The Embodied Mind and Its Challenge to Western Thought. Nova Iorque: Basic Book; Perseus, 1999.) em Uma filosofia na carne: a mente incorporada e seus desafios ao pensamento ocidental (Philosophy in the Flesh: the Embodied Mind its Challenge to Western Thought). O estatuto filosófico da experiência é então um divisor de águas para as filosofias do Sul (Dussel, 2014DUSSEL, E. Filosofías del sur y descolonización. Buenos Aires: Docencia, 2014.) como um âmbito da filosofia contemporânea em que o corpo, suas vicissitudes e as experiências que produz na subjetividade apontam a formas de conhecer radicalmente distintas das produzidas no contexto europeu, ocidental, no qual a experiência ocupa um lugar sempre subordinado ao pensamento, à cognição chamada superior e ao raciocínio e a inferência (Mignolo; Walsh, 2018MIGNOLO, W. D.; WALSH, C. E. On Decoloniality: Concepts, Analytics, Praxis. [S.l.]: Duke UP, 2018.).

Há aí um salto metodológico, próprio da filosofia, na medida em que essa disciplina costumeiramente critica a si mesma, seus entricheiramentos, delimitações, alçando-se ao nível meta. Isso significa que estamos falando do reconhecimento de novas condições de possibilidade epistemológicas, ou seja, novas condições de possibilidade para o conhecimento e para as formas de conhecer. Fazer jus a esse deslocamento metodológico significa reposicionar a dimensão corporal da experiência no seu sentido singular e no seu sentido vital ‒ histórico ‒, bem como os contextos e condições sociais e culturais nos quais essas experiências se consumam. Nesse sentido, é preciso reconduzir a experiência e o saber do corpo à condição de protagonismo epistemológico.

Ora, é inegável que o corpo das trabalhadoras e trabalhadores atravessa experiências diametralmente opostas das experiências dos corpos que se colocaram no centro da produção de conhecimento socialmente investido e não passam pelas mesmas opressões de classe. Ora, o corpo racializado como negro certamente não atravessa as mesmas experiências que o corpo racializado como branco, estando aquele no fulcro das opressões raciais originadas do colonialismo e alimentadas diuturnamente pelo racismo estrutural. Ora, o corpo identificado como mulher atravessa opressões, agenciamentos e assujeitamentos completamente distintos dos experienciados pelos homens cisgênero no contexto patriarcal e machista a serviço do capitalismo. Essas distintas experiências advindas das opressões sociais sobre o corpo, sempre que o corpo e suas experiências não são reconhecidos como produtores de formas legítimas de conhecer, sequer serão consideradas como significativas para delimitar o que é conhecimento6 6 A noção de lugar de fala é, portanto, essencial para a compreensão das diferenças de qualidade, determinação e origem das opressões e dos privilégios. Veja-se Ribeiro (2019). . É assim que, portanto, a filosofia vem, insidiosamente, há séculos, deitando fora a criança com a água do banho.

No entanto, esse saber do corpo e a pluralidade de suas experiências de opressão e desigualdade ‒ cujo desvelamento de suas vicissitudes discursivas e subjetivas Rolnik (2016ROLNIK, S. A hora da micropolítica. São Paulo: N-1 Edições, 2016.) entende como o cerne da atuação micropolítica ‒ não podem ser investigados de modo isolado, mas precisam ser vistos desde uma perspectiva inter-relacionada, na qual o pensamento e o conhecimento se sistematizam em diferentes intersecções. Isso é a interseccionalidade.

A teórica feminista Kimberle Crenshaw (1989), uma das principais pesquisadoras da teoria crítica da raça, é conhecida como propositora da noção de interseccionalidade. No Brasil, o conceito vem sendo divulgado e trabalhado mais amplamente a partir das obras de Patrícia Hill Collins e Sirma Bilge (2021COLLINS, P. H.; BILGE, S. Interseccionalidades. São Paulo: Boitempo, 2021.) e Carla Akotirene (2022AKOTIRENE, C. Interseccionalidade. São Paulo: Sueli Carneiro; Ed. Jandaíra, 2022.). Anteriormente, o feminismo negro de Lélia Gonzalez e Sueli Carneiro já inspiravam tal perspectiva como ferramenta de análise de discursos opressores sobre identidades minoritárias. A vantagem da interseccionalidade, como a pensou originalmente Crenshaw, consiste em sua capacidade de evidenciar os pontos de interação entre distintas opressões em sua relação com as condições sociais ou sistêmicas mais amplas. Uma definição de interseccionalidade pode ser assim encontrada em Crenshaw (1989, p. 140):

Eu argumento que mulheres negras são algumas vezes excluídas da teoria feminista e do discurso político antirracista porque, ambos, são [fundamentalmente] predicados sobre um conjunto discreto de experiências que, no mais das vezes, não refletem de modo apropriado a interação entre raça e gênero. Esses problemas de exclusão não podem ser simplesmente resolvidos ao incluirmos as mulheres negras dentro de uma estrutura analítica já estabelecida. Porque a experiência interseccional é maior que a soma do racismo e do sexismo, qualquer análise que não leve em conta a interseccionalidade não poderá abordar suficientemente a maneira particular por meio da qual as mulheres negras são subordinadas. Portanto, para que a teoria feminista e o discurso político antirracista abarquem as experiências e as questões das mulheres negras, todo o enquadramento até então utilizado como base para traduzir a “experiência da mulher” ou a “experiência negra” em demandas políticas concretas precisa ser repensado e reformulado.

Por outro lado, a questão da colonialidade deve ser considerada também como matriz produtora de subjetividades e experiências sociais e culturais específicas, dotada de um lastro histórico e geográfico, que desvelam a dimensão das opressões ou dos privilégios sociais dependentes da sistematização de uma estrutura racista para a compreensão das relações sociais. A ideia de raça, nesse sentido, assume um papel central para a compreensão da subjetividade e seus modos de conhecer e pensar também por meio das experiências corporais particulares ou experiências sociais e históricas.

Afirma Quijano (2005QUIJANO, A. A colonialidade do saber: eurocentrismo e ciências sociais. Perspectivas latino-americanas. Buenos Aires: CLACSO, Consejo Latinoamericano de Ciencias Sociales, 2005., p. 118, 121, 126):

As novas identidades históricas produzidas sobre a idéia de raça foram associadas à natureza dos papéis e lugares na nova estrutura global de controle do trabalho. [...] todas as experiências, histórias, recursos e produtos culturais terminaram também articulados numa só ordem cultural global em torno da hegemonia européia ou ocidental. Em outras palavras, como parte do novo padrão de poder mundial, a Europa também concentrou sob sua hegemonia o controle de todas as formas da subjetividade, da cultura, e em especial do conhecimento, da produção do conhecimento. [...] A elaboração intelectual do processo de modernidade produziu uma perspectiva de conhecimento e um modo de produzir conhecimento que demonstram o caráter do padrão mundial de poder: colonial/moderno, capitalista e eurocentrado. Essa perspectiva e esse modo concreto de produzir conhecimento se reconhecem como eurocentrismo.

Desse modo, o eurocentrismo é problematizado e criticado por uma perspectiva decolonial, capaz de explicitar as relações históricas tecidas entre a hierarquização das raças por meio de discursos racistas, originados, sobretudo, no modernismo filosófico, e as relações sociais de trabalho, opressão e privilégio. Na medida em que o racismo, oriundo do pensamento moderno europeu, sistematiza-se de modo estrutural (Almeida, 2020), ele também é capaz de replicar-se contemporaneamente no tecido social e se presentificar nas relações sociais, gerando, portanto, reverberações e experiências particulares nas subjetividades.

Essas experiências particulares são determinantes para a estipulação de uma nova forma de conhecer e falar sobre os sujeitos, uma forma que leva em consideração a singularidade da experiência e sua transformação, por meio da intersubjetividade e da transmissão, em experiências históricas. Tudo isso é deixado de lado na medida em que seguirmos advogando em favor de uma concepção de subjetividade ainda circunscrita ao modelo iluminista e moderno do século XVII e XVIII. Considerar a subjetividade como determinada pelo corpo e pelo contexto, bem como considerar as experiências peculiares que neles transcorrem, implica precisamente que uma nova concepção de subjetividade precisa ser considerada; algo que, por meio da nossa interpretação do desmodernismo de Davis (2002DAVIS, L. J. Bending over Backwards. Disability, dismodernism and other difficult positions. New York: New York UP, 2002.; 2006), encontra-se vinculado à recusa em conceber a subjetividade por meio de um pensamento desencarnado, imparcial, sem lugar social e sem história, típico do discurso iluminista moderno europeu.

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

A hipótese é a de que a consideração da interseccionalidade no estudo da deficiência ‒ que Grech e Soldatic (2016GRECH, S.; SOLDATIC, K. Disability in the Global South: The Critical Handbook. Cham, Suíça: Springer, 2016.) designam como estudos críticos da deficiência ‒ nos permite compreender esse fenômeno de modo ainda mais aprimorado, uma vez que ampliamos nossas capacidades descritivas e analíticas ao considerar categorias interseccionadas de análise (como gênero, raça, classe) junto, ou seja, complementarmente à categoria da deficiência. Assim, uma subjetividade na qual a deficiência se encontra como marca está, necessariamente, também atrelada a outras tantas marcas subjetivas como a cor de pele, o pertencimento a uma classe social e às identificações ou designações de gênero. Ganhamos muito mais, do ponto de vista epistemológico e discursivo (ou ainda científico), na medida em que enriquecemos nossas investigações sobre a deficiência com outros dados e informações advindas de investigações sobre a raça e o gênero, por exemplo. Mike Oliver, que nos anos 1970 foi um dos fundadores do modelo social da deficiência, base epistemológica para o atual campo dos estudos da deficiência (disability studies) já nos alertava em 1999 para o fato de que a deficiência, enquanto categoria de análise, é insatisfatória para dar conta justamente do fenômeno da opressão à deficiência.

Portanto, a opressão que as pessoas com deficiência enfrentam está enraizada nas estruturas econômicas e sociais do capitalismo. E esta opressão é estruturada pelo racismo, o sexismo, a homofobia, o preconceito de idade, é endêmica para todas as sociedades capitalistas e não pode ser explicada como um processo cognitivo universal (Oliver, 1999OLIVER, M. Capitalism, Disability and Ideology: A Materialist Critique of the Normalization Principle. In: FLYNN, R. J.; LEMAY, R. A. A Quarter-Century of Normalization and Social Role Valorization: Evolution and Impact. Londres: independentliving.org, 1999. Disponivel em: https://www.independentliving.org/docs3/oliver99.pdf. Accesso em: 24 mar. 2024.
https://www.independentliving.org/docs3/...
, p. 4).

Se a educação, enquanto instituição social responsável pela transmissão do legado científico e cultural de uma sociedade pretende levar a cabo o projeto da inclusão de pessoas com deficiência, é preciso que esta última interrogue-se também sobre a natureza de uma concepção de sujeito aberta à experiência, ao corpo e aos privilégios e opressões sociais que advêm das contingências derivadas da racialização, pertencimento a certa classe social e identificação com um gênero em um sistema binário que afetam esse corpo. E isso implica abandonar uma base discursiva moderna/iluminista que ousou engendrar um conceito de subjetividade completamente blindado a essas contingências existenciais e vitais. Do contrário, a educação corre o risco de não incorporar a necessidade de uma democracia radical.

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  • WITTGENSTEIN, Ludwig. Philosophische Untersuchungen - Philosophical Investigations. Tradução de G. E. Anscombe, P. Hacker & J. Schulte. Oxford: Basil-Blackwell, 2009 [1953].
  • 1
    Ao estender sua atuação às escolas, a medicina afirma e é afirmada como competente para prevenir e tratar os problemas escolares antes mesmo que surjam - antes mesmo que haja escola, entendida como direito do cidadão e dever do Estado. Medicaliza-se a educação por meio da transformação de problemas pedagógicos, sociais, políticos e até administrativos em problemas médicos. (Moysés; Collares, 2017MOYSÉS, M. A. A.; COLLARES, C. A. L. Produção do fracasso escolar e medicalização da infância e da escola. In: VASQUES, C. K.; MOSCHEN, S. Z. Psicanálise, educação especial e formação de professores: construções em rasuras. Porto Alegre: Ed. da UFRGS, 2017. p. 43-72.). São subentendidas em seu sistema ideias tácitas, pretensamente ateóricas, a respeito de saúde e aprendizagem. Criam-se daí doenças do não aprender e para estas são propostas soluções ministradas em forma de protocolos de intervenção e receituários cujo destino são as farmácias.
  • 2
    Victor de Aveyron (1788-1928) foi um garoto que, por volta dos 9 anos de idade, foi resgatado de uma floresta na região de Aveyron, na França, onde viveu sozinho por, presumivelmente, seis ou sete anos. A partir do trabalho do jovem médico Jean Itard, que lhe deu o nome Victor, tornou-se o caso mais estudado dentre os das muitas crianças “selvagens” abandonadas na Europa.
  • 3
    Aliás, Condillac já havia estudado, antes de Itard, em seu Ensaio sobre as origens do conhecimento humano, o caso de um menino abandonado que teria vivido entre ursos na Lituânia. Esse fato certamente foi conhecido por Itard, estimulando seu interesse no menino Selvagem de Aveyron quando lhe surgiu tal oportunidade (Condillac, 2011 [1746]).
  • 4
    Sobre os prefixos “dis-” e “des-” na língua portuguesa e sua origem etimológica no latim vulgar, ver: https://www.revistas.usp.br/flp/article/view/165701/167247.
  • 5
    Crítica da Razão Pura (Doutrina Transcendental dos Elementos, Estética Transcendental, B33-B36).
  • 6
    A noção de lugar de fala é, portanto, essencial para a compreensão das diferenças de qualidade, determinação e origem das opressões e dos privilégios. Veja-se Ribeiro (2019).

Editor de Seção:

Fábio José Rauen

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    27 Maio 2024
  • Data do Fascículo
    2024

Histórico

  • Recebido
    07 Mar 2024
  • Aceito
    27 Mar 2024
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