Acessibilidade / Reportar erro

DIVULGAÇÃO CIENTÍFICA E A HETEROGENEIDADE DISCURSIVA: ANÁLISE DE “UMA BREVE HISTÓRIA DO TEMPO” DE STEPHEN HAWKING

SCIENTIFIC INFORMATION AND DISCURSIVE HETEROGENEITY: AN ANALYSIS OF “A BRIEF HISTORY OF TIME”, BY STEPHEN HAWKING

LA DIVULGATION SCIENTIFIQUE ET L’HÉTÉROGÉNÉITÉ DISCURSIVE: ANALYSE D’UNE “BRÈVE HISTOIRE DU TEMPS” DE STEPHEN HAWKING

DIVULGACIÓN CIENTÍFICA Y LA HETEROGENEIDAD DISCURSIVA: ANÁLISIS DE “UNA BREVE HISTÓRIA DEL TIEMPO” DE STEPHEN HAWKING

Resumo

Este artigo tematiza a questão da heterogeneidade no Discurso de Divulgação Científica (DDC). Este discurso, ao se articular na zona de contato entre o discurso científico (DC) e os dizeres dos “não cientistas” (DNC), apresenta uma heterogeneidade que chamarei de discursiva (nos termos de GALLO, 2001) que se constitui não só de não-coincidências enunciativas (conforme AUTHIR-REVUZ, 1982), mas também de coincidências com sentidos pré-construídos. Desses confrontos entre sentidos pode resultar uma nova formação discursiva, aquela do DDC, reordenando sentidos do DC e do DNC.

Palavras-chave:
discurso; heterogeneidade; formação discursiva; divulgação científica

Abstract

The present paper thematizes the issue of heterogeneity in the Discourse of Scientific Circulation (DSC). Such a discourse, articulated in the interface between scientific discourse (SC) and the statements of “non-scientists” (SNS), presents a heterogeneity which I call discursive (following GALLO, 2001), and which is constituted not only of non-coincidental enunciations (AUTHIER-REVUZ, 1982), but also of coincidences bearing pre-constructed meanings. From such an interface of meanings a new discursive formation can arise, that of DSC, reordering the meanings of SC and of SNS.

Keywords:
discourse; heterogeneity; discursive formation; scientific circulation

Résumé

Cet article a comme thème la question de l’hétérogénéité dans le Discours de Divulgation Scientifique (DDS). Ce discours, tout en s’articulant dans la zone de contact entre le discours scientifique (DS) et les dires de “ceux qui ne sont pas de scientifiques” (DNS), présente une hétérogénéité que je nomme discursive (selon GALLO, 2001) constituée en même temps par des non-coïncidences énonciatives (conformément AUTHIER-REVUZ, 1982), et, aussi, par des coïncidences ayant des sens préconstruits. De ces confrontations entre ces sens, il en résulte, peutêtre, une nouvelle formation discursive, celle qui appartient au DDS, tout en rétablissant les sens du DS et ceux du DNS.

Mots-clés:
discours; hétérogénéité; formation discursive; divulgation scientifique

Resumen

Este artículo desarrolla el tema de la cuestión de la heterogeneidad en el Discurso de Divulgación Científica (DDC). En su articulación en la zona de contacto entre el discurso científico (DC) y los modos de decir de los “no cientistas” (DNC), tal discurso presenta una heterogeneidad, nombrada “discursiva” (en los términos de GALLO, 2001), que se compone no sólo de las no coincidencias enunciativas (conforme AUTHIR-REVUZ, 1982), sino también de las coincidencias con sentidos preconstruidos. Desde esas confrontaciones entre sentidos puede resultar una nueva formación discursiva, aquella del DDC, reordenando sentidos del DC y del DNC.

Palabras-clave:
discurso; heterogeneidad; formación discursiva; divulgación científica

Vivemos em uma galáxia que tem aproximadamente 100.000 anos-luz de diâmetro e rotação lenta; as estrelas em seus braços espirais giram em torno de seu centro, em média, uma vez a cada muitas centenas de milhões de anos. Nosso sol é apenas uma estrela comum, de grande porte e amarela, perto do limite interno de um dos braços espirais. Percorremos certamente um longo caminho desde Aristóteles e Ptolomeu, quando se pensava que a terra fosse o centro do universo! (Stephen Hawking, 1988HAWKING, Stephen W. Uma breve historia do tempo. São Paulo: Círculo do livro S.A., 1988.)

1 INTRODUÇÃO

A discussão sobre o que estamos denominando Divulgação Científica implica problematizarmos o papel da ciência tal como ela se constitui na sociedade contemporânea, em que observamos, dentre outras coisas, o deslocamento, através do DDC, do conhecimento científico para a informação científica. Interessa refletir, portanto, sobre as condições de produção de ciência, tecnologia, administração1 1 Orlandi (2001, p. 150), por exemplo, afirma que os sentidos investidos neste modo de produção da ciência envolvem tanto a indissociabilidade (PÊCHEUX, 1975 apud ORLANDI, 2001), entre ciência, tecnologia, e administração (governo), quanto o deslocamento, através do discurso de divulgação científica, do conhecimento científico para a informação científica, processo este que faz circular o saber/ciência de maneira singular. e mídia, que numa sociedade como a nossa, produz um outro sentido para o conhecimento científico ao dirigi-lo para fora da sua comunidade de origem.

A partir dessa perspectiva, cito algumas propostas sobre o tema. A primeira relaciona-se a afirmação de Authier-Revuz (1982) que entende o DDC como um mero processo de reformulação. Para a autora, o discurso de divulgação se situa no campo da ciência, sendo apenas um “outro” discurso que se pretende equivalente ao discurso científico. O autor de textos de divulgação de ciência, dessa perspectiva, seria mais um sujeito inscrito na FD da ciência, ou seja, uma outra posição de sujeito do DC que não aquela do cientista. Esta relação de equivalência, segundo Zamboni (2001ZAMBONI, Lilian Márcia Simões. Cientistas, jornalistas e a divulgação científica - subjetividade e heterogeneidade no discurso de divulgação científica. Editora Autores Associados. Apoio FAPESP. Campinas, São Paulo, 2001.), traz como conseqüências para DDC uma posição desfavorável no campo científico, já que vai incorporar um imaginário de discurso da ciência degradado.

A outra se relaciona à característica heterogênea deste tipo de discurso. De fato, o DDC, que no processo de “publicização” da ciência a “retira” do seu próprio meio levando-a a ocupar um lugar no “cotidiano” dos sujeitos, singulariza-se pela maneira como constrói e delimita a si mesmo. De acordo com Authier-Revuz (1999), a estrutura enunciativa que se estabelece a partir da organização ternária: “eu vos (lhes) digo que eles dizem que P” (p. 12), ou, eu (divulgador) digo a vocês (público leigo) que eles (cientistas) dizem, pode ser entendida como característica de um processo que oferece um campo privilegiado para o estudo dos mecanismos do dialogismo.

De fato, o DDC se singulariza pela maneira como constrói e delimita a si mesmo, pois se articula continuamente entre dois exteriores: DC e os dizeres dos DNC2 2 A literatura sobre divulgação científica tem utilizado para designar o sujeito leitor dos textos de divulgação, os termos “grande público”, “público leigo”, “senso comum”. Contudo, as análises têm mostrado que o “público alvo” destes textos não se constitui de forma tão homogênea. De fato, o corpus aqui analisado, mostra que o leitor destes textos não pode ser considerado uma “tábula rasa“: o leitor do livro Uma Breve História do Tempo apresenta-se, em certa medida, mais proficiente com relação a ciência do que um leitor dos textos de uma revista de divulgação como a Superinteressante, por exemplo. E ainda muito mais competente se comparado ao leitor dos textos de divulgação da revista Veja. Por isso, a minha opção por denominar estes leitores “não cientistas”. , sendo, portanto, um “lugar” privilegiado das práticas discursivas em que marcas explícitas de heterogeneidade deverão, necessariamente, aparecer.

É, contudo, o outro, o divulgador, a quem se atribui o papel de colocar sob uma forma acessível ao público o resultado das pesquisas científicas, o elemento que, acredito, vai garantir uma discussão diferenciada envolvendo a questão da heterogeneidade. Interessa-me mostrar que esse sujeito, responsável pela articulação entre os dizeres dos cientistas e dos não-cientistas, funda-se fundamentalmente no nível do discurso, pois o que singulariza o DDC é uma heterogeneidade que se constitui discursivamente e não somente no plano enunciativo.

Esta é uma análise possível, se entendermos que a heterogeneidade no DDC pode não se estabelecer como mostrada marcada nos termos de Authier-Revuz (1982). Enquanto esta se funda como denegação do Outro para a afirmação do “eu” enunciativo, a heterogeneidade no DDC pode não resultar dessa negociação, mas se constituir, sim, pela afirmação do Outro enquanto pré-construído.

2 O CORPUS

O material analisado é o livro intitulado Uma Breve Historia do Tempo, do matemático e astrofísico Stephen Hawking3, publicado pela primeira vez em 1988HAWKING, Stephen W. Uma breve historia do tempo. São Paulo: Círculo do livro S.A., 1988.. É, segundo o seu autor, um livro de “alcance popular”, que aborda as questões do espaço e do tempo relacionadas à cosmologia e à teoria quântica e pretende tratar de interrogações bastante pontuais como: de onde surgiu o universo? Como e por que ele começou? Chegaria a um fim, e, em caso de resposta afirmativa, como seria isso?

Hawking entende que essas são perguntas do interesse de todos; no entanto, o que ele chama de ciência contemporânea, a qual faria frente a essas indagações, se tornou tão técnica, a ponto de apenas um pequeno número de especialistas ser capaz de dominar a matemática necessária para lidar com elas. O seu livro é, então, uma tentativa de transmitir esse conhecimento: traz as idéias básicas com relação à origem e ao destino do universo, as quais “podem ser consideradas sem o uso da matemática, de maneira que as pessoas sem formação científica possam compreendêlas” (HAWKING, 1988HAWKING, Stephen W. Uma breve historia do tempo. São Paulo: Círculo do livro S.A., 1988., p. 9). Por isso, o livro, mesmo apresentando alguns gráficos, figuras e um glossário, não inclui nenhuma equação a não ser a mais famosa de Einstein4 4 E=mc2 (onde E significa energia, m, massa e c, a velocidade da luz): energia é igual a massa vezes a velocidade da luz ao quadrado. : E=mc2. Contudo, deve ser lido de forma linear, já que os capítulos estão organizados de maneira que sua compreensão resulte e dependa dos anteriores.

O que está na essência das pesquisas de Hawking, enquanto cientista, nada mais é do que uma teoria chamada a Grande Unificação (GU), que procura unir numa mesma estrutura lógica as duas maiores conquistas do pensamento científico do século XX: a teoria da relatividade de Einstein, que estuda os fenômenos cósmicos, e a mecânica quântica que verifica as relações existentes dentro de um mundo menor que o átomo. Evidentemente trata-se de um projeto bastante ambicioso, e as propostas teóricas de Hawking envolvem discussões, até certo ponto, ousadas para um representante da comunidade científica estabelecida. De fato, um fragmento do posfácio de seu livro, intitulado O Autor e sua Obra escrito pela editora, parece ilustrar bem porque, na obra desse autor, o que se propõe como verdade “é quase sempre mais estranho do que a ficção” (idem, p. 183):

... Hawking sugere, por exemplo, que o tempo real- aquele que o relógio marca e que impede que as coisas aconteçam simultaneamente- seja mera abstração psicológica da humanidade. Prefere trabalhar com o que chamou de “tempo imaginário”, ou seja, algo que inexiste para os padrões da percepção humana. Segundo este conceito, uma fração de segundos e um período de bilhões de anos são a mesma coisa diante da eternidade.

Para Hawking, uma bigorna, um poema, um sopro de vento e uma abóbora são formas diferentes de uma mesma energia e estão submetidas às mesmas leis que regem o universo. Elas têm uma característica em comum: não existem, não são matéria. Reduzidas às suas essências quânticas, não passam de energia concentrada. (idem)

É preciso destacar ainda, que o divulgador, neste caso, não é um jornalista ou repórter, o divulgador é aqui o próprio produtor do discurso fonte, que, exceção feita ao seu primeiro livro “A macroestrutura do espaço-tempo” escrito em 1974, altamente técnico e quase incompreensível ao leitor “comum”, espera ter “aprendido a escrever de maneira mais fácil” (ibidem, p. 10).

Mesmo havendo na construção do texto de divulgação, tanto por parte do jornalista quanto por parte do cientista, uma atividade efetiva de intermediação entre a linguagem “incompreensível” dos textos científicos e aquela linguagem “fácil” de alcance popular, algumas ressalvas devem ser feitas, já que o trabalho jornalístico apresenta particularidades, algumas relacionadas à própria estrutura dos meios de comunicação da qual fazem parte. De tal modo, as restrições impostas por decisões das editorias, que submetem o trabalho jornalístico, na maioria das vezes, a interesses econômicos da empresa de comunicação, vão contribuir para mudar as condições de produção do texto de divulgação. De fato, Moirand (2000MOIRAND, Sophie. Formas discursivas de saberes na mídia. Revista Rua, n. 6, p. 9-24, 2000.) discutindo o papel intermediário assumido pela mídia entre a ciência e o grande público, afirma que nesta função5 5 Moirand (2000) propõe que a mídia constitui mais do que um lugar de transmissão de informação, pois enquanto comunidade de linguagem particular, é uma produtora de informações. Além disso, levanta outro ponto bastante relevante para a discussão: aquele relacionado ao papel desempenhado pela mídia como possível substituta dos lugares de ensino institucionais da ciência. É do âmbito da pesquisa então, estudar “os modos de circulação desses fluxos discursivos através da diversidade das comunidades de linguagem que eles atravessam” (BEACCO, 1995 apud MOIRAND, 2000, p. 22), sendo a mídia a comunidade discursiva intermediária, que neste contexto, atravessa posições e lugares discursivos que os produtores de conhecimento não mais controlam. , a mídia apresenta uma imagem bastante característica. Destaca diferentes modos discursivos mais ou menos imbricados, envolvidos no processo: o narrativo, o explicativo, o argumentativo, o preventivo, o de aconselhamento. Contudo, em sua maioria, a mídia reveste-se de um papel de conselheira para a vida cotidiana (dietética, médica); de consultora (cartas de leitores, telefonemas); de transmissora de know how técnico ou experimental (não somente limitados à vida cotidiana, mas que envolvem outros aspectos como os saberes sobre astronomia). Por conseqüência, a heterogeneidade deste discurso de divulgação pode apresentar-se cada vez mais velada quando “se trata de difundir opiniões fazendo-as passar por verdades” (idem, p. 21), ou seja, as funções da explicação, fundamental neste tipo de discurso, estariam estreitamente ligadas à natureza dos saberes transmitidos e aos domínios científicos e técnicos implicados, apresentando graus na vontade de “fazer-compreender”6 6 No domínio das novas tecnologias, por exemplo, a explicação desliza para um discurso quase promocional, em que “o modo explicativo desliza para o da justificativa, a persuasão impõe-se sobre o raciocínio...” (idem, p. 20). .

Evidentemente, não se pretende propor, que o material usado como corpus nesta análise, por não se tratar de objeto manipulado pela mídia ordinária, esteja isento desse tipo de cerceamento. Trata-se de evidenciar que o que define qualquer texto é a posição de sujeito por ele “prevista” pelos parâmetros da formação discursiva dominante, e dos quais não há exterior, por serem de caráter ideológico e histórico. Portanto, não se trata de vontade ou intenção de um indivíduo, mas de sua necessária inscrição em um conjunto já lá de parâmetros, ou seja, em uma materialidade de natureza histórico-ideológica. Assim, a interpretação produzida por este sujeito se dá muito mais pelo desconhecimento do que pelo reconhecimento. O que em última análise significa dizer que, do ponto de vista teórico assumido aqui, importa menos “quem diz” e mais “o que possibilita esse dizer”, que pode ser assumido por qualquer um.

3 OS FUNDAMENTOS

Assim, talvez o que chamamos de tempo imaginário seja realmente mais concreto, e o que chamamos tempo real seja apenas uma idéia que inventamos para nos ajudar a descrever o que pensamos do universo. Mas [...] uma teoria científica é apenas um modelo matemático, que criamos para descrever nossas observações: existe apenas na nossa imaginação. Portanto, não tem sentido perguntar: o que é verdadeiro o tempo “real” ou “imaginário”? Trata-se simplesmente de uma questão de utilidade na descrição. (HAWKING, 1988HAWKING, Stephen W. Uma breve historia do tempo. São Paulo: Círculo do livro S.A., 1988.)

A análise do discurso (AD), estabelecida sobre a tríade teórica envolvendo a lingüística, a psicanálise e o materialismo histórico, “visa construir um método de compreensão dos objetos da linguagem” (ORLANDI, 1990, p. 25). Sendo assim, o estudo das formas textuais para a AD inscreve-se num terreno em que intervêm questões teóricas relativas à historicidade e à ideologia (ALTHUSSER, 1970) e ao sujeito (“o Outro” lacaniano), enquanto afirma que o discurso materializa o contato entre o ideológico e o lingüístico (PÊCHEUX, 1975PÊCHEUX, M. Les vérités de la palice. Paris. Mespero, 1975. [trad.bras.: Semântica e discurso.Campinas, SP: Editora da UNICAMP, 1988].).

No entanto, mais que resgatar um sujeito do discurso no estudo lingüístico, evidentemente excluído pelo estruturalismo, a AD inaugura uma nova percepção da linguagem quando assume que esta é falha, já que significação e sujeito não são transparentes: esta intencionalidade e transparência atribuídas aos sentidos e á linguagem nada mais são do que efeitos ideológicos, ou seja, todo sentido resulta de efeitos produzidos por feixes de condicionantes histórico-sociais.

Assim, na tentativa de entendimento do que constitui a construção da interpretação, assume-se que todo sentido “reflete e refrata uma outra realidade que lhe é exterior” (BAKHTIN, 1992BAKHTIN, M.; (VOLOSHINOV, V. N.). Marxismo e filosofia da linguagem. São Paulo: Hucitec, 1992., p. 31), sendo que este exterior não se estabelece fora da discursividade. Trata-se então de escapar da armadilha da transparência da significação, buscando aquilo que realmente institui o sentido: as suas condições de produção, o seu sujeito dividido mas estruturado a partir da linguagem7 7 Segundo Orlandi (1990), o rompimento da AD com a forma como as ciências usam seus objetos de análise se deve à própria concepção discursiva de linguagem, a qual não é vista como instrumento de comunicação de significações que existiriam e que seriam definidas independentemente da linguagem. Há, portanto, um deslocamento tanto na noção de sujeito quanto na noção de história, já que para a AD estes conceitos somente podem ser definidos através do “seu caráter eminentemente constituído pelo outro termo do sintagma de que participam, ou seja, da linguagem“ (ORLANDI, 1990, p. 28). e por isso assujeitado (não-consciente). Sentido este que radicalmente se instaura mesmo no silenciamento.

De fato, o sujeito, resultado da relação entre linguagem e história, não é a fonte única do sentido, nem tampouco elemento onde se origina o discurso. Ele se constitui, primordialmente, a partir da sua relação com o Outro. Segundo Lacan, o Outro é o inconsciente, que se estrutura como uma linguagem8 8 Lacan faz uma releitura de Freud e recorre ao estruturalismo lingüístico (Saussure e Jakobson) buscando uma abordagem mais precisa do inconsciente. Assim, assume que o inconsciente se estrutura como uma linguagem latente, a qual se repete e interfere no discurso efetivo. As noções estruturalistas envolvendo os critérios relacional e diferencial são então aplicadas ao conceito lacaniano de sujeito que se define não por ele mesmo, mas por sua relação e diferenciação com aquilo que ele não é. . É o lugar do desconhecido, do estranho, de onde emana o discurso do pai, da familia, da lei, enfim, do outro, e em relação ao qual o sujeito se define, ganha identidade. O sujeito lacaniano, visto primordialmente como uma representação do outro, assim o é, porque tem na estrutura discursiva o seu meio de expressão: para Lacan “a linguagem é condição do inconsciente” (1949 apud MUSSALIM, 2001MUSSALIM, Fernanda. Análise do Discurso. In: BENTES, Anna Cristina; MUSSALIM, Fernanda (Orgs.). Introdução à Lingüística: domínios e fronteiras. Vol. 1. São Paulo: Editora Cortez, 2001. p. 102-142.). Assim, “longe de ser ‘um’, o sujeito é aquilo que um significante representa para outro significante, ou seja, o que emerge entre os significantes” (CARREIRA, 2001CARREIRA, Alessandra Fernandes. Sobre a singularidade do sujeito na posição de autor. Linguagem em (Dis)curso, v. 1, n. 2, p. 51-60, jan./jun. 2001, p. 53-54). E por ser a linguagem incompleta, é possível que sobre espaço para a construção do “eu” no sujeito através da produção das suas próprias cadeias de significantes9 9 Lacan rompe, portanto, com o pressuposto básico do estruturalismo, de completude do sistema, pois este sujeito clivado, dividido entre o consciente e o inconsciente inscreve-se na estrutura (que é lingüística) como uma descontinuidade na cadeia de significante, causando assim, um descompasso na relação entre significante e significado. , o que resultaria, segundo Carreira (idem, p. 54), no recalque do discurso do Outro, a própria constituição do inconciente, que tem no outro polo o consciente (eu).

O discurso do Outro recalcado não deixa de ecoar, de retornar atestando a exterioridade primordial10 10 Sobre a noção de exterioridade primordial Carreira (2001) baseada em Lacan diz: “Petrificado por uma dependência primordial, mortal e alienante em relação aos significantes do Outro, o sujeito está no terror. Mas, como a linguagem é incompleta, é possível que sobre um espaço para o bebê produzir “suas cadeias de significantes, deslocando-se da relação especular com o Outro, se parindo, separando-se. [...] a construção do “eu” no sujeito pressupõe o recalque do discurso do Outro, constituindo o inconsciente como uma cadeia de significantes primordiais que se repete em uma Outra Cena (LACAN, 1966)” (p. 54). da constituição do sujeito, interferindo no discurso efetivo do sujeito, o qual tenta se organizar, unificar-se. O que socorrerá este sujeito diante deste “sem-sentido”, que surge às custas do seu deslocamento do Outro primordial, é o que Lacan (1949 apud CARREIRA, 2001CARREIRA, Alessandra Fernandes. Sobre a singularidade do sujeito na posição de autor. Linguagem em (Dis)curso, v. 1, n. 2, p. 51-60, jan./jun. 2001) chama de “a entrada na dialética social”, e o que Pêcheux (1975PÊCHEUX, M. Les vérités de la palice. Paris. Mespero, 1975. [trad.bras.: Semântica e discurso.Campinas, SP: Editora da UNICAMP, 1988].) afirma ser função da ideologia11 11 “...a interpelação ideológica que, é importante frisar, já estava afetando o sujeito desde os primórdios de sua constituição, o que torna esta ordem que vai do primordial ao histórico puramente lógica, e não cronológica“ (CARREIRA, 200, p. 55). : fornecer coisas-a-saber, um já-lá interdiscursivo, que visam homogeneizar o mundo. Mas para que a interpelação ideológica possa produzir no sujeito a ilusão de que o sentido já existe como tal, neutralizando o que é produzido na relação do histórico e do simbólico, é preciso que o trabalho ideológico seja antes de tudo um trabalho do esquecimento.

De fato, Pêcheux (1975PÊCHEUX, M. Les vérités de la palice. Paris. Mespero, 1975. [trad.bras.: Semântica e discurso.Campinas, SP: Editora da UNICAMP, 1988].) supõe haver duas ilusões constitutivas do sujeito, que ele denomina Esquecimentos no 1 e no 2.

O Esquecimento n o 1 está no nível do inconsciente: todo sujeito esquece aquilo que determina os sentidos de seu dizer e em razão desse esquecimento (apagamento), coloca-se na origem do dizer. O autor assevera que esta é uma condição necessária para a constituição de qualquer sujeito, sem a qual só haveria silêncio, pois o sujeito seria calado pela consciência (lembrança) de que tudo já foi dito antes, em algum lugar. Segundo Orlandi (1999ORLANDI, Eni. Análise do Discurso: princípios e procedimentos. Campinas, SP: Pontes, 1999.), este esquecimento é também denominado esquecimento ideológico, pois resulta do modo como somos afetados pela ideologia.

Já o Esquecimento n o 2, que é da ordem da enunciação, relaciona-se com uma impressão de realidade do pensamento, isto é, com a ilusão referencial que “nos faz acreditar que há uma relação direta entre o pensamento, a linguagem e o mundo” (ORLANDI, 1999ORLANDI, Eni. Análise do Discurso: princípios e procedimentos. Campinas, SP: Pontes, 1999., p. 35). Esta ilusão conduz à aceitação de que o que se diz somente pode ser dito com aquelas palavras e não com outras, do ato de colocar o “dito” e, em conseqüência, rejeitar o “não-dito”. Contudo, este esquecimento é parcial, semi-consciente, pois vai conduzir ao reconhecimento do “não-dito”, uma vez que se recorre às formações parafrásicas que constituem cada dizer, atestando que a estrutura formal da língua que se modifica a cada “modo de dizer não é indiferente aos sentidos” (idem, p. 35). De tal modo, todo sujeito e todo discurso, assim constituídos, são atravessados pelo(s) discurso(s) do(s) outro(s): o sujeito nasce dependente primordialmente dos significantes do Outro ao mesmo tempo que, interpelado ideologicamente, assume uma posição em uma dada FD, a qual é “constitutivamente ‘invadida’ por elementos que vêm de outro lugar (isto é, de outras FD) que se repetem nela, fornecendo-lhe suas evidências discursivas fundamentais (por exemplo, sob a forma de ‘pré-construído’ e de ‘discursos transversos’)” (PÊCHEUX, 1990b, p. 314 apud ZAMBONI, 2001ZAMBONI, Lilian Márcia Simões. Cientistas, jornalistas e a divulgação científica - subjetividade e heterogeneidade no discurso de divulgação científica. Editora Autores Associados. Apoio FAPESP. Campinas, São Paulo, 2001.). Esta heterogeneidade que perpassa todo discurso é elemento constitutivo de práticas discursivas que se dominam, se aliam ou se afrontam em um certo estado de luta ideologica e política, no seio de uma formação social em uma conjuntura histórica determinada12 12 A noção de Formação Discursiva em que os diversos discursos que a atravessam não se constituem independentemente uns dos outros (diferentemente do que se supunha para a “máquina discursiva”) para em seguida serem postos em relação (relações estas ainda entre as “máquinas discursivas”), mas se formam de maneira regulada pelo Interdiscurso, o que equivale dizer que o “outro”- outra(s) FD(s)- será organizado, estruturado a partir de algo que “fala antes, em outro lugar, independentemente” (ORLANDI, 1999, p. 31), remetendo o “dizer a toda uma filiação de dizeres, a uma memória, e a identificá-lo em sua historicidade” (idem p.35). .

Assim, a permanente recusa em aceitar a existência da linguagem como uma entidade homogênea, monolítica, não articulável com a história e com o sujeito, vai se firmar ainda mais na assunção de uma heterogeneidade constitutiva do discurso, a qual garante à AD uma argumentação em favor “de um espaço de trocas entre vários discursos” (MAINGUENEAU, 1984MAINGUENEAU, D. Genèses du discours. Liège; Bruxelles: Pierre Mardaga, 1984., p. 11), em que a especificidade constitutiva de cada discurso se faz nesta sua relação necessária com os outros discursos.

3.1 A heterogeneidade: constitutiva e mostrada

Dentre os trabalhos que se inscrevem no que se denominou a terceira fase13 13 Gallo (2001) faz referência a Maldidier que caracteriza a terceira fase da teoria do Discurso como sendo a fase do “outro sobre o mesmo”. Maldidier ainda cita, entre outros trabalhos, Heterogeneités Énouciatives de AuthierRevuz (1984) para ilustrar esta fase da AD. da teoria do Discurso, faz-se alusão àquele de Authier-Revuz (1982) que trata da heterogeneidade discursiva. A autora, discutindo a noção de subjetividade, já reconhecidamente heterogênea, propõe que toda fala é determinada de fora da vontade do sujeito, pois o Outro como elemento constitutivo do sujeito compartilha com ele o espaço discursivo da enunciação. Propõe então, uma classificação da heterogeneidade em dois tipos: a constitutiva e a mostrada (marcada e nãomarcada).

A primeira, dita constitutiva, relaciona-se ao que Pêcheux (1975PÊCHEUX, M. Les vérités de la palice. Paris. Mespero, 1975. [trad.bras.: Semântica e discurso.Campinas, SP: Editora da UNICAMP, 1988].) denomina Esquecimento n o 1, articulando-se portanto no nível do inconsciente e do interdiscuso. A noção baktiniana de dialogismo também aparece na origem deste conceito de heterogeneidade. De fato, a “dialogicidade interna do discurso” é fenômeno que orienta a estrutura de todo e qualquer discurso, pois a linguagem verbal é essencialmente dirigida para a interação verbal, para o Outro da interlocução, para a plurivalência dos sentindos em que cada discurso se orienta para e por outros discursos. Zamboni (2001ZAMBONI, Lilian Márcia Simões. Cientistas, jornalistas e a divulgação científica - subjetividade e heterogeneidade no discurso de divulgação científica. Editora Autores Associados. Apoio FAPESP. Campinas, São Paulo, 2001.), discutindo as reflexões do círculo de Bakhtin tomadas como base por Authier, afirma que o princípio do dialogismo nos escritos do autor assume uma dupla perspectiva: por um lado a relação dialógica é orientada para o discurso do Outro na ordem do “já-dito”, pois “ao contrário de um aparecimento adâmico, as palavras não são neutras, nem virgens, assumem sua existência de palavras nos discursos nos quais adquiram uma vida socialmente sustentada” (idem, p. 23); e por outro lado, o dialogismo é orientado para um discurso do Outro na ordem do “ainda-por-dizer”, ou seja, da resposta antecipada.

Authier-Revuz, desse modo, assume a noção de heterogeneidade constitutiva como condição sem a qual não há discurso. Não evidenciada através de marcas lingüísticas explícitas, mas amparada pelos pressupostos psicanalíticos do discurso atravessado pelo inconsciente, pelo interdiscurso e pela orientação dialógica de todo discurso, esta noção é o princípio de ancoragem das outras formas de heterogneidade enunciativa: a mostrada (marcada e não-marcada). De tal modo, a autora considera a heterogeneidade mostrada como sendo uma maneira de negociação do sujeito com a heterogeneidade constitutiva. Este acordo se dá sob a forma de denegação: o sujeito (locutor) reformula o seu próprio dizer marcando o seu enunciado14 14 Relaciona-se ao Esquecimento no 2. O enunciado se constitui então, pela manifestação do “dito” e, em conseqüência, rejeição do “não-dito”. com um sentido diferente, o qual estaria no universo do Outro (interlocutor). Como resutado, o sujeito garante um efeito de sentido de que o resto do dizer é todo seu. Assim, “entregando-se à evidência de uma voz que fala nele, o sujeito delimita o campo de ação dessa voz e garante a originalidade do restante” (GALLO 2001GALLO, Solange Leda. Autoria: questão enunciativa ou discursiva. Linguagem em (Dis)curso, v. 1, n. 2, p. 61-70, jan./jun. 2001., p. 64). Ou seja, ao circunscrever a alteridade o sujeito garante uma unidade aparente.

É, então, no domínio da heterogeneidade mostrada que o trabalho de AuthierRevuz se desenvolve de maneira mais original. A autora propõe dois tipos de enuncidos: aqueles em que se pode apreender lingüisticamente a presença do outro no um, isto é, que mostram a heterogeneidade com marcas explícitas (mostrada marcada) e aqueles em que a heterogeneidade não é visivel lingüisticamente (mostrada não-marcada). Exemplos do primeiro tipo é o discurso relatado, em que enunciador ou usa i) suas próprias palavras para transmitir o discurso de um outro (discurso indireto), ou ii) recorta as palavras do outro e as cita (discurso direto), assinalando estas palavras no seu discurso através de “operações locais explícitas” (AUTHIER-REVUZ, 1982AUTHIER-REVUZ, Jacqueline. Hétérogeneité montrée et hétérogeneité constitutive: éléments pour une approche de láutre dans lê discours. DRLAV- Revue de linguistique, Paris: Centre de recherche de l’Université de Paris VIII, n. 26, 1982., p. 36), ou seja, por meio de aspas, itálico, glosa. Já no que diz respeito a heterogeneidade não visível na materialidade lingüística (mostrada não-marcada), tem-se o humor, a ironia, a imitação, que contam com o “outro dizer” para produzir sentido, sem necessariamente explicitá-lo.

3.2 Heterogeneidade e o discurso de divulgação científica

Nos estudos da discursivização, ou seja, nas discussões envolvendo as relações entre condições de produção dos muitos discursos e seus processos de constituição e formulação, podem ser identificadas formas discursivas relacionadas à circulação do conhecimento. A divulgação científica é considerada uma atividade desse tipo.

Bueno (1984 apud ZAMBONI, 2001ZAMBONI, Lilian Márcia Simões. Cientistas, jornalistas e a divulgação científica - subjetividade e heterogeneidade no discurso de divulgação científica. Editora Autores Associados. Apoio FAPESP. Campinas, São Paulo, 2001.)15 15 Bueno (1984, apud ZAMBONI, 2001), apresenta um quadro conceitual sobre o que ela denomina “difusão” científica, no qual inclui o jornalismo científico como espécie de divulgação científica, assim como os livros didáticos, as aulas de ciências do ensino médio, os cursos de extensão para não-especialistas, as estórias em quadrinhos, os suplementos infantis, folhetos de extensão rural, etc. De acordo com Zamboni, a classificação feita por Bueno ora se baseia na caracterização do publico alvo (disseminação científica ou divulgação científica), ora na modificação por que deve passar a linguagem hermética da ciência para chegar até o publico leigo (“recodificação” da linguagem). apresenta a circulação científica com um gênero que se desdobra em dois diferentes tipos: disseminação científica (quando esta circulação é orientada para e pelos especialistas), divulgação científica (quando é orientada para o público leigo).

Interessa, aqui, esta última: a divulgação científica, que pode ser considerada genericamente como uma atividade de circulação de conhecimento dirigida para fora de seu contexto original, isto é, para fora de uma comunidade de limites restritos, que produz e faz circular em seu interior conhecimento científico específico16 16 O Discurso Científico (DC) se caracteriza, no que diz respeito à questão da heterogeneidade, justamente pelo seu caráter opositivo, ou seja: para se constituir necessita ser subtraído de sua heterogeneidade. Assim, há um trabalho, um movimento para a monologicidade sustentando o discurso da ciência, que vai gerar a ilusão de um discurso uno, absoluto, manifestação da “verdade”, da “fala incontestável”. Esta homogeneidade discursiva implica numa linguagem reconhecidamente hermética e esotérica, que, de acordo com Peytard (1984, apud ZAMBONI, 2001), pode ser evidenciado no ideal de univocidade e de “monossemiotização” do DC. De fato, o DC articula-se num nível estrutural fundamental em que as conceptualizações em forma de teoremas, axiomas, de operações matemáticas “enformam-se num conjunto de termos-pivô ou termos-chave imutáveis e universais” (idem, p. 77), constituindo o que o autor denomina alta densidade discursiva do DC. Afirma, ainda, que, por apresentarem alta densidade discursiva, os textos científicos somente admitem reformulação no nível das relações sintagmáticas da língua e sobre os vocábulos não-conceptualizados. Conseqüentemente para Peytard, na divulgação científica, o discurso segundo somente poderá produzir-se, se resguardada a relação de equivalência com o discurso fonte (DC), justamente porque nem tudo é passível de reformulação num texto científico. . Neste processo, será necessário mobilizar diferentes recursos, técnicas e procedimentos para a veiculação dessas informações científicas e tecnológicas para os não cientistas, os quais estão fora dos limites da comunidade em questão.

Claramente relevante para a discussão, é o que acima foi designado “recursos, técnicas e procedimentos” que possibilitam a circulação desse tipo de informação para a comunidade não cientifica. Tais metódos, relacionados ao fator “linguagem”, é o que, para muitos especialistas, vai garantir o sucesso desse tipo de discurso. De certo, a divulgação pressupõe um processo de “transferência” que, segundo Orlandi (2001), produz um efeito metafórico pelo qual algo que significava de um modo (linguagem especializada) desliza para produzir outros efeitos de sentidos diferentes (linguagem não especializada).

Para Orlandi (2001), esse processo de “articulação” entre o DC e o discurso dos não cientistas deve ser entendido como um jogo complexo de interpretação com efeitos particulares e que, por isso, não pode ser considerado como uma “tradução”17 17 Na tradução há um trabalho de busca de equivalentes entre línguas diferentes. No caso do DDC, a relação se estabelece entre dois discursos - o científico e o de divulgação - numa mesma língua. . O DDC aí produz efeitos de sentidos que lhes são próprios ao se constituir pelo duplo movimento de interpretação: o divulgador lê em um discurso e diz no outro, isto é, “ele toma um discurso constituído numa relação com uma ordem e formula em outra ordem” (idem, p. 24)18 18 Além disso, ao se produzir como uma forma de específica de autoria, desencadeia novos gestos interpretativos, constituindo ao mesmo tempo um certo efeito-leitor correspondente. “...a ciência tem necessidade de se representar em uma certa exterioridade, que se faz pela construção desse sujeito-leitor de ciência que se apresenta como sujeito social. Esse sujeito-leitor está representado (ou seja, presente mas transformado) no texto, pelo mecanismo da antecipação que, ao produzir os efeitos de sentidos produz o próprio efeito-leitor (um imaginário de leitura). No caso da divulgação científica, há uma representação do leitor no texto pela acentuaçao do aspecto técnico” (ORLANDI, 2001, p. 20). . Contudo, segundo a autora, o DDC é uma certa “versão” do texto científico, ou seja, parte de um texto que é da ordem do discurso científico e busca manter pela textualização jornalística um efeito-ciência, através de uma certa organizaçao textual. Desse modo, enquanto a formulação do DC é garantida pela sua metalinguagem específica, significando na direção da ciência, o DDC é constituído por essa metalinguagem deslocada para uma terminologia “que permite que a ciência circule, que se entre assim em um ‘processo de transmissão’” (idem, p. 27).

Assim, a linguagem científica, que é para o público não cientista uma “língua” incompreensível dado o seu caráter hermético e esotério, necessita de um “divulgador” capaz de “trocar a ciência em miúdos”, que o fará através de uma estrutura discursiva, em que estão em jogo certos processos enunciativamente marcados. De acordo com Authier-Revuz (1999, p. 10), a estrutura enunciativa que se estabelece a partir da organização ternária: “eu (divulgador) digo a vocês (público leigo) que eles (cientistas) dizem”, pode ser entendida como característica de um processo que, no campo da DDC, produz um discurso segundo em função do “alvo visado”, oferecendo um campo privilegiado ao estudo dos mecanismos do dialogismo, pela nitidez com a qual pode aí ser posta a dupla restrição do já-dito do discurso fonte e do destinatário do discurso segundo.

É o que Orlandi (2001) chama de “efeito de informação científica”, quando se busca, através do uso de certa terminologia, por em contato sem substituir o discurso do “senso-comum” e o da ciência. Por meio de vários procedimentos o termo científico é apresentado ao lado de descrições, sinônimos, perífrases, equivalentes, etc, “deixando à vista o processo pelo qual o discurso científico se apresenta como uma re-tomada” (p. 27). Nos termos de Authier-Revuz, o DDC sendo uma prática de reformulação explícita19 19 Para Authier-Revuz, o DDC não é meramente uma prática de reformulação como as atividades pedagógicas, como a tradução, a resenha, o resumo, mas uma prática de reformulação explícita. Contudo, de acordo com Zamboni (2001), ao assumir esta concepção de reformulação, Authier-Revuz situa a divulgação científica no campo da ciência, “a cujo discurso a divulgação responde como sendo um “outro” que se pretende equivalente a ele” (idem, p. 84). Essa relação de equivalência traz como conseqüência para o DCC uma posição desfavorável no campo científico, já que vai incorporar uma imagem de um discurso da ciência degradado. Quanto a isso, Orlandi (2001) diz que o DDC tem uma relação intrínseca com o seu discurso de origem (DC), relação esta que precisa ser evidenciada justamente para que se tenha o efeito de exterioridade da ciência. Contudo, quando a metalinguagem constitutiva do DC é substituída pela terminologia que dá “ancoragem” científica ao discurso de divulgação, o que se observa é uma exacerbação no uso dessa terminologia, buscando garantir uma função legitimadora para o DDC. De tal modo, perde-se aí justamente o que seria constitutivo do discurso da ciência: sua “objetividade”, ou o que ele “constrói pela objetividade real contraditória de sua metalinguagem”(ide, p. 28). , que longe de “esconder a maquinaria” vai mostrá-la sistematicamente, é o “lugar” em que a heterogeneidade mostrada marcada é especialmente perceptível. Pode-se identificá-la em dois níveis: i) na estrutura enunciativa e ii) no fio do discurso.

No que diz respeito ao quadro da enunciação20 20 Para Orlandi (2001, p. 25) o entendimento do funcionamento (constituição, formulação e circulação) do DDC, deve passar pela reflexão de Maingueneau (1987) sobre “encenação”. De acordo com o autor, a cenografia discursiva organizada pelo eu/tu-agora-aqui do discurso em termos de locutor/destinatário-cronografia-topografia é entendida porque o que funciona no discurso são relações que se produzem em um mecanismo de substituições, isto é, num conjunto já-lá de “lugares” determinados por uma topografia social, “nas quais os sujeitos se inscrevem e que funcionam imaginariamente no discurso (em relação com a posição-sujeito)”. Assim, partindo dessa perspectiva, no que diz respeito ao DDC, o que é encenada é a relação intrínseca com o DC que traz marcas específicas no próprio enunciado, dentre elas marcas lingüísticas explícitas (sintático-semânticas) como, por exemplo, aquelas identificadas ao modo de funcionamento da menção: “segundo o cientista x”, “o que digo se refere ao que na biologia (ou fisiologia, etc) está sendo estudado como”, “especialistas reunidos em W chegaram à conclusão de que .... etc”. , a autora observa uma dupla estruturação enunciativa:

a) a do discurso científico (D1) que aparece massivamente sob a formade discurso relatado i) indireto: “O Senhor X (os especialistas, o mundo dos eruditos, os cientistas) pensa (diz, experimentou, demonstrou, explicou, etc...) que...”, (e na forma de ii) discurso direto, em que se recorta as palavras do outro e as cita. Em ambos os casos, os nomes próprios dos enunciadores, lugares, tempos dos atos de enunciação são especificados abundantemente. O cientista designado individualmente com seu nome, sustentado em seu título e em seu lugar de trabalho, garante ao DDC um “efeito de real” originário do discurso científico, além de assegurar a autoridade da voz que “diz a verdade”:

[...] Numa tentativa de encontrar um modelo no qual muitas configurações iniciais diferentes pudessem ter evoluído para alguma coisa semelhante ao atual universo, um cientista do Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT), Alan Guth, sugeriu que [...] (HAWKING, 1988HAWKING, Stephen W. Uma breve historia do tempo. São Paulo: Círculo do livro S.A., 1988., p. 129).

b) a do DDC (D2) produzindo-se: uma ancoragem temporal muito marcada(hoje, nos últimos anos, na próxima década, etc); e uma designação dos interlocutores - o divulgador e o leitor - e do ato de comunicação que os liga: “cremos ser nosso dever informar”, “os leitores que gostam de estar em dia”, “mostro-lhes”:

[...] Decidi tentar escrever este livro de alcance popular, tratando das questoes do espaço e do tempo [...] de onde surgiu o universo, Como e por que ele começou? Chegaria a fim? [...] São perguntas do interesse de todos [...] Natuaralmente, as ideias basicas com relação à origem e ao destino do universopodem ser considerada sem o uso da matemática, de maneira que as pessoas sem formação cientifica possam compreendê-las. É exatamente isso que tentei fazer neste livro. Cabe ao leitor julgar aqui se consegui. (HAWKING, 1988HAWKING, Stephen W. Uma breve historia do tempo. São Paulo: Círculo do livro S.A., 1988., p. 9)

No nível do fio do discurso, o DDC vai construir-se através do contato de dois discursos no próprio desenrolar da atividade através de um fio explicitamente heterogêneo21 21 Authier-Revuz (1999) diz que o divulgador é freqüentemente apresentado como um perito em tradução, a quem é necessário recorrer em virtude de uma ruptura de comunicação na sociedade. Contudo, entende que o DDC não deve ser confundido com a atividade de tradução que num “trabalho de vaivém entre as duas línguas, de busca de equivalência, de tateamentos vai produzir um texto segundo que, homogeneamente em língua de chegada, substitui um texto da língua fonte”(p. 12). Para Authier-Revuz, portanto, o DDC não é meramente uma prática de reformulação como as atividades pedagógicas, como a tradução, a resenha, o resumo, mas uma prática de reformulação explícita. . De fato, o DDC coloca em uma relação simétrica os dois discursos entre os quais ele se constitui caracterizando-os de modo diferenciado. Além disso, segundo Authier, “a verdadeira regularidade desses textos é o estabelecimento, através destas inumeráveis formas de heterogeneidade mostrada, de um caminho de vaivém entre esses dois discursos, de um lugar em que se realiza uma colocação em contato” (1985, p. 13). A representação desse dialogismo acontece no fio do discurso através de duas estruturas principais:

a) a justaposição de dois discursos por numerosas formas de estabelecimento de equivalência: A, ou seja, B; A, em outras palavras B; A significando, batizado de B; A ou B;

[...] (O tempo gasto é, no final das contas, apenas a velocidade da luzsobre a qual os observadores concordam - multiplicada pela distância que a luz percorreu- sobre a qual eles não concordam.) Em outras palavras, a teoria da relatividade sela o fim do conceito de tempo absoluto! Parece que cada observador pode ter sua própria medida de tempo, tal como registrada pelo seu relógio, e com a qual relógios idênticos, com diferentes observadores, não concordam necessariamente. (HAWKING, 1988HAWKING, Stephen W. Uma breve historia do tempo. São Paulo: Círculo do livro S.A., 1988., p. 33); b) o distanciamento metalingüístico alternativamente de um e de outo discurso, designado pelo itálico, pelas aspas, parentêses, etc, como exterior, inapropriado.

[...] Foi então sugerido que havia uma substância chamada “éter”, presente em todos os lugares, mesmo nos espaços “vazios”. (HAWKING, 1988HAWKING, Stephen W. Uma breve historia do tempo. São Paulo: Círculo do livro S.A., 1988., p. 45)

No exemplo acima, as aspas identificam os termos científicos, marcando-os como termos “estranhos” à linguagem do leitor, isto é: a linguagem dos especialistas é identificada como “exterior” ao discurso do grande público. No entanto, para Authier-Revuz também as palavras cotidianas podem receber a marca de distanciamento com relação à linguagem científica, não havendo um sentido privilegiado nos estabelecimentos de equivalência, que indicariam uma regularidade na mudança do especializado para o familiar ou vice-versa. Além disso, a autora faz também uma distinção no procedimento de distanciamento metalingüístico, denominando autonímia quando, pelo aspeamento, por exemplo, o locutor faz menção e não uso das palavras aspeadas, o que pode ser verificado nos fragmentos acima. Já na conotação autonímica a palavra marcada é usada com conotação de menção, isto é, o locutor faz menção e faz uso da palavra aspeada, à maneira de um duplo uso, como demonstrado nas estruturas que se seguem:

[...] A resposta, dada pela teoria quântica, é que as partículas não vêm de dentro do buraco negro, mas do espaço “vazio” exatamente além do seu horizonte de eventos! Pode-se compreender o fato da seguinte maneira: o que pensamos ser “vazio” pode não ser completamente vazio, por que isso implicaria que todos os campos, tais como o gravitacional e o eletromagnético, teriam de ser exatamente nulos. [...] (HAWKING, 1988HAWKING, Stephen W. Uma breve historia do tempo. São Paulo: Círculo do livro S.A., 1988., p. 109-110)

4 A ANÁLISE

A discussão que se segue apresenta, inicialmente, uma descrição pormenorizada das marcas de heterogeneidade na obra de Hawking (1988HAWKING, Stephen W. Uma breve historia do tempo. São Paulo: Círculo do livro S.A., 1988.). Estas explicitações de natureza formal constitutivas do plano enunciativo vão, em um segundo momento, servir como instrumentos juntamente com o conteúdo do texto, para se chegar às propriedades internas do processo discursivo, aquelas que podem evidenciar a relação da língua com a história e com a ideologia. Partindo-se, então, dos produtos (indícios, pistas), busca-se o entendimento do processo de constituição dos sujeitos e dos sentidos aí inscritos, procurando evidenciar que a heterogeneidade do discurso pode ser constituída não somente pela “diferença” (denegação), mas também pela “coincidência” com o Outro (pré-construído).

4.1 A Descrição: marcas lingüísticas explícitas de heterogeneidade em “Uma breve História do Tempo”

No nível da enunciação, o DC fonte apresenta-se sob a forma de discurso relatado indireto “O cientista fulano de tal diz...”, em que o cientista vem representado a) por uma terceira pessoa que não o divulgador (“ele(s) diz(em) que...”), e b) pela própria pessoa do divulgador (“eu digo que...”). E ainda, em alguns poucos casos, sob a forma de discurso direto. Seguem alguns fragmentos do material aqui analisado que ilustram esse procedimento enuniciativo:

a) DC fonte identificado na forma da 3 a . pessoa (os outros cientistas)

O cientista responsável por este dizer é denominado individualmente, amparado em seu título e suas obras:

[...] Entretanto, num famoso artigo, em 1905, um até então desconhecido funcionário público suíço, Albert Einstein, mostrou que o conceito de éter era desnecessário, uma vez que se estava querendo abandonar a idéia de tempo absoluto. [...] (p. 32)

[...] Em 1974, Joel Scherk, de Paris, e John Schwartz, do Instituto de Tecnologia da Califórnia, publicaram um trabalho que demonstrava que a teoria da corda poderia descrever a força gravitacional, mas apenas se a tensão da corda fosse muito mais elevada [...] (p. 158)

A designação do cientista pode manifestar-se de forma mais anônima, já que identificados através do pronome “se”22 22 Mas também, de acordo com Moirand (2000), podem aparecer incluídos em um subgrupo da comunidade: Os cientistas se interrogam...; para numerosos cientistas...; a maioria dos especialistas; alguns dos melhores especialistas da comunidade. Nos dados investigados, raras foram as ocorrências deste tipo. Pode-se citar um caso: [...] Atualmente os cientistas descrevem o universo através de duas teorias parciais básicas: [...] (p. 25) assumem uma forma indeterminada de sujeito. Além disso, alguns exemplos de frases passivas (exemplos das pgs. 31 e 83), em que o agente não está expresso, também demonstram esse caráter menos individualizado do sujeito, o que corrobora a sua inscrição num discurso que busca a homogeneidade e a neutralidade do sujeito responsável pelo dizer:

[...] Provou-se que é muito difícil descobrir uma teoria que descreva o universo. Por isso divide-se o problema em diversas partes e inventam-se inúmeras teorias parciais. [...] (p. 24);

[...] Supõe-se que o universo tinha tamanho zero e temperatura infinitamente quente quando da grande explosão. [...] (p. 119);

[...] Foi então sugerido que havia uma substância chamada “éter”, presente em todos os lugares mesmo nos espaços “vazios”. [...] (p. 31);

[...].Grande quantidade desses experimentos foi levada a cabo, mas nenhum deles apontou evidência definitiva de decaimento de prótons e de nêutrons [...] (p. 83).

b) DC fonte identificado na forma da 1 a . pessoa (próprio divulgador)

[...] Durante os anos seguintes desenvolvi novas técnicas matemáticas para extrair essa e outras condições técnicas dos teoremas que provam que as singularidades devem ocorrer. [...] (p. 61)

[...] até que em 1970 isso foi definitivamente provado por Penrose e por mim, com base na teoria geral da relatividade de Einstein. [...] (p. 62); [...] Vou abordar em primeiro lugar a seta termodinâmica de tempo. [...] (p. 145)

Já o DNC vem identificado, sobretudo, na forma da 1a. pessoa do plural “nós”, o que indica a inscrição do divulgador também junto ao grande público-leitor: é a enunciação do discurso de divulgação em vias de se produzir.

[...] Muitas pessoas podem julgar essa imagem do universo como uma torre infinita de tartarugas absolutamente ridículas, mas porque pensar que sabemos mais? O que sabemos sobre o universo? E como sabemos? [...] Algum dia, talvez, essas respostas possam ser tão obvias para nós quanto o fato de a terra girar em torno do sol; [...] (p. 15);

[...] Mesmo que descobríssemos uma teoria completa e unificada, não significaria que seríamos capazes de prever eventos em geral, [...] (p. 165) [...] Então todos, filósofos, cientistas, e mesmo leigos seremos capazes de fazer parte das discussões sobre a questão de por que nós e o universo existimos. [...] Se encontrarmos a resposta para isso teremos o triunfo definitivo da razão humana; porque, então, teremos atingido o conhecimento da mente de Deus. (p. 169).

A composição ternária do quadro enunciativo proposta por Authier: “eu digo a vocês que eles dizem ...” na qual funciona a mediação do “eu” (divulgador) entre os dois polos: “eles”(ciência) e “vocês” (grande público), não vai apresentar-se tão evidente, se aplicada ao corpus em questão, já que o divulgador (“eu”) tanto pode se combinar com leitor (“vocês”) quanto ser o próprio representante do discurso fonte. Contudo, Alguns poucos registros mostram uma opção pela identificação dos não cientistas sob a forma da 2a. pessoa pronominal “você”, diferenciando-se, assim, do divulgador:

[...] Lembre-se que o horizonte de eventos é a trajetória, através do espaçotempo, percorrida pela luz, que está tentando escapar do buraco-negro, [...] (p. 95);

[...] Se você se recorda de cada palavra deste livro, sua memória terá registrado cerca de dois milhões de partes de informação: a ordem em seu cérebro teria aumentado cerca de 2 milhões de unidades. [...] Entretanto, enquanto você estava lendo este livro, deve ter convertido pelo menos mil calorias de energia ordenada, sob a forma de alimento, em energia desordenada [...] (p. 151).

São exemplos de discurso direto, em que se faz o recorte das palavras do outro para citá-las posteriormente:

[...] Einstein contestou muito fortemente esse aspecto [...] Ainda assim, ele jamais aceitou que o universo fosse comandado pelo acaso; seus sentimentos sintetizavam-se em sua famosa afirmação: “Deus não joga dados” [...] (p. 65); [...] Pode-se muito bem dizer, sobre o horizonte de eventos, o que o poeta Dante disse com relação à entrada do inferno: “Quem entrar aqui, abandone qualquer esperança”. Qualquer coisa que caia através do horizonte de eventos logo atingirá a região da densidade infinita e do fim do tempo. [...] (p. 95);

Na constituição do fio do discurso, a atividade de passagem de um discurso (DC) para o outro (DNC) mostra-se na justaposição dos dois discursos através de algumas formas de colocação em equivalência, quais sejam:

- DC ou DNC; DC, em outras palavras, DNC:

[...] A freqüência (ou o número de ondas por segundo) é extremamente alta, [...] (p.50);

[...] Toda a matéria da estrela será comprimida numa região de volume zero, e, assim, a densidade da matéria e a curvatura do espaço se tornam infinitas. Em outras palavras, surge uma singularidade, contida numa região do espaço-tempo, conhecida como buraco negro. [...] (p. 60).

- DC, DNC:

[...] Corpos como a terra não foram feitos para se movimentar em órbitas curvas devido a uma força chamada gravidade; em vez disso, eles seguem a coisa mais parecida com uma trajetória reta dentro de espaço curvo, o que é chamado de geodésica. Uma geodésica é a menor (ou maior) trajetória entre dois pontos próximos [...] (p. 42)

[...] Einstein mostrou que o que era chamado movimento browniano movimento irregular e casual das pequenas partículas de poeira suspensas num líquido - poderia ser explicado como efeito dos átomos do líquido colidindo com partículas de poeira.[...] (p. 71).

Nos exemplos que se seguem, observa-se que a expressão formal da equivalência entre um e outro discurso, além de envolver a justaposição dos dois discursos através de sentenças numa relação de parataxe, apresenta um recurso formal a mais, ou seja, a colocação em equivalência também é evidenciada pelo uso de parênteses, os quais vão apontar para o discurso dos não cientistas.

[...] Ao mesmo tempo, Johanes Kepler a modificara, sugerindo que os planetas se moviam não em círculos, mas em elipses (uma elipse é um círculo alongado) (p. 18);

[...] Segundo a teoria da relatividade geral, os corpos sempre seguirão linhas retas no espaço-tempo quadridimensional, e, no entanto, parecerão, a nós, mover-se em trajetórias curvas em nosso espaço tridimensional. (É quase como observar um avião voando sobre um terreno montanhoso. Embora siga uma linha reta no espaço tridimensional, projeta uma sombra curva no terreno bidimensional.) [...] (p. 42);

[...] No inicio deste século pensava-se que os átomos eram semelhantes aos planetas, que giravam ao redor do Sol, com elétrons (partículas de eletricidade negativa) [...] (p. 68).

- DC, isto é/ou seja, DNC:

[...] Tanto Aristóteles quanto Newton acreditavam no tempo absoluto. Isto é, acreditavam que se pode, sem qualquer ambigüidade, medir o intervalo de tempo entre dois eventos, e que o resultado será sempre o mesmo em qualquer mensuração, desde que se use um relógio preciso. [...] (p. 30); [...] A taxa de energia perdida no caso da Terra e do Sol, é muito baixa, aproximadamente o suficiente para fazer funcionar apenas um pequeno aquecedor elétrico. Ou seja, levaria cerca de mil milhões de milhões de milhões de anos para a terra colidir com o sol, [...] (p. 96).

Ainda no nível do fio do discurso, verifica-se o emprego de signos de distância metalingüística, como aspas e itálico para palavras e expressões de um e outro discurso. Como já mencionado, tanto os termos científicos quanto os não científicos podem ser marcados como “estranhos”, não há um sentido privilegiado no estabelecimento dessa equivalência. Contudo, os dados parecem sugerir uma maior ocorrência na marcação de palavras e expressões do DC.

- DC marcado como exterior ao DNC:

- através de aspas:

Pode-se destacar que, neste tipo de procedimentos de distanciamento metalingüístico, o estatuto do aspeamento, segundo Authier-Revuz (1982) pode assumir um valor de autonímia (faz uso e não menção das palavras assinaladas) ou de conotação autonímica (faz uso da palavra com conotação de menção). São exemplos disso os fragmentos que se seguem:

- Valor autonímico:

[...] Foi então sugerido que havia uma substância chamada “éter”, presente em todos os lugares, mesmo nos espaços “vazios”. [...] (p. 45); [...] A nossa e outras galáxias, entretanto, devem conter uma grande quantidade de “matéria escura”, que embora de existência reconhecida, não podemos ver diretamente, devido à influência da atração gravitacional nas órbitas das estrelas das galáxias.[...] (p. 57);

[...] Esses buracos dificilmente merecem o epíteto de “negros”; eles são, na verdade, brancos, quentes e estão emitindo energia [...] (p. 112).

- Valor de conotação autonímica:

[...] Um argumento para tal começo é o sentimento de que é necessário haver uma “causa inicial” para explicar a existência do universo. (Dentro do universo, sempre se explica qualquer evento como tendo sido causado por outro anterior, mas a existência do universo em si só pode ser explicada dessa forma se tiver havido um começo.) [...] (p. 21);

[...] Existem inúmeras e diferentes variedades de quarks: pelo menos seis “sabores”, chamados up, down, strange, charmed, bottom e top. Cada “sabor” se apresenta em três “cores”: vermelho, verde, e azul. (É preciso enfatizar que estes termos não passam de rótulos; os quarks são muito menores que o comprimento da onda de luz visível e, portanto, não apresentam qualquer cor no sentido normal. Trata-se apenas do fato de os físicos modernos utilizarem maneiras mais criativas de batizar novas partículas e fenômenos; já não se restringem aos gregos!) [...] (p. 73);

Os exemplos das páginas 21 e 73 ilustram a conotação autonímica que, de uma forma, vem assinalada pelas aspas na expressão “causa inicial” (p. 21) e nas palavras “sabores”, “sabor” e “cores” (p. 73) indicando uma menção; e de outra forma, vem marcada com conotação de menção, isto é, além da citação, faz-se uso das palavras redefinindo-as pela glosa. Esse duplo uso das palavras na conotação autonímica vem, nos exemplos citados, marcado pelos parênteses, os quais, ao mesmo tempo em que garantem um efeito de “traçar, no âmbito do fenômeno da heterogeneidade, o contorno de um discurso com relação a um “outro” que importa distinguir” (AUTHIER-REVUZ, 1982AUTHIER-REVUZ, Jacqueline. Hétérogeneité montrée et hétérogeneité constitutive: éléments pour une approche de láutre dans lê discours. DRLAV- Revue de linguistique, Paris: Centre de recherche de l’Université de Paris VIII, n. 26, 1982.), apontam para o DNC que se justapõe ao DC estabelecendo uma relação de equivalência entre eles : DC, DNC (A, B):

- DNC marcado como exterior ao DC:

- através de itálico:

[...] O universo pareceria, portanto, grosso modo, o mesmo em todos os tempos, bem como em todos os pontos do espaço. [...] (p. 58);

- através de aspas (valor autonímico):

[...] Desde que o comprimento da onda de luz é muito maior do que o tamanho de um átomo, não podemos esperar “olhar” para as partes de um átomo da maneira comum. [...] (p. 73);

4.2 Heterogeneidade Discursiva: o sujeito conta com o Outro (pré construído) para fazer sentido

É no quadro da heterogeneidade enunciativa que Authier-Revuz (1999) analisa o DDC como sendo, segundo ela, um lugar privilegiado de “um dialogismo ‘mostrado’, isto é, a representação que um discurso dá, em si mesmo, de sua relação com o outro, do lugar que ele lhe dá, explicitamente, designado na cadeia, por meio de marcas lingüísticas, pontos de heterogeneidade” (p. 11). Como apontado na descrição (seção 4.1), o discurso de divulgação que sustenta o livro “Uma breve história do tempo”, apresenta uma estrutura em que marcas lingüísticas específicas caracterizam sua organização, mostrando explicitamente os vários dizeres que o constituem.

Authier-Revuz, em sua análise, propõe que o DDC é uma prática de reformulação, em que a heterogeneidade explícita lingüisticamente é o resultado de uma negociação do sujeito enunciador com a heterogeneidade constitutiva, na forma de denegação. O sujeito ao reformular mostra “uma sensibilidade imaginária” a um dizer diferente do seu. Ao delimitar este sentido “outro” garante que o resto do dizer seja seu.

Contudo, pode-se afirmar também que, na organização das várias vozes do discurso de divulgação, o divulgador tem uma posição pré-estabelecida que é “dar lugar ao(s) outro(s)”. Esse processo pode ser considerado mais do que “um momento de negociação do sujeito com a heterogeneidade constitutiva”, se entendido como necessário, já que, a custa da própria constituição do discurso de divulgação, precisa imprescindivelmente “mostrar os bastidores da proeza”.

Essa delimitação “positiva” do outro no DDC, que parece contrastar com a heterogeneidade mostrada marcada, em que há uma negociação semiconsciente com a heterogeneidade constitutiva23 23 Para Orlandi, a heterogeneidade mostrada marcada está relacionada ao Esquecimento no 2 (Pêcheux 1975) que trata da ilusão de que o que dizemos somente poderia ser dito com aquelas palavras e não com outras. Mas esse “é um esquecimento parcial, semiconsciente e muitas vezes voltamos sobre ele, recorremos a esta margem de famílias parafrásicas, para melhor especificar o que dizemos” Orlandi (1999, p. 35). através de “um ‘eu sei o que digo’, isto é, sei quem fala, eu ou um outro, e eu sei como eu falo, como utilizo as palavras” (AUTHIER-REVUZ, 1990______. Heterogeneidade(s) Enunciativa(s). Cadernos de Estudos Lingüísticosnúmero, Campinas, SP, n. 19, jul./dez. 1990., p. 33), pode ser entendida como um efeito de sentido que, no DDC, aponta já para um nível de alteridade não denegada.

Gallo (2001GALLO, Solange Leda. Autoria: questão enunciativa ou discursiva. Linguagem em (Dis)curso, v. 1, n. 2, p. 61-70, jan./jun. 2001.), propõe um nível de heterogeneidade que não envolve, necessariamente, uma negociação com a heterogeneidade constitutiva. Segundo a autora, este nível de heterogeneidade, que ela denomina “discursiva”, é permanente na medida em que não é denegada pelo sujeito, pois o sujeito conta com a heterogeneidade para fazer sentido, “ou seja, o sentido se faz nela” (p. 65).

Partindo daí, é possível observar que o trabalho do sujeito/divulgador de ciência, que precisa necessariamente circunscrever os dizeres dos “outros”: de um lado os dos cientistas e de outro os dos não cientistas, não implica no estabelecimento de um lugar do dizer que seja seu: neste caso, a delimitação do dizer do outro não garante a originalidade do seu próprio dizer, nem sua unidade aparente, pois “sabendo” que o dizer mais importante é o do(s) “outro(s)”, vai assumir um lugar “secundário” do dizer. Dessa forma, a “positividade” na identificação do outro no DDC por parte do sujeito divulgador, pode ser entendida agora, como reflexo da heterogeneidade no nível do discurso, a qual não é denegada. O sujeito “sabe” do “outro” e o marca explicitamente na materialidade do texto sem precisar circunscrever uma parte de seu dizer.

Indispensável para o entendimento desta análise é a referência ao que se denomina pré-construído e acontecimento discursivo. A noção de acontecimento discursivo envolve o momento de constituição do sujeito sem priorizar os aspectos enunciativos aí envolvidos. É o momento em que o enunciado rompe com a estrutura vigente e instaura um novo processo discursivo, como mostra Pêcheux, no texto “Discurso: estrutura ou acontecimento”. Já o pré-construído, de acordo com Paul Henry, dá conta do outro, que não é o outro enunciativo e nem o outro do interdiscurso, mas o “outro do interdiscurso circunscrito em uma região histórica e ideológica, delimitada no acontecimento do discurso” (GALLO 2001GALLO, Solange Leda. Autoria: questão enunciativa ou discursiva. Linguagem em (Dis)curso, v. 1, n. 2, p. 61-70, jan./jun. 2001., p. 65).

De fato, existem posições de sujeito já cunhadas historicamente, as quais estão lá para serem assumidas. As especificidades que constituem cada uma dessas posições no acontecimento de sua produção é o pré-construído, ou seja, um já-dito acordado em outro lugar, proveniente de discursos outros, anteriores, “como se esse elemento já se encontrasse sempre-aí por efeito da interpelação ideológica” (PÊCHEUX, 1975PÊCHEUX, M. Les vérités de la palice. Paris. Mespero, 1975. [trad.bras.: Semântica e discurso.Campinas, SP: Editora da UNICAMP, 1988].)24 24 Pêcheux (1975 apud FERREIRA, 2001, p. 21). . Sendo assim, o sujeito pode assumir essa posição já pronta, porque, de acordo com Gallo (idem), “ele aí se identifica e o seu dizer se faz contando, justamente, com os limites e a unidade desse discurso” (p.65), e por não ser a heterogeneidade, neste caso, aquela constitutiva alienante e caótica, o sujeito não precisa circunscrever uma parte do seu discurso e mostrá-la como sua.

Assim, a aceitação da heterogeneidade no DDC por parte do sujeito divulgador, que identifica o seu dizer com os dizeres do “outro cientista” e do “outro não cientista”, é entendida aqui, como constitutiva da relação de confronto que se estabelece entre as formações discursivas da ciência e dos não cientistas. O resultado desse confronto é uma nova posição de sujeito de um “discurso científico para uma comunidade de não cientistas”, que se materializa, por exemplo, através do enunciado “sabemos agora”:

[...] Sabemos agora que nem os átomos, nem os prótons ou nêutrons são indivisíveis.[...] (p. 73);

[...] Sabemos agora que a nossa é apenas uma de algumas centenas de milhares de milhões de galáxias [...] (p. 49);

[...] Sabemos agora que as esperanças de Laplace no determinismo não podem se realizar [...] (p. 167).

Gallo propõe a noção de efeito-autor para dar conta desse efeito de sentido produzido pelo “confronto de formações discursivas, cuja resultante é uma nova formação discursiva dominante” (p. 67). As questões não tão “óbvias” levantadas por Carreira (2001CARREIRA, Alessandra Fernandes. Sobre a singularidade do sujeito na posição de autor. Linguagem em (Dis)curso, v. 1, n. 2, p. 51-60, jan./jun. 2001): “Por que partimos da noção de sujeito e não de autor?”, “Por que precisamos falar do sujeito quando falamos do autor?”, “Por que não precisamos falar do autor quando falamos do sujeito?”, são aqui evidentemente adequadas, na medida em que iniciam a discussão sobre a noção de efeito-autor, já pontuando as relações aí envolvidas.

De fato, para a Análise do Discurso, o sujeito é elemento clivado que se constitui primordialmente em relação aos significantes do Outro (Lacan), e, ao mesmo tempo, através de sua inscrição em uma região histórica e ideológica, já sempre delimitada no acontecimento do discurso (pré-construído), que aponta também para uma exterioridade, já que o conduz para significados compartilhados pelo outro. Portanto, o sujeito do discurso, assim como o sentido, é disperso, descontínuo, contraditório, pois heterogêneo.

Orlandi (1999ORLANDI, Eni. Análise do Discurso: princípios e procedimentos. Campinas, SP: Pontes, 1999.), citando Vignaux diz que o discurso não tem como função construir a representação de uma realidade, no entanto, funciona garantindo a permanência de uma certa representação. Para que isso ocorra, deve haver na base de todo discurso um projeto totalizante do sujeito, o qual o converte em autor: “o autor é o lugar em que se realiza esse projeto totalizante, o lugar em que se constrói a unidade do sujeito” (idem, p. 73), sendo, contudo, imaginária25 25 É através da articulação necessária entre o real e o imaginário que o discurso funciona, sendo também da natureza do funcionamento discursivo a distinção necessária entre discurso e texto, sujeito e autor, em que o “sujeito, diríamos está para o discurso assim como o autor está para o texto” (ORLANDI, 1999, p. 73). a coerência e completude dessa função de autoria. Assim, mesmo que o discurso e seu sujeito sejam constitutivamente incompletos e descontínuos, heterogêneos, enquanto afetados por distintas formações discursivas e diferentes posições de sujeito, ele é regido na sua constituição, também, pela força do imaginário da unidade, o que garante o estabelecimento da relação de dominância de uma formação discursiva com as outras.

Vislumbram-se, então, possíveis respostas para as questões pontuadas por Carreira: a autoria é uma das funções do sujeito, que além de ser enunciativa, é uma função discursiva do sujeito. Além disso, Orlandi (idem), de maneira a ampliar a noção de autoria26 26 Foucault (1971 apud ORLANDI,1999), um dos primeiros a tratar da noção de autoria, afirma que ela é um dos processos internos de controle discursivo, mas que não vale para qualquer sujeito ou discurso, ou seja, segundo ele, há discursos, como as conversas, receitas, decretos, contratos, que vão precisar de quem os assine, mas não de autores. vai propor que a própria unidade do texto é um efeito discursivo que deriva do princípio da autoria. A autoria é entendida, então, como sendo da dimensão de todo sujeito, a qual está “mais determinada pela exterioridade (contexto histórico social) e mais afetada pelas exigências de coerência, não contradição, responsabilidade etc” (p. 75).

Já segundo Gallo (2001GALLO, Solange Leda. Autoria: questão enunciativa ou discursiva. Linguagem em (Dis)curso, v. 1, n. 2, p. 61-70, jan./jun. 2001.), a autoria pode ser observada em dois níveis. Primeiramente, em um nível enunciativo-discursivo, que é o caso da função-autor, que tem relação com a heterogeneidade enunciativa e que é condição de todo sujeito e, portanto, de todo acontecimento discursivo. E em segundo lugar, pode ser observada em um nível discursivo por excelência, e diz respeito “ao confronto de formações discursivas com uma nova dominante, verificável em alguns acontecimentos discursivos, mas não em todos” (p. 69). Este é o caso do efeito-autor.

De tal modo, no que diz respeito ao DDC, o “novo” sujeito divulgador que surge do confronto das diferentes FDs, se constitui através de uma heterogeneidade discursiva, identificando o seu dizer aos dizeres desses “outros (cientistas e nãocientistas), contanto com os limites e a unidade desses discursos, provocando um efeito de sentido de anulação do próprio “eu”. Ou seja, sua forma de inscrição no discurso o coloca nesse lugar “secundário do dizer”, produzindo esse efeito no qual a sua autoria é, aparentemente, menos importante.

5 CONCLUSÃO

Proponho, então, que o DDC não deva ser considerado um processo de reformulação em que se produz um discurso segundo a partir de um discurso fonte, mas sim como um discurso outro, resultante do confronto entre o discurso científico e o discurso dos não cientistas. Um argumento em favor disto é considerarmos o DDC como um discurso no qual se produz um efeito-autor, na mediada em que há um acontecimento discursivo que, pondo em confronto formações discursivas distintas (DC/DNC) inaugura, assim, um novo sentido através do estabelecimento de uma nova FD dominante (DDC).

Assim, de forma conclusiva, no DDC a afirmação do sujeito enquanto autor vai se produzir no “fechamento”: a produção de um novo sentido que não é nem aquele do DC, nem tampouco do DNC, mas sim o sentido do DDC.

REFERÊNCIAS

  • ALTHUSSER, L. Ideologia e aparelhos ideológicos de Estado. Lisboa: Presença; Martins Fontes, 1974 [título original 1970].
  • AUTHIER-REVUZ, Jacqueline. Hétérogeneité montrée et hétérogeneité constitutive: éléments pour une approche de láutre dans lê discours. DRLAV- Revue de linguistique, Paris: Centre de recherche de l’Université de Paris VIII, n. 26, 1982.
  • ______. Dialogismo e Divulgação Científica. Revista Rua, n. 5, p. 9-15, 1999. [Publicação original: DISCOSS, n. 1, p. 117-122, 1985.]
  • ______. Heterogeneidade(s) Enunciativa(s). Cadernos de Estudos Lingüísticosnúmero, Campinas, SP, n. 19, jul./dez. 1990.
  • BAKHTIN, M.; (VOLOSHINOV, V. N.). Marxismo e filosofia da linguagem. São Paulo: Hucitec, 1992.
  • CARREIRA, Alessandra Fernandes. Sobre a singularidade do sujeito na posição de autor. Linguagem em (Dis)curso, v. 1, n. 2, p. 51-60, jan./jun. 2001
  • FERREIRA, Maria Cristina Leandro. Glossário de termos do discurso. Porto Alegre: Instituto de Letras-UFRGS, 2001.
  • GALLO, Solange Leda. Autoria: questão enunciativa ou discursiva. Linguagem em (Dis)curso, v. 1, n. 2, p. 61-70, jan./jun. 2001.
  • HAWKING, Stephen W. Uma breve historia do tempo. São Paulo: Círculo do livro S.A., 1988.
  • ______. O Universo numa casca de noz. São Paulo: Editora Mandarim, 2002.
  • MAINGUENEAU, D. Genèses du discours. Liège; Bruxelles: Pierre Mardaga, 1984.
  • ______. Novas tendências em Análise do Discurso. Campinas, SP: Editora da Unicamp; Pontes, 1989 [1987].
  • MOIRAND, Sophie. Formas discursivas de saberes na mídia. Revista Rua, n. 6, p. 9-24, 2000.
  • MUSSALIM, Fernanda. Análise do Discurso. In: BENTES, Anna Cristina; MUSSALIM, Fernanda (Orgs.). Introdução à Lingüística: domínios e fronteiras. Vol. 1. São Paulo: Editora Cortez, 2001. p. 102-142.
  • NUNES, José Horta. Discurso de divulgação: a descoberta entre a ciência e a não-ciência in. In: GUIMARÃES, Eduardo (Org.). Produção e circulação do conhecimento - v. 1: Estado, Mídia, Sociedade. Campinas, SP: Pontes; CNPq/Pronex; Núcleo de Jornalismo Científico, 2001.
  • ORLANDI, Eni. Análise do Discurso: princípios e procedimentos. Campinas, SP: Pontes, 1999.
  • ______. Terra à vista-discurso do confronto: velho e o novo mundo. São Paulo: Cortez; Campinas: Editora da Unicamp, 1990.
  • ______. Divulgação científica e efeito leitor: uma política social e urbana. In: GUIMARÃES, Eduardo (Org.). Produção e circulação do conhecimento – v. 1: Estado, Mídia, Sociedade. Campinas, SP: Pontes; CNPq/Pronex; Núcleo de Jornalismo Científico, 2001.
  • PÊCHEUX, M. Les vérités de la palice. Paris. Mespero, 1975. [trad.bras.: Semântica e discurso.Campinas, SP: Editora da UNICAMP, 1988].
  • ZAMBONI, Lilian Márcia Simões. Cientistas, jornalistas e a divulgação científica - subjetividade e heterogeneidade no discurso de divulgação científica. Editora Autores Associados. Apoio FAPESP. Campinas, São Paulo, 2001.
  • 1
    Orlandi (2001, p. 150), por exemplo, afirma que os sentidos investidos neste modo de produção da ciência envolvem tanto a indissociabilidade (PÊCHEUX, 1975PÊCHEUX, M. Les vérités de la palice. Paris. Mespero, 1975. [trad.bras.: Semântica e discurso.Campinas, SP: Editora da UNICAMP, 1988]. apud ORLANDI, 2001), entre ciência, tecnologia, e administração (governo), quanto o deslocamento, através do discurso de divulgação científica, do conhecimento científico para a informação científica, processo este que faz circular o saber/ciência de maneira singular.
  • 2
    A literatura sobre divulgação científica tem utilizado para designar o sujeito leitor dos textos de divulgação, os termos “grande público”, “público leigo”, “senso comum”. Contudo, as análises têm mostrado que o “público alvo” destes textos não se constitui de forma tão homogênea. De fato, o corpus aqui analisado, mostra que o leitor destes textos não pode ser considerado uma “tábula rasa“: o leitor do livro Uma Breve História do Tempo apresenta-se, em certa medida, mais proficiente com relação a ciência do que um leitor dos textos de uma revista de divulgação como a Superinteressante, por exemplo. E ainda muito mais competente se comparado ao leitor dos textos de divulgação da revista Veja. Por isso, a minha opção por denominar estes leitores “não cientistas”.
  • 3
    Hawking é doutor em cosmologia pela Universidade de Cambridge, onde ocupa a cadeira de Newton como professor lucasiano de matemática. O universo numa casca de noz (2001) é a sua mais recente publicação na área de divulgação científica depois Uma breve história do tempo (1988) e Uma breve história do tempo ilustrada (1996). Diferentemente do seu primeiro livro, este não esta organizado de uma forma linear, possibilitando ao leitor uma leitura mais independente dos capítulos que o compõe. Os capítulos apresentam um panorama de alguns campos mais ativos da pesquisa atual em cosmologia na busca da “Teoria de Tudo”, sendo que suas ilustrações e legendas fornecem rotas alternativas ao texto.
  • 4
    E=mc2 (onde E significa energia, m, massa e c, a velocidade da luz): energia é igual a massa vezes a velocidade da luz ao quadrado.
  • 5
    Moirand (2000MOIRAND, Sophie. Formas discursivas de saberes na mídia. Revista Rua, n. 6, p. 9-24, 2000.) propõe que a mídia constitui mais do que um lugar de transmissão de informação, pois enquanto comunidade de linguagem particular, é uma produtora de informações. Além disso, levanta outro ponto bastante relevante para a discussão: aquele relacionado ao papel desempenhado pela mídia como possível substituta dos lugares de ensino institucionais da ciência. É do âmbito da pesquisa então, estudar “os modos de circulação desses fluxos discursivos através da diversidade das comunidades de linguagem que eles atravessam” (BEACCO, 1995 apud MOIRAND, 2000MOIRAND, Sophie. Formas discursivas de saberes na mídia. Revista Rua, n. 6, p. 9-24, 2000., p. 22), sendo a mídia a comunidade discursiva intermediária, que neste contexto, atravessa posições e lugares discursivos que os produtores de conhecimento não mais controlam.
  • 6
    No domínio das novas tecnologias, por exemplo, a explicação desliza para um discurso quase promocional, em que “o modo explicativo desliza para o da justificativa, a persuasão impõe-se sobre o raciocínio...” (idem, p. 20).
  • 7
    Segundo Orlandi (1990), o rompimento da AD com a forma como as ciências usam seus objetos de análise se deve à própria concepção discursiva de linguagem, a qual não é vista como instrumento de comunicação de significações que existiriam e que seriam definidas independentemente da linguagem. Há, portanto, um deslocamento tanto na noção de sujeito quanto na noção de história, já que para a AD estes conceitos somente podem ser definidos através do “seu caráter eminentemente constituído pelo outro termo do sintagma de que participam, ou seja, da linguagem“ (ORLANDI, 1990, p. 28).
  • 8
    Lacan faz uma releitura de Freud e recorre ao estruturalismo lingüístico (Saussure e Jakobson) buscando uma abordagem mais precisa do inconsciente. Assim, assume que o inconsciente se estrutura como uma linguagem latente, a qual se repete e interfere no discurso efetivo. As noções estruturalistas envolvendo os critérios relacional e diferencial são então aplicadas ao conceito lacaniano de sujeito que se define não por ele mesmo, mas por sua relação e diferenciação com aquilo que ele não é.
  • 9
    Lacan rompe, portanto, com o pressuposto básico do estruturalismo, de completude do sistema, pois este sujeito clivado, dividido entre o consciente e o inconsciente inscreve-se na estrutura (que é lingüística) como uma descontinuidade na cadeia de significante, causando assim, um descompasso na relação entre significante e significado.
  • 10
    Sobre a noção de exterioridade primordial Carreira (2001CARREIRA, Alessandra Fernandes. Sobre a singularidade do sujeito na posição de autor. Linguagem em (Dis)curso, v. 1, n. 2, p. 51-60, jan./jun. 2001) baseada em Lacan diz: “Petrificado por uma dependência primordial, mortal e alienante em relação aos significantes do Outro, o sujeito está no terror. Mas, como a linguagem é incompleta, é possível que sobre um espaço para o bebê produzir “suas cadeias de significantes, deslocando-se da relação especular com o Outro, se parindo, separando-se. [...] a construção do “eu” no sujeito pressupõe o recalque do discurso do Outro, constituindo o inconsciente como uma cadeia de significantes primordiais que se repete em uma Outra Cena (LACAN, 1966)” (p. 54).
  • 11
    “...a interpelação ideológica que, é importante frisar, já estava afetando o sujeito desde os primórdios de sua constituição, o que torna esta ordem que vai do primordial ao histórico puramente lógica, e não cronológica“ (CARREIRA, 200, p. 55).
  • 12
    A noção de Formação Discursiva em que os diversos discursos que a atravessam não se constituem independentemente uns dos outros (diferentemente do que se supunha para a “máquina discursiva”) para em seguida serem postos em relação (relações estas ainda entre as “máquinas discursivas”), mas se formam de maneira regulada pelo Interdiscurso, o que equivale dizer que o “outro”- outra(s) FD(s)- será organizado, estruturado a partir de algo que “fala antes, em outro lugar, independentemente” (ORLANDI, 1999ORLANDI, Eni. Análise do Discurso: princípios e procedimentos. Campinas, SP: Pontes, 1999., p. 31), remetendo o “dizer a toda uma filiação de dizeres, a uma memória, e a identificá-lo em sua historicidade” (idem p.35).
  • 13
    Gallo (2001GALLO, Solange Leda. Autoria: questão enunciativa ou discursiva. Linguagem em (Dis)curso, v. 1, n. 2, p. 61-70, jan./jun. 2001.) faz referência a Maldidier que caracteriza a terceira fase da teoria do Discurso como sendo a fase do “outro sobre o mesmo”. Maldidier ainda cita, entre outros trabalhos, Heterogeneités Énouciatives de AuthierRevuz (1984) para ilustrar esta fase da AD.
  • 14
    Relaciona-se ao Esquecimento no 2. O enunciado se constitui então, pela manifestação do “dito” e, em conseqüência, rejeição do “não-dito”.
  • 15
    Bueno (1984, apud ZAMBONI, 2001ZAMBONI, Lilian Márcia Simões. Cientistas, jornalistas e a divulgação científica - subjetividade e heterogeneidade no discurso de divulgação científica. Editora Autores Associados. Apoio FAPESP. Campinas, São Paulo, 2001.), apresenta um quadro conceitual sobre o que ela denomina “difusão” científica, no qual inclui o jornalismo científico como espécie de divulgação científica, assim como os livros didáticos, as aulas de ciências do ensino médio, os cursos de extensão para não-especialistas, as estórias em quadrinhos, os suplementos infantis, folhetos de extensão rural, etc. De acordo com Zamboni, a classificação feita por Bueno ora se baseia na caracterização do publico alvo (disseminação científica ou divulgação científica), ora na modificação por que deve passar a linguagem hermética da ciência para chegar até o publico leigo (“recodificação” da linguagem).
  • 16
    O Discurso Científico (DC) se caracteriza, no que diz respeito à questão da heterogeneidade, justamente pelo seu caráter opositivo, ou seja: para se constituir necessita ser subtraído de sua heterogeneidade. Assim, há um trabalho, um movimento para a monologicidade sustentando o discurso da ciência, que vai gerar a ilusão de um discurso uno, absoluto, manifestação da “verdade”, da “fala incontestável”. Esta homogeneidade discursiva implica numa linguagem reconhecidamente hermética e esotérica, que, de acordo com Peytard (1984, apud ZAMBONI, 2001ZAMBONI, Lilian Márcia Simões. Cientistas, jornalistas e a divulgação científica - subjetividade e heterogeneidade no discurso de divulgação científica. Editora Autores Associados. Apoio FAPESP. Campinas, São Paulo, 2001.), pode ser evidenciado no ideal de univocidade e de “monossemiotização” do DC. De fato, o DC articula-se num nível estrutural fundamental em que as conceptualizações em forma de teoremas, axiomas, de operações matemáticas “enformam-se num conjunto de termos-pivô ou termos-chave imutáveis e universais” (idem, p. 77), constituindo o que o autor denomina alta densidade discursiva do DC. Afirma, ainda, que, por apresentarem alta densidade discursiva, os textos científicos somente admitem reformulação no nível das relações sintagmáticas da língua e sobre os vocábulos não-conceptualizados. Conseqüentemente para Peytard, na divulgação científica, o discurso segundo somente poderá produzir-se, se resguardada a relação de equivalência com o discurso fonte (DC), justamente porque nem tudo é passível de reformulação num texto científico.
  • 17
    Na tradução há um trabalho de busca de equivalentes entre línguas diferentes. No caso do DDC, a relação se estabelece entre dois discursos - o científico e o de divulgação - numa mesma língua.
  • 18
    Além disso, ao se produzir como uma forma de específica de autoria, desencadeia novos gestos interpretativos, constituindo ao mesmo tempo um certo efeito-leitor correspondente. “...a ciência tem necessidade de se representar em uma certa exterioridade, que se faz pela construção desse sujeito-leitor de ciência que se apresenta como sujeito social. Esse sujeito-leitor está representado (ou seja, presente mas transformado) no texto, pelo mecanismo da antecipação que, ao produzir os efeitos de sentidos produz o próprio efeito-leitor (um imaginário de leitura). No caso da divulgação científica, há uma representação do leitor no texto pela acentuaçao do aspecto técnico” (ORLANDI, 2001, p. 20).
  • 19
    Para Authier-Revuz, o DDC não é meramente uma prática de reformulação como as atividades pedagógicas, como a tradução, a resenha, o resumo, mas uma prática de reformulação explícita. Contudo, de acordo com Zamboni (2001ZAMBONI, Lilian Márcia Simões. Cientistas, jornalistas e a divulgação científica - subjetividade e heterogeneidade no discurso de divulgação científica. Editora Autores Associados. Apoio FAPESP. Campinas, São Paulo, 2001.), ao assumir esta concepção de reformulação, Authier-Revuz situa a divulgação científica no campo da ciência, “a cujo discurso a divulgação responde como sendo um “outro” que se pretende equivalente a ele” (idem, p. 84). Essa relação de equivalência traz como conseqüência para o DCC uma posição desfavorável no campo científico, já que vai incorporar uma imagem de um discurso da ciência degradado. Quanto a isso, Orlandi (2001) diz que o DDC tem uma relação intrínseca com o seu discurso de origem (DC), relação esta que precisa ser evidenciada justamente para que se tenha o efeito de exterioridade da ciência. Contudo, quando a metalinguagem constitutiva do DC é substituída pela terminologia que dá “ancoragem” científica ao discurso de divulgação, o que se observa é uma exacerbação no uso dessa terminologia, buscando garantir uma função legitimadora para o DDC. De tal modo, perde-se aí justamente o que seria constitutivo do discurso da ciência: sua “objetividade”, ou o que ele “constrói pela objetividade real contraditória de sua metalinguagem”(ide, p. 28).
  • 20
    Para Orlandi (2001, p. 25) o entendimento do funcionamento (constituição, formulação e circulação) do DDC, deve passar pela reflexão de Maingueneau (1987) sobre “encenação”. De acordo com o autor, a cenografia discursiva organizada pelo eu/tu-agora-aqui do discurso em termos de locutor/destinatário-cronografia-topografia é entendida porque o que funciona no discurso são relações que se produzem em um mecanismo de substituições, isto é, num conjunto já-lá de “lugares” determinados por uma topografia social, “nas quais os sujeitos se inscrevem e que funcionam imaginariamente no discurso (em relação com a posição-sujeito)”. Assim, partindo dessa perspectiva, no que diz respeito ao DDC, o que é encenada é a relação intrínseca com o DC que traz marcas específicas no próprio enunciado, dentre elas marcas lingüísticas explícitas (sintático-semânticas) como, por exemplo, aquelas identificadas ao modo de funcionamento da menção: “segundo o cientista x”, “o que digo se refere ao que na biologia (ou fisiologia, etc) está sendo estudado como”, “especialistas reunidos em W chegaram à conclusão de que .... etc”.
  • 21
    Authier-Revuz (1999) diz que o divulgador é freqüentemente apresentado como um perito em tradução, a quem é necessário recorrer em virtude de uma ruptura de comunicação na sociedade. Contudo, entende que o DDC não deve ser confundido com a atividade de tradução que num “trabalho de vaivém entre as duas línguas, de busca de equivalência, de tateamentos vai produzir um texto segundo que, homogeneamente em língua de chegada, substitui um texto da língua fonte”(p. 12). Para Authier-Revuz, portanto, o DDC não é meramente uma prática de reformulação como as atividades pedagógicas, como a tradução, a resenha, o resumo, mas uma prática de reformulação explícita.
  • 22
    Mas também, de acordo com Moirand (2000MOIRAND, Sophie. Formas discursivas de saberes na mídia. Revista Rua, n. 6, p. 9-24, 2000.), podem aparecer incluídos em um subgrupo da comunidade: Os cientistas se interrogam...; para numerosos cientistas...; a maioria dos especialistas; alguns dos melhores especialistas da comunidade. Nos dados investigados, raras foram as ocorrências deste tipo. Pode-se citar um caso: [...] Atualmente os cientistas descrevem o universo através de duas teorias parciais básicas: [...] (p. 25)
  • 23
    Para Orlandi, a heterogeneidade mostrada marcada está relacionada ao Esquecimento no 2 (Pêcheux 1975PÊCHEUX, M. Les vérités de la palice. Paris. Mespero, 1975. [trad.bras.: Semântica e discurso.Campinas, SP: Editora da UNICAMP, 1988].) que trata da ilusão de que o que dizemos somente poderia ser dito com aquelas palavras e não com outras. Mas esse “é um esquecimento parcial, semiconsciente e muitas vezes voltamos sobre ele, recorremos a esta margem de famílias parafrásicas, para melhor especificar o que dizemos” Orlandi (1999, p. 35).
  • 24
    Pêcheux (1975PÊCHEUX, M. Les vérités de la palice. Paris. Mespero, 1975. [trad.bras.: Semântica e discurso.Campinas, SP: Editora da UNICAMP, 1988]. apud FERREIRA, 2001FERREIRA, Maria Cristina Leandro. Glossário de termos do discurso. Porto Alegre: Instituto de Letras-UFRGS, 2001., p. 21).
  • 25
    É através da articulação necessária entre o real e o imaginário que o discurso funciona, sendo também da natureza do funcionamento discursivo a distinção necessária entre discurso e texto, sujeito e autor, em que o “sujeito, diríamos está para o discurso assim como o autor está para o texto” (ORLANDI, 1999ORLANDI, Eni. Análise do Discurso: princípios e procedimentos. Campinas, SP: Pontes, 1999., p. 73).
  • 26
    Foucault (1971 apud ORLANDI,1999ORLANDI, Eni. Análise do Discurso: princípios e procedimentos. Campinas, SP: Pontes, 1999.), um dos primeiros a tratar da noção de autoria, afirma que ela é um dos processos internos de controle discursivo, mas que não vale para qualquer sujeito ou discurso, ou seja, segundo ele, há discursos, como as conversas, receitas, decretos, contratos, que vão precisar de quem os assine, mas não de autores.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    20 Set 2024
  • Data do Fascículo
    May-Aug 2006

Histórico

  • Recebido
    01 Set 2005
  • Aceito
    13 Fev 2006
Universidade do Sul de Santa Catarina Av. José Acácio Moreira, 787 - Caixa Postal 370, Dehon - 88704.900 - Tubarão-SC- Brasil, Tel: (55 48) 3621-3369, Fax: (55 48) 3621-3036 - Tubarão - SC - Brazil
E-mail: lemd@unisul.br