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GAZETA DE HOLANDA, NA LUTA ANTIESCRAVISTA: DENÚNCIAS DE UM CRONISTA VERSEJADOR

GAZETA DE HOLANDA, IN THE ANTI-SLAVERY FIGHT: COMPLAINTS FROM A VERSE-MAKING CHRONIST

Resumo:

Este artigo tem por objetivo o estudo dos elementos satíricos em duas crônicas da série "Gazeta de Holanda", de Machado de Assis, publicada na Gazeta de Notícias . Ambos os textos tiveram como assunto central a escravidão. Assim, também, o teor social é analisado em sua relação com a composição versificada dos dois textos. No primeiro, o escritor tratou de um crime que chocou a sociedade fluminense, em 1886; já no segundo, deu voz a um escravo, que revelou as duras penas de se viver sob a condição de status-liber .

Palavras-chave:
escravidão; crônicas; Machado de Assis; Gazeta de Notícias ; "Gazeta de Holanda"

Abstract:

This article aims to study the satirical elements in two chronicles from the "Gazeta de Holanda" series, by Machado de Assis, published in Gazeta de Notícias . Both texts dealt with slavery. Thus, the social content is also analysed in its relationship with the versified composition of the two texts. In the first, the writer dealt with a crime that shocked Rio de Janeiro´s society in 1886; in the other, he gave voice to a slave, who revealed the harsh hardships of living under the condition of status-liber.

* Keywords:
slavery; chronicles; Machado de Assis; * Gazeta de Notícias*; "Gazeta de Holanda"*

[...] Tout cela était indispensable, répliquait le docteur borgne, et les malheurs particuliers font le bien général; de sorte que plus il y a de malheurs particuliers, et plus tout est bien.

Voltaire, Candide, ou l'Optimisme

Aos olhos do Machado de Assis cronista não passaram despercebidos os problemas que assolavam a sociedade oitocentista. Ao longo de mais de quarenta anos à frente das colunas semanais, foram muitos os registros e denúncias acerca da condição do negro escravizado no país. Como não se lembrar, por exemplo, da publicação de 25 de julho de 1864, da série "Ao acaso", no Diário do Rio de Janeiro , na qual o narrador diz ter disputado com um filantropo a compra de uma pobre criança, em um leilão de escravos? Ou da publicação de 1º de outubro de 1876, das "Histórias de Quinze Dias", na Ilustração Brasileira , em que aborda as conquistas alcançadas desde a promulgação da Lei do Ventre Livre, decretada em 28 de setembro de 1871? A escravidão também foi abordada em outras crônicas, como na do dia 19 de maio de 1888, quando o narrador da série "Bons Dias", publicada na Gazeta de Notícias , afirma ter se antecipado à assinatura da Lei Áurea, assinada a 13 de maio, ao alforriar Pancrácio, o seu molecote. Ao final do relato, no entanto, o benfeitor revela sua artimanha para se promover perante o eleitorado, usando o jovem cativo e, em especial, sua libertação, como um instrumento para angariar votos.

Os dois textos que serão trabalhados neste estudo ainda são pouco estudados pela crítica machadiana, o que possivelmente se deve ao fato de ambos terem sido escritos em verso, em uma série toda ela versificada, a "Gazeta de Holanda", publicada entre 1º de novembro de 1886 e 24 de fevereiro de 1888, na Gazeta de Notícias . Os 49 textos lá veiculados versaram sobre os mais diversos assuntos, desde questões científicas, como a epidemia de cólera (12 nov. 1886) e a hipnose (6 abr. 1887), até questões políticas, envolvendo a Câmara Municipal (20 mar. 1887). A doutrina espírita (2 nov. 1887), as práticas da cartomancia (21 dez. 1886) e do curandeirismo (29 nov. 1887) também estiveram presentes em alguns dos textos. As manifestações artísticas, fossem elas mais eruditas, como o teatro (28 dez. 1887), ou mais populares, como o carnaval (16 fev. 1888), também marcaram presença nos versos de Machado de Assis nessa série. 1 1 Conferir a série "Gazeta de Holanda" na edição da Obra completa (ASSIS, 2015a ).

Na primeira crônica a ser estudada, a número um da série, o autor, com um olhar arguto e uma escrita afiada, não deixou passar em branco um caso de ampla repercussão na imprensa e que comoveu os habitantes da cidade do Rio de Janeiro, no ano de 1886. Os jornais da época referiram-se ao caso como "um célebre processo" criminal, que envolvia uma senhora de nome Francisca da Silva Castro e suas duas escravas menores, Joana e Eduarda. Na publicação inaugural para a série, o cronista rememora, à la filosofia da personagem Pangloss, da novela satírica Cândido , do escritor francês Voltaire, o caso que mobilizou jornalistas, políticos e pessoas comuns. No segundo texto a ser estudado, datado de 27 de setembro de 1887, foi dada voz a um escravo, identificado como pai Silvério. O homem vivia sob a condição de status-liber , situação que, juridicamente, garantia liberdade aos escravos que atingissem sessenta anos de idade, mas que, na prática, os mantinha nas mesmas condições de um cativo. Fosse um caso real ou pura ficção, uma voz escrava se fez ouvir em uma dessas gazetas machadianas.

Horrores sobre horrores

A 11 de fevereiro de 1886, na redação da Gazeta da Tarde , foi apresentada uma negra, escrava, nomeada Eduarda. O periódico divulgou uma matéria, intitulada "Horrores sobre horrores", na qual revelava a degradante situação em que se encontrava a jovem após anos de cativeiro. Os detalhes do texto jornalístico revelavam também as cruéis condições em que viviam os escravizados no Brasil:

Não se podia ter de pé: para caminhar, uma companheira amparava-lhe o corpo. Tinha o rosto aberto em chagas, retalhado em sangrentos vincos, à ponta de vergalho; os olhos fechados, as pálpebras avolumadas como tumores, por medonha inflamação, deixando gotejar lágrimas horripilantes, através das dobras de inchação; as mãos inchadas como o rosto; os pulsos, o pescoço, cobertos de horríveis vestígios de cordas; o corpo, todo contundido e lacerado por graves sevícias

( GAZETA DA TARDE , 1886GAZETA DA TARDE, Rio de Janeiro, 1886-1888. , p. 1, Hemeroteca Digital).

O povo compareceu na redação do jornal, ao saber do estado em que lá se encontrava uma escrava, recém-fugida. Segundo relatou a jovem, Joana, sua companheira de cárcere, se encontrava em situação ainda mais miserável. Os membros da Confederação Abolicionista, 2 2 Grupo formado por José do Patrocínio, Ferreira de Meneses, Vicente de Sousa, Nicolau Moreira e João Clapp, presidente da Confederação Abolicionista, como destaca Joaquim Nabuco, em Minha formação ( 1998 ). Na obra, o intelectual também afirma que o movimento abolicionista começou na Câmara, em 1879, com o pronunciamento de Jerônimo Sodré, o que, para Nabuco ( 1998 , p. 192-193), seria a mais clara demonstração de que o "gérmen" da abolição era parlamentar. ao saberem do ocorrido, tomaram a causa para si, levando o caso para instâncias superiores, a fim de punir a criminosa. Na ocasião, o dr. Sizenando Nabuco foi nomeado curador das duas jovens.

A 12 de fevereiro, o mesmo jornal voltou a tratar do crime na matéria de capa, intitulada "As duas mártires". No texto, foram dados detalhes sobre as duas vítimas. Foi destacado que o ocorrido na casa de Botafogo não era um fato isolado, mas mais um a ocorrer em antros espalhados pelo Brasil. Também foi informado que as adolescentes foram levadas às redações dos principais jornais acompanhadas por representantes da imprensa.

A 16 de fevereiro, o jornal Gazeta de Notícias , em sua primeira página, informa, na matéria "Barbaridade", o resultado da autópsia feita no corpo de Joana. Foram dados detalhes sobre as condições que levaram a recém-liberta ao óbito, chamando a atenção para a curiosidade que o caso havia despertado em advogados, médicos, jovens estudantes e jornalistas. No relatório, foram reveladas as marcas externas e internas da escravidão no corpo da vítima: em sua face havia sevícias, no pulmão apresentavam-se granulações tuberculosas, o baço estava congesto, o fígado, volumoso, assim como os dois rins, o esquerdo mais que o direito. Findo o exame, o corpo foi pedido pelo dr. João Clapp para ser sepultado. O estandarte da Confederação Abolicionista foi utilizado no cortejo fúnebre até o cemitério de São João Batista. Lá, José do Patrocínio proferiu algumas palavras, antes de baixarem o caixão.

A 2 de março, o jornal de Ferreira de Araújo 3 3 Fundador e redator-chefe da Gazeta de Notícias . estampou em sua capa a notícia sobre a prisão de dona Francisca da Silva Castro, apontada como responsável pelas barbaridades contra as duas jovens. No texto jornalístico, intitulado "Enfim", foi mencionado em tom satisfatório o nome do sr. dr. Carlos Gusmão, 3º delegado de polícia, responsável por dar seguimento ao processo. Segundo consta, a criminosa estava recolhida em uma Casa de Saúde, onde se tratava. Na matéria, ainda se afirma que a acusada se encontrava em estado de fraqueza, visto não se alimentar desde sua ida para o local.

A cobertura dada pela Gazeta da Tarde e pela Gazeta de Notícias , ao longo do ano de 1886, revela detalhes do processo que mobilizou a sociedade como um todo. Foram apresentadas desde as falas das testemunhas de acusação e defesa até mesmo um relatório de autoridades médicas sobre as condições mentais em que se encontrava a ré, o que, para os advogados, seria um meio de inocentá-la das acusações. Todo esse enredo criminal e, principalmente, o que resultou dele, também apareceu na primeira crônica da "Gazeta de Holanda".

De acordo com a matéria, intitulada "Júri", veiculada a 24 de outubro de 1886, na Gazeta de Notícias , no dia do julgamento a ré se apresentou aos jurados da seguinte forma: "Trajava um magnífico vestido de cetim preto, todo enfeitado de vidrilhos. O chapéu, também preto, em forma de boset , era um veludo, com pequenas e quase imperceptíveis filigranas de ouro" ( GAZETA DE NOTÍCIAS , 1886GAZETA DA TARDE, Rio de Janeiro, 1886-1888. , p. 2, Hemeroteca Digital). A acusada também fazia uso de joias e se abanava com um leque de finíssimas rendas pretas. O seu porte físico chamava a atenção, pois era "formosa" e seus olhos tinham muita vivacidade e brilho, a ponto de levar um espectador a declarar que a acusada devia ser conhecida "pelos olhos", dado que sua expressão era de "quem está habituado ao mando imperioso, sem encontrar o menor obstáculo à sua vontade, tendo à roda de si gente que presta obediência passiva a todos os seus desejos" ( GAZETA DE NOTÍCIAS , 1886GAZETA DA TARDE, Rio de Janeiro, 1886-1888. , p. 2, Hemeroteca Digital).

Nos autos do processo, foram mencionadas informações de sua infância, como o fato de ser filha ilegítima e que, constantemente, recorria a ataques histéricos quando encontrava resistência a ter seus desejos atendidos. Para o júri, foram escolhidos 12 homens que juraram perante os Santos Evangelhos. A ré, ao responder às perguntas, deixou transparecer seu tom de raiva, afirmando, mesmo, que José do Patrocínio, Sizenando Nabuco e João Clapp se interessavam pelo caso por questões financeiras. Ao falar sobre Eduarda, a escrava sobrevivente, a acusada disse que esta temia uma punição, dado que havia deixado a companheira exposta à chuva, no dia que precedeu à fuga.

Na leitura do processo, destaca-se a tentativa da defesa em manipular os fatos, ao conceder cartas de alforria às duas escravas depois que o caso se tornou público. Também é informado que Eduarda, além de quase cega, sofria de males físicos, resultado dos castigos a que fora exposta. A esse respeito, foram tecidas as seguintes considerações:

Às vezes, estas sevícias eram feitas pelas próprias acusadas, a mandado de sua senhora, uma contra a outra... Em algumas ocasiões a senhora mandava que elas se atirassem como bestas feras, castigando-se, ferindo-se mutuamente, rolando pelo chão, que ficava manchado de sangue...

( GAZETA DE NOTÍCIAS , 1886GAZETA DA TARDE, Rio de Janeiro, 1886-1888. , p. 2, Hemeroteca Digital).

Durante a leitura do processo e ao longo do julgamento, a ré simulou ataques violentos, o que levou a sessão a ser suspensa por várias vezes. Na tentativa de reverter a situação desfavorável, seu advogado, dr. Ignácio Martins, afirmou que davam ao caso uma proporção dispensável e que os acusadores tomavam a causa como uma questão escravista, a fim de despertar "sentimentos generosos" na população. A matéria jornalística ainda informa que a sala de julgamento esteve tomada de gente durante todo o tempo. A repercussão foi tamanha que nas proximidades era grande a aglomeração de curiosos, o que levou às ruas 30 praças do corpo militar da polícia oficial. Até mesmo a prisão de um homem suspeito de vender entradas para o julgamento ao preço de dez contos de réis foi realizada. 4 4 O caso despertou tanta atenção dos cariocas que, na publicação de 25 de outubro, dia, portanto, em que se divulgou a sentença final, os redatores informam em nota que a tiragem do jornal no dia anterior foi extraordinária. Isso fez com que os jornais se esgotassem muito cedo. Para mais, declaram que alguns vendedores recebiam abusivamente cem réis pela folha, cujo preço habitual era quarenta ( GAZETA DE NOTÍCIAS , 25 out. 1885 , Hemeroteca Digital).

A 25 de outubro, o mesmo jornal divulga o último dia de julgamento, que se estendeu pela madrugada do dia 24, quando o curador das vítimas, o advogado de defesa e o promotor público fizeram suas considerações finais. Foram debatidos os relatórios médicos, que atestavam o desequilíbrio mental da ré. Na tréplica, seu advogado, o dr. Cândido de Oliveira, tomou a palavra, dizendo haver certo "ruído apaixonado" por parte da imprensa, e acrescentou:

Há nesta causa uma dose de exagero; o abolicionismo achou naquela paciente uma vítima para os seus excessos.

Se estas duas escravas estivessem em outra condição social, não haveria tal ruído. O abolicionismo aproveitou a ocasião para protestar com valentia, dando ao mesmo tempo pasto à doentia curiosidade do público, contra uma situação política que se inaugurava como reacionária de todo o sentimento liberal, reação que a história não lhe perdoará certamente

( GAZETA DE NOTÍCIAS , 1886GAZETA DA TARDE, Rio de Janeiro, 1886-1888. , p. 2, Hemeroteca Digital).

Após o resumo do debate, o juiz formulou 48 quesitos em quatro séries de doze. Por unanimidade, os jurados julgaram inocente a ré, mesmo diante de todas as acusações e provas de maus tratos contra as duas jovens. Após a sentença, dona Francisca, acompanhada por seu marido e filhos, retirou-se para casa em carro aberto.

Depois de passados alguns dias do julgamento, a 1º de novembro daquele ano, foi Machado de Assis o responsável por rememorar o caso de Botafogo, nos versos espirituosos da primeira publicação de sua "Gazeta de Holanda". No texto com 23 estrofes, o autor passa a se referir ao processo na 15ª. Antes, porém, apresenta ao leitor sua nova coluna e seu propósito comunicativo, nos seguintes termos:

Um doutor da mula ruça,

Caolho, coxo e maneta,

É o homem que se embuça

No papel desta gazeta.

Gazeta que, se tivesse

Outra forma, outro formato,

Pode ser que merecesse

Vir com melhor aparato.

Mas é modesta, não passa

De uma folha de parreira,

Que dá uva, que dá passa,

Que dá vinho e borracheira.

Traz programa definido,

Para entrar no grande prélio;

Nem bemol, nem sustenido,

Nem Caim, nem Marco-Aurélio.

Não traz ideias modernas,

Nem antigas; não traz nada.

Traz as suas duas pernas,

Uma sã, outra quebrada.

E vem, como é de ciência,

Entre muletas segura,

A muleta da inocência,

E a muleta da loucura.

[...]

Eu cá, perfeita unidade.

Ora aprovo, ora contesto,

Sem que haja necessidade

De ouvir protesto e protesto...

Exemplo: ao ler que se trata

De fazer um edifício

Para o júri: – colunata,

Vasto e grego frontispício.

E que esta ideia bizarra

Nasceu mesmo agora, agora,

Quando foi ali à barra

Uma distinta senhora;

Quando a afluência de gente

Era tal, que o magistrado

Teve de ir incontinente

Pedir sabão emprestado; [...]

( GAZETA DE NOTÍCIAS , p. 1, 1886GAZETA DA TARDE, Rio de Janeiro, 1886-1888. , Hemeroteca Digital).

Nas primeiras estrofes, o narrador apresenta-se como um "doutor da mula ruça / Caolho, coxo e maneta" e chama a atenção para o formato modesto de sua gazeta. Com um programa já definido, assegura vir sua publicação "entre muletas segura, / A muleta da inocência, / E a muleta da loucura". Como um juiz inconteste, aprova sua folha liberal, "Sem que haja necessidade / De ouvir protesto e protesto...".

Após essa breve apresentação, o narrador passa a se referir ao julgamento de dona Francisca da Silva Castro. Nos trechos, são feitas referências ao estado em que se encontrava o edifício em que fora realizada a audiência. Na ocasião, a péssima condição do local foi tema da matéria intitulada "Fórum", publicada a 26 de outubro de 1886, na primeira página da Gazeta de Notícias . Nela, foram destacadas as seguintes informações sobre o prédio: a péssima instalação para o júri; uma escada com 105 degraus; e um único compartimento para testemunhas junto ao cubículo dos réus. Além de serem quentes, as salas apresentavam más condições de segurança. O apelo para a construção de um novo prédio teria partido de um jurado. Finda a sessão, imediatamente formou-se uma comissão para realizar "tão útil medida". Aclamada pelos jurados que participaram do julgamento, a presidência da comissão foi dada ao dr. Ferreira Vianna, que aceitou a incumbência. À junta, o presidente expôs suas ideias para o novo empreendimento: imaginava a construção de um edifício, feito em puro estilo grego, sem madeiras, todo de abóbadas e colunatas. O preço: quinhentos contos de réis. Embora o custo fosse exorbitante, a ideia tinha tudo para ser levada adiante, tendo em vista a importância dos membros da delegação. Depois de rememorar essas informações em sua crônica, o narrador prossegue sua referência ao julgamento:

Comigo disse: – Bem-feito

Que a Joaninha expirasse

De uma moléstia do peito,

E que a Eduarda cegasse.

Só assim tínhamos prédio

Para um tribunal sem nada;

Não foi morte, foi remédio;

Foi vida, não foi pancada

( GAZETA DE NOTÍCIAS , p. 1, 1886GAZETA DA TARDE, Rio de Janeiro, 1886-1888. , Hemeroteca Digital).

Na epígrafe que abre esse trabalho, os dizeres de Pangloss afirmam que "tudo está bem quando tudo está mal", a saber: "[...] Tudo isso era indispensável, replicava o doutor caolho, e as desgraças particulares constituem o bem geral; de sorte que, quanto mais houver desgraças particulares, mais tudo estará bem" (VOLTAIRE, 2003VOLTAIRE. Cândido. Tradução de Maria E. Galvão. 3. ed. São Paulo: Martins Fontes, 2003. , p. 18). Há, portanto, nos versos de Machado de Assis, a coexistência do elemento sério junto ao elemento cômico, sem que nenhum dos dois se sobressaia, conforme apresenta Enylton José de Sá Rego ( 1989SÁ REGO, Enylton José de. O calundu e a panaceia: Machado de Assis, a sátira menipeia e a tradição luciânica. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1989. ), em O calundu e a panaceia: Machado de Assis, a sátira menipeia e a tradição luciânica . Esse recurso satírico, presente em romances do escritor, também teve lugar em sua produção cronística, fosse ela escrita em prosa, fosse escrita em verso, como se vê.

O fazer literário do autor, como bem destaca a pesquisadora Lúcia Granja ( 2000GRANJA, Lúcia. Machado de Assis, escritor em formação (à roda dos jornais). Campinas; São Paulo: Mercado de Letras; Fapesp, 2000. ), no estudo Machado de Assis, escritor em formação (à roda dos jornais) , encontra unidade em seus procedimentos narrativos. Nessa crônica de "Gazeta de Holanda" isso se manifesta, em especial, por meio do uso da autoridade literária, o que consiste em uma forma de criar força argumentativa e de representação do texto. Nesse sentido, Granja ( 2000GRANJA, Lúcia. Machado de Assis, escritor em formação (à roda dos jornais). Campinas; São Paulo: Mercado de Letras; Fapesp, 2000. , p. 72) afirma que:

[...] a tradição literária estará para sempre à disposição do narrador, que lançará mão da autoridade que ela lhe empresta, ainda que a distorça, sempre buscando o seu benefício próprio e, nesse sentido, suas observações, conselhos. Reflexões sobre a moral podem se tornar cada vez mais irônicas. E, sem dúvida, se esta pena pôde assim se tornar, foi graças ao exercício constante das hábeis mãos que a conduziam.

Ainda de acordo com a estudiosa, esse aspecto literário seria o responsável por tornar longevas as crônicas machadianas. É o que se vê, por exemplo, no texto em estudo. Nele, são apresentados preceitos da personagem da obra de Voltaire, que, com seus óculos satíricos, põe em questão a teoria do otimismo incondicional. No texto de Machado de Assis, essas ideias são apresentadas da seguinte maneira:

Pangloss, o doutor profundo,

Mostra que há grande harmonia

Entre as coisas deste mundo,

Entre um dia e outro dia;

Que os narizes foram dados

Para os óculos; portanto,

Trazem óculos pousados...

Pangloss é o meu padre-santo.

Logo, se uma e outra escrava

Brigaram sem sentimento,

A razão de ação tão brava

Foi termos um monumento.

[...]

Malvólio

( GAZETA DE NOTÍCIAS , p. 1, 1886GAZETA DA TARDE, Rio de Janeiro, 1886-1888. – Hemeroteca Digital).

A obra francesa é trazida ao repertório como um modo de delinear o que seriam os propósitos da nova série, sobretudo porque muitas de suas metáforas e alegorias seriam retomadas em outras crônicas da coluna, como foi apontado na dissertação de mestrado Gazeta de Holanda, de Machado de Assis: uma série singular , de Fábio da Silva Júnior ( 2021SILVA JÚNIOR, Fábio. Gazeta de Holanda, de Machado de Assis: uma série singular. 2021. 198 f. Dissertação (Mestrado em Letras) – Escola de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, Universidade Federal de São Paulo, Guarulhos, 2021. ). Após mencionar Pangloss, o narrador demonstra concordar com sua filosofia, ao chamá-lo de "meu padre-santo". Por meio de suas falas zombeteiras, mais especificamente do argumento utilizado pela defesa da ré que afirmou que as vítimas teriam se agredido, ele atribui à desgraça envolvendo o destino das duas escravas o fato de terem um novo prédio para o fórum, como demonstram os versos a seguir: "Logo, se uma e outra escrava / Brigaram sem sentimento, / A razão de ação tão brava / Foi termos um monumento". É por isso que seu mestre, o doutor Pangloss, afirmava em Cândido:

[...] que as coisas não podem ser diferentes; pois, tudo sendo feito para um fim, tudo é necessariamente para o melhor fim. Observai que os narizes foram feitos para sustentar óculos; por isso temos óculos. [...] Por conseguinte, aqueles que afiançaram que tudo está bem disseram uma tolice: deviam dizer que tudo está o melhor possível

(VOLTAIRE, 2003VOLTAIRE. Cândido. Tradução de Maria E. Galvão. 3. ed. São Paulo: Martins Fontes, 2003. , p. 4-5).

Sendo assim, todos os acontecimentos estariam encadeados no melhor dos mundos possíveis, de modo que o narrador do texto machadiano recupera a referência literária junto a informações de maior conhecimento público, como o julgamento de dona Francisca da Silva Castro, inocentada das acusações de maus tratos contra suas duas escravas. Como resultado do longo processo, um "monumento" com "colunata, vasto e grego frontispício". Em tom irônico, encerra seu primeiro registro da sociedade fluminense, declarando: "Neste ponto o ponto pingo, / E despeço-me no ponto / Em que cada novo pingo, / Já não é ponto, é posponto". Mesmo com tiradas brincalhonas, esse narrador, cuja identidade só é revelada ao final, por meio da assinatura de Malvólio, se mostra compromissado em denunciar os escândalos e revelar os segredos dos bastidores de uma sociedade ainda escravocrata.

Uma voz escrava

A figura do pregoeiro parece ter chamado a atenção de Machado de Assis pelo que nela havia de mais representativo. Fosse um simples vendedor de doces ou de itens domésticos, esse sujeito percorria as ruas anunciando seus produtos, ao mesmo tempo em que testemunhava as mudanças paisagísticas da cidade. Para além de testemunhar, também era o exemplo mais claro da sina de um escravo de ganho, 5 5 De acordo com Clóvis Moura ( 2022 , p. 150), no Dicionário da Escravidão Negra no Brasil , escravo de ganho era aquele que "[...] trabalhava fora da casa do seu proprietário, como jornaleiro. Vendia nos mercados ou nas ruas da cidade água, frangos, comidas e doces, louças, perfumes, tecidos e bagatelas, ou, eventualmente, agenciava prostitutas. [...] O escravo de ganho entregava ao seu proprietário uma quantia fixa, frequentemente uma vez por semana, e em geral tinha de prover o seu próprio sustento. Era possível também o arranjo pelo qual o pagamento era entregue integralmente ao senhor, que então ficava obrigado a sustentar o escravo". em um sistema escravista. É somente no instante em que sua voz é ouvida que se percebe a proporção de sua dor, em meio a tanta violência.

Em Machado de Assis: impostura e realismo , o pesquisador John Gledson ( 1991GLEDSON, John. Machado de Assis: impostura e realismo. Uma interpretação de Dom Casmurro. Tradução de Fernando Py. São Paulo: Companhia das Letras, 1991. ) faz considerações a respeito do "preto das cocadas" e seu cântico – "Chora, menina, chora / Chora, porque não tem / Vintém" –, apresentado no capítulo XVIII, "Um plano", de Dom Casmurro . Para o crítico, a personagem seria a "[...] alusão mais crua à inferioridade social e econômica de Capitu, em relação a Bento, em todo o livro. E é significativo que seja transmitida por alguém de condição social inferior à dela. [...]" (GLEDSON, 1991GLEDSON, John. Machado de Assis: impostura e realismo. Uma interpretação de Dom Casmurro. Tradução de Fernando Py. São Paulo: Companhia das Letras, 1991. , p. 100). Semelhantemente, na nota de 9 de janeiro de 1888, em Memorial de Aires , é um pregoeiro, vendedor de vassouras e espanadores, que desperta no conselheiro lembranças do dia em que regressara ao Brasil:

Ora bem, faz hoje um ano que voltei definitivamente da Europa. O que me lembrou esta data foi, estando a beber café, o pregão de um vendedor de vassouras e espanadores. "Vai vassouras! Vai espanadores!". Costumo ouvi-lo outras manhãs, mas desta vez trouxe-me à memória o dia do desembarque, quando cheguei aposentado à minha terra, ao meu Catete, à minha língua. Era o mesmo que ouvia há um ano, em 1887, e talvez fosse a mesma boca

(ASSIS, 2015bASSIS, Joaquim Maria Machado de. Memorial de Aires. In: ASSIS, Joaquim Maria Machado de. Obra completa em quatro volumes. 3. ed. Organização de Aluizio Leite Neto, Ana Lima Cecílio, Heloisa Jahn. São Paulo: Nova Aguilar, 2015b. v. 1, p. 1194-1293. , p. 1197).

Assim como esses pregoeiros, pai Silvério, na publicação de 27 de setembro de 1887 na "Gazeta de Holanda", revelou as crueldades pelas quais passava, mesmo vivendo sob a condição jurídica de status-liber . Conforme apresenta a historiadora Emília Viotti da Costa ( 2008COSTA, Emília Viotti da. O abolicionismo. Terceira fase: a Lei dos Sexagenários. In: COSTA, Emília Viotti da. A abolição. 8. ed. rev. e ampl. São Paulo: Editora Unesp, 2008. p. 77-94. , p. 87), em A abolição , a promulgação da Lei de 28 de setembro de 1885 estipulava que "[...] os escravos emancipados aos sessenta anos ficavam obrigados a trabalhar mais três anos gratuitamente (ou até atingirem a idade de 65 anos), a título de compensação a seus senhores". A Lei Saraiva-Cotegipe, também conhecida por Lei dos Sexagenários, consistia em mais uma etapa lenta e progressiva para o fim da escravidão no Brasil. Mas se, por um lado, havia a garantia de liberdade àqueles que atingissem a idade exigida, por outro, a determinação firmava que, nesse ínterim, os cativos deveriam ficar sob os cuidados de seus senhores, o que, a duras penas, era o mesmo que os manter escravos e sob as condições em que viviam antes de decretada a nova legislação. Em Cenas da abolição: escravos e senhores no Parlamento e na Justiça , Joseli Nunes Mendonça ( 2001MENDONÇA, Joseli Nunes. Cenas da Abolição: escravos e senhores no Parlamento e na Justiça. São Paulo: Editora Fundação Perseu Abramo, 2001. (Série História do Povo Brasileiro). ) destaca que tanto a Lei do Ventre Livre como a Lei dos Sexagenários consistiam em projetos gradualistas, pois previam libertar aos poucos os escravos. Por isso, a pesquisadora afirma:

Talvez essa concepção da liberdade tenha sido o que de mais conservador houve em todo o processo de encaminhamento parlamentar da abolição. Significava, enfim, que a liberdade, para os ex-escravos, não deveria pressupor a ruptura com elementos da condição de escravidão. Os escravos, além de realizar os mesmos trabalhos, deveriam ser mantidos sob "proteção", controle, vigilância e domínio dos antigos senhores

(MENDONÇA, 2001MENDONÇA, Joseli Nunes. Cenas da Abolição: escravos e senhores no Parlamento e na Justiça. São Paulo: Editora Fundação Perseu Abramo, 2001. (Série História do Povo Brasileiro). , p. 51).

Não é à toa que no dia 17 de setembro de 1886, a Gazeta de Notícias , na coluna "Diário das Câmaras", fez uma referência à sessão parlamentar realizada no dia 15 daquele mês. Na interpelação, o senador sr. Afonso Celso Júnior apresentou ao presidente do conselho cinco questões concernentes à condição do escravo, sendo três delas diretamente relacionadas ao status-liber:

1ª Qual, na opinião do governo, a verdadeira condição dos escravizados existentes no império, desde que pelo art. 3º §10 da Lei n. 2.370 [sic] de 28 de setembro de 1885, foi fixado dia certo para entrarem no gozo da sua liberdade?

2ª Permanecem rigorosamente escravos ou tornaram-se statuliberi ?

3ª Subsistem em pleno vigor o art. 60 do código criminal (pena de açoites) e a Lei de 10 de junho de 1835, depois da nova situação para eles criada pela referida Lei de 28 de setembro? 6 6 O art. 60 do Código Criminal de 16 de dezembro de 1830 (ver: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/lim/LIM-16-12-1830.htm#art60 ) previa que o escravo que cometesse crime considerado leve fosse condenado ao açoite, com número fixado na sentença. Já o art. 1º da Lei nº 4 de 10 de junho de 1835 (ver: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/lim/LIM4.htm ) determinava que fossem punidos com a pena de morte os escravos ou escravas que matassem, ferissem ou cometessem qualquer ofensa grave contra seus senhores e/ou dependentes. A pena seria de açoitamento se as circunstâncias fossem menos agravantes. Ricardo Figueiredo Pirola ( 2017 ) mostra, em seu artigo "O castigo senhorial e a abolição da pena de açoites no Brasil: justiça, imprensa e política no século XIX", que somente em 15 de outubro de 1886, com a Lei nº 3.310 (ver: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/lim/LIM3310.htm#art1 ), o Parlamento brasileiro aboliu a pena de açoites contra escravos, revogando o art. 60 do Código Criminal e a Lei nº 4 de 1835. O historiador afirma que se tratava de uma medida "[...] que diminuía as distâncias entre as normas criminais voltadas para os escravos e aquelas destinadas aos livres no contexto de desmantelamento do escravismo" (PIROLA, 2017 , p. 3). Contudo, embora se tratasse de um avanço, o art. 14, § 6º, do Código Criminal do Império, mantinha intacto aos senhores o "açoite moderado" em seus escravos, dado que a prática era considerada crime justificável.

( GAZETA DE NOTÍCIAS , 1886GAZETA DA TARDE, Rio de Janeiro, 1886-1888. , p. 1, Hemeroteca Digital).

Em seu discurso, o político explica o termo jurídico, herança do direito romano. Segundo informa, o homem, no dito estado livre brasileiro, seria pleno dos mesmos direitos que um homem livre. Sua fala, no entanto, foi prontamente rebatida pelo dr. João Batista Pereira, membro do Instituto dos Advogados. Em seu trabalho publicado a 30 de setembro de 1887, sob o título Da condição atual dos escravos, especialmente após a promulgação da Lei n. 3.270 de 28 de setembro de 1885 , o doutor justificou o motivo de seu voto contrário ao dos colegas do Instituto, destacando que o estado livre não se diferenciava em nada quando comparado ao escravo. Em sua posterior manifestação à Câmara, fez a seguinte exposição:

A Lei n. 3.270 de 28 de setembro de 1885, fixando a idade além da qual cessa a prestação de serviços no presente e no futuro, e declarando livre o escravo que atingir sessenta anos, extinguiu a escravidão, transformando o escravo no statuliber da simples terminologia dos romanos

(PEREIRA, 1887 PEREIRA, João Batista. Da condição atual dos escravos, especialmente após a promulgação da Lei n. 3.270 de 28 de setembro de 1885. Rio de Janeiro: Imprensa Nacional, 1887. Disponível em: http://www2.senado.leg.br/bdsf/handle/id/185617 . Acesso em: 08 out. 2023.
http://www2.senado.leg.br/bdsf/handle/id...
, p. 5).

O advogado declara que "[...] o statuliber brasileiro tem a cor local ; não traja as roupagens do simbolismo romano" (PEREIRA, 1887 PEREIRA, João Batista. Da condição atual dos escravos, especialmente após a promulgação da Lei n. 3.270 de 28 de setembro de 1885. Rio de Janeiro: Imprensa Nacional, 1887. Disponível em: http://www2.senado.leg.br/bdsf/handle/id/185617 . Acesso em: 08 out. 2023.
http://www2.senado.leg.br/bdsf/handle/id...
, p. 6). Em outras palavras, o escravo era mantido como um bem material, não tendo os mesmos direitos que um homem livre. Conforme detalha o dr. Batista Pereira, no direito romano, a posição do status-liber seria a mesma que a de um escravo, salvo o fato de não poder ser alienado. 7 7 Alienado: "traspassado por alheação a outro domínio" (MORAES E SILVA, 1823 , p. 100-101). Para isso, informa que o filho do estado livre era escravo; é processado e julgado como escravo e sofre as mesmas penas que este; pode ser vendido; enquanto pende a condição, é escravo do herdeiro; e é partilhado como os outros bens onerados de alguma condição. Para ele, estava claro que essa condição em nada diferia da situação dos cativos. A eles só restava, então, a proteção da lei contra as injustiças e abusos de seus senhores, mas não os direitos de um cidadão livre. Assim, o doutor manifestou sua insatisfação contra o Instituto do qual fazia parte:

Por todas estas razões, em meu humílimo conceito, o voto do Instituto dos Advogados foi exorbitante; legislou, com manifesta incompetência, e sob a impressão das paixões do dia, que podem emocionar uma assembleia política deliberante, nunca uma sociedade de jurisperitos que se congregam para discutir pontos de doutrina e resolver controvérsias jurídicas

(PEREIRA, 1887 PEREIRA, João Batista. Da condição atual dos escravos, especialmente após a promulgação da Lei n. 3.270 de 28 de setembro de 1885. Rio de Janeiro: Imprensa Nacional, 1887. Disponível em: http://www2.senado.leg.br/bdsf/handle/id/185617 . Acesso em: 08 out. 2023.
http://www2.senado.leg.br/bdsf/handle/id...
, p. 34).

Esses argumentos foram usados na tentativa de demonstrar que, se comparado a um escravo, em nada diferia a posição de um status-liber , uma vez que ambos estavam sujeitos à venda, à hipoteca, à adjudicação e, principalmente, à alienação. Essa vulnerabilidade aparece na resposta de pai Silvério ao ser questionado sobre as teses do Instituto. Nas estrofes apresentadas a seguir, o narrador, em uma espécie de devaneio, refere-se aos acontecimentos envolvendo gente escrava, na semana que antecede seu relato. Nos versos, nota-se a forte presença da liberdade de imaginação e do tom de comicidade, elementos característicos do gênero satírico:

A semana que há passado...

Deixe leitor que me escuse,

E de um falar tão usado,

Abuse também, abuse.

Há passado, hão carcomido...

Hão, hão, hão, hão posto em tudo,

Hão, hão, hão, hão recolhido...

Estilo de tartamudo.

Ai, gosto! ai, cultura! ai, gosto!

Demos um jeito e outro jeito:

Venha dispor e há disposto

Venha dispor e há desfeito .

Mas usar de uma maneira

Até reduzi-la ao fio,

Não é estilo, é canseira;

Não dá sabor, dá fastio.

Porém... Já me não recordo

Do que ia dizer. Diabo!

Naveguei para bombordo,

E fui esbarrar a um cabo.

Outro rumo... Ah! sim; falava

Da outra semana. Cheia

Esteve de gente escrava,

Desde o almoço até a ceia.

[...]

Pois se os próprios advogados

(E quem mais que eles?) tiveram

Debates acalorados

No Instituto, em que nos deram

Uma questão – se, fundado

Este regime presente,

Pode ser considerado

O escravo inda escravo ou gente.

Digo mal: – inda é cativo

Ou statulíber ? Qual seja

Correu lá debate vivo,

Melhor dizemos peleja.

Mas peleja de armas finas,

Sem deixar ninguém molesto:

Nem facas, nem colubrinas,

Digesto 8 8 Digesto: "s. m. Livro das Leis Romanas, que contém os Fragmentos dos Antigos Jurisconsultos, Pandectas, coleções diferentes dos diversos Códigos Romanos , que contém as opiniões, e sentenças dos Jurisconsultos, e seus comentários, e ampliações dos Senatus Consultos, Edicto Perpetuo, e dos Pretorios, e que mandou coligir Justiniano, e lhe deu forma de Lei. V. Código " (MORAES E SILVA, 1823 , p. 630). contra Digesto

( GAZETA DE NOTÍCIAS , p. 1, 1887 Hemeroteca Digital da Biblioteca Nacional (RJ). Disponível em: https://bndigital.bn.gov.br/hemeroteca-digital/ .
https://bndigital.bn.gov.br/hemeroteca-d...
, Hemeroteca Digital).

Após iniciar a publicação em tom lamentoso, o narrador revela que seu assunto diz respeito à "gente escrava", especialmente às discussões acaloradas por parte dos advogados, no Instituto. Com um comentário não tão despretensioso (e quem mais que eles?), indica que tiveram como pauta a seguinte questão: "fundado / Este regime presente, / Pode ser considerado / O escravo inda escravo ou gente"? De forma mais clara: "inda é cativo / Ou statulíber ?". O narrador afirma que, em resposta a essa peleja, eles não fizeram uso de armas, mas de argumentos, como demonstram os versos a seguir:

Uns acham que é este o caso

Do statulíber. Havendo

Condição marcada ou prazo,

Não há mais o nome horrendo.

Outros, que não são sujeitos

Ferozes nem sanguinários,

Combatem esses efeitos

Com argumentos contrários

( GAZETA DE NOTÍCIAS , p. 1, 1887 Hemeroteca Digital da Biblioteca Nacional (RJ). Disponível em: https://bndigital.bn.gov.br/hemeroteca-digital/ .
https://bndigital.bn.gov.br/hemeroteca-d...
, Hemeroteca Digital).

Para uns, o status-liber assemelhava-se à posição do homem livre, de modo que nem mais se empregava o "nome horrendo"; já para outros, a nova denominação não alterava em nada a situação dos cativos, uma vez que viviam sob a tutela de seus antigos donos e, consequentemente, continuavam a sofrer as mesmas violências. O narrador, ao supor ser mais sensato ouvir àquele a quem a questão mais interessava, decide, então, chamar do alto do seu poleiro um preto que apregoava:

Eu, que suponho acertado,

Sempre nos casos como esses,

Indagar do interessado

Onde acha os seus interesses,

Chamei cá do meu poleiro

Um preto que ia passando,

Carregando um tabuleiro,

Carregando e apregoando.

E disse-lhe: "Pai Silvério,

Guarda as alfaces e as couves;

Tenho negócio mais sério,

Quero que m'o expliques. Ouves?"

Contei-lhe em palavras lisas,

Quais as teses do Instituto,

Opiniões e divisas.

Que há de responder-me o bruto?

( GAZETA DE NOTÍCIAS , p. 1, 1887 Hemeroteca Digital da Biblioteca Nacional (RJ). Disponível em: https://bndigital.bn.gov.br/hemeroteca-digital/ .
https://bndigital.bn.gov.br/hemeroteca-d...
, Hemeroteca Digital).

No verso "chamei cá do meu poleiro", o narrador revela certo ponto de vista distanciado, como se estivesse vendo do alto ou de um ponto até mais elevado que a sociedade enriquecida pelo trabalho escravo. Essa visão privilegiada consiste em mais um elemento satírico presente na publicação. Assim, ao questionar esse "bruto" por meio de um discurso mais simples do que aquele proferido pelos advogados, o cronista parece querer ouvir desse pregoeiro as verdades não ditas sobre a real condição de um status-liber . É o que se vê nos seguintes versos, quando o homem revela:

– "Meu senhor, eu, entra ano,

Sai ano, trabalho nisto;

Há muito senhor humano,

Mas o meu é nunca visto.

"Pancada, quando não vendo,

Pancada que dói, que arde;

Se vendo o que ando vendendo,

Pancada, por chegar tarde.

"Dia santo nem domingo

Não tenho. Comida pouca:

Pires de feijão, e um pingo

De café, que molha a boca.

"Por isso, digo ao perfeito

Instituto, grande e bravo:

Tu falou muito direito,

Tu tá livre, eu fico escravo".

Malvólio

( GAZETA DE NOTÍCIAS , 1887 Hemeroteca Digital da Biblioteca Nacional (RJ). Disponível em: https://bndigital.bn.gov.br/hemeroteca-digital/ .
https://bndigital.bn.gov.br/hemeroteca-d...
, p. 1 – Hemeroteca Digital).

Pai Silvério expõe aos leitores da "Gazeta de Holanda" os castigos físicos de que é vítima constantemente: "Pancada, quando não vendo, / Pancada que dói, que arde" e "Se vendo o que ando vendendo / Pancada, por chegar tarde". Muito embora a pena de açoites tenha sido revogada a 15 de outubro de 1886, com a Lei nº 3.310, como mostra Keila Grinberg ( 2018GRINBERG, Keila. Castigos físicos e legislação. In: SCHWARCZ, Lilia Moritz; GOMES, Flávio dos Santos (Orgs). Dicionário da escravidão e liberdade: 50 textos críticos. 1. ed. São Paulo: Companhia das Letras, 2018. p. 144-148. ) em "Castigos físicos e legislação", o texto de Machado de Assis revela que a violência física e moral contra os escravos ainda era constante no ano de 1887, talvez por ser considerada "moderada" quando praticada com a finalidade de "educar", como previa o art. 14, § 6º, do Código Criminal do Império. Sobre os mesmos versos, o crítico Magalhães Júnior ( 1957MAGALHÃES JÚNIOR, Raimundo. Machado de Assis: desconhecido. 3. ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1957. , p. 173) fez a seguinte afirmação:

[...] Nessas quadras, que os biógrafos e comentadores da obra de Machado de Assis inexplicavelmente desprezam, há um retrato perfeito das condições do cativeiro, caracterizadas pelo excesso de trabalho dos escravos, sem direito a qualquer descanso, e pelo excesso dos castigos corporais [...].

Sem descanso nem mesmo nos dias santos, o escravo de ganho ainda relata ser limitada até sua refeição: "Comida pouca / Pires de feijão, e um pingo / De café, que molha a boca". No posfácio à antologia Machado de Assis afrodescendente: escritos de caramujo , Eduardo de Assis Duarte ( 2007DUARTE, Eduardo de Assis. Posfácio. Estratégias de caramujo. In: ASSIS, Joaquim Maria Machado de. Machado de Assis afrodescendente: escritos de caramujo [antologia]. 2. ed. rev. e ampl. Organização, ensaio e notas de Eduardo de Assis Duarte. Rio de Janeiro; Belo Horizonte: Pallas; Crisálidas, 2007. p. 249-288. , p. 258) afirma que: "Ao destacar a violência física contra o escravo, o escritor novamente evidencia o alinhamento de sua postura de jornalista com a do escritor de ficção. [...]", fosse ela escrita em prosa ou em verso, vale acrescentar.

Como bem observou o dr. João Batista Pereira ( 1887 PEREIRA, João Batista. Da condição atual dos escravos, especialmente após a promulgação da Lei n. 3.270 de 28 de setembro de 1885. Rio de Janeiro: Imprensa Nacional, 1887. Disponível em: http://www2.senado.leg.br/bdsf/handle/id/185617 . Acesso em: 08 out. 2023.
http://www2.senado.leg.br/bdsf/handle/id...
), a escravidão era "o concubinato da lei com o crime". Por esse motivo, o amplo debate no Instituto dos Advogados em nada substituiria a fala de um escravo, vítima direta das barbaridades provocadas pela exploração humana. Sendo assim, quem mais poderia ouvi-lo senão aquele que também se engajou em denunciar as mazelas sociais mesmo que sob um olhar mais introspectivo? Esse cronista sempre atento à realidade de seu entorno recorreu não só à liberdade imaginativa e à mistura do sério e do cômico (elementos satíricos), como também utilizou de uma visão privilegiada, o que, naquele contexto, lhe permitiu melhor discernir aquela figura a quem mais interessavam as questões concernentes à escravidão.

Referências

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  • ASSIS, Joaquim Maria Machado de. Memorial de Aires. In: ASSIS, Joaquim Maria Machado de. Obra completa em quatro volumes. 3. ed. Organização de Aluizio Leite Neto, Ana Lima Cecílio, Heloisa Jahn. São Paulo: Nova Aguilar, 2015b. v. 1, p. 1194-1293.
  • COSTA, Emília Viotti da. O abolicionismo. Terceira fase: a Lei dos Sexagenários. In: COSTA, Emília Viotti da. A abolição. 8. ed. rev. e ampl. São Paulo: Editora Unesp, 2008. p. 77-94.
  • DUARTE, Eduardo de Assis. Posfácio. Estratégias de caramujo. In: ASSIS, Joaquim Maria Machado de. Machado de Assis afrodescendente: escritos de caramujo [antologia]. 2. ed. rev. e ampl. Organização, ensaio e notas de Eduardo de Assis Duarte. Rio de Janeiro; Belo Horizonte: Pallas; Crisálidas, 2007. p. 249-288.
  • GLEDSON, John. Machado de Assis: impostura e realismo. Uma interpretação de Dom Casmurro. Tradução de Fernando Py. São Paulo: Companhia das Letras, 1991.
  • GRANJA, Lúcia. Machado de Assis, escritor em formação (à roda dos jornais). Campinas; São Paulo: Mercado de Letras; Fapesp, 2000.
  • GRINBERG, Keila. Castigos físicos e legislação. In: SCHWARCZ, Lilia Moritz; GOMES, Flávio dos Santos (Orgs). Dicionário da escravidão e liberdade: 50 textos críticos. 1. ed. São Paulo: Companhia das Letras, 2018. p. 144-148.
  • MAGALHÃES JÚNIOR, Raimundo. Machado de Assis: desconhecido. 3. ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1957.
  • MENDONÇA, Joseli Nunes. Cenas da Abolição: escravos e senhores no Parlamento e na Justiça. São Paulo: Editora Fundação Perseu Abramo, 2001. (Série História do Povo Brasileiro).
  • MORAES E SILVA, Antônio de. Diccionario da Língua Portugueza. Tomo Primeiro. Lisboa: Tipografia de M. P. de Lacerda, 1823. Disponível em: http://www2.senado.leg.br/bdsf/handle/id/562936 . Acesso em: 08 out. 2023.
    » http://www2.senado.leg.br/bdsf/handle/id/562936
  • MOURA, Clóvis. Dicionário da Escravidão Negra no Brasil. 1. ed. 2. reimpr. São Paulo: Edusp, 2022.
  • NABUCO, Joaquim. Minha formação. Introdução de Gilberto Freyre. Brasília: Senado Federal, 1998.
  • PEREIRA, João Batista. Da condição atual dos escravos, especialmente após a promulgação da Lei n. 3.270 de 28 de setembro de 1885. Rio de Janeiro: Imprensa Nacional, 1887. Disponível em: http://www2.senado.leg.br/bdsf/handle/id/185617 . Acesso em: 08 out. 2023.
    » http://www2.senado.leg.br/bdsf/handle/id/185617
  • PIROLA, Ricardo Figueiredo. O castigo senhorial e abolição da pena de açoites no Brasil: justiça, imprensa e política no século XIX. Revista de História, São Paulo, n. 176, a08616, 2017.
  • SÁ REGO, Enylton José de. O calundu e a panaceia: Machado de Assis, a sátira menipeia e a tradição luciânica. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1989.
  • SILVA JÚNIOR, Fábio. Gazeta de Holanda, de Machado de Assis: uma série singular. 2021. 198 f. Dissertação (Mestrado em Letras) – Escola de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, Universidade Federal de São Paulo, Guarulhos, 2021.
  • VOLTAIRE. Cândido. Tradução de Maria E. Galvão. 3. ed. São Paulo: Martins Fontes, 2003.
  • Hemeroteca Digital da Biblioteca Nacional (RJ). Disponível em: https://bndigital.bn.gov.br/hemeroteca-digital/ .
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  • DIÁRIO DO RIO DE JANEIRO, Rio de Janeiro, 1864.
  • GAZETA DE NOTÍCIAS, Rio de Janeiro, 1883-1888.
  • GAZETA DA TARDE, Rio de Janeiro, 1886-1888.
  • 1
    Conferir a série "Gazeta de Holanda" na edição da Obra completa (ASSIS, 2015aASSIS, Joaquim Maria Machado de. Gazeta de Holanda. In: ASSIS, Joaquim Maria Machado de. Obra completa em quatro volumes. 3. ed. Organização de Aluizio Leite Neto, Ana Lima Cecílio, Heloisa Jahn. São Paulo: Nova Aguilar, 2015a. v. 4,p. 622-745. ).
  • 2
    Grupo formado por José do Patrocínio, Ferreira de Meneses, Vicente de Sousa, Nicolau Moreira e João Clapp, presidente da Confederação Abolicionista, como destaca Joaquim Nabuco, em Minha formação ( 1998NABUCO, Joaquim. Minha formação. Introdução de Gilberto Freyre. Brasília: Senado Federal, 1998. ). Na obra, o intelectual também afirma que o movimento abolicionista começou na Câmara, em 1879, com o pronunciamento de Jerônimo Sodré, o que, para Nabuco ( 1998NABUCO, Joaquim. Minha formação. Introdução de Gilberto Freyre. Brasília: Senado Federal, 1998. , p. 192-193), seria a mais clara demonstração de que o "gérmen" da abolição era parlamentar.
  • 3
    Fundador e redator-chefe da Gazeta de Notícias .
  • 4
    O caso despertou tanta atenção dos cariocas que, na publicação de 25 de outubro, dia, portanto, em que se divulgou a sentença final, os redatores informam em nota que a tiragem do jornal no dia anterior foi extraordinária. Isso fez com que os jornais se esgotassem muito cedo. Para mais, declaram que alguns vendedores recebiam abusivamente cem réis pela folha, cujo preço habitual era quarenta ( GAZETA DE NOTÍCIAS , 25 out. 1885GAZETA DE NOTÍCIAS, Rio de Janeiro, 1883-1888. , Hemeroteca Digital).
  • 5
    De acordo com Clóvis Moura ( 2022MOURA, Clóvis. Dicionário da Escravidão Negra no Brasil. 1. ed. 2. reimpr. São Paulo: Edusp, 2022. , p. 150), no Dicionário da Escravidão Negra no Brasil , escravo de ganho era aquele que "[...] trabalhava fora da casa do seu proprietário, como jornaleiro. Vendia nos mercados ou nas ruas da cidade água, frangos, comidas e doces, louças, perfumes, tecidos e bagatelas, ou, eventualmente, agenciava prostitutas. [...] O escravo de ganho entregava ao seu proprietário uma quantia fixa, frequentemente uma vez por semana, e em geral tinha de prover o seu próprio sustento. Era possível também o arranjo pelo qual o pagamento era entregue integralmente ao senhor, que então ficava obrigado a sustentar o escravo".
  • 6
    O art. 60 do Código Criminal de 16 de dezembro de 1830 (ver: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/lim/LIM-16-12-1830.htm#art60 ) previa que o escravo que cometesse crime considerado leve fosse condenado ao açoite, com número fixado na sentença. Já o art. 1º da Lei nº 4 de 10 de junho de 1835 (ver: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/lim/LIM4.htm ) determinava que fossem punidos com a pena de morte os escravos ou escravas que matassem, ferissem ou cometessem qualquer ofensa grave contra seus senhores e/ou dependentes. A pena seria de açoitamento se as circunstâncias fossem menos agravantes. Ricardo Figueiredo Pirola ( 2017PIROLA, Ricardo Figueiredo. O castigo senhorial e abolição da pena de açoites no Brasil: justiça, imprensa e política no século XIX. Revista de História, São Paulo, n. 176, a08616, 2017. ) mostra, em seu artigo "O castigo senhorial e a abolição da pena de açoites no Brasil: justiça, imprensa e política no século XIX", que somente em 15 de outubro de 1886, com a Lei nº 3.310 (ver: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/lim/LIM3310.htm#art1 ), o Parlamento brasileiro aboliu a pena de açoites contra escravos, revogando o art. 60 do Código Criminal e a Lei nº 4 de 1835. O historiador afirma que se tratava de uma medida "[...] que diminuía as distâncias entre as normas criminais voltadas para os escravos e aquelas destinadas aos livres no contexto de desmantelamento do escravismo" (PIROLA, 2017PIROLA, Ricardo Figueiredo. O castigo senhorial e abolição da pena de açoites no Brasil: justiça, imprensa e política no século XIX. Revista de História, São Paulo, n. 176, a08616, 2017. , p. 3). Contudo, embora se tratasse de um avanço, o art. 14, § 6º, do Código Criminal do Império, mantinha intacto aos senhores o "açoite moderado" em seus escravos, dado que a prática era considerada crime justificável.
  • 7
    Alienado: "traspassado por alheação a outro domínio" (MORAES E SILVA, 1823 MORAES E SILVA, Antônio de. Diccionario da Língua Portugueza. Tomo Primeiro. Lisboa: Tipografia de M. P. de Lacerda, 1823. Disponível em: http://www2.senado.leg.br/bdsf/handle/id/562936 . Acesso em: 08 out. 2023.
    http://www2.senado.leg.br/bdsf/handle/id...
    , p. 100-101).
  • 8
    Digesto: "s. m. Livro das Leis Romanas, que contém os Fragmentos dos Antigos Jurisconsultos, Pandectas, coleções diferentes dos diversos Códigos Romanos , que contém as opiniões, e sentenças dos Jurisconsultos, e seus comentários, e ampliações dos Senatus Consultos, Edicto Perpetuo, e dos Pretorios, e que mandou coligir Justiniano, e lhe deu forma de Lei. V. Código " (MORAES E SILVA, 1823 MORAES E SILVA, Antônio de. Diccionario da Língua Portugueza. Tomo Primeiro. Lisboa: Tipografia de M. P. de Lacerda, 1823. Disponível em: http://www2.senado.leg.br/bdsf/handle/id/562936 . Acesso em: 08 out. 2023.
    http://www2.senado.leg.br/bdsf/handle/id...
    , p. 630).

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    16 Ago 2024
  • Data do Fascículo
    2024

Histórico

  • Recebido
    08 Out 2023
  • Aceito
    10 Abr 2024
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