RESUMO
Este trabalho busca identificar as novas práticas de transferência das materialidades do território e do planejamento territorial para as grandes corporações. Levanta-se a hipótese de que nos últimos anos se conformou no Brasil um novo tipo de planejamento territorial, pautado nos novos usos que são feitos dos elementos estruturadores do território. Lançando luz sob os aspectos territoriais que compõem o processo de uso corporativo - a informação organizacional e o controle dos fluxos de pessoas e mercadorias - identificamos um planejamento corporativo do território, feito diretamente pelas grandes corporações por meio do controle e articulação dos sistemas de infraestruturas territoriais e que têm decorrências substantivas para a circulação e a integração espacial da formação socioespacial brasileira. Pretendemos identificar esse processo por meio da investigação da atual concessão aeroportuária e seus desdobramentos para a integração/desintegração territorial.
Palavras-chave: Planejamento Corporativo; Uso Corporativo; Concessões; Espoliação Territorial
RESUMEN
Este trabajo busca identificar nuevas formas de transferencia de las materialidades del territorio y la planificación territorial para las grandes corporaciones. Plantea la hipótesis de que en los últimos años se estableció en Brasil un nuevo tipo de planificación territorial, con base a los nuevos usos que se hacen de los elementos estructurales del território. Arrojando luz sobre los aspectos territoriales que conforman el proceso de uso corporativo - información y control de la organización de los flujos de personas y bienes - es identificado un territorio de planificación corporativa, hecho directamente por las grandes corporaciones a través del control y la coordenacíon de los sistemas de infraestructuras territorial y tienen derivaciones substantivas para em movimiento y la integración espacial de la formación socioespacial brasileña. Tenemos la intención de identificar a este proceso mediante la investigación de la actual concesión del aeropuertos e sus consecuencias para la integración/desintegración territorial.
Palabras clave: Planificacion Corporativa; Uso Corporativo; Consesiones; Expoliación Territorial
ABSTRACT
This work seeks to identify the new practices of transferring the materialities of territories and territorial planning to large corporations. It is hypothesized that in recent years a new type of territorial planning has been established in Brazil, based on the new uses that are made of the structuring elements of the territory. Shedding light on the territorial aspects that make up the process of corporate use - organizational information and the control of flows of people and goods - we identify a corporate planning of territory, done directly by large corporations through the control and articulation of territorial infrastructure systems and that have substantive consequences for the circulation and spatial integration of Brazilian socio-spatial formation. The intention is to identify this process by means of the investigation of the current airport concession and its unfolding for territorial integration / disintegration.
Keywords: Corporate Planning; Corporate Use; Concessions; Territorial dispossession
INTRODUÇÃO
A importância dos sistemas de movimento no território para o desenvolvimento e o planejamento territorial (analisados como transportes, mobilidade, fluidez, fluxos ou ainda como interações espaciais) se constitui como tema consagrado nas mais diversas análises da Geografia, Economia Regional e especialistas do desenvolvimento regional. A escolha dos sistemas de movimento aeroviário para investigar o planejamento corporativo do território justificou-se, portanto, pela hipótese de que esse sistema de movimento tenha assumido papel cada vez mais importante nos processos recentes de articulação territorial diante da emergência de um planejamento corporativo do território.
Este adquire uma importância crescente diante da necessidade de uma fluidez cada vez mais rápida e necessária ao padrão de acumulação flexível/just in time (HARVEY, [1989] 2014; ANTUNES, 1999; BENKO, 1996)1 que colocou o sistema de movimento aeroviário como um dos principais articuladores do movimento de pessoas e mercadorias de alto valor agregado no processo de realização da circulação do capital globalizado. Por outro lado, a magnitude e importância desse sistema, desde seu processo de construção, manutenção e ampliação, sejam dos aeroportos e suas conexões, justificam sua importância no planejamento territorial, pois foi sob a administração do Estado - nas várias escalas da federação - que se articulou uma rede densa de aeroportos e conexões aeroviária, sustentando o período de investimento estatal em sistemas públicos nas décadas de 1950/60/70 na formação socioespacial brasileira (SANTOS, 2005).2
Nesse sentido, o conteúdo abordado neste trabalho busca elucidar alguns pontos a serem investigados em relação às características de integração e desintegração territorial decorrentes do processo de concessão e sua importância para o planejamento territorial em suas diversas escalas. A análise da estruturação do sistema de movimento aeroviário, pensada como infraestrutura de integração regional, pode revelar as características ainda mais perversas decorrentes de sua espoliação (HARVEY, 2004) por meio do uso corporativo do território (SANTOS; SILVEIRA, 2001).
SISTEMA DE MOVIMENTO AEROVIÁRIO E INTEGRAÇÃO TERRITORIAL
A gestão territorial, entoada por empresas globais de consultoria e grandes corporações como planejamento (corporativo) - sobe o eufemismo de planejamento estratégico - aprofundou as assimetrias e desigualdades regionais, fruto da divisão territorial da formação socioespacial brasileira, levando a uma maior especialização regional com destaque para o papel das cidades polarizadoras da rede urbana brasileira, que hoje assumem papéis de comando regionais e nacionais. O sistema de movimento aeroviário acompanha o desenho da rede de cidades e conforma também suas características históricas de centralidade, polarização, integração e desintegração.3
Os dados sobre o tráfego aéreo do sistema de movimento aeroviário, oferecidos pelo Departamento de Aviação Civil (DAC) a cada ano, com nível de detalhamento de cada aeroporto administrado pela INFRAERO, nos oferecem a possibilidade de organizar mapas de fluxos em todo o território e fazer o intercruzamento com a rede de cidades. Esses bancos de dados ajudam a revelar a importância dos fixos aeroportuários para a organização do planejamento territorial, os principais fluxos ancorados na análise da rede urbana e, revelam ainda, a importância do sistema de movimento para a análise da rede de cidades, possibilitando comparar as séries históricas e as capacidades de interligações dos aeroportos e avaliar suas tendências.
A análise inicial dos dados de 2010 revelam uma estrutura interligações que acompanham a estrutura centralizada e polarizada da rede de cidades brasileiras. Ao mesmo tempo, revelam uma enorme capilaridade nas trocas locais, regionais e inter-regionais. A característica da rede demonstra uma alta conectividade entre as cidades que se conformam como principais hubs4 no território nacional. A cidade de São Paulo - SP destaca-se como a principal centralidade da rede de fluxos aéreos do território brasileiro, estabelecendo ligações diretas e indiretas com praticamente todas as cidades da rede aeroviária. Do total das 878 principais ligações que transportam 72 milhões de passageiros, a cidade tem 67 ligações (7,6% das ligações), entretanto, um número pequeno de ligações transporta um total de 32 milhões de passageiros, ou seja 44,9 % de toda a rede. Isto ocorre por conta da cidade ser a grande metrópole nacional do país, que, segundo Santos (1990), IBGE (2008) e Corrêa (1992), acumula funções dos mais altos níveis da rede. São Paulo - SP, acumula as funções de centro de gestão empresarial e também tem alto nível de centralização da gestão pública (IBGE, 2014). Sua predominância no transporte de passageiros ainda está relacionada à concentração de serviços sofisticados, sedes de grandes companhias, indústria avançada; além de dividir, segundo IBGE (2008), com a cidade do Rio de Janeiro - RJ o centro financeiro do país. Relevante ainda, é o fato da cidade abarcar dois aeroportos (Guarulhos e Congonhas) que recebem a demanda dos mais de 20 milhões de pessoas que habitam a região metropolitana de São Paulo, a maior metrópole do país.
Brasília - DF, tem um total de 49 ligações (5,5 % da rede) que transportam pouco mais de 9 milhões de passageiros, 13,2 % do total da rede. A cidade destaca-se por sua posição central no território que a qualifica como segundo principal hub de interligação para as regiões norte e centro-oeste. Além disso, a demanda de passageiros é intensa por conta da cidade ocupar a primeira posição de centro de gestão pública no território, por ser a capital do país.
O restante da rede transporta em suas 763 principais ligações cerca de 30 milhões de passageiros. Ou seja, as cidades de Brasília e São Paulo têm fluxos que ultrapassam todo o restante da rede (Tabela 1 e Tabela 2).
Em relação a questão regional, a Figura 1 indica a continuidade dos padrões de concentração na região sudeste e na região concentrada. A região Sudeste tem 1/3 de todas as ligações da rede de fluxos e transporta 66,3% de todos os passageiros das principais linhas de fluxos. A região centro-oeste confirma seu recente dinamismo associado à expansão da fronteira agrícola com o centro de gestão pública instalado em Brasília - DF, transportando 15,07 % de todos os passageiros da rede o aeroporto internacional Juscelino Kubistchek instalado na cidade torna-se o nó da região centro oeste que passa a ser hub de interligação territorial do Norte com a região Sudeste. As regiões Norte e Nordeste apresentam-se como as regiões rarefeitas do território, pois apesar de concentrarem quase 40% das ligações, elas transportam apenas 14% dos passageiros. O complexo formado pela região concentrada tem uma interligação densa, altamente fluída, oferecendo uma maior capacidade de interligação no território (Figura 2).
CENTRALIDADE DOS SISTEMAS FIXOS DE AEROPORTOS
A análise da evolução dos fluxos dos 20 principais aeroportos do Brasil reflete a centralização política, econômica e espacial dos sistemas técnicos. Acompanham também a rede de hierarquia de cidades e as reforça, sendo que apenas Campinas - SP, segundo o IBGE (2008), ocupa papel hierárquico mais elevado na rede de fluxos aeroviários que seu lugar na rede de cidades. A cidade de São Paulo - SP aparece como principal fluxo da rede com seus dois aeroportos (Guarulhos e Congonhas). Brasília - DF aparece em seguida, logo à frente do Rio de Janeiro.
A Figura 1 demonstra que a estrutura da rede aeroportuária acompanha a evolução da rede de cidades associada à centralidade da região concentrada. A organização da rede acompanha o padrão da divisão do trabalho e não apenas os desequilíbrios regionais. É a organização da divisão territorial do trabalho na formação socioespacial que determina os padrões de concentração.
São Paulo - SP, aparece como central no fluxo de passageiros por conta de sua função dentro da rede de cidades de centro de gestão de negócios e Brasília - DF aparece com rede de interligação aérea por ser centro de gestão administrativa (IBGE, 2008; IBGE, 2014; CORRÊA, 1977). Uma análise da evolução do setor demonstra que hoje o padrão da divisão territorial foi fruto de um processo histórico que dotou a região Sudeste dos maiores aportes de infraestruturas técnicas, vindo a conformar em conjunto com a região Sul e Centro-Oeste a região concentrada do território.5 Brasília - DF assume papel de destaque na rede, pois sua posição central no país organiza os fluxos com outras metrópoles polarizadas diretamente como Manaus - AM, Belém - PA, Fortaleza - CE, Recife - PE e Salvador - BA. Podemos dizer que Brasília assume o papel de “ponte” territorial dentro da região concentrada com as regiões Norte e Nordeste. Destaca-se que completam as interligações as capitais regionais de Campinas - SP, Florianópolis - SC, Natal - RN e Vitória - ES, que assumem importância por terem fluxos que variam entre 1 milhão e 5 milhões de passageiros, assumindo fluxos compatíveis com as metrópoles polarizadoras da rede.
A Figura 1 demonstra a evolução das ligações do sistema de movimento aeroviário em seus fluxos de passageiros desde a década de 1970 até a década de 2010. Nesta Figura, podemos notar que a densidade do sistema é presente com maior relevância na região concentrada do Brasil. A cidade de São Paulo - SP confirma sua centralidade e onipresença no território (SANTOS, 1990) desde a década de 1970. O Rio de Janeiro - RJ continua tendo a primazia de ligações com São Paulo - SP, mas chama a atenção o papel de Brasília - DF e de algumas das metrópoles do Nordeste. Nota-se que em 1972 a região Sudeste já alcança fluxos com mais de 3 milhões de passageiros. Em 1980 a sistema de movimento se amplia consideravelmente e já estabelece ligações com o norte e nordeste de mais de 50 mil passageiros, ganhando destaque a ligação Manaus - AM/Belém - PA que passam, em 1990, a formar bases de distribuição de pessoas na região norte. Nos anos 2000, destacam-se as ligações estabelecidas com densidade elevada na região concentrada no sentido centro-oeste e sul e por suas ligações altamente conectadas em todas as regiões em 2010.
Esses dados confirmam que a formação socioespacial brasileira é marcada pelas dinâmicas das redes que se conformaram em um território vasto, de integração heterogênea, distribuída em pontos de densidades e rarefações (SANTOS, 2008). Tais características conformam grandes desafios para o planejamento territorial,6 haja vista que a heterogeneidade territorial se conforma como entrave para a formação de um mercado nacional integrado, necessário ao desenvolvimento (BRANDÃO, 2007). As disparidades regionais em termos econômicos, sociais e técnicos são hoje a maior dificuldade imposta para planejamento abrangente que busque a integração territorial.
Essa dinâmica teve uma iniciativa de superação a partir da década de 1960 com as elaborações da teoria do subdesenvolvimento,7 que formulou uma integração a partir da conformação de redes técnicas no território, sejam elas de transporte de pessoas (com predominância do transporte rodoviário), de mercadorias, mas também - de forma complementar e cada vez mais intensa - de energia e informação. Esse processo teve ainda mais intensidade por conta da dinâmica cada vez mais veloz exigida pela acumulação flexível que colocou na linha de frente do processo de acumulação os transportes velozes, como o aeroviário e as redes de comunicação e organização das redes telemáticas.
O planejamento associado à necessária integração do território foi modulado nos governos Juscelino Kubitschek e João Goulart (1956 - 1964), mas foi, entretanto, aprofundado nos anos dos governos militares (1964 - 1988). Dessa maneira, buscaram uma integração de escoamento da base técnica localizada na área core do país, espraiada a partir do eixo litorâneo da região concentrada. O processo de um planejamento de substituição de importações apenas aprofundou essa tendência que diferenciou ainda mais as regiões mais consumidoras e mais produtoras à sua integração extravertida ao mercado global. A tecnificação do território (SANTOS, [1988] 2008; SANTOS; SILVEIRA, 2001) possibilita que a circulação (de transporte e informação) aconteça em todo o território, porém de forma fragmentada dotando lugares e regiões de densidades e rarefações em uma verdadeira geografia das redes (SANTOS, 1999).
A conexão dos fluxos, portanto, torna-se fundamental para a organização das empresas em um período de necessária atração de infraestruturas produtivas para o território. Porém, alguns impasses de infraestrutura devem ser transpostos, haja vista que a rede ferroviária torna-se obsoleta para a nova velocidade das empresas na produção, circulação e no uso do território. Assim, os investimentos em sistemas de transporte rodoviária e aeronáutico passam a zona de fronteira da expansão da circulação capitalista na formação socioespacial brasileira. Novos arranjos produtivos também expandem os sistemas de fluxos de energia elétrica; fixos e fluxos de diversas ordens se ampliam pelo território, porém ainda mantendo um padrão concentrado e desigual entre as regiões.
LÓGICA DE CONTROLE DAS INFORMAÇÕES POR NOVOS AGENTES CORPORATIVOS
O uso do território (SANTOS; SILVEIRA, 2001) se dá por meio do controle das técnicas e ações que operam sobre sua materialidade. A ascendência da informação e da técnica como novos motores do período constituíram um novo meio geográfico que se desenvolveu por meio de quantidades enormes de informações que qualificam seus usos: um meio técnico-científico-informacional (SANTOS, 1999). Estamos diante de um mundo em que a distribuição desigual de informação torna-se cada vez mais decisiva, tanto para o capital quanto para as lutas sociais; explodem na sociedade novas formas de mobilizações em que os usos de informações, por exemplo, por meio das redes sociais, têm servido aos movimentos de contestação sociais em suas lutas e conflitos cotidianos. A era da globalização revela na informação seu caráter contraditório de possibilidade, banalidade e organicidade (SANTOS, 2001).
Por isso é importante questionar quem controla a informação, quem a difunde, seus usos e seu papel na reestruturação da economia e do espaço. As redes de interconexões informacionais têm sido constantemente debatidas nos planos documentos de planejamento territorial, no entanto, poucas são as análises que conseguem sair do senso comum e depurar o que seria a informação e seu estatuto. Antes de investigar a questão, é necessário diferenciar a informação aqui analisada. Segundo Mattelart (1994), não se trata da informação banal, aquela a que todos têm, potencialmente, acesso ilimitado. Enfocamos a informação organizacional, a qual poucas empresas e poucos Estados acessam, exatamente por serem estratégicas à acumulação, ao poder e ao controle do uso do território. Portanto, para a organização do capital, é necessário o controle da informação como forma de organizar o poder no território. Para Santos (1999, p. 147),
Controle centralizado e organização hierárquica conduzem à instalação de estruturas inigualitárias, já que a informação essencial é exclusiva e apenas transita em circuitos restritos. Cerca de noventa por cento de todos os dados veiculados por meio de satélites o fazem entre grandes corporações e metade das mensagens transnacionais cabe dentro das redes de empresas multinacionais.
É inegável o papel cada vez mais presente da informação a partir da década de 1970, conforme assinalou Benko (1996), foi em busca de uma mais valia cada vez mais sequiosa de agilidade que no último quartel do século XX o capitalismo esteve marcado por uma ampla reestruturação da produção baseado nos sistemas informacionais. Grandes empresas de consultoria globais e de estratégias marcam o controle das atividades produtivas atuando em reorganizações de grandes empresas privadas e estruturas estatais.8
A iniciativa de transferência dos aeroportos brasileiros às corporações internacionais, portanto, foi dirigida por essas empresas. O relatório feito pela empresa global de Consultoria Mckinsey&Company (2010) foi a linha mestra do processo de concessão. Neste relatório a lógica global de concessão é incentivada e sugerida, o que é levado a cabo pelo Estado ignorando estudos anteriores que serviram apenas para legitimar a organização proposta pela empresa de consultoria.
Não é nova a iniciativa da passagem do controle das infraestruturas de transporte para as grandes corporações, desde o começo dos anos de 1990, com o advento do neoliberalismo, já havia a intenção de levar esse processo adiante. No entanto, a operacionalização da espoliação das infraestruturas de transporte não logrou êxito, pois foram priorizadas as infraestruturas de energia e comunicação. Somente a partir dos anos de 2000 é que vai se operacionalizar a transferência das infraestruturas de transporte como ferrovias, rodovias, portos e aeroportos. Esses sistemas passam, portanto, a linha de frente do processo de espoliação. Os preparativos para a transferência do sistema de movimento aeroviário começam com um processo de propagandear a INFRAERO como empresa de pouco eficiência diante da demanda crescente necessária ao crescimento econômico e melhoria da renda média da população. Com isso, o novo governo (Lula I, 2003 - 2006), a partir de 2003, passa a solicitar às empresas de consultoria e entidades estatais ligadas as forças armadas9 estudos para a concessão (Ver quadro 1).
Em 2003 é encomendado ao comando da aeronáutica um estudo que pudesse organizar o aparato regulatório para a privatização dos aeroportos. Nesse mesmo ano é publicado o estudo “Aeroportos e Privatizações: proposta de privatização aeroportuária para o Brasil”, o estudo objetiva em linhas muito claras “informar sobre o desenvolvimento do processo de privatização aeroportuária e sugerir opções de concessão que possam se adequar ao modelo de administração de aeroportos adotado no Brasil” (COMANDO DA AERONÁUTICA, 2003 p. 4). Esse documento é basilar, pois, segundo nossas pesquisas, esse documento vai orientar os passos que o governo dará para o início das concessões. Em 2005, por meio da Lei nº 11.182, é criada a Agência Nacional de Aviação Civil (ANAC).10 A nova Agência substituiu o Departamento de Aviação Civil (DAC)11 como autoridade de aviação civil e assumiu o papel de regulador do transporte aéreo no país. Suas atribuições são regular e fiscalizar as atividades de aviação civil e de infraestrutura aeronáutica e aeroportuária, tais agências, como demonstra Antas Jr. (2005), cumprem o papel de legitimar as privatizações como parte do Estado em uma suposta fiscalização que aos poucos se moldam as empresas em uma regulação híbrida dos processos. Nesse mesmo sentido é que a ANAC cumpriu o papel de organizar a estrutura normativa para a concessão do setor seguindo as diretrizes já apontadas. Em 2008, a ANAC publica o documento “Relatório de desempenho regulatório 2008”. Nesse primeiro documento a ANAC aponta as linhas gerais do processo de concessão primeiramente apontado críticas ao setor como ineficiente e sugerindo a concessão como saída para o bem funcionamento do sistema:
O ano que passou foi marcado pelo esforço da ANAC - integrada a todos os órgãos do Sistema de Aviação Civil do Brasil - para normalizar as operações da aviação regular, após os momentos críticos de 2006 e 2007, e ao mesmo tempo criar novos paradigmas que permitissem à sociedade e aos agentes sociais recuperarem a confiança na aviação como peça fundamental para o desenvolvimento econômico e a integração nacional” (…) “Nesse sentido, a ANAC desenvolveu uma série de iniciativas: a elaboração de medidas para retirar restrições não-operacionais em aeroportos centrais; a criação de regra de entrada em aeroportos com limitação de novos voos; a liberação das tarifas internacionais; e a preparação de um marco regulatório para a concessão dos aeroportos brasileiros à iniciativa privada (ANAC, 2008).
Em 2008 é feito o estudo “projetos do setor de transporte Aéreo e Concessão de Aeroportos”; feito pela equipe do BNDES este estudo busca legitimar as futuras intervenções do banco no processo de concessão dos aeroportos. Em 2009 é criado o CONAC - Conselho de Aviação Civil, órgão de assessoramento do presidente responsável por propor uma política nacional de aviação civil. Este conselho teve o papel de encaminhar as propostas de concessão à presidência. No mesmo ano é encomendado pela ANAC, por meios do Projeto BRA/01/801 - ICAO - ANAC o “Estudo Econômico sobre regulação e concorrência do setor de aeroportos”. O estudo, mais denso que os anteriores, organiza uma revisão completa da privatização e pela primeira vez adota o conceito de concessão como o melhor modelo para o Brasil. Abaixo organizamos um quadro com os estudos que indicam o processo de transferência do setor as corporações.
Chama a atenção que todos esses estudos foram praticamente ignorados no processo final, no qual sobressaiu o Estudo da Mckinsey&Company. Ao nosso entender isso se deu pela necessidade de legitimar internacionalmente a concessão, já que o órgão referido não dispõe do mesmo know how corporativo das grandes empresas de consultoria. Além disso, o que se nota em todos os relatórios é o incentivo a espoliação do sistema diante de um possível gargalo, legitimado segundo o argumento da realização de grandes eventos e a crescente demanda.
ESPOLIAÇÃO CORPORATIVA E O SISTEMA DE MOVIMENTO AEROVIÁRIO
O modelo utilizado para as concessões foi um aprimoramento dos processos de espoliação do período anterior. Para mover o aparato, algumas experiências foram feitas com a concessão do Aeroporto de São Gonçalo do Amarante - RN.
A primeira experiência foi designar um modelo de concessão. O modelo designava uma série de pressupostos corporativos, entre eles a da responsabilidade de operações e transferência para o Estado após o período de concessão, no caso do Aeroporto de São Gonçalo, 38 anos de concessão. Outra experiência feita com o aeroporto, foi a composição da operadora de aeroportos Inframérica, composta pela associação do grupo brasileiro Engevix e o grupo argentino Corporacíon América. Essa operadora, depois de sua primeira experiência em São Gonçalo, arrematou o Aeroporto Internacional de Brasília por R$ 4,5 bilhões. Utilizando-se do modelo normativo outras duas rodadas de concessões foram realizadas com o acréscimo de que 49% das ações dos aeroportos concedidos deveriam ficar em poder da INFRAERO. Tudo indica que a participação estatal deu-se de maneira a garantir que não apenas os consórcios ficariam responsáveis pelo investimento, mas também o Estado assumiria boa parte das adequações de infraestruturas.
Na primeira rodada de concessões, os aeroportos de Guarulhos - SP, Brasília -DF e Campinas - SP foram arrematados pelos montantes de R$ 16,21 bilhões, R$ 4,51 bilhões e R$ 3,82 bilhões, respectivamente. Contando com os investimentos imediatos, a INFRAERO assumiu o montante de investimentos de R$ 1,48 bilhões em Guarulhos - SP, R$ 180 milhões em Brasília - DF e surpreendentes R$ 6,46 bilhões em Campinas - SP. A segunda rodada de concessões mantém, no Aeroporto de Belo Horizonte, o mesmo padrão, no qual o arremate do aeroporto foi de R$ 1,8 bilhões e o investimento da INFRAERO de R$ 3,31 bilhões. Ressalta-se que o edital da concessão do Aeroporto do Rio de Janeiro opera uma mudança na medida em que nesse aeroporto o montante declarado de investimento é menor do que o valor do leilão, sendo que não há especificações imediatas de investimentos. Para esse aeroporto, os números são de R$ 19 bilhões de leilão e R$ 12,43 bilhões de investimento.12
O resultado final das concessões, segundo os dados dos editais sistematizados no quadro 2, nos dão valor de R$ 45 bilhões de arrecadação ao Estado. Entretanto deve-se considerar que boa parte desse investimento foi assegurado nos próprios editais com financiamento do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES).13
Esses números chamam a atenção, primeiro porque os investimentos são projetados a partir de um aumento no fluxo que pode não se realizar, no entanto, esse foi um dos critérios para decidir o grupo que ganharia a concessão dos aeroportos em questão. Em segundo lugar, o valor pago para a concessão, contraditoriamente, também vai depender da renda destinada pelos fluxos de passageiros, podendo não ser pago se esse fluxo não se confirmar. É o que prevê o edital das concessões, pois as quantias aqui descritas serão pagas em prestações, a juros baixos financiado pelo BNDES a depender da demanda dos lucros gerados nos aeroportos: “o valor da Concessão será pago em parcelas anuais, contado da data e eficácia do contrato de concessão até o advento de seu prazo final” (ANAC, 2011 p. 27).
Outro sinônimo da lógica corporativa aplicada ao território, é a participação de empresas estrangeiras na concessão dos aeroportos. Participarão do leilão, nos termos do edital de concessão, pessoas jurídicas brasileiras ou estrangeiras, entidades de previdência complementar e fundos de investimento, isoladamente ou em Consórcio. O edital, portanto, praticamente obriga que os consórcios que disputarão a licitação tenham um sócio estrangeiro. Isso, porque, segundo o edital, pelo menos um dos parceiros deve ter experiência na administração de aeroporto com movimento superior a cinco milhões de passageiros por ano, o que não gabarita nenhuma empresa brasileira. Interessante notar que apenas a INFRAERO tem o número de operações e requisitos para administrar os aeroportos, nesse caso a questão da concessão também aparece de forma contraditória.14
Chamamos a atenção para o papel desempenhado pelo Banco Nacional de desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) nesse processo, pois esse banco revela a lógica do Estado brasileiro para com as empresas estatais do país. No histórico do processo de desestatização brasileiro, o BNDES liberou recursos para financiar a privatização dos aparatos públicos para empresas, cumprindo papel de catalizador das ações extravertidas, já que em inúmeros casos se tratou de empresas estrangeiras. Em suma, tratou-se de assumir os riscos do não pagamento às custas dos fundos trabalhistas que compões as reservas do banco.15
A decorrência desse processo para a interligação regional poderá, em breve, ter efeitos danosos para a rede de aeroportos, já que o sistema funciona com subsídios cruzados: os aeroportos de lucratividade sustentam aqueles que operam sem lucro. Os aeroportos espoliados correspondem a 88% da lucratividade da INFRAERO. Como forma de neutralizar essa possível desestruturação, foi criado o Fundo Nacional de Aviação Civil (FNAC) responsável por arrecadar entre 5% e 10% dos lucros dos consórcios em outorga. Entretanto, o edital não especifica a arrecadação em caso de prejuízo.
Uma última relação do conteúdo discutido com a pesquisa merece ser destacada de forma introdutória. O controle desse sistema é fundamental para as estratégias de planejamento territorial, tanto por seu aspecto de controle circulatório quanto por seu potencial de interligação regional. Trata-se, no Brasil, de um dos maiores sistemas de engenharia em poder público, com uma grande rede dispersa no território e com os principais aeroportos centralizados e operados pelo Estado, via INFRAERO. Destaca-se que, ainda que o serviço de transporte seja efetivado exclusivamente por empresas privadas, estas são submetidas à regulação e fiscalização estatal pela Agência Nacional de Aviação Civil (ANAC) e pelo Departamento de Controle do Espaço Aéreo (DECEA). Seu crescente posicionamento estratégico diante da nova configuração territorial da organização produtiva colocou a rede de aeroportos no centro dos processos de espoliação do território desencadeados a partir da década de 1990.
Opondo-se ao papel da década de 1970, na década de 1990 o Estado foi responsável pela privatização dos mesmos aparatos que havia consolidado em seu controle nas décadas precedentes. Nesse processo, diversas empresas estatais passam à administração privada de grandes corporações por meio das privatizações, são os casos do sistema elétrico, mineração e etc. Os sistemas de movimento, no entanto, por seu alto custo de investimento, não entram nas estratégias corporativas do momento. Outrossim, passam a ser preparados para esse processo futuro - sustentando o que observa Harvey (2004; [1982] 2013) e Moraes (2000) sobre a espoliação de fundos territoriais na plataforma de espoliação permanente que se tornou o território nacional (BRANDÃO, 2007). Mantendo o padrão de subdesenvolvimento, contando com reservas territoriais de infraestruturas estatais, a formação socioespacial brasileira tornar-se-á lócus privilegiado para as estratégias de ajuste espacial do grande capital. Esse processo tomará feições ainda mais modernas por meio de novas formas normativas e regulatórias que são elaboradas e reorganizadas a partir dos anos 2000, com as parcerias público-privadas e as concessões.
O levantamento feito para este trabalho mostra que as concessões dos aeroportos têm a extensão de todo o território. Observa-se na Figura 2 que dos 879 pares de ligações origem-destino da rede de fluxos do sistema do movimento que transportam um total de 72 milhões de passageiros, foram espoliados, via concessão, 67 pares de ligações referentes a São Paulo - SP que transporta 32 milhões de passageiros; 56 pares de ligações referentes ao Rio de Janeiro -RJ que transportam 11 milhões de passageiros; 52 pares de ligações referentes a Belo Horizonte - MG que transportam 2,5 milhões de passageiros; 50 pares de ligações referentes a Brasília - DF que transportam 9,4 milhões de passageiros; 26 pares de ligações referentes a Campinas - SP que transportam 1,2 milhões de passageiros e 14 pares de ligações referentes à Natal - RN que transportam 60 mil passageiros. Temos, portanto, que cerca de 57 milhões de passageiros são transportados tendo como origem os aeroportos concedidos, ou seja, cerca de 80% dos passageiros transportados.
A análise da Figura 2 de ligações aéreas indica também a quantidade de linhas de interligação que agora são espoliadas nas concessões, demonstrando que as extensões dos fluxos espoliados abarcam toda a rede a partir dos principais centros da região concentrada do território.
A análise da densidade de passageiros embarcados nos aeroportos demonstra a rede espoliada por meio da capacidade dos fixos. A região sudeste concentra os maiores índices de embarques em seus principais aeroportos, que chegaram a embarcar mais de 60 milhões de passageiros em 2015. Destacamos em roxo na Figura 2 as densidades dos aeroportos espoliados pelo processo de concessão. Pode-se observar que os maiores aeroportos foram espoliados e estão hoje sob o domínio dos grandes consórcios formados por gigantescos agentes corporativos como fundos financeiros, corporações nacionais e internacionais.16
Os investimentos exigidos das corporações nos aeroportos concedidos tendem a abrir mais possibilidades de fluxos que são ocupados pelas empresas aéreas já operantes nestas localidades. Dessa maneira, as empresas abandonam aqueles fluxos que estão fora da rede mais densa, fazendo com que em curto prazo cresçam os fluxos da rede. No médio prazo, a decorrência é o corte das linhas com menores capacidades, localizadas nos aeroportos que não foram concedidos; o que pode se agravar caso não haja o pagamento das outorgas17 que constituem a possibilidade de investimento nos aeroportos de menores fluxos. Assim, promove-se ainda mais a desintegração territorial em favor de uma reconcentração regional dos fluxos que, como vimos na operação sediada pela INFRAERO, foi crescente.
O que vimos até agora sobre o planejamento corporativo com seu inerente processo de espoliação parece comprovar a tese de Cano (1997) de uma reconcentração espacial na região sudeste e, acrescentamos, em toda a região concentrada.
a manter-se o neoliberalismo e introjetarmos doses significativas de “modernização” (novos processos ou setores mais complexos, com tecnologia mais sofisticadas) haverá uma reconcentração espacial (em SP e adjacências) produtiva, em detrimento da periferia nacional, pois aquela modernidade, como é sabido, não pode localizar-se em qualquer tipo de espaço econômico, mas tão somente naqueles que possuem condições especiais de recepção de mais modernidades (CANO, 1997 p. 104).
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A intensa espoliação a que estão submetidos o Estado nacional e as cidades brasileiras levam à paralisia de qualquer tentativa de planejamento que não opere conforme os desígnios das grandes corporações. Trata-se agora, apenas, do planejamento corporativo. Essa política de ajuste neoliberal de abertura às grandes corporações, privatizações e concessões, agudizam ainda mais as disparidades regionais e sociais da formação socioespacial brasileira. Assim, com a abertura às empresas, a reestruturação organizacional e a busca insana por superar as deficiências territoriais, em termos de fluxos e logísticas, o território tem sido marcado por uma reconcentração nos espaços já privilegiados do território.
O Planejamento corporativo, portanto, pode ser identificado por seu carácter de reconcentração regional na formação socioespacial brasileira. As concessões promovem um processo de sucessivos arranjos para a realização da acumulação capitalista em novos espaços, conformando um território da espoliação nas áreas em que a localização promove mais lucratividade as atividades aeroportuárias. Podemos, assim, classificar o território brasileiro como um espaço de coexistências de formas renovadas de espoliação por meio do processo de concessões. Os resultados obtidos mostram que houve um crescimento vertiginoso do fluxo de passageiros entre 1972 e 2010. Destaca-se que esse fluxo foi acompanhado por um adensamento de aeroportos e de malhas de conexões, consolidando uma rede nacional dispersa, no entanto concentrada na região sul/sudeste. Observado o padrão topológico da rede, é sustentável a hipótese da rede de aeroportos ser hoje umas das principais linhas de interligação de mercadorias de alto valor agregado e transporte de altos executivos entre as cidades polarizadoras da rede urbana (CORRÊA, 1977) justificando sua importância para o planejamento territorial.
No período desenvolvimentista, a integração produtiva e territorial do país foi organizada por investimentos estatais em infraestruturas de circulação que pudessem articular a rede de cidades, de maneira a atender a integração funcional dos centros urbanos no sentido da dinamização de um mercado interno ancorado em novos objetos técnicos designados a integração do território nacional. Seu posterior processo de concessão também revela um novo padrão de articulação territorial e inserção na economia internacional, posto que, como destaca Vainer (2007), o Estado se retira dos setores de infraestrutura que ajudaram a consolidar no período desenvolvimentista, entregando, assim, também o planejamento territorial aos interesses extravertidos das grandes corporações.
Portanto, o grande investimento inicial em planejamento foi feito por meio das empresas estatais de infraestrutura. Com a espoliação desses sistemas o planejamento passa a ser feito pelos agentes do capital. Tratam-se de grandes organizações que redefinem as ações nos territórios por meio de modelos de gestão corporativas, difundidos mundialmente por empresas vinculadas à ordem global do processo de acumulação espoliativa. Um uso corporativo do território ganha contornos de um planejamento corporativo. Com isso, aprofundam o padrão assimétrico e concentrado da formação socioespacial brasileira, revelando que, em última instância, o planejamento corporativo aprofunda as desigualdades da divisão regional e territorial do trabalho, impulsionando a continuidade de um planejamento da pobreza (SANTOS, 2007).
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A acumulação flexível/Just in time foi o modo de produção que substituiu o modo de produção fordista. Caraterizado como flexível, esse modo de produção organiza os processos de produção, circulação e consumo de forma toyotista, flexibilizando as relações de trabalho e fragmentando o espaço em circuitos espaciais produtivos em escala mundial.
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Historicamente os padrões econômicos e sociais se delineiam de forma tal que determinam como os objetos técnicos se dispunham em determinada nação. Lênin (1982), havia identificado esse processo chamado de Formação Econômica e Social, já Santos (1977) identificou essa formação econômica, social acrescentando seus condicionantes espaciais, cunhando com isso o conceito de Formação Socioespacial. Portanto, o que se deve entender como formação socioespacial é a diferença econômica, social e espacial entre as diversas nações dentro de um capitalismo organizado de forma desigual e combinada. O conceito aqui ganha uma força crucial para a análise geográfica. Trata-se, como explicita Corrêa (2000, p. 123), de “um esforço teórico visando explicitar as especificidades com que um dado modo de produção concretamente se manifesta. Definido por meio de características principais, invariantes, um dado modo de produção concretiza-se em diversas formações econômico-sociais”.
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Este trabalho assume a desintegração territorial como uma hipótese do processo em curso na formação socioespacial brasileira.
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Hubs são os aeroportos com maiores quantidades de fluxos.
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Essa denominação - Região Concentrada - foi introduzida na literatura geográfica com as pesquisas dirigidas por Milton Santos e Ana Clara Torres Ribeiro em 1979. Essa região é constituída pelos estados do Rio de Janeiro, Espírito Santo, Minas Gerais, São Paulo, Paraná, Santa Catarina, Rio Grande do Sul e pedaços do Centro-Oeste. Sua gênese deve-se a consolidação da base técnica, presente nessas regiões, provenientes, sobretudo, da economia cafeeira e do investimento do Estado em infraestruturas às empresas, sobretudo na região circunvizinha a São Paulo e ao incremente de objetos técnicos informacionais. Uma densidade demográfica, por sua vez, impulsiona também a divisão do trabalho e a especialização dessas áreas, que concentram cada vez mais incrementos materiais e imateriais à produção globalizada.
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Entendemos por planejamento territorial a prática conflitual de ordenar a política, a economia e o território tendo em vista um projeto de futuro relacionado a construção da nação. Desse ponto de vista não propomos entender o planejamento territorial como um modelo, outrossim, propomos, concordando com Oliveira (1987) e Santos (2007), entender o planejamento territorial como a manifestação espacializada dos conflitos dentro das arenas de disputas entre as classes sociais, corporações e Estado.
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O esforço sobre o debate nacional e a síntese de projetos nacionais que pudessem superar o subdesenvolvimento foi empreendido por inúmeros intelectuais latino-americanos e brasileiros. Esses últimos mereceram destaque e, dentre eles, as elaborações de Furtado ([1959] 1982), Prado Jr (1966) e Fernandes ([1975] 2006) nos parece representativas desse esforço. Partindo de matrizes metodológicas e categorias de análises distintas, esses autores, cada qual em seu tempo, buscaram orientar uma explicação para os problemas nacionais relacionando as mudanças do capitalismo mundial com o papel desempenhado pelos países subdesenvolvidos na divisão internacional do trabalho e, guardadas as diferenças entre eles, podemos dizer que tinham o objetivo comum de superação da condição de subdesenvolvimento e dependência.
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Tratam-se de empresas de consultoria que ficaram conhecidas como “big four” por controlarem o mercado de consultoria e auditoria no mundo: Pwc, Delloite, E&Y e KPMG. Além dessas empresas estão empresas conhecidas como consultorias de estratégia. Estas lidam com informações de mais alto nível de interações atuando em empresas de capital fechado que entram em setores com grandes fusões acopladas ao mercado financeiro, figuram como principais empresas a Mckinsey&Company, Bain e DBO.
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A relação do setor com as forças armadas no processo de concessão ainda precisa ser melhor investigada, haja vista que antes da concessão eram os aeroportos peças fundamentais do setor militar. Os principais quadros de rede de gerenciamento de tráfego aéreo passam por escolas e cursos oferecidos pela aeronáutica.
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O complexo de transformações desencadeadas pela criação do Plano Nacional de Desestatização (PND) quando aplicadas aos diversos setores, implicou a criação de mais normas orientadas a reger as relações entre as corporações e destas com o território. Para Antas Jr. (2005, p. 193) é “nesse universo de mudança de papéis e emergência de novos agentes, as agências de regulação começam a ser criadas”. A criação de diversas agências nacionais de regulação se apresentam como portadoras da nova racionalidade corporativa no território organizando os processos de privatizações e concessões.
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O DAC foi um departamento integrante da estrutura administrativa do Ministério da Aeronáutica até 1999.
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Inventário completo das concessões e a fonte dos dados encontram-se sistematizados no quadro 2 desta publicação.
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“De cada R$ 100 investidos, R$ 70 virão do BNDES e de outras fontes de financiamento e R$ 30 dos sócios. Dos R$ 30,0, ainda R$ 14,7 virão da Infraero (...) ” (Secretário de aviação civil da Presidente da República. Valor Econômico, 20/10/2011)
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É importante destacar que não propomos analisar nesse trabalho a conformação dos grupos que passaram a administrar os aeroportos concedidos. Entretanto a análise do quadro 2 demonstra que os ramos das empresas concessionárias são dos mais diversos. Entre elas, encontram-se empresas administradoras de aeroportos, corporações de produtos alimentícios e fundos de pensões públicos e privados.
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Fundos de recursos do BNDES: FAT - Fundo de Amparo ao Trabalhador; FGE - Funde de Garantia à Exportação; PIS- Programa de Integração Social; PASEP - Programa de Patrimônio do Servidor Público.
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O aeroporto de Guarulhos/SP é o caso exemplar. O maior aeroporto do país foi arrematado para o consórcio Invepar que tem como participantes o fundo de pensão do Banco do Brasil (PREVI), o fundo de pensão da Petrobrás (PETROS), o fundo de pensão da Nossa Caixa (FUNCEF), a empreiteira OAS Engenharia e a companhia internacional Airports Company South África SOC Limited - que opera de forma privada nove aeroportos internacionais, entre eles o ultra moderno aeroporto de Mumbai.
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As outorgas são prestações anuais que as empresas são obrigadas a repassar ao governo pelos contratos de privatização. A hipótese levantada tornou-se fato concreto com a publicação da Medida Provisória 779/2017, que permite às concessionárias de aeroportos pedirem a reprogramação do pagamento das outorgas.
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Datas de Publicação
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Publicação nesta coleção
2018
Histórico
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Recebido
10 Nov 2017 -
Aceito
08 Jan 2018