Open-access Características e atributos de Latossolos sob diferentes usos na região Oeste do Estado da Bahia

Characteristics and attributes of Oxisols under different land uses in the western region of the state of Bahia, Brazil

Resumo

O objetivo deste trabalho foi avaliar os efeitos de diferentes usos da terra nas características e nos atributos de Latossolos da região Oeste do Estado da Bahia. Os Latossolos apresentavam texturas com fração areia amplamente predominante, e foram avaliados em áreas de cerrado, algodão, soja e feijão, no Município de Luís Eduardo Magalhães. A caracterização morfológica e a coleta de amostras de solos para avaliação dos atributos físicos e químicos por horizontes foram feitas em minitrincheiras, enquanto a avaliação da condutividade hidráulica saturada foi feita com permeâmetro de Guelph em duas profundidades: 0,0-0,20 e 0,20-0,40 m. Os Latossolos avaliados, além de uma estrutura maciça, apresentaram horizonte genético adensado, que, sob uso agrícola, torna-se mais compactado, espesso e superficial, e forma torrões quando revolvido. O uso agrícola reduz a condutividade hidráulica saturada dos Latossolos avaliados nas duas camadas, com exceção do cultivo de feijão.

Termos para indexação: Cerrado; camada adensada; compactação de solo; condutividade hidráulica saturada; permeâmetro de Guelph; solos leves

Abstract

The objective of this work was to evaluate the effects of different land uses on the characteristics and attributes of Oxisols in the western region of the state of Bahia, Brazil. The Oxisols had textures with largely predominant sand fraction, and they were evaluated in areas of cerrado, cotton, soybean, and common bean in the municipality of Luís Eduardo Magalhães. The morphological characterization and the collection of samples for evaluating soil physical and chemical attributes of horizons were carried out in small trenches, while the evaluation of field saturated hydraulic conductivity was done using the Guelph permeameter at two depths: 0.0 to 0.20 and 0.20 to 0.40 m. The evaluated Oxisols, besides their massive structure, showed a dense genetic horizon, which, under agricultural use, becomes more compacted, thick, and shallow, forming clods when plowed. Agricultural use reduces the saturated hydraulic conductivity of the evaluated Oxisols in both layers, except for common bean cultivation.

Index terms: Cerrado; dense layer; soil compaction; field saturated hydraulic conductivity; Guelph permeameter; light soils

Introdução

A região Oeste do Estado da Bahia presencia expansão agropecuária e intensificação do uso do solo para o cultivo de grãos, fibras, materiais energéticos, culturas perenes e a agricultura irrigada. A produção agropecuária na região registrou aumento de 70% em razão do avanço da fronteira agrícola nos últimos dez anos. Na safra de 2013/2014, a área cultivada foi em torno de 2,3 milhões de hectares, com produção agrícola de 7,5 milhões de toneladas, principalmente com os cultivos de soja, algodão, milho e feijão, além da expansão da cafeicultura, plantios de florestas e pastagens (Aiba, 2014).

O relevo, de plano a suave ondulado, os solos responsivos as práticas agrícolas e a boa produtividade das culturas sob agricultura intensiva e convencional estão entre os fatores favoráveis a essa expansão do cultivo na região. O preparo periódico do solo é feito com o uso de grades pesadas, arados, escarificadores ou subsoladores e grade niveladora. Em menor escala, há também sistemas com preparo do solo menos intenso, como na integração lavoura-pecuária e no plantio direto, os quais têm sido fomentados por instituições de pesquisa e políticas de estímulo.

A intensificação do uso dos solos nos sistemas agrícolas comumente tem efeito sobre suas características e atributos químicos e físicos, com aparecimento de camadas compactadas limitantes ao desenvolvimento radicular e redução nas taxas de infiltração de água, na aeração e na permeabilidade dos solos. A redução nos espaços entre partículas aumenta a coesão do solo e dificulta seu preparo.

Além disso, tem-se constatado na região, especialmente no Município de Luís Eduardo Magalhães, a presença de uma camada adensada ou compactada, de aspecto maciço coerente, na parte superficial de solos sob cultivo agrícola. Esta camada, ao ser revolvida, aflora na forma de grandes blocos, ou "torrões", que dificultam a realização das operações agrícolas. Ainda são escassas as avaliações dos solos dessa região com a presença das camadas adensadas e entre esses destaca-se Sá et al. (2007) e Marchão et al. (2008). Dessa forma, estudos da estrutura do solo e da transmissão de água entre as camadas do solo podem fornecer informações importantes sobre a origem, distribuição espacial, espessura e profundidade dessas camadas adensadas. Além disso, é importante que se avalie o efeito dos diferentes usos do solo sobre a ocorrência dessas camadas e sobre os atributos físicos e químicos dos solos da região.

O objetivo deste trabalho foi avaliar os efeitos de diferentes usos da terra nas características e atributos de Latossolos no Município de Luís Eduardo Magalhães, no Oeste Baiano.

Material e Métodos

As avaliações foram realizadas no Município de Luís Eduardo Magalhães, na região Oeste do Estado da Bahia (Figura 1). A região apresenta topografia de plataforma aplainada, com as altitudes entre 700 e 900 m, o relevo plano a suave ondulado, vegetação original de cerrado subcaducifólio (Cerrado "stricto sensu") e formação geológica predominante de arenitos da Formação Urucuia (Levantamento..., 1976). O clima apresenta duas estações climáticas bem definidas: a estação seca e fria, de maio a setembro; e a estação chuvosa e quente, de outubro a abril. As temperaturas médias mínimas e máximas variam entre 20 e 26ºC. A precipitação pluvial anual está entre 1.400 e 1.600 mm, concentrada entre os meses de novembro e março (Batistella et al., 2002).

Figura 1
Localização dos pontos estudados no Município de Luís Eduardo Magalhães, Bahia.

Foram selecionadas duas áreas sob cerrado para representar a linha de base dos diferentes atributos em estudo, e três outras áreas sob cultivo: uma com algodão sob cultivo convencional; outra com feijão, sob cultivo convencional irrigado por pivô central; e uma última com soja, sob plantio direto. Esses cultivos podem ser considerados os mais comuns sobre Latossolos que têm o cerrado como vegetação original, na região estudada.

Nas áreas de algodão e feijão, as práticas de preparo do solo adotadas foram: gradagem pesada - que serviu como aração - e leve - para nivelamento e destorroamento do solo - ; escarificação; e semeadura. A aplicação de corretivos era feita a cada dois anos, com aplicação anual de fertilizantes, espalhados sobre a superfície do solo e em cobertura, bem como por meio de pulverizações. Essas operações eram feitas com máquinas agrícolas pesadas, que trafegavam nas entrelinhas sem controle de tráfego. Na área com algodão, ocorreram variações quanto ao uso de trituradores da parte aérea e ao arranque da soca, e o uso do correntão como nivelador, antes da semeadura, era comum. Nesta área, efetuou-se também o cultivo de uma safra de soja, em 2009/2010.

Na área com soja, cobertura do solo antes do plantio era feita pela vegetação espontânea de timbête, ou capim carrapicho (Cenchrus echinatus), a qual era dessecada antes da semeadura direta sobre a palhada. Este sistema, sem o revolvimento do solo, foi utilizado nos últimos 14 anos, sempre com plantio de soja em semeadura direta, e com apenas dois cultivos de milho nesse período.

As áreas selecionadas eram de Latossolos com predomínio da fração areia na composição granulométrica. A coleta das amostras e as descrições dos solos foram feitas em cada área, em três minitrincheiras de 0,80 m de profundidade. Os horizontes do solo foram separados quanto às características morfológicas, como tipo de estrutura e consistência do solo seco e úmido (Santos et al., 2013a). As minitrincheiras foram distribuídas nas áreas de cultivo e nas áreas de cerrado preservado.

Foram avaliados os seguintes atributos químicos e físicos do solo: pH em água, cátions trocáveis (Ca2++ Mg2+, Al3+), capacidade de troca catiônica (CTC), carbono orgânico (Corg), ADA, GF, AF, AG, AG/AF, Ds, VTP análise granulométrica e argila dispersa em água (ADA) (Donagema et al., 2011). Foram calculados o grau de floculação das argilas (GF) e a relação entre areia grossa (AG) e areia fina (AG/AF). Os valores de densidade do solo foram obtidos em amostras indeformadas após coleta em duplicata, em cada horizonte, com anéis de 100 cm3, tendo-se então estimado o volume total de poros (Donagema et al., 2011). Os solos foram classificados segundo o Sistema Brasileiro de Classificação de Solos (Santos et al., 2013b).

As determinações da condutividade hidráulica saturada (Kfs) foram feitas com o permeâmetro de Guelph, com poços escavados nas camadas de 0,0-0,20 e 0,20-0,40 m de profundidade, conforme a seguinte equação (Soil Moisture, 2012):

em que Kfs é a condutividade hidráulica saturada no campo (cm s-1); Q é o valor do fluxo no reservatório (cm s-1); C é um fator adimensional que depende da estrutura do solo, que, neste estudo, teve o valor 3,0 (Reynolds et al., 2002);H é a carga hidráulica estabelecida no poço de avaliação (cm); e a* é o raio dos poços (capilaridade macroscópica), que tinham o diâmetro de 5 cm.

Os dados de Kfs apresentaram distribuição log normal e foram transformados pela extração do logaritmo dos valores, adicionados de uma unidade. A apresentação da estatística descritiva dos valores de Kfs avaliados nos diferentes sistemas e camadas foi feita com o uso de gráficos "boxplot". Os dados de Kfs, após transformação, foram comparados estatisticamente em cada camada, nos diferentes usos, por meio da análise de variância e do teste de comparação de médias HSD Tukey, a 5% de probabilidade. As análises foram realizadas no Programa R 3.12 (R Core Team, 2015). Foram apresentados os dados originais de Kfs, para permitir a comparação com avaliações de Kfs feitas em outros estudos.

Resultados e Discussão

Os solos das áreas estudadas foram classificados como Latossolos Vermelhos, Vermelho-Amarelos e Amarelos, todos distróficos. De maneira geral, as áreas apresentaram atributos físicos e químicos semelhantes, com exceção da área sob cultivo de feijão, que se distinguiu das demais principalmente quanto à composição granulométrica, teores de carbono orgânico (Corg) e capacidade de troca catiônica (CTC) (Tabela 1).

Tabela 1
Atributos químicos e físicos dos horizontes dos Latossolos avaliados sob diferentes usos em Luís Eduardo Magalhães, Bahia(1) (1) AG, areia grossa; AF, areia fina; GF, grau de floculação; CTC, capacidade de troca catiônica a pH 7,0; e Corg, carbono orgânico. .

Os solos apresentaram predomínio da fração areia na composição granulométrica, com os teores de 643 a 883 g kg-1. A participação dessa fração, no entanto, diminuiu em profundidade, com aumento gradativo da fração argila (Tabela 1). Os teores de areia grossa foram ligeiramente superiores aos de areia fina, tendo-se observado relação areia grossa/areia fina (AG/AF) com valores superiores a 1,09, exceto no cerrado (P5), onde essa relação esteve em torno de 1,00 no horizonte BA (0,33 m de profundidade). Os teores de silte foram os de menor expressão em todos os solos estudados, indício de material de origem mais arenoso - no caso, os arenitos da Formação Urucuia (Levantamento..., 1976) - e de elevada taxa de intemperismo durante a gênese desses solos.

O grau de floculação (GF) variou entre 11 e 29% nos horizontes mais superficiais (até 0,15 m), com ligeiro decréscimo, com valores entre 8 e 17%, nos horizontes imediatamente abaixo e geralmente transicionais AB ou BA. Nos horizontes subsuperficiais, os valores de GF foram de duas a quatro vezes (GF entre 60 e 100%) maiores que nos horizontes superficiais (Tabela 1). Vários fatores podem estar relacionados ao grau de floculação das amostras de solo, especialmente o pH e o teor de matéria orgânica e de cátions no complexo sortivo do solo; mas chama atenção a ausência de floculação das amostras superficiais nas áreas sob feijão e pivô, com consequente alteração na estrutura do solo, em comparação ao cerrado nativo.

As alterações nos atributos químicos decorrentes das aplicações de calcário e fertilizantes nos horizontes superficiais foram as mais destacadas, nos diferentes sistemas de uso do solo. Nos solos sob cerrado, destacam-se os baixos valores de pH e de Ca2+ + Mg2+ e altos valores de Al3+ (Tabela 1), enquanto, nas áreas sob cultivo, os valores de pH estiveram próximos da neutralidade, associados a maiores teores de Ca2+ + Mg2+ e menores de Al3+. Independentemente do uso, todos os atributos apresentam tendência de diminuição em profundidade, exceto para o pH no solo sob cerrado. Também ficou evidente a concentração do efeito da calagem em superfície, nas áreas de plantio direto, e da distribuição mais homogênea de Ca2+ + Mg2+ no solo sob feijão irrigado.

Os teores de Corg variaram entre 9,6 e 12,8 g kg-1 nos horizontes mais superficiais e seguiram a tendência de diminuírem em profundidade, em todos os usos estudados (Tabela 1). Comparando os diferentes usos às áreas de referência, não é possível observar grandes diferenças nos teores de Corg do solo em virtude da textura predominantemente arenosa desses Latossolos, que deixa a matéria orgânica naturalmente exposta a decomposição (Zinn et al., 2002; Fialho & Zinn, 2014). De maneira geral, os teores do Corg estiveram diretamente correlacionados com a CTC, independentemente dos usos e das profundidades avaliadas.

A área com cultivo de feijão apresentou os menores teores de argila, com textura arenosa/média leve, o que destaca o atributo diferencial ''psamítico'' na classificação do solo. O GF nessa área foi nulo, tanto nos horizontes superficiais quanto nos intermediários, com exceção do horizonte Bw1, que apresentou GF de 67% e teores de Corg inferiores aos das demais áreas (3,6 g kg-1) (Tabela 1). Associado a essa textura mais grosseira, o uso intensivo de fertilizantes e corretivos, bem como o de irrigação, apresentam-se como fator adicional de degradação ou mineralização da matéria orgânica, com reflexos sobre a biodiversidade, CTC e reserva de nutrientes desses solos (Lopes et al., 1982, 2013; Mendes et al., 2012).

Na avaliação das características morfológicas, nos horizontes mais superficiais dos solos cultivados de forma convencional (algodão e feijão), observou-se estrutura do solo em grãos simples; enquanto na área de soja e nas áreas de cerrado, a estrutura foi granular (Tabela 2). O fraco grau de desenvolvimento da estrutura nos horizontes superficiais dos solos, associado a práticas mecânicas de preparo, com revolvimento intensivo do solo, resulta na ocorrência comum de uma camada superficial pulverizada e na forma de grãos simples.

Tabela 2
Estrutura e consistência dos horizontes de Latossolos avaliados sob diferentes usos em Luís Eduardo Magalhães, Bahia.

A ocorrência de estrutura maciça, nas áreas de cultivo, se dá logo abaixo dos horizontes superficiais, com formação de horizontes com cimentação aparente (Apx e BAx) (Tabela 2). Nessas áreas, grandes "torrões" são observados na superfície do solo por ocasião do preparo do solo com revolvimento por hastes escarificadoras ou grades pesadas. Esses torrões, no entanto, se tornam muito friáveis quando umedecidos, o que é indicado pelo sufixo "x", que representa um processo de cimentação aparente ou pseudocimentação. Esse fenômeno é caracterizado pela variação na consistência do solo de dura a fortemente dura no solo seco, e friável a muito friável no solo úmido. O manual de descrição e coleta de solos no campo não prevê o uso do sufixo "x" para os horizontes superficiais A e transicionais AB (Santos et al., 2013a); contudo, propõe-se a adição dele na descrição destes horizontes como forma de qualificar e destacar um processo específico, como a grande variação observada na consistência do solo seco e úmido.

Os solos sob vegetação de cerrado (P1 e P5) diferenciaram-se dos solos sob cultivo, basicamente, quanto à consistência do solo seco, que sob cerrado foi ligeiramente dura na superfície; já no solo sob cultivo, houve horizontes caracterizados como extremamente duros e duros (Tabela 2). O aumento na coesão dos solos aumenta a resistência à penetração e promove fraca organização estrutural, com pouca ou nenhuma superfície de fraqueza, o que confere o aspecto maciço da estrutura e a tendência de formação de blocos pelo preparo (Santos et al., 2013a, 2013b). Neste estudo, a resistência dos solos à penetração (RP) apresentou-se acima do limite máximo de medida do aparelho (>2.000 kPa), o que inviabilizou sua determinação precisa.

Os valores de densidade do solo (Ds) evidenciaram os efeitos dos diferentes usos do solo, sobretudo com o aumento nos seus valores nos horizontes caracterizados como compactados (Apx e BAx), que foram maiores ou iguais a 1,64 g m-3(Tabela 2). Como reflexo do aumento da Ds, o volume total de poros (VTP) diminuiu e atingiu valores entre 35 e 40%. Notadamente nos solos sob cerrado, os horizontes transicionais ou subsuperficiais indicaram ligeiro aumento dos valores de Ds; contudo, em menor magnitude que nos solos cultivados. Esse aumento da Ds, mesmo em áreas sem tráfego de máquinas, indica a presença de horizonte genético coeso em condições originais. A evidência de adensamento pedogenético é comumente relacionada a Latossolos desenvolvidos em ambiente de Tabuleiro Costeiro (Giarola et al., 2001; Moreau et al., 2006; Silva & Carvalho, 2007; Corrêa et al., 2008; Lima Neto et al., 2009; Dantas et al., 2014).

Mesmo reconhecendo que a composição granulométrica das áreas podem influenciar os valores de Ds, os horizontes superficiais com os menores valores desse atributo foram os dos Latossolos sob cerrado (P5) e sob cultivo de algodão, que foram inferiores aos observados sob cultivo de feijão, soja e sob a área P1 de cerrado. Aumento nos valores de Ds no horizonte AB (0,30-0,50 m de profundidade) já foi relatado em levantamento de Latossolos na região do Cerrado (Levantamento..., 1976). Freitas et al. (2014) também observaram aumento na Ds nos horizontes transicionais de Latossolos (entre 0,19 e 0,68 m de profundidade), o qual se assemelhou ao observado na área P1 de cerrado, no presente estudo. No que se refere a solos cultivados, Marchão et al. (2008) observaram menores valores de Ds para solos sob cerrado e cultivo de algodão, em comparação a solos sob cultivo de soja e feijão, na camada de 0 a 0,10 m de profundidade.

O aumento da Ds nas áreas sem tráfego de máquinas (áreas sob cerrado) ocorreu abaixo de 0,30 m de profundidade, ao passo que, sob cultivo, além de mais espessa e densa, essa camada adensada ocorreu mais próxima à superfície. Nos solos das áreas cultivadas, adiciona-se ao adensamento genético o processo de compactação ocasionado pelas operações de preparo do solo e tráfego de máquinas agrícolas. Dias Junior & Pierce (1996) apresentam uma revisão pertinente sobre o processo de compactação do solo, enquanto Richart et al. (2005) discutem as causas e os efeitos da compactação.

Os valores de condutividade hidráulica saturada de campo (Kfs) apresentaram grande variabilidade, o que é ilustrado pelo tamanho dos boxes e das barras (desvio-padrão), em especial na área sob cultivo de feijão (Figura 2). Os valores de Kfs foram significativamente menores na superfície dos solos sob algodão e feijão, enquanto a área sob plantio direto de soja apresentou valores intermediários, e as áreas de cerrado, os maiores valores.

Figura 2
Condutividade hidráulica saturada dos solos (Kfs), avaliada em duas camadas, em Latossolos sob diferentes usos em Luís Eduardo Magalhães, Bahia. Médias seguidas de letras iguais, na mesma camada, não diferem pelo teste de Tukey, a 1% de probabilidade. P1, Cerrado; P2, algodão; P3, soja; P4, feijão; e P5, Cerrado.

Nas camadas superficiais das áreas de cerrado, os valores da Kfs foram de 6,13 e 6,73 cm min-1 (Tabela 3), os quais indicam ocorrência de meios porosos com alta permeabilidade. Na camada de 0,20 a 0,40 m, os valores estiveram entre 0,04 e 0,94 cm min-1, com exceção da área sob cultivo de feijão (4,58 cm min-1), que são considerados valores de permeabilidade intermediários (Reynolds et al., 2002).

Tabela 3
Condutividade hidráulica saturada média, avaliada em duas camadas, em Latossolos sob diferentes usos em Luís Eduardo Magalhães, Bahia.

Constatou-se a existência de um gradiente de Kfs entre as camadas, com exceção para o Latossolo Vermelho-Amarelo sob cultivo de algodão, onde os valores do atributo foram muito baixos em ambas as camadas avaliadas, indício de uma degradação bastante acentuada da estrutura do solo. Nas áreas sob cerrado e sob cultivo de soja, a Kfs diminuiu em profundidade, enquanto ocorreu o oposto no solo sob feijão. A maior variação nos valores de Kfs entre camadas ocorreu nos solos sob cerrado (Tabela 3). De forma geral, observou-se redução acentuada nos valores da transmissão de água das camadas superficiais para as subsuperficiais do solo, mesmo nas áreas naturais, sem tráfego de máquinas. Esse resultado indica a presença de horizonte coeso.

Os valores da Kfs das duas camadas avaliadas corroboram, em parte, os dados obtidos para Ds, VTP, consistência e coesão nos horizontes correspondentes. Dessa forma, os menores valores da Kfs na camada superficial, até 0,20 m de profundidade, para os solos sob cultivo, estiveram relacionados a maiores valores da Ds e à estrutura maciça e fortemente coesa.

O aumento da coesão do solo provocado pelas práticas de cultivo demanda um conhecimento mais efetivo da umidade do solo e de seus limites de plasticidade, especialmente para o uso de grades aradoras e niveladoras, escarificadores e subsoladores, que são ineficazes na quebra ou afrouxamento das camadas compactadas com o solo seco, quando há formação de torrões na superfície dos solos, que dificultam o plantio. Acima do limite de plasticidade, com o solo úmido e muito friável, o preparo também é ineficaz, pois neste caso ocorre o simples corte do solo, sem a quebra das camadas compactadas.

Os resultados do presente estudo, especialmente quanto à camada coesa existente nos Latossolos sem uso agrícola na região, apontam para restrições ao cultivo intensivo desses solos, uma vez que o tráfego intenso de máquinas pode agravar os efeitos nocivos dessa camada, pela compactação do solo, o que teria forte reflexo sobre a produtividade agrícola, especialmente em anos com deficiência hídrica. Além disso, a intensificação da restrição física ao uso dos Latossolos com camada genética coesa, pela compactação, pode levar ao estreitamento do calendário agrícola na região.

Conclusões

  1. Os Latossolos sob vegetação de cerrado, avaliados na região do Oeste da Bahia, apresentam horizonte subsuperficial adensado, o qual pode tornar-se ainda mais compacto, espesso e superficial com o uso agrícola.

  2. Os horizontes compactados dos Latossolos sob o uso agrícola apresentam estrutura maciça, com consistência seca muito dura ou extremamente dura, e maiores valores de densidade do solo, o que leva ao desenvolvimento de grandes torrões na superfície dos solos quando estes são revolvidos com baixa umidade.

  3. A condutividade hidráulica saturada diminui em profundidade, em todos os usos, exceto o com feijão irrigado; e os Latossolos sob uso agrícola apresentaram menor condutividade hidráulica saturada que os sob cerrado, na camada superficial do solo.

Agradecimentos

Ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), pelo financiamento no Projeto Universal Nº 478003/2013-7 e pela bolsa de Iniciação Científica à quarta autora; ao engenheiro-agrônomo Ingbert Dowich, consultor técnico da Associação de Plantio Direto no Cerrado (APDC), e à Círculo Verde, Assessoria Agronômica & Pesquisa, pelo apoio logístico, indicação de áreas, avaliações em campo e coleta das amostras; e às fazendas Marechal Rondon e Alvorada, pela recepção e disponibilização das áreas para as avaliações e amostragem dos solos.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Set 2016

Histórico

  • Recebido
    31 Ago 2015
  • Aceito
    21 Mar 2016
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