Relação entre ocorrência da bicheira-da-raiz e profundidade da água em arroz irrigado por inundação

Resumo:

O objetivo deste trabalho foi determinar a relação entre profundidade da água de irrigação e infestação larval de Oryzophagus oryzae em arroz irrigado por inundação. A profundidade da água e a infestação larval foram avaliadas no leiveiro superior, no centro do quadro e no leiveiro inferior. Os dados foram submetidos às análises estatística descritiva e geoestatística. A maior infestação larval ocorre em áreas da lavoura de maior profundidade da água, típica do leiveiro inferior. A distribuição espacial das larvas de O. oryzae é do tipo agregada e dependente da maior profundidade da lâmina de irrigação.

Termos para indexação:
Oryza sativa; Oryzophagus oryzae; distribuição espacial; geoestatística

Abstract:

The objective of this work was to assess the relationship between the depth of irrigation water and larval infestation by Oryzophagus oryzae in flooded rice crop. Water depth and larval infestation were evaluated in the upper levee, in between levees, and in the lower levee. The data were subjected to the descriptive statistical and geostatistical analyses. The highest larval infestation occurs in field areas with greater water depth, which is typical of the lower levee. The spatial distribution of O. oryzae larvae is of the aggregate type and depends on the greater irrigation water depth.

Index terms:
Oryza sativa; Oryzophagus oryzae; geostatistics; spatial distribution.

Oryzophagus oryzae (Costa Lima, 1936) (Coleoptera: Curculionidae) é praga de solo de elevada importância econômica nos arrozais irrigados por inundação (Martins et al., 2009). As larvas, conhecidas como bicheiras-da-raiz, alimentam-se do sistema radicular das plantas e podem reduzir a produção de grãos em cerca de 20% (Neves et al., 2011).

A profundidade da água de irrigação afeta a dinâmica populacional de gorgulhos-aquáticos em arrozais (Martins et al., 2009; Tindall et al., 2013). Assim, a distribuição espacial e a densidade larval podem ser alteradas pelas irregularidades e pelo nivelamento do terreno, que incluem leiveiros e quadros de arrozais instalados em áreas inclinadas. Nesse cenário, o maior conhecimento sobre a densidade, a distribuição e a dependência espacial de O. oryzae em áreas de arroz inclinadas, irrigadas por inundação, pode auxiliar no manejo do inseto (Dal Prá et al., 2011).

A geoestatística é ferramenta essencial para determinação da distribuição espacial da praga, uma vez que associa o valor da observação (da infestação larval) e da sua localização (coordenada espacial e profundidade da água de irrigação) nas estimativas de distribuição espacial, o que possibilita avanços no entendimento do comportamento espacial de insetos-praga e, consequentemente, seu manejo integrado (Pazini et al., 2015).

O objetivo deste trabalho foi determinar a relação entre a profundidade da água de irrigação e a infestação larval de O. oryzae em arroz irrigado por inundação.

O experimento foi conduzido no ano agrícola de 2012/2013, na Estação Experimental Terras Baixas da Embrapa Clima Temperado, situada no Município de Capão do Leão, no Estado do Rio grande do Sul (31º49'22"S, 52º27'56"W). O solo da área foi classificado como Planossolo Háplico (Santos et al., 2013), com declividade de 0,2 a 3,0%. A lavoura de arroz foi conduzida em área de 2,1 ha, no sistema de cultivo convencional, tendo-se utilizado a cultivar Puitá Inta-CL.

A área em estudo foi dividida em oito tabuleiros, onde foram distribuídos, aleatoriamente, os pontos amostrais georreferenciados para avaliação da infestação larval de O. oryzae e da profundidade da lâmina de água de irrigação. O monitoramento de larvas de O. oryzae foi realizado aos 40 dias após a irrigação, de acordo com Neves et al. (2011). Coletaram-se 237 amostras de solo e raízes, sendo: 79 amostras no leiveiro superior (LS), a parte mais elevada da área no sentido do desnível; 79 amostras no centro do quadro (CQ), o espaço entre os leiveiros; e 79 amostras no leiveiro inferior (LI), a parte mais baixa da área. Posteriormente, foram registrados o número das larvas e a profundidade da lâmina de água.

Os dados obtidos foram submetidos à análise estatística descritiva e geoestatística por meio do pacote geoR (Ribeiro Júnior & Diggle, 2001) do programa R, versão 3.2.0 (R Core Team, 2015). A análise estatística descritiva consistiu do cálculo da média, do desvio-padrão, dos valores máximo e mínimo, do coeficiente de variação e do índice razão variância/média. A análise geoestatística foi realizada a partir de semivariogramas e do ajuste de modelos teóricos (Yamamoto & Landim, 2013). A qualidade dos ajustes foi determinada pelo índice de dependência espacial (IDE) (Seidel & Oliveira, 2014). Por fim, utilizou-se a krigagem ordinária para interpolação dos dados populacionais e elaboração de mapas de predição.

Constatou-se que o número de larvas de O.oryzae apresentou distribuição agregada, em que os valores obtidos na razão variância/média foram maiores que a unidade (Tabela 1). Esse comportamento se assemelha ao observado a partir de dados provenientes da avaliação populacional de outros insetos-praga de solo (Dal Prá et al., 2011).

Tabela 1.
Estatísticas descritivas para profundidade da lâmina de água de irrigação (PLA, cm) e número de larvas (Larvas) de Oryzophagus oryzae, bem como parâmetros geoestatísticos estimados para os modelos de semivariograma sobre a população larval no leiveiro superior, no centro do quadro e no leiveiro inferior da lavoura de arroz (Oryza sativa) irrigado por inundação⁽¹⁾.

Local da coleta	Variáveis	Valor mínimo	Valor máximo	Média	Desvio-padrão	CV (%)	I	Modelo	Efeito pepita	Patamar	Alcance (m)	MD (m)	IDE (%)
Leiveiro superior	PLA	3,00	19,00	8,87	3,64	41,01	-	Gaussiano	4,61	3.090,88	8.951,51	162,67	50,32
	No de larvas	0,00	11,00	3,49	2,51	71,87	1,81
Centro do quadro	PLA	1,00	15,00	5,96	2,61	43,84	-	Exponencial	0,63	1,28	65,17	162,67	12,90
	No de larvas	0,00	6,00	1,46	1,40	96,40	1,34
Leiveiro inferior	PLA	6,00	20,00	13,96	3,28	23,49	-	Gaussiano	9,65	5.120,05	9.337,13	180,74	50,31
	No de larvas	1,00	16,00	6,62	3,26	49,29	1,61

• ⁽¹⁾CV, coeficiente de variação; I, razão variância/média; MD, máxima distância dos pontos dentro da área; e IDE, índice de dependência espacial, que varia no intervalo de 0%≤ IDE ≤50,40%; no modelo gaussiano e de 0≤ IDE ≤31,70% modelo exponencial (Seidel & Oliveira, 2014). O número de amostras por local foi de 79.

A densidade populacional de O.oryzae mais expressiva ocorreu no LI, onde a profundidade da lâmina de água era maior. Este resultado fornece subsídios para possíveis estratégias de monitoramento do inseto, ao indicar pontos propensos à sua ocorrência relacionados à distribuição da água na área.

Os modelos de semivariograma gaussiano e exponencial se ajustaram aos dados de contagem de larvas de O.oryzae nos locais de coleta LS, CQ e LI. Esse resultado corrobora com estudo recente sobre contagem de insetos (Pazini et al., 2015). Os alcances de dependência espacial no LI e no LS foram maiores que a máxima distância de amostragem dentro da área georreferenciada. Isso significa que todos os pontos amostrados são fortemente correlacionados. No CQ, o alcance foi de cerca de 65 m. A qualidade dos ajustes, definida pelo IDE, foi classificada como alta no LI e no LS, e como moderada no CQ.

Pela análise dos mapas de predição, observou-se comportamento semelhante da infestação larval de O.oryzae no LS e no LI em relação à profundidade da água, com infestação de até 16 larvas nos pontos da lavoura com maiores lâminas de água de irrigação. No CQ, porém, a infestação foi de seis larvas (Tabela 1 e Figura 1). Além disso, nos três locais, verificou-se a ocorrência de pequenos agrupamentos do inseto, o que evidencia o caráter agregado de distribuição das larvas (Figura 1).

Figura 1
Semivariogramas e mapas de predição populacional de larvas de Oryzophagus oryzae na lavoura de arroz (Oryza sativa) irrigado por inundação, nos locais de coleta: leiveiro superior (LS), pelo modelo gaussiano; centro do quadro (CQ), pelo modelo exponencial; e leiveiro inferior (LI), pelo modelo gaussiano.

A relação existente entre profundidade da lâmina de água de irrigação e densidade populacional de larvas de O.oryzae pode decorrer, de igual modo, de efeitos nocivos da temperatura da água sobre os insetos (Raksarart & Tugwell, 1975). Entretanto, isso pode ocorrer de modo distinto, pois lâminas menores aquecem e esfriam em horários de maior e menor radiação solar, respectivamente, enquanto lâminas maiores aquecem menos e têm menor amplitude térmica. Dessa forma, a maior profundidade de água pode criar condições favoráveis para sobrevivência, acasalamento e postura dos gorgulhos-aquáticos (Martins et al., 2009). Em contrapartida, menor profundidade da lâmina de água pode reduzir a oviposição antes de as plantas se tornarem mais tolerantes ao ataque do inseto, o que diminui a infestação e os danos às raízes (Stout et al., 2013). Ademais, a água pode atingir temperaturas letais aos ovos e às larvas (Raksarart & Tugwell, 1975; Martins et al., 2009; Tindall et al., 2013).

Com base no conhecimento da distribuição espacial, o potencial de dano do inseto em diferentes partes da lavoura pode ser previsto e a real necessidade de adoção de medidas de controle ser determinada com maior efetividade, o que pode resultar, consequentemente, em redução de custos de produção e de riscos de contaminação ambiental por agroquímicos.

A infestação de larvas em arrozais irrigados por inundação em terrenos ondulados é agregada e maior em maior profundidade da água, típica do leiveiro inferior.

Agradecimentos

À Embrapa Clima Temperado e à Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), pelo apoio técnico e financeiro

References

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Datas de Publicação

• Publicação nesta coleção
  Jul 2017

Histórico

• Recebido
  13 Dez 2015
• Aceito
  15 Ago 2016