Resumos
A brusone, causada pelo fungo Pyricularia oryzae Cav., é uma das mais importantes doenças da cultura do arroz. O conhecimento das raças do fungo permite direcionar o melhoramento genético, visando ao desenvolvimento de cultivares resistentes. Este trabalho objetivou determinar a variabilidade do fungo e a prevalência de raças, em genótipos de arroz irrigado; avaliar as reações das linhagens quase isogênicas de CO 39 aos isolados de P. oryzae; e identificar os genótipos de arroz que possuem genes complementares de resistência a estes isolados. O estudo foi realizado com 36 isolados de P. oryzae, coletados em 18 cultivares de arroz irrigado, em quatro municípios do Rio Grande do Sul. Foram identificadas 21 raças, ocorrendo maior frequência das raças do grupo IA, em todos os locais de coleta, destacando-se, dentre elas, a IA-1. Reação de resistência foi observada nas cultivares BRS Firmeza, Bluebelle, Te-tep e BRS 7 (Taim) e de susceptibilidade em Fanny, Dawn, BRS Pelota e BRS Atalanta. A série de linhagens quase isogênicas obtidas da cultivar CO 39 foi resistente aos isolados na seguinte ordem: C101 A51 (resistente para todos os isolados); C101 PKT (12); C104PKT (11); C105HP4L23 (8); e C101-LAC (3). A partir do estudo destes isolados, concluiu-se que há variabilidade de P. oryzae, prevalência da raça IA, maior tolerância da cultivar BRS Firmeza e que o gene Pi-2 confere resistência à brusone, em todos os isolados analisados.
Oryza sativa L.; Magnaporthe oryzae; brusone; raças fisiológicas
Rice blast, caused by the fungus Pyricularia oryzae Cav., is one of the most important diseases of rice. The understanding of its different strains allows a more efficient breeding towards resistant cultivars. This work aimed to determine the variability of the fungus and the prevalence of strains in irrigated rice genotypes, to evaluate the reaction of near isogenic lines of CO 39 to the collected P. oryzae isolates and to identify rice genotypes having complementary resistance genes to these isolates. The study was performed with 36 P. oryzae isolates collected in 18 irrigated rice cultivars from four counties in Rio Grande do Sul State, Brazil. A total of 21 strains were identified, with a prevalence for the IA group strains, in all collection sites, especially the IA-1 strain. A resistance reaction was observed for the cultivars BRS Firmeza, Bluebelle, Te-tep and BRS 7 (Taim), while a susceptible reaction was observed for Fanny, Dawn, BRS Pelota and BRS Atalanta. The series of near isogenic lines obtained from the CO 39 cultivar showed resistance to the isolates in the following order: C101 A51 (resistant to all isolates); C101 PKT (12); C104PKT (11); C105HP4L23 (8); and C101-LAC (3). From the studied isolates, it was concluded that there is variability of P. oryzae, prevalence of the IA strain, a higher tolerance for the cultivar BRS Firmeza and that the Pi-2 gene confers resistance to rice blast in all isolates analyzed.
Oryza sativa L.; Magnaporthe oryzae; rice blast; physiologic strains
PROTEÇÃO DE PLANTAS
Variabilidade de Pyricularia oryzae Cav. em genótipos de arroz1 1 Trabalho recebido em ago./2013 e aceito para publicação em jul./2014 (nº registro: PAT 25853).
Variability of Pyricularia oryzae Cav. in irrigated rice genotypes
Cley Donizeti Martins NunesI; Monalize Salete MotaII; Fernando Irajá Félix de CarvalhoII; Antonio Costa de OliveiraII
IEmpresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária, Embrapa Clima Temperado, Pelotas, RS, Brasil. E-mail: cley.nunes@embrapa.br
IIUniversidade Federal de Pelotas (UFPel), Faculdade de Agronomia Eliseu Maciel, Centro de Genômica e Fitomelhoramento, Pelotas, RS, Brasil. E-mails: monalizem@yahoo.com.br, carvalho@ufpel.edu.br, acostol@cgfufpel.org
RESUMO
A brusone, causada pelo fungo Pyricularia oryzae Cav., é uma das mais importantes doenças da cultura do arroz. O conhecimento das raças do fungo permite direcionar o melhoramento genético, visando ao desenvolvimento de cultivares resistentes. Este trabalho objetivou determinar a variabilidade do fungo e a prevalência de raças, em genótipos de arroz irrigado; avaliar as reações das linhagens quase isogênicas de CO 39 aos isolados de P. oryzae; e identificar os genótipos de arroz que possuem genes complementares de resistência a estes isolados. O estudo foi realizado com 36 isolados de P. oryzae, coletados em 18 cultivares de arroz irrigado, em quatro municípios do Rio Grande do Sul. Foram identificadas 21 raças, ocorrendo maior frequência das raças do grupo IA, em todos os locais de coleta, destacando-se, dentre elas, a IA-1. Reação de resistência foi observada nas cultivares BRS Firmeza, Bluebelle, Te-tep e BRS 7 (Taim) e de susceptibilidade em Fanny, Dawn, BRS Pelota e BRS Atalanta. A série de linhagens quase isogênicas obtidas da cultivar CO 39 foi resistente aos isolados na seguinte ordem: C101 A51 (resistente para todos os isolados); C101 PKT (12); C104PKT (11); C105HP4L23 (8); e C101-LAC (3). A partir do estudo destes isolados, concluiu-se que há variabilidade de P. oryzae, prevalência da raça IA, maior tolerância da cultivar BRS Firmeza e que o gene Pi-2 confere resistência à brusone, em todos os isolados analisados.
Palavras-chave:Oryza sativa L.; Magnaporthe oryzae; brusone; raças fisiológicas.
ABSTRACT
Rice blast, caused by the fungus Pyricularia oryzae Cav., is one of the most important diseases of rice. The understanding of its different strains allows a more efficient breeding towards resistant cultivars. This work aimed to determine the variability of the fungus and the prevalence of strains in irrigated rice genotypes, to evaluate the reaction of near isogenic lines of CO 39 to the collected P. oryzae isolates and to identify rice genotypes having complementary resistance genes to these isolates. The study was performed with 36 P. oryzae isolates collected in 18 irrigated rice cultivars from four counties in Rio Grande do Sul State, Brazil. A total of 21 strains were identified, with a prevalence for the IA group strains, in all collection sites, especially the IA-1 strain. A resistance reaction was observed for the cultivars BRS Firmeza, Bluebelle, Te-tep and BRS 7 (Taim), while a susceptible reaction was observed for Fanny, Dawn, BRS Pelota and BRS Atalanta. The series of near isogenic lines obtained from the CO 39 cultivar showed resistance to the isolates in the following order: C101 A51 (resistant to all isolates); C101 PKT (12); C104PKT (11); C105HP4L23 (8); and C101-LAC (3). From the studied isolates, it was concluded that there is variability of P. oryzae, prevalence of the IA strain, a higher tolerance for the cultivar BRS Firmeza and that the Pi-2 gene confers resistance to rice blast in all isolates analyzed.
Key-words:Oryza sativa L.; Magnaporthe oryzae; rice blast; physiologic strains.
INTRODUÇÃO
O fungo Pyricularia oryzae Cav. [Magnaporthe grisea (Herbert) Barr.] infecta várias gramíneas, como o arroz (Oryza sativa L.), trigo (Triticum aestivum L. ), aveia (Avena sativa L.), cevada (Hordeum vulgare L.), centeio (Secale cereale L.), capim arroz (Echinochloa spp.), azevém (Lolium multiflorum Lam.), grama-boiadeira (Leersia hexandra Sw.) e capim braquiária (Brachiaria mutica Forsk), entre outras. A transmissão bidirecional ocorre entre o arroz e estas gramíneas, com exceção do trigo (Couch et al. 2005).
No Rio Grande do Sul, isolados de P. oryzae obtidos de milhã (Digitaria sanguinalis L., Scop.), capim arroz e grama-boiadeira foram patogênicos em arroz, enquanto dois isolados de Paspalum sp. e dois de grama-boiadeira não o foram (Ribeiro 1981).
A diferenciação genética da população de P. oryzae pode ocorrer tanto geográfica como temporalmente e ser atribuída, em maior parte, à seleção feita no hospedeiro (Chen et al. 1995).
No Rio Grande do Sul, a variabilidade de P. oryzae foi detectada em trabalhos desenvolvidos nos períodos de 1968-1978 e 1979-1985 (Ribeiro 1980, Ribeiro & Terres 1987), constatando-se mudança gradativa na prevalência das raças de P. oryzae, diminuindo e aumentando a frequência dos grupos IB e IA, respectivamente. Estas alterações foram atribuídas à substituição das cultivares de arroz (CICA 4 e CICA 8) pelas novas cultivares lançadas na época (BR-IRGA 409 e BR-IRGA 410), as quais apresentaram aumento na susceptibilidade, passando de reação intermediária (1981-1983) para susceptível (1984-1985).
No Tocantins, em arroz de terras altas, uma grande variabilidade na patogenicidade de P. oryzae foi observada, sendo identificadas 21 raças fisiológicas entre 119 isolados (Santos et al. 2012). Em São Paulo, um acúmulo de fatores de virulência em isolados de P. oryzae obtidos da variedade de arroz IAC 201 foi observado, sendo duas raças (JP 177 e JP 137) caracterizadas por superarem a resistência conferida por sete genes (pi-ks, pi-a, pi-i, pi-k, pi-km, pi-ta e pi-z) e seis genes (pi-ks, pi-a, pi-i, pi-k, pi-km e pi-ta), respectivamente (Melo & Urashima 2003).
Diante do exposto, um isolado pode representar todo o espectro de virulência de uma linhagem, mesmo não sendo o mais frequente na população local do patógeno. O isolado com estas características é mais frequentemente encontrado em cultivares com alto grau de resistência do que em cultivares com alto grau de susceptibilidade. A obtenção deste tipo de isolado se reveste de grande importância, para a seleção de fontes de resistência (Levy et al. 1993, Correa-Victoria et al. 1997).
O conhecimento das raças de P. oryzae permite direcionar o melhoramento genético, visando ao desenvolvimento de cultivares resistentes, direcionando, também, a recomendação de cultivares comerciais de arroz para determinadas regiões, conforme a reação a estes isolados.
Dessa forma, este trabalho objetivou determinar a variabilidade de P. oryzae e a prevalência de raças em genótipos de arroz irrigado; avaliar as reações das linhagens quase isogênicas de CO 39, em seis cultivares comerciais e duas do banco de germoplasma, aos isolados de P. oryzae coletados; e identificar os genótipos de arroz que possuem genes complementares para resistência a estes isolados.
MATERIAL E MÉTODOS
Foram coletadas, anualmente, folhas e/ou panículas de arroz infectadas por brusone, de diferentes cultivares e locais, por meio de visitas às lavouras ou de amostras enviadas por produtores ou extensionistas, durante as safras de 2001/2002 a 2004/2005 (Tabela 1). Este material foi desidratado em condições de bancada e armazenado em sacos de papel previamente identificados, sendo conservados sob refrigeração a 10ºC, até o isolamento do fungo.
O isolamento monospórico consistiu da retirada de esporos de P. oryzae das lesões de brusone e sua transferência para placas com meio ágar-água, sendo, então, submetidos à temperatura de 24ºC, por 24 horas. Os esporos germinados foram transferidos, individualmente, para placas com meio BDA (batata 200 g, dextrose 15 g, ágar 16 g por litro de água) + estreptomicina (0,2 g L-1) e incubados à temperatura de 24ºC (Ribeiro & Terres 1987). Para as inoculações, os isolados monospóricos foram transferidos para o meio de cultura aveia (Tuite 1969), considerado ideal para esporulação, e incubados por 12 a 15 dias, sob luz fluorescente (12 horas de luz/12 horas no escuro), à temperatura de 25ºC (Atkins et al. 1967, Ribeiro & Terres 1987).
Para a identificação de raças de P. oryzae, foram utilizados 36 isolados sobre as cultivares diferenciais da Série Internacional (Raminad - STR 3, Zenith, NP 125, Usen, Dular, Kanto 51, Caloro e CI 8970(S), também conhecida por Shao-tio-tsao) proposta por Ling & Ou (1969). Os isolados que apresentaram maior esporulação foram utilizados para avaliar as reações dos genótipos de arroz irrigado.
Para o estudo da patogenicidade da população de P. oryzae, foram usados 26 isolados, em seis cultivares recomendadas para o cultivo na região (BRS 7 (Taim), BRS Pelota, Bluebelle, BRS Firmeza, BRS Atalanta e Dawn), duas cultivares do banco de germoplasma (Te-tep e Fanny) e 17 raças (14 do grupo IA, 2 do IB e 1 do IC), para as cinco linhagens quase isogênicas da cultivar CO 39 (C 101 LAC, C 101 A51, C 104 PKT, C 101 PKT e C 101 TTP 4L 23) e a cultivar CO 39, como testemunha.
As cultivares foram semeadas em bandejas plásticas (30 cm x 40 cm x 4 cm), contendo 4,5 kg de solo do tipo Planosolo Hápico (Embrapa 2006), sem adubação de base, e mantidas em casa-de-vegetação. Para aumentar a predisposição à brusone, quando as plantas atingiram os estádios de 2 a 3 folhas, foram adubadas com ureia, em quantidade equivalente a 0,5 g de nitrogênio por m2 (Ribeiro & Terres 1987).
As inoculações dos isolados de P. oryzae foram realizadas quando as plantas diferenciais atingiram a fase de 3 a 5 folhas, pulverizando-se uma suspensão de esporos do fungo em uma concentração de 4,5 x 105 esporos mL-1 (Ribeiro & Terres 1987), com o auxílio de um pulverizador (marca Brudden), com pressão constante e volume de 60 mL de inóculo por bandeja. As plantas foram mantidas em câmara de incubação com temperatura de 20-28ºC e umidade relativa superior a 90%, por 10 dias, em local de pouca luz ambiente (Asai et al. 1967).
As avaliações das reações das cultivares aos isolados de P. oryzae em estudo foram realizadas aos 7 e 10 dez dias após a inoculação, atribuindo-se notas de 0 a 9 (IRRI 1996). As notas de 0 a 3 foram consideradas como resistentes ou incompatíveis e as de 4 a 9 como susceptíveis ou compatíveis. Estas notas dadas às oito cultivares internacionais foram comparadas às tabelas apresentadas por Ling & Ou (1969), para confirmação da raça.
Posteriormente, foi realizada análise de agrupamento dos genótipos relacionados ao conjunto de isolados de P. oryzae avaliados por meio de análise multivariada, utilizando-se a distância euclidiana. Este procedimento foi dividido em duas fases: i) estimativa da distância entre todos os pares de genótipos possíveis, incluindo 22 genótipos, sendo oito cultivares comerciais, oito genótipos da Série Diferencial Internacional, cinco linhas quase isogênicas CO e a cultivar CO 39; e ii) incluídos todos os pares de genótipos, porém, considerando-se somente as oito cultivares comerciais e as oito da Série Diferencial Internacional. Esta distância foi estimada com base nas reações de resistência dos genótipos aos diferentes isolados de P. oryzae, utilizando-se o programa computacional Genes (Cruz 2001). Com base na matriz de similaridade, foi realizada uma análise de agrupamento e estimada pelo coeficiente de correlação cofenética (r) (Sokal & Rohlf 1962), por meio do programa computacional NTSYS pc 2.1 (Rohlf 2000).
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Durante as safras de 2001/2002 a 2004/2005, foram obtidos 36 isolados de P. oryzae, em 18 cultivares de arroz irrigado provenientes de quatro municípios do Rio Grande do Sul: cinco isolados oriundos de Torres, vinte e oito de Capão do Leão, dois de Dom Pedrito e um de Rio Grande (Tabela 1).
A partir dos 36 isolados, foram determinadas 21 raças fisiológicas de P. oryzae, por meio da inoculação do patógeno nas cultivares da Série Diferencial Internacional (Tabela 2), confirmando a diversidade da virulência do patógeno. Em relação à frequência dos grupos de patógenos e à variação de raças dentro de cada grupo, verificou-se que IA apresentou maior frequência entre os grupos, sendo a raça IA-1 a mais frequente entre todas (Tabelas 1 e 2). As raças dos grupos IC, ID, IE e IF, conhecidas por possuírem menor espectro de virulência, foram as que ocorreram em menor número, no total de oito, entre os 36 isolados, encontradas nas cultivares susceptíveis BRS 6 (Chui), BR-IRGA 410, BR-IRGA 414, Fanny e Dular (Tabela 1).
Variabilidade patogênica de P. oryzae foi observada no Estado do Tocantins, onde foram identificadas 21 raças fisiológicas, entre 119 isolados, sendo prevalente o grupo IA e as raças IA-1, IA-33, IC-1 e ID-9 (Santos et al. 2012). Semelhantemente, no Estado de Minas Gerais, 14 raças foram identificadas em 138 isolados monospóricos (Cornelio et al. 2003), com prevalência das raças IA (59%), IB (16,9%) e IC (10%). No Estado de São Paulo, do total de 71 isolados monospóricos, foram identificadas 21 raças fisiológicas, porém, prevaleceram os grupos IB (32%) e ID (30%) (Malavolta et al. 2009).
Os resultados da determinação de raças realizadas nas cultivares de arroz mostram que os isolados mais virulentos foram provenientes das variedades mais resistentes (BRS 7 (Taim), Te-tep, BRS Firmeza e BRS Bojuru) e das susceptíveis (BRS 6 (Chui) e El Paso 144) (Tabela 1).
O aumento da frequência das raças do grupo IA sobre o grupo IB corroboram os resultados de Ribeiro & Terres (1987). A predominância da raça IA, nesta população em estudo, pode estar relacionada ao aumento da pressão de seleção sobre P. oryzae exercida pelo aumento no tamanho da área plantada com a cultivar BR-IRGA 410, que ocupou 36,08% da área cultivada no Estado, em 1987/1988 e 1992/1993, e 71% na região Sul (Chen et al. 1995, Terres et al. 2004).
Uma alta diversidade de brusone foi encontrada dentro de cada lavoura de arroz de terras altas, na região de Goiás, com predomínio das raças IB (Silva et al. 2009). Em Formoso do Araguaia (TO), uma ampla variabilidade genética dentro das populações e não entre as populações foi observada (Garrido 2001). A diversidade de perfis multilocos encontrada indicou a existência da fase sexual ou parassexual do patógeno, considerando-se esta uma das razões prováveis para a quebra da resistência de variedades de arroz lançadas naquela região de clima tropical.
As cultivares BR-IRGA 409, BR-IRGA 410 e BRS Pelota possuem a mesma genealogia (IR 930-2/IR 665-31-2-4) e mantêm um padrão de reação de resistência similar para brusone (Terres et al. 2004). Os dados apresentados na Tabela 1 levam à inferência de que as raças dos grupos IA e IB produzem susceptibilidade na cultivar BRS 7 (Taim), que ocupou 8% da área cultivada em 2003 e possui maior grau de resistência à brusone e ao maior número de isolados das raças IA e IB, em relação à BRS-Pelota. Isto é importante, porque, recentemente, o genótipo da cultivar BRS 7 (Taim) foi lançado como BRS Sinuelo CL, o que mantém uma pressão de seleção semelhante, em termos de raças.
Em relação à reação de resistência, a cultivar Fanny foi susceptível a 92,3% dos 26 isolados testados (Tabela 3), enquanto as cultivares BRS Firmeza e Bluebelle mostraram-se como as mais tolerantes, apresentando susceptibilidade somente para o grupo IA. Esta característica de reação de resistência pode estar relacionada ao grau de parentesco entre estas duas cultivares, pois a BRS Firmeza foi originada do cruzamento múltiplo entre BR-IRGA 411/ Bluebelle/ Lemont. Porém, a cultivar BRS Firmeza se mantém mais resistente, quando comparada com a Bluebelle, podendo este fato estar relacionado à presença de alguns genes de resistência obtidos de BR-IRGA 411, resultantes do cruzamento entre as cultivares 407 e Dawn (Terres et al. 2004).
A cultivar Bluebelle foi intensamente cultivada, principalmente na safra de 1980/1981, alcançando 65% da área de arroz irrigado, tornando-se susceptível, principalmente, à brusone na panícula (Ribeiro et al. 1984). Porém, o seu cultivo em escala comercial deixou de ser realizado há décadas, o que contribuiu para a redução na reação de susceptibilidade.
Os 17 isolados de P. oryzae inoculados na série de linhagens quase isogênicas de CO 39 mostraram reações diferenciadas para os genes de resistência (Tabela 4). A linhagem C101-A51 (Pi-2) foi resistente a todos os isolados inoculados, enquanto a C101-LAC (Pi-1) foi resistente somente aos isolados IA-1, IA-3 e IA-17. As outras linhagens resistentes estão em ordem decrescente: C101 PKT (Pi-4a), C104PKT (Pi-3) e C105HP4L23 (Pi-4b).
O gene Pi-1 possui reação de resistência à brusone complementar ao gene Pi-2 (Correa-Victoria et al. 1997, Filippi et al. 2002) e, portanto, para este conjunto de isolados, não se detectou nenhum tipo de combinação, para a obtenção de uma resistência duradoura. Nos isolados obtidos da cultivar Metica - 1, de duas lavouras de arroz da Lagoa da Confusão (TO) e outras duas do projeto Rio Formoso (TO), a virulência foi rara para estes dois genes (Filippi et al. 2002), sugerindo que a constituição genética a ser empregada no programa de melhoramento genético de resistência à brusone deve ser diferenciada, para aquela região.
O agrupamento com base na distância euclidiana estimada para o caráter de reação de resistência à brusone dos 16 genótipos (8 da Série Diferencial Internacional e 8 cultivares comerciais), para 26 isolados de P. oryzae, possibilitou a formação de dois grandes grupos definidos a partir da média da distância genética (Figura 1). O primeiro agrupamento é composto por um pequeno número de cultivares (NP-125, Dawn, Kanto 151 e BRS 7 Taim), tendo somente a BRS 7 (Taim) como cultivar comercial que expressa reação de susceptibilidade a poucas raças dos grupos IA, IB, IC e ID (Tabela 3). No segundo agrupamento do dendrograma, composto pelos demais genótipos, verificou-se a presença de dois subgrupos.
As cultivares BRS Firmeza e Bluebelle, mais resistentes para os isolados do grupo IA, e a cultivar Te-tep, com genética diferenciada, apresentando três genes de resistência à brusone identificados (Mackill & Bonman 1992), embora possuindo menor susceptibilidade, se comparadas com as cultivares Fanny e Zenith, ainda ficaram no mesmo grupo (Figura 1 e Tabela 3).
Os 22 genótipos (oito da Série Diferencial Internacional, oito cultivares comerciais e seis linhagens quase isogênicas da série CO 39) apresentaram reações de resistência para 11 raças virulentas de P. oryzae (Figura 2). Com a definição da distância genética média dos genótipos, foi possível verificar a formação de dois grupos distintos. O primeiro envolve o maior número de genótipos (16) com reações susceptíveis para um conjunto de isolados de P. oryzae. Neste grupo, foi possível observar três subgrupos. No primeiro, há sete cultivares mais resistentes, incluindo as cultivares BRS 7 (Taim) e Te-tep, que possuem reação de resistência à brusone semelhante para o maior número de isolados (Tabela 3). No segundo subgrupo, as cultivares com reação de susceptibilidade ao maior número de isolados foram as cultivares comerciais BRS Pelota, Fanny e Caloro. O terceiro subgrupo foi formado somente pelo genótipo susceptível BRS Atalanta, que possui reação de susceptibilidade para determinadas raças dos grupos IA, IB e ID, que causaram susceptibilidade no primeiro grupo (Tabela 3).
O segundo grupo é composto pelas cultivares que apresentaram maior reação de resistência ao maior número de isolados, como as comerciais Bluebelle e BRS Firmeza, seguidas das linhas quase isogênicas C101-A51, C104PKT, C101 PKT e C105HP4L23, que possuem, isoladamente, os genes Pi-2, Pi-3, Pi-4a e Pi-4b, respectivamente (Tabelas 3 e 4).
A diferenciação em dois grupos deve-se ao fato de os genótipos destes grupos apresentarem graus de resistência bem definidos, para os diferentes isolados estudados (Figuras 1 e 2). Dos grupos de genótipos envolvidos, é possível recomendar cruzamentos, de modo a incrementar a resistência à brusone, indicando os genótipos já melhorados, como BRS 7 (Taim) de um grupo com Bluebelle ou BRS Firmeza de outro grupo. Deste modo, é possível que estes genótipos possuam genes diferentes e complementares, para resistência à brusone, com possibilidade de produzirem populações segregantes transgressivas para este caráter.
CONCLUSÕES
1. Houve alta variabilidade de raças fisiológicas de P. oryzae, em cultivos de arroz irrigado nos municípios gaúchos de Dom Pedrito, Rio Grande, Torres e Capão do Leão.
2. As raças mais virulentas pertencem ao grupo IA, com prevalência da raça IA-1, nos quatro municípios analisados.
3. O gene Pi-2, presente na linhagem C101-A51, conferiu resistência a todos os isolados de brusone analisados.
4. As cultivares BRS Firmeza e Bluebelle foram as mais tolerantes, apresentando susceptibilidade somente para o grupo IA.
- ASAI, G. N.; JONES, M. E.; RORIE, F. G. Influence of certain environmental factors in the field on infection of rice by Piricularia oryzae. Phytopathology, St. Paul, v. 57, n. 3, p. 237-241, 1967.
- ATKINS, J. G.; ROBERT, A. L.; ADAIR, C. R. An international set of rice varieties for differentiating races of Piricularia oryzae. Phytopathology, St. Paul, v. 57, n. 3, p. 297-301, 1967.
- CHEN, D. et al. Population structure of Pyricularia oryzae at two screening sites in the Philippines. Phytopathology, St. Paul, v. 85, n. 9, p. 1011-1020, 1995.
- CORNELIO, V. M. de O. et al. Identificação de raças fisiológicas de Pyricularia grisea em arroz no Estado de Minas Gerais. Ciência e Agrotecnologia, Lavras, v. 27, n. 5, p. 1016-1022, 2003.
- CORREA-VICTORIA, F. J.; GUIMARÃES, E. P.; MARTINEZ, C. P. Caracterización de la estructura genética y la virulencia de Pyricularia oryzae Sacc. para desarrollar variedades resistentes al añublo del arroz. In: GUIMARÃES, E. P. Selección recurrente en arroz Cali: CIAT, 1997. p. 203-215.
- COUCH, B. C. et al. Origins of host-specific populations of the blast pathogen Magnaporthe oryzae in crop domestication with subsequent expansion of pandemic clones on rice and weeds of rice. Genetics, Bethesda, v. 170, n. 2, p. 613-630, 2005.
- CRUZ, C. D. Programa genes: aplicativo computacional em genética e estatística. Viçosa: UFV, 2001.
- EMPRESA BRASILEIRA DE PESQUISA AGROPECUÁRIA (Embrapa). Centro Nacional de Pesquisa de Solos. Sistema brasileiro de classificação de solos 2. ed. Rio de Janeiro: Embrapa, 2006.
- FILIPPI, M. C. et al. Genetic diversity and virulence pattern in field populations of Pyricularia oryzae from rice cultivar Metica. Pesquisa Agropecuária Brasileira, Brasília, DF, v. 37, n. 12, p. 1681-1688, 2002.
- GARRIDO, L. da R. Identificação, desenvolvimento e uso de marcadores de regiões hipervariáveis do genoma de Magnaporthe grisea na análise da estrutura de populações do patógeno infectando plantações de arroz (Oryza sativa). 2001. 90 f. Tese (Doutorado em Fitopatologia) - Departamento de Fitopatologia, Faculdade de Agronomia, Universidade de Brasília, Brasília, DF, 2001.
- INTERNATIONAL RICE RESEARCH INSTITUTE (IRRI). Standard evaluation system for rice Manila: IRRI, 1996.
- LEVY, M. et al. Genetic diversity of the rice blast fungus in a disease nursery in Colombia. Phytopathology, St. Paul, v. 83, n. 12, p. 1427-1433, 1993.
- LING, K. C.; OU, S. H. Standardization of the international race numbers of Pyricularia oryzae. Phytopathology, St. Paul, v. 59, n. 3, p. 339-342, 1969.
- MACKILL, D. J.; BONMAN, J. M. Inheritance of blast resistance in near isogenic lines of rice. Phytopathology, St. Paul, v. 82, n. 6, p. 746-749, 1992.
- MALAVOLTA, V. M. A.; CARQUEIJO, A. de P.; MENDES, L. Pathogenic variability of Pyricularia grisea in the State of São Paulo, Brazil. Summa Phytopathologica, Botucatu, v. 35, n. 1, p. 49-51, 2009.
- MELO, A. P. A.; URASHIMA, A. S. Diversidade da virulência de Pyricularia oryzae num local de melhoramento genético de arroz. Fitopatologia Brasileira, Brasília, DF, v. 28, n. 5, p. 541-543, 2003.
- RIBEIRO, A. S. Prevalência de raças de Pyricularia oryzae Cav. no Rio Grande do Sul. Pesquisa Agropecuária Brasileira, Brasília, DF, v. 15, n. 2, p. 175-182, 1980.
- RIBEIRO, A. S. Compatibilidade do arroz com Pyricularia de outras gramíneas. Pesquisa Agropecuária Brasileira, Brasília, DF, v. 16, n. 2, p. 209-212, 1981.
- RIBEIRO, A. S. et al. Resistência de cultivares de arroz à brusone e outras doenças fúngicas. In: REUNIÃO DA CULTURA DO ARROZ IRRIGADO, 13., 1984, Balneário Camboriú. Anais... Florianópolis: EMPASC, 1984. p. 292-297.
- RIBEIRO, A. S.; TERRES, A. L. S. Variabilidade do fungo Pyricularia oryzae e sua relação com cultivares resistentes à brusone. Fitopalogia Brasileira, Brasília, DF, v. 12, n. 4, p. 316-21, 1987.
- ROHLF, F. J. NTSYS-pc: numerical taxonomy and multivariate analysis system. Version 2.1. New York: Exeter Publishing, 2000.
- SANTOS, G. R. dos et al. Diversidade de Magnaporthe grisea em arroz de terras altas no sul do Estado do Tocantins, na safra 2008/09. Revista Ceres, Viçosa, v. 59, n. 1, p. 65-70, 2012.
- SILVA, G. B. et al. Genetic and phenotypic diversity of Magnaporthe oryzae from leaves and panicles of rice in commercial fields in the State of Goiás, Brazil. Tropical Plant Pathology, Brasília, DF, v. 34, n. 1, p. 77-86, 2009.
- SOKAL, R. R.; ROHLF, F. J. The comparison of dendrograms by objective methods. Taxon, Berlin, v. 11, n. 1, p. 30-40, 1962.
- TERRES, A. L. S. et al. Melhoramento genético e cultivares de arroz irrigado. In: GOMES, A. S.; MAGALHÃES JÚNIOR, A. M. Arroz irrigado no Sul do Brasil. Brasília, DF: Embrapa Informação Tecnológica, 2004. p. 161-226.
- TUITE, J. Plant pathological methods Minneapolis: Burgess Publishing Company, 1969.
Datas de Publicação
-
Publicação nesta coleção
20 Out 2014 -
Data do Fascículo
Set 2014
Histórico
-
Aceito
Jul 2014 -
Recebido
Ago 2013