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Bons encontros e Cidadania: os Sentidos Atribuídos ao Serviço de Convivência e Fortalecimento de Vínculos pelos(as) Idosos(as)

Good meetings and Citizenship: the meanings attributed to the Service of Coexistence and Strengthening of Bonds (Serviço de Convivência e Fortalecimento de Vínculos) by Older Adults

Buenos Encuentros y Ciudadanía: los Significados Atribuidos al Servicio de Convivencia y Fortalecimiento de Lazos por los Adultos Mayores

Resumo:

Este artigo tem como objetivo analisar os dados produzidos por uma pesquisa qualitativa que investigou os sentidos atribuídos ao Serviço de Convivência e Fortalecimento de Vínculos (SCFV) por seus usuários(as) em Florianópolis/SC. Por meio da observação participante realizada em um SCFV durante três meses e da aplicação de uma entrevista coletiva com idosos(as), este artigo traz algumas análises sobre os processos de significação vivenciados por esses sujeitos. Apoiados na perspectiva sócio-histórica, elaboramos dois eixos de significação, que serão discutidos neste artigo: 1) Intersubjetividade e vínculo: o SCFV como “lugar acolhedor” e de “bons encontros”; 2) O(a) idoso(a) e os processos de exclusão: o SCFV como promotor da cidadania. Em termos de resultados, é possível afirmar que esse espaço se configura como um lugar importante na vida desses(as) idosos(as) – onde eles(as) se sentem acolhidos, ouvidos e reconhecidos como sujeitos. Além do fato de esse espaço ser marcado por afetos e “bons encontros”, o grupo também o revelou como um lugar potente para processos de reflexão e questionamento contra as diversas formas de segregação e violências vividas cotidianamente por ele.

Palavras-chave:
SCFV; Idosos; Grupos; SUAS; PNAS

Abstract:

This study aims to analyze the data produced by qualitative research that investigated the meanings attributed to the Service of Coexistence and Strengthening of Bonds (Serviço de Convivência e Fortalecimento de Vínculos - SCFV) by its users in the municipality of Florianópolis. By participant observation carried out in an SCFV for three months and the application of a collective interview with older adults, this study will bring some analysis of the processes of meaning experienced by these subjects. Sustained by the socio-historical perspective, we elaborated two axes of meaning to be discussed in this study : 1. Intersubjectivity and bonding: the SCFV as a “warm place” and “good meetings;” and 2. Older adults and processes of exclusion: the SCFV as a enhancer of citizenship. Results show that this space configures an important place in the lives of these older adults — a place in which they feel welcomed, heard, and recognized as subjects. In addition to the fact this space is marked by affections and “good meetings,” the group also shows itself as a potent place for processes of reflection and questioning against the various forms of segregation and violence daily experienced by these people.

Key-Words:
SCSB; Elderly People; Groups; SUAS; PNAS

Resumen:

Este artículo tiene como objetivo analizar los datos producidos por un estudio cualitativo sobre los significados atribuidos al Servicio de Convivencia y Fortalecimiento de Lazos (SCFL) por sus usuarios en Florianópolis (Santa Catarina, Brasil). Desde la observación participante realizada en un SCFL durante el período de tres meses y desde la aplicación de una entrevista colectiva con personas mayores, este artículo presenta algunos análisis sobre los procesos de significado vividos por estos sujetos. Apoyados en la perspectiva sociohistórica, elaboramos dos ejes de significado que serán discutidos: 1) Intersubjetividad y vinculación: el SCFL como “lugar de acogida” y “buenos encuentros”; 2) Las personas mayores y los procesos de exclusión: el SCFV como promotor de ciudadanía. Los resultados permiten afirmar que este espacio se configura como un lugar importante en la vida de estas personas mayores, un lugar donde se sienten acogidos, escuchados y reconocidos como sujetos. Además de que este espacio está marcado por afectos y “buenos encuentros”, el grupo también se reveló como un lugar propenso a procesos de reflexión y cuestionamiento frente a las diversas formas de segregación y violencia que viven a diario estas personas.

Palabras clave:
SCFV; Personas Mayores; Grupos; SUAS; PNAS

Introdução

Este artigo é um recorte de uma pesquisa de mestrado cujo objetivo geral foi investigar os sentidos atribuídos ao Serviço de Convivência e Fortalecimento de Vínculos (SCFV) por seus(suas) usuários(as) no município de Florianópolis/SC. O campo desta pesquisa foi um SCFV de Idosos – que ocorre em um espaço do Centro de Referência da Assistência Social (CRAS) –, onde são desenvolvidas atividades com este público há sete anos, que ocorrem uma vez por semana e em que participam, em média, 20 idosos(as) 1 1 Vale destacar que a utilização da palavra “idoso” está de acordo com a denominação oficial adotada pelos censos demográficos, pela Organização Mundial da Saúde (OMS) e pelas políticas públicas e sociais que focalizam o envelhecimento, como a Política Nacional do Idoso (PNI), e, sendo assim, refere-se a todos os indivíduos que tenham 60 anos ou mais. Partindo desse critério formal, e para evitar diferentes conotações ao nos referirmos a esse grupo de sujeitos, utilizaremos o termo proposto. Nos pautaremos na perspectiva de Siqueira ( 2019 ), que critica o termo “terceira idade por não existir primeira nem segunda idade” compreendendo este termo como uma “tentativa de camuflar o envelhecimento”. .

Ancoradas na perspectiva da psicologia sócio-histórica, compreendemos que a constituição do sujeito é mediada pela linguagem, conferindo ao ser humano a capacidade de significar suas experiências. Em uma relação dialética com o seu contexto histórico-cultural, o sujeito torna-se, ao mesmo tempo, produto e produtor de sua história singular e coletiva. Sendo assim, buscamos investigar de que forma os(as) usuários(as) desse SCFV significam e constituem esse espaço, e, dialeticamente, de que maneira esse contexto medeia a constituição desses sujeitos.

Realizamos a observação participante durante o período de três meses nesse SCFV, onde participávamos das atividades cotidianas desenvolvidas pelo CRAS e especificamente dos encontros grupais realizados pela equipe técnica do SCFV. Somada à observação participante, realizamos uma entrevista coletiva com 11 usuários(as) desse serviço, que, categorizada a posteriori por unidades de “sentidos”, gerou dois eixos de análise, que serão debatidos neste artigo.

Ao submetermos o descritor “Serviço de Convivência e Fortalecimento de Vínculos” no Portal da CAPES e SciELO, encontramos 17 trabalhos (retirando os resultados duplicados). Destes, somente três são voltados para as pessoas idosas, sendo que nenhum é da área da Psicologia. Interessante também destacar que os artigos são publicados a partir de 2017, ou seja, são estudos recentes.

O artigo da área de Educação Física, intitulado Capacidade funcional, nível de atividade física e risco de queda de idosas participantes de um Centro de Convivência no interior da Paraíba (Sobrinho, Souza, Macedo, Aniceto & Oliveira, 2017 Sobrinho, P. C., Souza, G. G., Macedo, J. O. R., Aniceto, R. R., & Oliveira, L. S. (2017). Capacidade funcional, nível de atividade física e risco de quedas de idosas participantes de um Centro de Covivência no interior da Paraíba. Revista Brasileira de Prescrição e Fisiologia do Exercício, 11(68), 588-595. http://www.rbpfex.com.br/index.php/rbpfex/article/view/1207
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), teve como objetivo analisar o nível de atividade física (NAF), função cognitiva, capacidade funcional e risco de quedas de idosos participantes do Serviço de Convivência e Fortalecimento de Vínculos (SCFV) na cidade de Emas/PB. Os resultados desse estudo demonstraram que quanto maior o tempo gasto em atividades físicas, menor o número de quedas, concluindo que a participação nesse centro de convivência beneficia a saúde dos participantes.

O artigo Espaços de Convivência para idosos: benefícios e estratégias (Francisco & Pinheiro, 2018 Francisco, C. M., & Pinheiro, M. A. (2018). Espaços de Convivência para Idosos: benefícios e estratégias. Revista Recien, 8(24), 65-72. https://doi.org/10.24276/rrecien2358-3088.2018.8.24.65-72
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), da área de Enfermagem, teve como objetivo investigar os benefícios e as estratégias utilizadas nos Núcleos e Centros de Convivência para Idosos. A pesquisa é uma revisão integrativa, e os resultados demonstram que os idosos participantes de centros de convivência apresentam melhor equilíbrio, mobilidade funcional e qualidade de vida quando comparados àqueles que não frequentam o espaço. Por fim, o estudo destaca que os espaços de convivência não sejam apenas um local para atividade física, lazer, diversão e prevenção a doenças associadas ao processo do envelhecimento, mas sim um ambiente que contribua para a autonomia, independência e inclusão social da pessoa idosa.

O último artigo, da área de Serviço Social, intitulado Percepções de idosos sobre envelhecimento e violência nas relações intrafamiliares (Colussi, Kuyawa, Marchi, & Pichler, 2019 Colussi, E. L., Kuyawa, A., Marchi, A. C. B., & Pichler, N. A. (2019). Percepções de idosos sobre envelhecimento e violência nas relações intrafamiliares. Revista Brasileira de Geriatria e Gerontologia, 22(4). https://doi.org/10.1590/1981-22562019022.190034
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), é uma pesquisa exploratória que teve como objetivo conhecer as diferentes percepções do processo de envelhecimento e da violência nas relações intrafamiliares de idosos participantes de um grupo de serviço e convivência. As autoras apontam que os idosos significam a família como um lugar de cuidado e proteção, e, ao mesmo tempo, detectam práticas sutis de violência psicológica, financeira e de abandono, tornando-os impotentes, envergonhados e temerosos.

Iniciaremos este artigo discorrendo brevemente sobre a Assistência Social no Brasil, de modo a localizar o SCFV na Política Nacional de Assistência Social (PNAS). Em seguida, apresentaremos o método e os procedimentos empregados neste estudo. Após a descrição dos orientadores metodológicos, debateremos os dois eixos de análise produzidos pela entrevista coletiva e pela observação participante: 1) Intersubjetividade e vínculo: o SCFV como um “lugar de calor” e “bons encontros”; 2) O(a) idoso(a) e os processos de exclusão: o SCFV como um potencializador da cidadania. Por fim, sintetizaremos os principais dados e reflexões deste artigo nas considerações finais, apontando limitações e potencialidades vivenciadas no campo de pesquisa.

A Assistência Social brasileira: Localizando o SCFV no SUAS

A Constituição da República Federativa do Brasil ( 1988 Constituição da República Federativa do Brasil. (1988). Brasília, DF. http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm
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) teve implicações fundamentais para a Assistência Social na medida em que articulou suas ações com a Saúde e a Previdência Social, constituindo o Sistema Brasileiro de Seguridade Social, que se tornou, assim, dever do Estado ( Constituição… , 1988 Constituição da República Federativa do Brasil. (1988). Brasília, DF. http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/con...
). A partir de 1993 passou a vigorar a Lei Orgânica de Assistência Social (LOAS), que reconhece esta como política pública com o dever de garantir diretos, bem como promover a cidadania dos mais variados segmentos da população, especialmente daqueles que ficam em lugares de subordinação devido ao acirramento das desigualdades sociais ( Lei… , 1993 Lei Orgânica da Assistência Social (LOAS). (1993). Lei nº 8.742. Dispõe sobre a organização da Assistência Social e dá outras providências. Brasília, DF. http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8742compilado.htm
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). Foi somente em 2003, a partir das deliberações da IV Conferência Nacional de Assistência Social com as diretrizes da LOAS, que foi possível a construção e implementação do Sistema Único de Assistência Social (SUAS) (Centro de Referência Técnica em Psicologia e Políticas Públicas, 2007 Centro de Referência Técnica em Psicologia e Políticas Públicas. (2007). Referência técnica para atuação do(a) psicólogo(a) no CRAS/SUAS. CFP. http://www.crpsp.org.br/portal/comunicacao/artes-graficas/arquivos/2008-crepop-cras-suas.pdf
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).

Finalmente, em 2004, estabeleceu-se a Política Nacional de Assistência Social (PNAS) (Secretaria Nacional de Assistência Social [SNAS], 2005 Secretaria Nacional de Assistência Social. (2005). Política Nacional de Assistência Social -PNAS 2004 e Norma operacional básica NOB/SUAS. http://www.mds.gov.br/webarquivos/publicacao/assistencia_social/Normativas/PNAS2004.pdf
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), que promoveu uma ruptura com histórico de práticas de cunho assistencialista, intencionando benesses, clientelismos e contribuindo para a manutenção da condição de subalternidade dos(as) usuários(as) que recorriam à assistência social. A PNAS se operacionaliza por meio do SUAS, que atua a partir de duas grandes estruturas que se articulam: a Proteção Social Básica e a Proteção Social Especial.

Segundo a PNAS (SNAS, 2005 Secretaria Nacional de Assistência Social. (2005). Política Nacional de Assistência Social -PNAS 2004 e Norma operacional básica NOB/SUAS. http://www.mds.gov.br/webarquivos/publicacao/assistencia_social/Normativas/PNAS2004.pdf
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), a proteção social básica objetiva prevenir situações de risco por meio do desenvolvimento de potencialidades e aquisições e o fortalecimento de vínculos familiares e comunitários, destinando-se à população em situação de vulnerabilidade social decorrente da pobreza, privação (ausência de renda, precário ou nulo acesso aos serviços públicos) e/ou fragilização de vínculos afetivos – relacionais e de pertencimento social (discriminações relacionadas a faixa etária, etnia, de gênero ou a deficiência) –, tal como os(as) idosos(as) participantes deste estudo que sofrem processos de exclusão pela sua condição de classe social e faixa etária.

O SCFV se constitui como um serviço da Proteção Social Básica do SUAS, sendo regulamentado pela Tipificação Nacional de Serviços Socioassistenciais (Resolução nº 109, 2009 Resolução nº 109. (2009). Aprova a Tipificação Nacional de Serviços Socioassistenciais. Diário Oficial da União, ano CXLVI, n. 225, 25 nov. 2009. https://www.mds.gov.br/webarquivos/public/resolucao_CNAS_N109_%202009.pdf
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). Esse Serviço é oferecido de maneira complementar ao trabalho social com famílias realizado pelo Serviço de Proteção e Atendimento Integral às Família (PAIF) e Serviço de Proteção e Atendimento Especializado às Famílias e Indivíduos (PAEFI).

Ressalta-se o caráter preventivo do SCFV, baseado na defesa e afirmação de direitos, bem como no desenvolvimento de capacidades e potencialidades dos usuários, visando alcançar alternativas emancipatórias para o enfrentamento das vulnerabilidades sociais (Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome [MDS], 2016 Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome. (2016). Caderno de Orientações: Serviço de Proteção e Atendimento Integral à Família e Serviço de Convivência e Fortalecimento de Vínculos: Articulação necessária na Proteção Social Básica. https://www.mds.gov.br/webarquivos/publicacao/assistencia_social/Cadernos/Cartilha_PAIF_1605.pdf
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). A oferta desse serviço deve garantir a segurança da acolhida, do convívio familiar e comunitário e o estímulo ao desenvolvimento da autonomia dos usuários. Além disso, busca promover atividades geradoras de convivência e socialização, especialmente nos territórios e contextos de maior vulnerabilidade social, fortalecendo os vínculos e prevenindo situações de violação de direitos (MDS, 2015 Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome. (2015). Perguntas Frequentes: Serviço de Convivência e Fortalecimento de Vínculos. http://blog.mds.gov.br/redesuas/wp-content/uploads/2014/04/Perguntas-Frequentes-do-SCFV-01-de-2016.pdf
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).

A população idosa vem aumentando no Brasil de forma intensa. Segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) ( 2013 Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. (2013). Atlas do Censo Demográfico 2010. https://biblioteca.ibge.gov.br/index.php/biblioteca-catalogo?view=detalhes&id=264529
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), em 2013 as pessoas com 60 anos ou mais representavam o equivalente a 13% da população, e, segundo estimativas, até 2050 o número de pessoas idosas vai triplicar, totalizando ao menos 30% da população brasileira. Florianópolis não difere da realidade brasileira, e, de acordo com o censo supracitado, 11,4% da população dessa cidade já tem mais de 60 anos (453.285 habitantes), número que tende a crescer exponencialmente nos próximos anos (IBGE, 2013 Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. (2013). Atlas do Censo Demográfico 2010. https://biblioteca.ibge.gov.br/index.php/biblioteca-catalogo?view=detalhes&id=264529
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). Essa mudança trará novos impactos e desafios às políticas públicas, que precisarão estar voltadas às demandas e peculiaridades da pessoa idosa.

Em dissonância a esses dados, no município de Florianópolis havia apenas um grupo do SCFV de idosos(as) durante a realização desta pesquisa (2019). Segundo dados da Secretaria Municipal de Saúde de Florianópolis, na área de abrangência desse CRAS, que conta com oito comunidades, há aproximadamente 6.500 pessoas idosas, sendo que destas 215 recebem o Benefício de Prestação Continuada (BPC), e apenas 23 frequentam o SCFV, que, vale ressaltar, não atende um número maior de idosos(as) por conta de sua limitada capacidade em termos de número de profissionais e espaço físico (Momo, 2019Momo, B. A. (2019). A violência contra as mulheres na perspectiva de idosas. [Trabalho de Conclusão de Curso, Universidade Federal de Santa Catarina]. ).

Métodos e procedimentos de pesquisa: Contribuições da psicologia

A psicologia sócio-histórica se propõe a fazer uma apropriação do método materialista histórico-dialético para analisar os fenômenos subjetivos. Para essa perspectiva, o método precisa ir além da função instrumental, buscando compreender a própria constituição do sujeito, a fim de produzir um conhecimento mais aproximado do concreto.

Portanto, estudar algo historicamente significa estudá-lo em movimento, pois “só em movimento as coisas são o que são” (Vigotski, 1987Vigotski, L S. (1987). Historia del desarollo de las funciones psíquicas superiores. Científico-Técnica. , p. 74), sendo essa uma exigência fundamental da dialética, entendida como o movimento de contrários. Ao compreender o ser humano como produto e produtor do contexto no qual está inserido, pressupõe-se uma dialética entre sujeito e sociedade, singular e coletivo, “contrários” imbricados dialeticamente um no outro que não podem ser compreendidos de forma estanque e isolada.

Os processos de significação são elementos-chave na pesquisa orientada pela perspectiva sócio-histórica, sendo estes produzidos na relação intersubjetiva entre pesquisador-pesquisado (Freitas, 2002 Freitas, M. T. A. (2002). A abordagem sócio-histórica como orientadora da pesquisa qualitativa. Cadernos de Pesquisa, (116), 21-39. https://doi.org/10.1590/S0100-15742002000200002
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). A partir do referencial vigotskiano, compreende-se que o sujeito se constitui por meio da mediação semiótica, em que uma relação dialética é estabelecida entre seus pares e seus contextos. Inspirado no materialismo histórico-dialético, Vigotski compreende que a linguagem constitui e é constituída nas relações, sendo instrumento simbólico fundamental na formação do sujeito. Sendo assim, é por meio da base afetivo-volitiva (Vigotski, 2001Vigotski, L. S. (1934/2001). Pensamento e Palavra. In A construção do Pensamento e da Linguagem. Martins Fontes. ) que o sujeito (re)cria sentidos para sua própria vida, sendo estes orientadores de suas práticas sociais e formas de se relacionar com a alteridade.

Com o intuito de nos aproximarmos dos processos de significação que os(as) usuários(as) do SCFV analisado atribuíam a este espaço, realizamos uma observação participante durante aproximadamente três meses. A observação participante é uma aproximação com o campo de pesquisa que tem como objetivo criar uma relação entre pesquisador-pesquisado. Para isso, o pesquisador deve frequentar os locais em que acontecem os fatos nos quais está interessado, preocupando-se em observá-los, entrar em contato com os sujeitos, conversando e recolhendo material produzido por eles ou a eles relacionado (Freitas, 2002 Freitas, M. T. A. (2002). A abordagem sócio-histórica como orientadora da pesquisa qualitativa. Cadernos de Pesquisa, (116), 21-39. https://doi.org/10.1590/S0100-15742002000200002
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).

Outro ponto importante sobre a observação participante é que ela é marcada por um estranhamento, um “olhar do estrangeiro”, ou seja, “aquele que não é do lugar, que acabou de chegar, é capaz de ver aquilo que os que lá estão não podem mais perceber” (Peixoto, 1999Peixoto, N. B. (1999). O olhar do estrangeiro. In A. Novaes (Org.), O olhar (pp. 361-365). Companhia das Letras. , p. 363). É ver as coisas como não passíveis de serem vistas pelos olhares acostumados, engessados, reintroduzindo algo novo. Nesse ponto, cabe salientar a constituição histórica do olhar humano, entendendo este como não natural ou inato, mas produzido, ou seja, cultural. “Não existe, portanto, ‘o olhar’, mas diferentes modos de ver segundo a referência do que é visto a sistemas específicos de atribuição de sentidos culturalmente produzidos” (Reis, Zanella, França & Ros, 2004 Reis, A. C., Zanella, A. V., França, K. B., & Ros, S. Z. (2004). Mediação Pedagógica: mudança e permanência no olhar estético em contexto de escolarização formal. Psicologia: Reflexão e Crítica, 17(1), p. 51-60. Recuperado de: https://doi.org/10.1590/S0102-79722004000100008
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, p. 53).

Além da observação-participante, realizamos uma entrevista coletiva com 11 idosos(as) que participam do grupo semanal. Todos(as) os(as) idosos(as) que participavam do SCFV no momento em que estava sendo realizada a pesquisa foram convidados(as) a participar da entrevista – que foi realizada coletivamente por escolha consensual do grupo –, sendo que lhes foi informado que a qualquer momento poderiam desistir de participar da pesquisa. A entrevista qualitativa, com roteiro norteador, foi realizada no próprio SCFV e teve duração de 50 minutos. Foi utilizado um gravador, com a ciência dos(as) participantes. Em seguida, foi transcrita e categorizada conforme as unidades de “sentidos” produzidas por esse coletivo. Todos(as) os(as) participantes foram esclarecidos(as) sobre os objetivos e procedimentos da pesquisa e assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido. Os nomes utilizados neste artigo são fictícios para preservar o anonimato dos(as) participantes. A pesquisa foi apreciada e aprovada pelo Comitê de Ética de Pesquisa com Seres Humanos da Universidade Federal de Santa Catarina, por meio do parecer n° 3.577.302.

Conforme Minayo, Deslandes e Gomes ( 2016Minayo, M. C. S. (Org.), Deslandes, S. F., & Gomes, R. (2016). Pesquisa Social: Teoria, método e criatividade. Vozes. ), as entrevistas coletivas consistem em reuniões com um pequeno grupo de interlocutores(as) e uma de suas principais características é o seu papel interativo, permitindo a formação de consensos sobre determinados assuntos ou mostrando dissensos a partir de mútuas argumentações, favorecendo os processos de identificação e desidentificação. Seu resultado é único e diferente do que o pesquisador obteria na interlocução com apenas uma pessoa.

Nesta pesquisa a entrevista é compreendida como produção de linguagem, portanto dialógica. Os sentidos criados e as enunciações produzidas dependem da situação em que se realizam, da relação que se estabelece entre pesquisador e pesquisados(as). Na entrevista é o sujeito que se expressa, mas sua voz carrega o tom de outras vozes, refletindo a realidade de seu grupo, gênero, etnia, classe, momento histórico e social (Freitas, 2002 Freitas, M. T. A. (2002). A abordagem sócio-histórica como orientadora da pesquisa qualitativa. Cadernos de Pesquisa, (116), 21-39. https://doi.org/10.1590/S0100-15742002000200002
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).

Dessa forma, a partir da perspectiva sócio-histórica, compreendemos que os discursos produzidos no campo intersubjetivo com o(a) pesquisador(a) são, simultaneamente, singulares e coletivos: singulares pois estão amalgamados no processo de constituição de cada sujeito, e coletivos pois refletem processos sociais mais amplos de um determinado grupo social, localizado em um específico momento histórico.

Após a análise da entrevista coletiva, construímos dois eixos de significação que serão debatidos neste artigo. A discussão dos resultados, então, foi composta tanto pela análise dos sentidos produzidos na entrevista coletiva, quanto pelos recortes realizados nos registros do diário de campo em que as impressões, afecções, anseios e inquietações foram escritas pela pesquisadora durante a imersão nesse grupo de idosos(as).

Contextualização do território e participantes da pesquisa

Florianópolis, onde este CRAS/SCFV está localizado, tem oito comunidades e 41.402 habitantes, segundo dados de 2010 (IBGE, 2013 Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. (2013). Atlas do Censo Demográfico 2010. https://biblioteca.ibge.gov.br/index.php/biblioteca-catalogo?view=detalhes&id=264529
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). O contexto de grande parte dessas comunidades é marcado pela pobreza, violências, presença do tráfico de drogas, altas taxas de baixa escolaridade e analfabetismo.

Os participantes do grupo de idosos(as) entrevistados(as) tinham idades variando entre 65 e 86 anos, e em sua maioria vivem nesse território marcado pelas vulnerabilidades sociais supracitadas ( Tabela 1 ).

Tabela 1
Descrição dos(as) participantes da pesquisa.

O SCFV tem sete anos de existência, mas antes disso já ocorriam outras oficinas no espaço que hoje é o CRAS, onde funcionava o Conselho Comunitário. O SCFV contava com 24 idosos(as) no momento em que foi feita a inserção no campo de pesquisa. Referente a este grupo, destacamos a chegada recente de imigrantes 2 2 Cabe destacar que a mobilização da sociedade civil – especialmente do Grupo de Apoio a Imigrantes e Refugiados da cidade de Florianópolis (GAIRF) – conseguiu implantar o CRAI (Centro de Referência de Atendimento ao Imigrante), que foi pensado para atuar com a rede intersetorial das políticas públicas. Sendo assim, ainda que com muitas fragilidades institucionais, o CRAI buscava atuar em parceria com a rede SUAS na cidade de Florianópolis. Infelizmente, sob o argumento de que não seria possível renovar o convênio entre a Ação Social Arquidiocesana (ASA) e a Secretaria de Assistência Social, Habitação e Trabalho, o Estado de Santa Catarina, após um ano e sete meses de atividades, fechou o CRAI da cidade de Florianópolis, encerrando um importante diálogo com os CRAS e CREAS sobre o tema da migração (Machado, Barros, & Martins-Borges, 2019 ). – que não estavam presentes no dia da entrevista coletiva – vindos da Venezuela e do Haiti, reflexo do fluxo migratório dessas pessoas para o Brasil que, por questões econômicas, ambientais e/ou políticas, têm buscado este país como um lugar para refazer seus laços sociais e projetos de vida.

Esse grupo de idosos(as) se encontra uma vez por semana no período matutino, realizando primeiramente uma atividade física – que os(as) idosos(as) chamam de “ginástica” –, depois o lanche coletivo e finalizam com alguma atividade, que pode ser oficina de teatro, rodas de conversa, dinâmicas de grupo, assistir a um pequeno documentário, entre outras.

Importante ressaltar que a equipe busca abordar temáticas que venham ao encontro dos interesses e das demandas do grupo, elaborando as atividades a cada reunião, que acontecem no CRAS da região. O grupo ainda é acompanhado por uma orientadora social formada em Educação, um educador social que é educador físico e uma técnica de referência que é assistente social e faz parte da equipe do CRAS, conforme preconizado nas orientações técnicas do SCFV (MDS, 2015 Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome. (2015). Perguntas Frequentes: Serviço de Convivência e Fortalecimento de Vínculos. http://blog.mds.gov.br/redesuas/wp-content/uploads/2014/04/Perguntas-Frequentes-do-SCFV-01-de-2016.pdf
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).

Discussão dos resultados

Intersubjetividade e formação de vínculo: O SCFV como um “lugar de calor” e “bons encontros”

A partir das inserções com esse grupo, foi possível perceber o forte vínculo que os(as) usuários(as) têm com esse espaço. Sendo assim, esta categoria foi elaborada para abarcar as narrativas que recorrentemente apontavam para esse contexto como um lugar significativo para as vidas dos(as) usuários(as) entrevistados(as), como disse Fátima: “ aqui é praticamente uma segunda família para mim ”, ou quando Patrícia diz que vem para o grupo “ mesmo com chuva ou vento ”.

Compreendemos o grupo como uma unificação de singularidades em torno de um projeto em comum, por meio do qual se partilham tarefas e sentidos, em uma lógica afetiva de pertencimento, sob a perspectiva horizontalizada das relações, na qual o outro é engrenagem fundamental do projeto coletivo (Maheirie, 2010Maheirie, K. (2010). O músico, os processos de exclusão e relações grupais no trabalho acústico. In K. B. Macêdo (Org.), O trabalho de quem faz arte e diverte os outros. Editora PUC-Goiás. ; 2019Maheirie, K. (2019). Grupos e ações coletivas como objetos de análise e foco nas intervenções psicossociais. In F. A. Costa, M. R. Mesquita (Orgs.), Psicologia política no Brasil e enfrentamentos a processos antidemocráticos (pp. 123-142). EDUFAL. ; Maheirie et al., 2012Maheirie, K., Hinkel, J., Groff, A. R., Muller, F. L., Gomes, M. A., & Gomes, A. H. (2012). Coletivos e relações estéticas: alguns apontamentos acerca da participação política. In C. Mayorga, L. R. Castro, & M. A. M. Prado (Orgs.), Juventude e a experiência da política no contemporâneo (pp. 143-168). Contra Capa. ; Sartre, 1979Sartre, J. P. (1979) Critica de la razón dialéctica. Losada. ).

À medida que convivíamos e conversávamos com essas pessoas ficava evidente a forma como o SCFV foi se configurando como um potente espaço de produção de sentidos e de pertença, ou um “lugar de calor”, conceito desenvolvido por Sawaia ( 1994Sawaia, B. B. (1994). Cidadania, diversidade e comunidade: uma reflexão psicossocial. In M. J. P. Spink (Org.), A cidadania em construção: uma reflexão transdisciplinar. Cortez. ; 1995 Sawaia, B. B. (1995). O calor do lugar: segregação urbana e identidade. São Paulo em Perspectiva, 9(2), 20-24. http://produtos.seade.gov.br/produtos/spp/v09n02/v09n02_04.pdf
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; 1999Sawaia, B. B. (1999). Comunidade como Ética e Estética da Existência: uma reflexão mediada pelo conceito de identidade. ) a partir de sua leitura sobre a obra de Espinosa, que diz respeito a um lugar que vai além do local físico, é a forma a partir da qual um coletivo se organiza; é um lugar que permite identificação entre pares, gestando novas formas de relação alimentadoras da “potência de ação” e de calor humano; é um espaço que contém o estar junto e o estar discriminado, é “rizomático, móvel e ambíguo” (Sawaia, 1995 Sawaia, B. B. (1995). O calor do lugar: segregação urbana e identidade. São Paulo em Perspectiva, 9(2), 20-24. http://produtos.seade.gov.br/produtos/spp/v09n02/v09n02_04.pdf
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, p. 23).

Um recorte do diário de campo que demonstra essa forte conexão desse grupo foi quando indagamos aos(às) usuários(as) se prefeririam realizar a entrevista por meio de uma conversa individual ou coletiva: mesmo os(as) mais quietos(as) e tímidos(as) imediatamente responderam que preferiam em grupo. Uma das idosas, Regina, sintetizou os anseios do grupo: “ A gente prefere coletiva porque somos um grupo, né? Um coletivo, um grupo de todos ”, dando indícios sobre o grau de pertencimento e engajamento daquele coletivo.

Para o materialismo histórico-dialético, base epistemológica da perspectiva sócio-histórica, não é possível cindir as dimensões objetividade/subjetividade, coletividade/singularidade, já que são entendidas como unidades dialéticas: “. . . apenas na coletividade é que cada indivíduo encontra os meios de desenvolver suas capacidades em todos os sentidos; somente na coletividade, portanto, torna-se possível a liberdade pessoal” (Marx & Engels, 1989Marx, K., & Engels, F. (1989). I: Feuerbach. In A Ideologia Alemã (7a ed., pp. 55-86). Hucitec. , p. 117). Conforme aponta Maheirie ( 2002 Maheirie, K. (2002). Constituição do sujeito, subjetividade e objetividade. Interações, 7(13), 31-44. https://www.redalyc.org/pdf/354/35401303.pdf
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), essa perspectiva supera as clássicas dicotomias entre subjetivo/objetivo, coletivo/singular, já que só há sujeito constituído em meio a coletivos, e formas de subjetivação produzidas a partir de determinadas condições objetivas: “o sujeito, a partir das relações que vivencia no mundo, produz significações e, como ser significante, vivenciar esta sua condição de ser lhe permite singularizar os objetos coletivos, humanizando a objetividade do mundo” (p. 36).

Assim, entendemos que a construção de espaços coletivos na Proteção Social Básica da Assistência Social é fundamental, pois é no grupo que os(as) usuários(as) poderão produzir novas formas de subjetivação e objetivação, já que o coletivo é composto, como destaca Maheirie ( 2002 Maheirie, K. (2002). Constituição do sujeito, subjetividade e objetividade. Interações, 7(13), 31-44. https://www.redalyc.org/pdf/354/35401303.pdf
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), por um entrecruzamento de singularidades. Nos grupos os sujeitos podem vivenciar sentimentos de pertencimento que são fundamentais para a construção de si, sendo um espaço de afetos, de semelhanças e diferenciações, de identificações e desidentificações (Campos & Sousa, 2015Campos, H. R., & Sousa, S. M. G. (2015). Emocore: experiências grupais na constituição da adolescência. EDUFRN. ).

De acordo com o SUAS, a Proteção Social Básica deve operar baseando-se na prevenção a partir da convivência e fortalecimento de vínculos familiares e comunitários. Ou seja, a Proteção Social Básica aposta nas estratégias grupais como fonte de transformação na vida dos sujeitos e territórios; parte da ideia de que o fortalecimento familiar e comunitário é um elemento preventivo e promotor da cidadania, ao mesmo tempo em que fortalece a conexão e rede de solidariedade entre os sujeitos.

O uso do dispositivo grupal foi apontado no trabalho de Gomes e Santos ( 2017 Gomes, M. A., & Santos, C. M. (2017). A perspectiva sociohistórica e a política nacional de assistência social. Revista de Ciências HUMANAS, 51(2), 345-368. https://doi.org/10.5007/2178-4582.2017v51n2p345
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) como uma potente ferramenta de intervenção psicossocial no âmbito do SUAS. A abordagem psicossocial – um dos pilares da PNAS – foi definida pelas autoras como:

um olhar teórico e metodológico que, simultaneamente, se pauta em uma escuta singularizada dos processos de significação, das experiências, dos afetos e da relação com a alteridade, ao mesmo tempo em que tem como foco a mobilização da rede de direitos e benefícios socioassistenciais que venham garantir a cidadania e uma vida digna a estes(as) usuários(as) do SUAS (p. 361).

Ao acompanhar o grupo de idosos(as) do SCFV, percebemos o quanto a formação e fortalecimento dos vínculos entre eles(as) e com a equipe técnica é de fundamental importância para que se sintam reconhecidos(as), acolhidos(as) e legitimados(as) enquanto sujeitos. Nadia demonstra o carinho que tem com suas colegas de grupo e com as profissionais do SCFV: “ Essas colegas maravilhosas aí, e essas gatonas aí que atendem nós. . . já quinta-feira, já tá com vontade de vim sexta-feira, sabe? Porque a gente sabe que a gente chega aqui e elas vêm com aquele abraço gostoso, aquele acolhimento ”.

Rogério também pontua que a oficina “ alegra a gente ”, e Patrícia diz que quando chegam no SCFV “ a gente entra já, elas tudo sorrindo; a gente já olha já é outra, outra mente . . .”. Apreendemos por meio dessas falas que há um acolhimento caloroso e afetivo por parte da equipe profissional: “o que produz calor do lugar é a segurança e uma forte dose de sentimento de sentir-se gente entre os pares” (Sawaia, 1995 Sawaia, B. B. (1995). O calor do lugar: segregação urbana e identidade. São Paulo em Perspectiva, 9(2), 20-24. http://produtos.seade.gov.br/produtos/spp/v09n02/v09n02_04.pdf
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, p. 23), tornando-se um lugar de referência simbólica e uma experiência subjetiva compartilhada.

Conforme a leitura de Sawaia ( 2009 Sawaia, B. B. (2009). Psicologia e desigualdade social: uma reflexão sobre liberdade e transformação social. Psicologia e Sociedade, 21(3), 364-372. https://doi.org/10.1590/S0102-71822009000300010
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) – debruçada na filosofia espinosana –, o ser humano é um grau de potência movido pelo seu desejo, um corpo composto por afecções, ou seja, o afeto é a condição e fundamento do ser e do existir. O grupo, nessa perspectiva, pode ser compreendido como uma intercorporeidade afetiva que pode tanto ampliar como reduzir a potência de viver. A alegria – afeto citado por Rogério – amplia a capacidade de existir e criar, favorecendo relações que façam a passagem da heteronomia para a autonomia, transpondo as experiências de servidão para as de liberdade.

Foi possível notar que o vínculo é fortalecido por meio do trabalho nas oficinas e demais espaços de conversa e acolhimento, o que vem promovendo um forte engajamento dos(as) usuários(as), como fica evidente na fala de Nadia e Regina, respectivamente: “. . . comecei a participar acho que já faz uns cinco anos, e eu adoro aqui, adoro ”; “ eu faço já faz uns dez anos, desde que era lá no morrinho lá, lá [no antigo endereço do CRAS]”.

Partindo de Vigotski (1934/ 2001Vigotski, L. S. (1934/2001). Pensamento e Palavra. In A construção do Pensamento e da Linguagem. Martins Fontes. ; 2000 Vigotski, L. S. (2000) Manuscrito de 1929. Educação & Sociedade, 21(71), 23-44. http://dx.doi.org/10.1590/S0101-73302000000200002
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), compreendemos que a convivência e os vínculos são atributos da própria condição humana, dando-se entre os sujeitos que se constituem na medida em que se relacionam, sujeitos constituídos por meio da linguagem numa relação dialética com o seu contexto eminentemente social. Ou seja, a linguagem é um instrumento fundamental no processo de constituição do sujeito. Em “Pensamento e Palavra”, última obra de Vigotski, o autor escreve sobre a mútua constituição entre pensamento e linguagem, dizendo que o pensamento “não se exprime na palavra, mas nela se realiza” (Vigotski, 1934/ 2001Vigotski, L. S. (1934/2001). Pensamento e Palavra. In A construção do Pensamento e da Linguagem. Martins Fontes. , p. 409). Portanto, o sujeito é compreendido como um agregado de relações sociais (Vigotski, 2000 Vigotski, L. S. (2000) Manuscrito de 1929. Educação & Sociedade, 21(71), 23-44. http://dx.doi.org/10.1590/S0101-73302000000200002
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), já que é por meio dos diversos encontros com o outro, com a diferença, que vai constituindo seus processos de significação, constituindo a si mesmo e seu contexto.

Conforme Zanella ( 2005 Zanella, A. V. (2005). Sujeito e Alteridade: Reflexões a partir da Psicologia Histórico-Cultural. Psicologia & Sociedade, 17(2), 99-104. http://dx.doi.org/10.1590/S0102-71822005000200013
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), a relação com o outro é fundante do sujeito, já que “a existência de um eu só é possível via relações sociais e, ainda que singular, é sempre e necessariamente marcado pelo encontro permanente com os muitos outros que caracterizam a cultura” (p. 102). Dessa forma, temos que a alteridade se dá nas relações interpessoais e intergrupais em que as diferenças se tecem e se (des)encontram, em que “vontades e desejos são produzidos nas relações cotidianamente e coletivamente vividas e que são subjetivadas, convertendo-se em diferença” (p. 103).

A partir do entendimento dos afetos e sua importância na constituição do sujeito, podemos perceber como esse grupo do SCFV pode se configurar com um espaço potencialmente gerador de “bons encontros”, o que fica evidente nas falas de Patrícia e Nadia sobre as amizades que fizeram no SCFV: “ A gente arrumou bastante amiga aqui ”; “ Tem umas amigas aqui que, meu Deus, tudo elas, tudo minhas amigas ”. O grupo foi proporcionando bons encontros à medida que possibilitava a vivência de relações potencializadoras e mais duradouras, elementos que expandem a vida.

Sob esta perspectiva, partimos da ideia de que as emoções são desencadeadoras de modos de subjetivação acerca de si e do outro. Como afirma Maheirie ( 2002 Maheirie, K. (2002). Constituição do sujeito, subjetividade e objetividade. Interações, 7(13), 31-44. https://www.redalyc.org/pdf/354/35401303.pdf
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), a possibilidade humana de se emocionar é “uma forma de apreender o mundo” (p. 38). De acordo com a forma como é significado pelos outros, da maneira como é acolhido e ouvido, da importância dada à fala e às afecções, pode-se produzir mobilizações subjetivas que afetam o entendimento que o sujeito tem de si e de seus contextos, mobilizando-o para reinventar sua própria existência.

Portanto, destacamos a relevância do desenvolvimento de atividades e ações nas políticas sociais, mais especificamente na Assistência Social, que estejam de acordo com essa perspectiva, que é pautada na necessidade de reconhecimento e expansão da vida, ressaltando a importância da sobrevivência objetiva e subjetiva. Para a psicologia sócio-histórica é inviável cindir o corpo em uma dimensão biológica e outra subjetiva/cultural, já que, antes mesmo de nascer, um lugar social e subjetivo vai sendo configurado no corpo simbólico do bebê que ainda está para chegar.

Em sua pesquisa sobre a dialética estabelecida entre as funções biológicas e culturais ao longo do desenvolvimento infantil, Pino ( 2005Pino, A. (2005). As marcas do humano: às origens da constituição cultural da criança na perspectiva de Lev. S.Vigotski. Cortez. ) discorre sobre a semiotização do corpo biológico, que vai gerando desenvolvimento e aprendizagem, processos eminentemente culturais. Na busca de rastrear “as marcas do humano” no desenvolvimento filo e ontogenético, o autor afirma que “o ato biológico de nascer tem, no mundo humano, o caráter de um evento cultural” (Pino, 2005Pino, A. (2005). As marcas do humano: às origens da constituição cultural da criança na perspectiva de Lev. S.Vigotski. Cortez. , p. 151). Sendo assim, para essa perspectiva, a sobrevivência humana depende tanto dos processos biológicos quanto culturais, ou, como afirma Sawaia ( 2009 Sawaia, B. B. (2009). Psicologia e desigualdade social: uma reflexão sobre liberdade e transformação social. Psicologia e Sociedade, 21(3), 364-372. https://doi.org/10.1590/S0102-71822009000300010
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), trata-se de uma sobrevivência afetiva e física.

Um dado interessante é que a fragilização da saúde corporal foi um dos principais elementos que fizeram alguns usuários(as) buscarem o grupo por conta própria ou serem encaminhados(as) por algum profissional da saúde: “ Eu vim aqui que eu tava muito doentinha, daí sempre falavam que era bom pra mim aqui, e foi bom mesmo ” (Inácia). Nadia nos conta que começou a participar do grupo por orientação médica quando teve que fazer uma cirurgia na coluna: “ coloquei oito parafusos e uma placa na coluna, daí os médicos me indicaram fazer exercício, ficar ali fazendo exercício. Daí eu vim pra cá fazer, por causa da cirurgia; eu comecei a fazer exercício aqui ”. Ivone também relata que chegou até o grupo em busca de atividade física pois “ eu não podia nem andar, e agora tô caminhando. . . ”.

Como já havia apontado no estudo de Sobrinho e colaboradores ( 2017 Sobrinho, P. C., Souza, G. G., Macedo, J. O. R., Aniceto, R. R., & Oliveira, L. S. (2017). Capacidade funcional, nível de atividade física e risco de quedas de idosas participantes de um Centro de Covivência no interior da Paraíba. Revista Brasileira de Prescrição e Fisiologia do Exercício, 11(68), 588-595. http://www.rbpfex.com.br/index.php/rbpfex/article/view/1207
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), a participação em um grupo no SCFV para idosos na cidade de Emas/PB trouxe benefícios à saúde geral. Além de fazer exercícios, estimular a saúde corporal e colocar “ os nervo pro lugar, né? ”, tal como disse Cecília, o grupo propiciou mediações tanto para o corpo biológico quanto para o corpo subjetivo, semiotizando as relações que cada corpo biológico estabelecia nesse espaço intersubjetivo.

Entendemos que a participação nesse grupo acarreta impactos na saúde de seus participantes quando a entendemos, como afirma Sawaia ( 1999Sawaia, B. B. (1999). Comunidade como Ética e Estética da Existência: uma reflexão mediada pelo conceito de identidade. ), como um processo social e cultural que inclui o corpo biológico, o corpo afetivo e um sistema político. Este corpo é potencializado quando inserido em um campo intersubjetivo que expande os afetos e a vida, possibilitando a construção de novas aprendizagens e movimentos de superação:

Ah, isso aqui pra nós é uma saúde, uma dinâmica, assim, pra voz . . . porque tinha muita gente que tinha vergonha até de se comunicar, e aqui trouxe bastante superação nisso aí pra nós. Tinha gente que chegava aqui nem abaixar assim não conseguia, hoje já consegue se abaixar, né? (Regina)

Outro ponto a ser destacado foi a superação da timidez, que alguns usuários(as) relataram que foi propiciada pelos encontros grupais. Inácia conta na entrevista coletiva que era “ muito tímida, não falava ”. Sua colega, Regina, complementa sua fala afirmando que “ Inácia nem levantava a cabeça! Andava sempre assim ” – imitando Inácia andando de forma cabisbaixa. Como já havia assinalado o estudo de Francisco e Pinheiro ( 2018 Francisco, C. M., & Pinheiro, M. A. (2018). Espaços de Convivência para Idosos: benefícios e estratégias. Revista Recien, 8(24), 65-72. https://doi.org/10.24276/rrecien2358-3088.2018.8.24.65-72
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), é importante que os espaços de convivência para idosos(as) não sejam apenas um local para atividade física, lazer, diversão e prevenção de doenças associadas ao processo do envelhecimento, mas sim um ambiente que contribui para a autonomia, independência e inclusão social da pessoa idosa.

Por isso a importância e relevância de formas de intervenção promotoras de encontros que afetem os sujeitos, causando mobilizações e provocando transformações, tal como são os grupos e coletivos na Proteção Social Básica do SUAS. No trabalho de Gomes, Andrade e Maheirie ( 2017Maheirie, K. (2019). Grupos e ações coletivas como objetos de análise e foco nas intervenções psicossociais. In F. A. Costa, M. R. Mesquita (Orgs.), Psicologia política no Brasil e enfrentamentos a processos antidemocráticos (pp. 123-142). EDUFAL. ), realizado com os trabalhadores(as) de um CRAS, é apontada a possibilidade do grupo se configurar como uma oficina estética, ou seja, um espaço mediado pela atividade criadora que venha a fomentar processos criativos. O grupo, assim, torna-se um lugar de aprendizagem e transformação, onde o encontro com a diferença possibilita o afeto mútuo:

Além de ser um recurso pertinente para abarcar a vasta demanda destes serviços, as experiências que são vividas nos grupos diferem-se daquelas vivenciadas no âmbito individual. O encontro com o outro, o processo de troca e identificação, o entrecruzamento das narrativas, a ruptura e criação de novos sentidos são amplamente estimuladas e possibilitadas dentro destes espaços coletivos

(Gomes & Santos, 2017 Gomes, M. A., & Santos, C. M. (2017). A perspectiva sociohistórica e a política nacional de assistência social. Revista de Ciências HUMANAS, 51(2), 345-368. https://doi.org/10.5007/2178-4582.2017v51n2p345
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, p. 362).

Uma das estratégias de intervenção na Proteção Social Básica é o processo de territorialização que busca aproximar o CRAS da comunidade, construindo com ela as ações promotoras de vínculos e de cidadania para cada contexto. Ou seja, não se trata de montar um grupo no CRAS e aguardar que as pessoas se inscrevam; o trabalho de territorialização subverte essa lógica típica da psicologia de consultório e coloca a equipe para atuar no território e escutar as demandas que dali irão emergir. A inserção de Maria no SCFV foi decorrente de uma intervenção realizada por uma das técnicas no território do CRAS:

Eu vim porque eu tive acidente, daí eu tava na rua toda agarradinha no muro, daí apareceu a Joseane [técnica de referência], né? E daí ela assim: ‘quer ir lá com nós, no CRAS?’. Daí eu pensei: ‘como é que eu vou, desse jeito?“. Daí, assim: ’vamo dar um jeitinho de você ir’. Daí eu comecei a vim com a Irene, minha colega, né? Daí eu vim, sempre vim, daí ela parou de vim e eu fiquei (Maria).

A escuta psicológica é uma das principais ferramentas da abordagem psicossocial tal como é proposta pela PNAS. Alguns usuários(as) apontaram que o SCFV é um lugar para falar e escutar, onde “ tem alguém para escutar a gente ” (Patrícia). A escuta psicológica dá abertura e catalisa o processo de singularização, favorecendo a “emergência da singularidade, uma vez que possibilita uma variação infinita de sentidos de uma afecção provocada” (Sawaia, 2009 Sawaia, B. B. (2009). Psicologia e desigualdade social: uma reflexão sobre liberdade e transformação social. Psicologia e Sociedade, 21(3), 364-372. https://doi.org/10.1590/S0102-71822009000300010
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, p. 369), tendo como cerne desse processo a imaginação, que amplia a experiência, permite ao sujeito se apropriar da experiência do outro, ressignificar as marcas do passado e presentificar o futuro.

Conforme Gomes e Santos ( 2017 Gomes, M. A., & Santos, C. M. (2017). A perspectiva sociohistórica e a política nacional de assistência social. Revista de Ciências HUMANAS, 51(2), 345-368. https://doi.org/10.5007/2178-4582.2017v51n2p345
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), o grupo como ferramenta de intervenção serve como um espaço de referência, de produção de sentidos e acolhimento subjetivo em que “o espaço de fala, de escuta e trocas com o outro podem trazer novas mediações simbólicas que venham subsidiar novas formas de subjetivação e objetivação” (p. 355).

A partir das narrativas escutadas ao longo dessa observação participante, foi possível constatar que esse grupo tem conseguido alcançar alguns resultados propostos pela PNAS, tais como: o desenvolvimento das capacidades e potencialidades dos(as) usuários(as) – como constatamos com a formação de novos vínculos; a expansão da alegria e potência de viver; a superação da timidez; e os benefícios corporais. Observamos também que esse espaço tem gerado algo que vai além de atividades geradoras de convivência e socialização, servindo também como um espaço afetivo e transformador para a vida de alguns(as) usuários(as).

Apostamos que o grupo pode servir como um espaço de acolhida, de fortalecimento de vínculos e de emancipação humana, já que, como aponta Sawaia ( 2009 Sawaia, B. B. (2009). Psicologia e desigualdade social: uma reflexão sobre liberdade e transformação social. Psicologia e Sociedade, 21(3), 364-372. https://doi.org/10.1590/S0102-71822009000300010
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), investir em bons encontros potencializadores de ação, que gerem bons afetos, é invariavelmente combater as relações sociais cristalizadas que geram dependência, subordinação e submissão. Apontado como um “lugar para se encontrar” e “ter aconchego”, esse SCFV tem servido de alimento da potência de ação e do calor humano, promovendo movimentos de recriação da existência singular e coletiva. Destacamos a importância de construir intervenções psicossociais que apostem na capacidade sígnica e criativa do sujeito, pois dessa forma conseguimos atuar tanto na dimensão singular das afecções como no âmbito macropolítico, já que este é formado por um sistema intersubjetivo.

O(a) idoso(a) e os processos de exclusão: O SCFV como um potencializador da cidadania

Iniciaremos esta categoria trazendo um diálogo que emergiu da entrevista coletiva, e que, sob nossa leitura, nos traz indícios desse espaço como potencializador da cidadania destes(as) participantes. A usuária Leila, ao discorrer sobre o apreço que tem pela equipe técnica, conta-nos um episódio em que elas entraram no ônibus e ficaram “ caindo e levantando e ninguém falava nada, tá? Aquelas dondoca, as menina nova sentada ali na frente, não tava nem aí, né?”. Segue contando que Joana (técnica) “ deu pra nós um livrinho, como é que é, do Idoso? ” – referindo-se ao Estatuto do Idoso ( 2003 Estatuto do Idoso. (2003). Lei nº 10.741. Dispõe sobre o Estatuto da Pessoa Idosa e dá outras providências. Brasília, DF. http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2003/l10.741.htm
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).

Leila continua contando que começaram a levar o Estatuto com elas quando pegavam ônibus, e diziam: “ó, olha aqui , motorista, tá vendo? O Estatuto dos Idosos, olha ali, ó, a pessoa largada ali! ”. Narra que “ um dia caiu uma senhorinha ” e as pessoas permaneceram sentadas nas vagas preferenciais. Em tom indignada diz “ poxa, quando entram no ônibus já passa pra trás, né? ”. Avalia que depois que começaram a frequentar o ônibus com o Estatuto do Idoso “. . . mudou muito, mudou, aí tu não via mais ninguém ali na frente, já entrava pro ônibus e ia lá pra trás né? Aí nós tinha boca, entendeu? Hoje a gente tem bem mais boc a. . .”. Comparando com outro tempo, Inácia diz: “ a gente não sabia, ficava quieta, aguentava bem quieta, mas igual; o idoso é maltratado ”. Antônia complementa a fala de Inácia afirmando que “ se tiver três, quatro idoso numa parada de ônibus, se não tiver um que paga, os ônibus passam corrido e não pegam, porque sabem que o idoso não vai pagar. Isso já me fizeram várias vezes, com amigas minhas, sabe?

Essas falas foram proferidas por três idosas ao serem questionadas se algo mudou na vida delas depois que começaram a participar do SCFV. Ao trazerem essas cenas vivenciadas no transporte público, essas idosas evidenciam a vulnerabilidade psicossocial e processos de exclusão a que estão submetidas por serem idosas. Muitas das construções verbais que escutamos durante a entrevista coletiva aliaram suas falas ao cotidiano, uma vez que é na concretude dos acontecimentos da vida das pessoas que as vulnerabilidades psicossociais a que estão submetidas ficam evidentes.

Reuniremos esses discursos e os entenderemos como uma composição enunciativa que amalgama forças e tensionamentos sociais, como cenas, na perspectiva de Rancière ( 2006Rancière, J. (2006). O disenso. In A. Novaes (Org,.), A crise da razão (pp. 367-382). Companhia das Letras. ). De acordo com Gomes e Santos ( 2017 Gomes, M. A., & Santos, C. M. (2017). A perspectiva sociohistórica e a política nacional de assistência social. Revista de Ciências HUMANAS, 51(2), 345-368. https://doi.org/10.5007/2178-4582.2017v51n2p345
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), “a montagem da cena na pesquisa é um exercício de observação dos detalhes da vida que expressam questões do campo no âmbito de relações singulares” (p. 7), que são, por condição, produzidas na partilha coletiva.

Assim, entendemos que essas cenas do “motorista” e das “dondocas” revelam atos de segregação e violência que os(as) idosos(as) vivenciam constantemente na sociedade capitalista que exalta a juventude e rechaça o envelhecimento. Conforme Guareschi Comunello, Nardini e Hoenisch ( 2004Guareschi, N., Comunello, L. N., Nardini, M., & Hoenisch, J. C. (2004). Problematizando as práticas psicológicas no modo de entender a violência. In M. N. Strey, M. P. Azambuja R., & F. P. Jaeger (Orgs.), Violência, gênero e políticas públicas (pp. 177-193). EDIPUCRS. ), a violência é um fenômeno complexo amalgamado por questões sociais, históricas e culturais. Podemos afirmar que as práticas de violência ocorrem por meio do uso injusto da força e do poder, produzindo relações assimétricas de opressão e sofrimento, configurando-se como uma violação de direito. Importante destacar que a prática de violência contra a pessoa idosa é recorrente não somente na esfera pública, como também na esfera privada, tal como apontou a pesquisa de Colussi e colaboradoras ( 2019 Colussi, E. L., Kuyawa, A., Marchi, A. C. B., & Pichler, N. A. (2019). Percepções de idosos sobre envelhecimento e violência nas relações intrafamiliares. Revista Brasileira de Geriatria e Gerontologia, 22(4). https://doi.org/10.1590/1981-22562019022.190034
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).

As autoras destacam que a banalização da violência no cotidiano é intensificada quando se trata de grupos subalternizados pela sociedade, como são as pessoas pobres e idosas na sociedade contemporânea. Ao denunciarem a postura violenta e segregadora do “motorista” e das “dondocas” – entendendo a postura desses sujeitos como reflexos de processos sociais coletivos –, os(as) idosos(as) nomeiam e visibilizam uma violência que geralmente ficaria escamoteada ou silenciada. De alguma forma eles(as) provocam a engessada e violenta relação da sociedade contra as pessoas idosas, colocando-se de forma mais ativa, questionadora e provocativa nessas situações cotidianas.

Os serviços ofertados no CRAS – dentre eles o SCFV – têm como objetivo prevenir a ocorrência de situações de vulnerabilidades sociais nos territórios por meio do desenvolvimento de potencialidades, do fortalecimento de vínculos familiares e comunitários, e da ampliação do acesso aos direitos e cidadania (Resolução nº 109, 2009 Resolução nº 109. (2009). Aprova a Tipificação Nacional de Serviços Socioassistenciais. Diário Oficial da União, ano CXLVI, n. 225, 25 nov. 2009. https://www.mds.gov.br/webarquivos/public/resolucao_CNAS_N109_%202009.pdf
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). As narrativas supracitadas nos dão indícios de que esse SCFV tem mediado processos de reflexão e ação que possibilitam que esses(as) usuários(as) superem as situações de discriminação e violência. De algum modo, o grupo favorece a construção de recursos simbólicos para lidarem com as vulnerabilidades psicossociais vividas nesse território. Leila encontra no uso do Estatuto do Idoso uma alternativa para lidar com uma situação que fere sua cidadania e sua condição de sujeito.

Ao pensarmos sobre cidadania, e mais, sobre o SCFV como potencializador da cidadania desses(as) idosos(as), pensamos um conceito de cidadania que, conforme Sawaia ( 1994Sawaia, B. B. (1994). Cidadania, diversidade e comunidade: uma reflexão psicossocial. In M. J. P. Spink (Org.), A cidadania em construção: uma reflexão transdisciplinar. Cortez. ), está além da igualdade de direitos. É necessário agregar a noção de alteridade nessa reflexão, compreendendo a cidadania como um fenômeno inter e intrassubjetivo, que abarca tanto as dimensões política, social e histórica, como a subjetiva. A cidadania é mais do que a noção de que todos somos iguais em direitos, pois não é apenas relacionada aos conhecimentos sobre legislação, mas tem a ver com um sentir-se igual aos outros. Nessa mesma perspectiva, o trabalho de Gomes e colaboradoras ( 2017 Gomes, A. H., Andrade, L., & Maheirie, K. (2017). A experiência de ser trabalhador na assistência social: imagens de vidas implicadas com o campo da desigualdade social. Pesquisa e Práticas Psicossociais, 12(3), 21-39. http://pepsic.bvsalud.org/pdf/ppp/v12n3/11.pdf
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), em diálogo com a obra de Jacques Rancière ( 2006Rancière, J. (2006). O disenso. In A. Novaes (Org,.), A crise da razão (pp. 367-382). Companhia das Letras. ), aponta que as condições da cidadania e o exercício dos direitos sociais se alteram a cada tempo histórico e se pautam na lógica do dissenso provocado por aqueles que lutam para se fazerem percebidos como sujeitos em seu contexto social e histórico.

A partir das cenas e falas proferidas no grupo do SCFV de Idosos(as), podemos pensar o SCFV como um potencializador dessa cidadania, que vai além do conhecimento sobre os direitos na medida em que abarca a dimensão da alteridade e dos encontros, dos dissensos e das reivindicações por reconhecimento enquanto sujeitos, um lugar que potencializa a ação coletiva e individual em direção à luta por direitos das pessoas idosas como um todo. Como fica evidente na fala de Leila, que, ao conhecer o Estatuto do Idoso e, com ele, seus direitos no transporte público, foi solicitar ajuda ao motorista para outra senhora que ela nem conhecia. Tal qual traduz Sawaia ( 1994Sawaia, B. B. (1994). Cidadania, diversidade e comunidade: uma reflexão psicossocial. In M. J. P. Spink (Org.), A cidadania em construção: uma reflexão transdisciplinar. Cortez. ): “toda ação coletiva é vivida como necessidade do eu – nada pode ser social sem ser ao mesmo tempo individual” (p. 151).

Outra fala que evidencia o CRAS e o SCFV como um possível potencializador da cidadania desses(as) usuários(as) é a fala de Leila que, ao ser questionada sobre como era sua relação com a equipe do CRAS, responde:

Então, eu também acho que o CRAS é muito bom pelo seguinte ó, a gente tem orientação sobre coisa que a gente não sabia, dos direitos, aqui a gente fica completa de tudo entendeu, fica espertinha (risos), porque tem gente que nem sabe os seus direitos né? Ou tipo assim, precisa resolver um problema e não sabe aonde, vem aqui tem toda a iniciativa né? Então é muito bom, a orientação muito boa (Leila).

Tendo em vista que o SCFV e o CRAS têm como um de seus objetivos a promoção da cidadania, entendemos, por meio das falas e vivências acompanhadas na observação desse grupo, que esse processo coletivo (Lane, 1984Lane, S. T. M. (1984). O processo grupal. In S. T. M. Lane, & W. Codo (Eds.), Psicologia Social: O homem em movimento (pp. 78-98). Brasiliense. ; Andaló, 2006Andaló, C. (2006). Mediação Grupal: uma leitura histórico-cultural. Ágora. ) contribui de alguma forma para a superação das desigualdades sociais e seu respectivo “sofrimento ético-político” (Sawaia, 2009 Sawaia, B. B. (2009). Psicologia e desigualdade social: uma reflexão sobre liberdade e transformação social. Psicologia e Sociedade, 21(3), 364-372. https://doi.org/10.1590/S0102-71822009000300010
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, p. 370).

O sofrimento ético-político é compreendido como uma construção social e histórica que produz sentimentos de invalidez, culpabilização e humilhação nos grupos sociais incluídos perversamente na sociedade capitalista. Conforme Maheirie ( 2002 Maheirie, K. (2002). Constituição do sujeito, subjetividade e objetividade. Interações, 7(13), 31-44. https://www.redalyc.org/pdf/354/35401303.pdf
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), “a qualidade relacional do afeto depende da história do sujeito, ou seja, de suas significações singulares que são mediatizadas por um determinado contexto histórico, social e político” (p. 38).

Podemos pensar que os(as) idosos(as) vivenciam o sofrimento ético-político por serem segregados, estereotipados e rechaçados pela cultura hegemônica. A sociedade capitalista, conforme aponta o trabalho de Martins ( 2013 Martins, E. (2013). Constituição e significação de família para idosos institucionalizados: uma visão histórico-cultural do envelhecimento. Estudos e Pesquisas em Psicologia, 13(1), 215-236. http://pepsic.bvsalud.org/pdf/epp/v13n1/v13n1a14.pdf
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), com suas relações de produção e valorização do trabalho, descarta e exclui tudo o que é considerado velho, valorizando e respeitando o que/quem é útil e novo para a lógica capitalista. Entendida como uma categoria social, a velhice vai sendo subjetivada por cada pessoa de uma forma singular atravessada por esses significados coletivos. Nesse sentido, faz-se importante a realização de trabalhos, como este que desenvolvemos no SCFV, para criar espaços de reflexão, trocas, criação e reinvenção de si.

Siqueira ( 2019 Siqueira, C. L. O. (2019). Contribuições da teoria histórico cultural de Vigotski para pensar envelhecimento. [Tese de Doutorado, Universidade Estadual Paulista]. https://repositorio.unesp.br/handle/11449/182034
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) compreende que o(a) idoso(a) nunca deixa de se reinventar, de construir novos modos de agir e pensar. A pesquisa realizada pela autora acompanhou durante dois anos um grupo de idosas e direcionou o olhar a elas enquanto pessoas singulares em processo de contínuo desenvolvimento, portanto refutando discursos que insistem em controlar e higienizar a velhice. Ressalta a importância de ressignificar o processo de envelhecimento, deslocando a(o) idosa(o) da condição de sujeito do não para sujeito do sim, ou seja, ao invés de pautar-se na compensação do que falta e almejar o propagado envelhecimento ativo e saudável, pode atuar no fomento de potencialidades do envelhecer a partir da liberação da(o) idosa(o) para o acontecimento vital em sua plenitude.

Por isso destacamos a importância de espaços coletivos que estimulem a promoção da cidadania por meio do acesso à informação e orientação e aos próprios direitos, espaços que permitam que os(as) usuários(as) sejam únicos(as) e diferentes dos(as) demais, ao mesmo tempo em que iguais a todo(as), que se possa aprender a (con)viver com o outro e a tomar decisões em conjunto, discutindo possibilidades de viver bem e melhor, instrumentalizando esses sujeitos a lutar contra toda forma de opressão e invisibilização presentes em seu cotidiano.

A construção de espaços coletivos potencializam a reflexão, a criação e o protagonismo, tornando-se ferramentas que enriquecem o encontro com a alteridade, fortalecendo as identidades coletivas-comunitárias que estarão mais unificadas e orgânicas para atuar contra os riscos e vulnerabilidades que constituem, de forma geral, os territórios dos(as) usuários(as) do SUAS (Gomes & Santos, 2017 Gomes, M. A., & Santos, C. M. (2017). A perspectiva sociohistórica e a política nacional de assistência social. Revista de Ciências HUMANAS, 51(2), 345-368. https://doi.org/10.5007/2178-4582.2017v51n2p345
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, p. 358).

A utilização do aporte teórico da teoria de Vigotski ajuda a pensar o desenvolvimento a partir de uma visão prospectiva, porque não condiciona esses processos à categoria biológica-maturacional, trazendo uma possibilidade nova de compreensão do processo de envelhecimento, tendo em vista que as teorias clássicas do desenvolvimento não contemplam o(a) idoso(a), e, quando o(a) consideram, fazem isso a partir de uma perspectiva orgânica cujo declínio, perda e limitação são inevitáveis. Ao vislumbrarmos a potência de vida, das experiências possíveis aos sujeitos, das conexões e dos embates que estes estabelecem no grupo, dos movimentos de transformação internos e externos, podemos mediar processos que os permitam se reposicionarem subjetivamente no seu lugar de idosos(as).

Considerações finais

A partir da análise que realizamos, podemos compreender o SCFV pesquisado como um espaço potencialmente acolhedor e afetuoso para seus(suas) usuários(as), que propicia “bons encontros” e promove a cidadania desses(as) idosos(as). Observamos que o SCFV se configura como um lugar importante na vida destes(as), um lugar que os(as) torna mais visíveis e reconhecidos(as). Além disso, o grupo também se revelou como um lugar potente para promover a reflexão, as identificações e desidentificações, os consensos e os dissensos, um lugar de pertencimento para esses(as) idosos(as).

Apesar dos aspectos positivos relacionados ao SCFV e ao CRAS trazidos pelos(as) idosos(as), pudemos observar no campo de pesquisa como vem crescendo o desmonte das políticas públicas, especialmente a Assistência Social, uma vez que estamos sob a lógica de uma governamentalidade necropolítica, em que não ocorre somente o desinvestimento nas políticas públicas e sociais, mas também uma ampliação do investimento nas políticas de segurança, demonstrando sob qual racionalidade o governo dos corpos e vidas vem sendo operado (Marques, Roberto, Gonçalves, & Bernardes, 2019 Marques, C. F., Roberto, N. L. B., Gonçalves, H. S., & Bernardes, A. G. (2019). O que significa o Desmonte? Desmonte Do que e Para Quem? Psicologia: Ciência e Profissão, 39(spe2), 6-18. https://doi.org/10.1590/1982-3703003225552
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).

Observamos as inúmeras dificuldades enfrentadas pela equipe do Serviço e do CRAS, muitas vezes contornadas pelo esforço e dedicação dos(as) profissionais envolvidos, que fazem muito mais do que suas atribuições para que o SCFV funcione, mesmo diante de tantas precarizações em suas condições de trabalho. Consideramos que espaços de convivência como o SCFV, que apostam no coletivo e na potência dos(as) usuários(as), deveriam ser ampliados, uma vez que cumprem com os objetivos da Proteção Social Básica do SUAS, prevenindo situações de violação dos direitos, possibilitando a construção da autonomia, reconhecimento e cidadania para as pessoas.

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    » https://doi.org/10.1590/S0101-73302000000200002
  • Zanella, A. V. (2005). Sujeito e Alteridade: Reflexões a partir da Psicologia Histórico-Cultural. Psicologia & Sociedade, 17(2), 99-104. http://dx.doi.org/10.1590/S0102-71822005000200013
    » https://doi.org/10.1590/S0102-71822005000200013
  • 1
    Vale destacar que a utilização da palavra “idoso” está de acordo com a denominação oficial adotada pelos censos demográficos, pela Organização Mundial da Saúde (OMS) e pelas políticas públicas e sociais que focalizam o envelhecimento, como a Política Nacional do Idoso (PNI), e, sendo assim, refere-se a todos os indivíduos que tenham 60 anos ou mais. Partindo desse critério formal, e para evitar diferentes conotações ao nos referirmos a esse grupo de sujeitos, utilizaremos o termo proposto. Nos pautaremos na perspectiva de Siqueira ( 2019 Siqueira, C. L. O. (2019). Contribuições da teoria histórico cultural de Vigotski para pensar envelhecimento. [Tese de Doutorado, Universidade Estadual Paulista]. https://repositorio.unesp.br/handle/11449/182034
    https://repositorio.unesp.br/handle/1144...
    ), que critica o termo “terceira idade por não existir primeira nem segunda idade” compreendendo este termo como uma “tentativa de camuflar o envelhecimento”.
  • 2
    Cabe destacar que a mobilização da sociedade civil – especialmente do Grupo de Apoio a Imigrantes e Refugiados da cidade de Florianópolis (GAIRF) – conseguiu implantar o CRAI (Centro de Referência de Atendimento ao Imigrante), que foi pensado para atuar com a rede intersetorial das políticas públicas. Sendo assim, ainda que com muitas fragilidades institucionais, o CRAI buscava atuar em parceria com a rede SUAS na cidade de Florianópolis. Infelizmente, sob o argumento de que não seria possível renovar o convênio entre a Ação Social Arquidiocesana (ASA) e a Secretaria de Assistência Social, Habitação e Trabalho, o Estado de Santa Catarina, após um ano e sete meses de atividades, fechou o CRAI da cidade de Florianópolis, encerrando um importante diálogo com os CRAS e CREAS sobre o tema da migração (Machado, Barros, & Martins-Borges, 2019 Machado, G. S., Barros, A. F. O., & Martins-Borges, L. (2019). A escuta psicológica como ferramenta de integração: práticas clínicas e sociais em um Centro de Referência de Atendimento a imigrantes em Santa Catarina. REMHU – Revista Interdisciplinar de Mobilidade Humana, 27(55), 79-96. https://doi.org/10.1590/1980-85852503880005506
    https://doi.org/10.1590/1980-85852503880...
    ).

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    24 Jun 2024
  • Data do Fascículo
    2024

Histórico

  • Recebido
    28 Out 2021
  • Aceito
    11 Maio 2022
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