Resumos
A presente pesquisa teve como objetivo a busca por evidência de validade com base na relação com variáveis externas para a Escala de Percepção do Suporte Social (versão adulto) - EPSUS-A, por meio da análise de correlação com os instrumentos Inventário de Percepção do Suporte Familiar (IPSF) e a Escala Baptista de Depressão (versão adulta) – EBADEP-A. A amostra do estudo foi composta por 102 universitários, com idade variando entre 18 e 61 anos (M = 26,59, DP = 9,57). Dos resultados, quanto às análises de correlação entre os instrumentos, todas as dimensões da EPSUS-A se correlacionaram de forma positiva e significativa em relação às dimensões do IPSF, assim como todas os fatores da EPSUS-A apresentaram correlações negativas e significativas com a EBADEP-A, evidenciando, dessa forma, validade em relação às variáveis externas da EPSUS-A.
Validade Social em Pesquisa; Familia; Apoio Social; Depressão
This study aimed to establish evidence regarding the validity (based on the relationship with external variables) of the Scale of Perceived Social Support (Adult Version, EPSUS-A) through a correlation analysis with the Perception Inventory Instruments of Family Support (IPSF) and the Baptista Depression Scale (Adult Version, EBADEP-A). The study sample comprised 102 students aged 18–61 years (M = 26.59, SD = 9.57). The results of the correlation analysis between the instruments show that all the dimensions of the EPSUS-A correlated positively and significantly with that of the IPSF. However, all the factors of the EPSUS correlated negatively and significantly with the EBADEP-A, thus depicting validity in the relationship with the external variables of the EPSUS.
Social Validity, Research; Family; Social Support; Depression
Esta investigación tuvo como objetivo buscar evidencias de validez basada en la relación con las variables externas de la Escala de percepción de Apoyo Social (versión para adultos) - EPSUS-A, a través del análisis de correlación con los instrumentos Inventario de Percepción de Apoyo a la Familia (IPSF) y la Escala Baptista de Depresión (versión para adultos) - EBADEP-A. La muestra del estudio consistió en 102 estudiantes universitarios, con edades entre 18 y 61 años (M = 26.59, SD = 9,57). Los resultados, del análisis de correlación entre los instrumentos, mostraron que todas las dimensiones de EPSUS-A se correlacionaron positiva y significativamente con respecto a las dimensiones de IPSF, así como todos los factores de la EPSUS-A se correlacionaron negativamente y de forma significativa con EBADEP-A, mostrando así. la validez con relación con las variables externas de la EPSUS-A.
Validez Social de la Investigación; Familia; Apoyo Social; Depresión
Introdução
A vinculação social pode ser considerada uma variável positiva no processo de atuação em sociedade, não somente pela necessidade de convivência, mas também devido ao bem-estar que tais vínculos podem proporcionar. É sabido que a interação social e, consequentemente, a percepção de apoio que advém desse meio, são concebidas como importantes ferramentas no processo de saúde e doença (Haber, Cohen, Lucas & Baltes, 2007). Suporte social é considerado um construto multidimensional e, em decorrência disso, há grande discussão com relação a sua definição e possíveis fontes provedoras de suporte (Ribeiro, 1999). Entretanto, o que não é questionado é sua importância como agente protetor frente a situações estressoras do cotidiano.
O construto suporte social surgiu na literatura em Psicologia e em áreas correlatas a partir de 1970 e teve como precursor dos estudos Cobb que, em 1976, o definiu como informações que levam o indivíduo a crenças de ser amado, apreciado, ter valor e que as pessoas se preocupam com ele. Para o autor, o suporte social está relacionado à percepção de afetividade entre as pessoas, buscando compreender como a inexistência ou precariedade do suporte social poderia aumentar a vulnerabilidade a doenças e como o suporte social protegeria os indivíduos de danos à saúde física e mental decorrentes de situações de estresse.
A partir dos estudos da década de 1970 o construto ganhou destaque principalmente na área da saúde, assim, outras definições e fontes de suportes foram estudadas e discutidas. Na década de 1980, Thoits (1982)acrescentou a dimensão instrumental. Para esse autor, o suporte social pode ser entendido não somente pela disponibilidade de relacionamentos afetivos (emocionais), mas também deveria ser levada em consideração a dimensão instrumental (material), ou seja, percepção de pessoas que podem ajudar os indivíduos no que concerne a recursos financeiros e práticos.
Na década de 1990, alguns autores salientaram a existência de uma terceira dimensão do suporte, além da emocional e instrumental, já mencionadas anteriormente, ou seja, a informacional. Essa terceira fonte de suporte está relacionada a receber de outras pessoas informações que ajudem os indivíduos no processo de tomada de decisão (Rodriguez, & Cohen, 1998). Ribeiro (1999) corrobora com essa informação na medida em que faz referência ao suporte social como um construto que pode ser observado em diversas esferas de interações humanas, tais como família, trabalho, instituições de ensino, saúde, religiosa e outras. Ressalta-se também que, geralmente, os estudos acerca do suporte social tem como foco a área da saúde. Para o presente estudo será feito um recorte apresentando informações sobre a relação do suporte percebido no contexto social e na família, assim como a relação entre suporte social e depressão.
Suporte social e familiar
Acerca da definição de família, Sanches (2012) pontua que essa é caracterizada como um sistema social e aberto, no sentido de que seus membros se relacionam tanto entre si, concebendo a família enquanto microesfera, assim como se relacionam com o meio externo, enquanto seres que atuam no contexto social, macroesfera. Nesses termos, na medida em que a família desempenha um papel facilitador, no sentido de contribuir para desenvolvimento de seus membros, essa passa a funcionar como um sistema suportivo, e não punitivo, para seus componentes (Férez-Carneiro, & Diniz Neto, 2012).
De acordo com Baptista, Cardoso e Gomes (2012) o processo de desenvolvimento familiar perpassa pela oferta e percepção de suporte de ordem física e emocional. Nessa mesma direção é destacada a importância da família como mediadora no processo de inserção de seus membros na sociedade por intermédio de transmissão de valores, cultura, regras e apoio. Quanto ao suporte oferecido por parte da família, Parker, Tupling e Brown (1979) ressaltaram que se trata de um construto estudado e que mantém relação com o suporte social, sendo, para os referidos autores, o suporte familiar um âmbito reduzido do suporte social. Em acréscimo, o concebe como ações de afeto, proteção e autonomia, expressas pelos familiares, e percebidos pelos seus membros. Ao encontro da afirmação anterior, Procidano e Heller (1983) referem-se ao suporte familiar como o grau de apoio recebido da família em relação às necessidades percebidas pelos indivíduos.
O suporte familiar é um conceito multidimensional que está relacionado ao grau em que as necessidades de apoio do indivíduo são satisfeitas pela família. O mesmo pode ser manifestado por meio de ações que demonstrem afetividade, diálogo e autonomia entre os integrantes da família. Nesse sentido, não há uma definição exata de suporte familiar, entretanto é sabido que o mesmo está relacionado à qualidade de apoio que o sujeito recebe de sua família (Baptista, 2005; Baptista, Baptista & Oliveira, 2004). Eggens, Werf e Bosker (2008) destacaram que, dentre os tipos de suporte disponíveis, o familiar se mostra um dos mais influentes na medida em que o indivíduo é formado, geralmente, em contato com seus familiares. Para esses últimos autores, o adequado suporte familiar permite que o indivíduo adquira habilidades e autoconfiança necessárias para enfrentar os desafios no âmbito social.
Há o interesse de autores em estudar a relação entre suporte oferecido pela família e suporte social e, mais do que isso, como as percepções desses suportes podem estar relacionadas a uma função amortecedora e preventiva em casos de situações estressantes vivenciadas pelos indivíduos. Procidano e Heller (1983), por exemplo, construíram um instrumento que visa avaliar esses dois tipos de suportes, social e familiar. No referido estudo, os autores aplicaram, em uma amostra de 222 universitários, aPerceived Social Support (PSS) em suas duas versões, a familiar (PSS-Fa) e em relação a amigos, ou suporte social (PSS-Fr), juntamente com a Life Experience Survey (LES), o Social Network Questionnaire (SNQ) e o Langner 22-item Scrrening Instrument. No que tange aos resultados encontrados com significância estatística nesse estudo, houve correlação de sentido positivo (r = 0,24) entre as escalas PSS-Fa e PSS-Fr, evidenciando que suporte social e familiar, na amostra aplicada, estiveram relacionados. Além disso, obteve-se correlações negativas entre a Langner Check List com os instrumentos de suporte (r = -0,27 com PSS-Fa e r = -0,29 com a PSS-Fr), nesse sentido, com base nesses resultados encontrados na amostra, quanto maior a percepção de suporte, menor a probabilidade de desenvolvimento de doenças psíquicas. E, por fim, correlações positivas entre o SNQ e as escalas de suporte (r =0,35 com PSS-Fa e r = 0,40 com a PSS-Fr), estando, dessa forma, associadas ao melhor relacionamento do indivíduo com sua rede social.
Baptista, Rigotto, Cardoso e Rueda (2012)correlacionaram instrumentos que avaliam suporte familiar, suporte social e autoconceito. Para tanto, aplicaram o Inventário de Percepção do Suporte Familiar (IPSF), o Questionário de Suporte Social (SSQ) e o Inventário de Esquemas de Gênero do Autoconceito (IEGA) em uma amostra de 254 universitários. No que tange aos resultados entre os instrumentos que mensuravam suporte, houve correlações de sentido positivo e estatisticamente significativas em todas as dimensões dos instrumentos IPSF e SSQ, sendo 0,27 (Afetivo consistente – IPSF e Número de figuras suportivas - SSQ), 0,34 (Afetivo consistente - IPSF e Satisfação com o suporte – SSQ), 0,23 (Adaptação familiar – IPSF e Número de figuras suportivas – SSQ), 0,29 (Adaptação familiar e Satisfação com o suporte – SSQ), 0,15 (Autonomia – IPSF e Número de figuras suportivas – SSQ), 0,22 (Autonomia – IPSF e Satisfação com o suporte – SSQ), 0,28 (IPSF Total e Número de figuras suportivas), 0,37 (IPSF Total e Satisfação com o suporte – SSQ), estando implícita a relação direta e positiva entre suporte social e familiar.
Compton, Thompson e Kaslow (2005)analisaram a associação entre suporte social e suporte familiar, e concluíram sobre sua função protetiva no que se refere ao suicídio. Para tanto, a amostra constou de 200 participantes americanos e africanos, sendo 100 com histórico de tentativa de suicídio e 100 não apresentando esse histórico. Os participantes responderam a instrumentos que avaliam o suporte familiar, suporte social, bem como depressão: o Family Adaptability and Cohesion Evaluation Scale (FACES II), a Social Embeddedness Scale, oMedical Outcomes Study (MOS) e o Beck Depression Inventory-II (BDI-II). Dos resultados, o grupo que já havia tentado suicídio percebeu menos suporte, tanto familiar quanto social, assim como os autores salientaram que os sintomas depressivos, na amostra estudada, podem ter função mediadora entre o ambiente social e as tentativas de suicídio.
Rueger, Malecki e Demaray (2010) revisaram diversos estudos que sustentam a hipótese de que o suporte social pode contribuir no processo de desenvolvimento de adequadas relações sociais e vinculação dos indivíduos e, também, a percepção positiva de suporte social e familiar relaciona-se a menores índices de depressão e de baixa autoestima. Em contrapartida, salientam os autores que, quanto menor a percepção de suporte social e familiar, maior tende a serem os índices de sintomatologia depressiva e sofrimento psíquico.
Suporte social e depressão
A depressão, de acordo com autores como Bahls e Bahls (2002), é atualmente um construto muito investigado na literatura na área de saúde, devido ao aumento de sua incidência na população em geral. Nessa mesma direção, Del Porto (1999) atentou para o fato de o termo depressão estar sendo utilizado pela população em geral de forma errônea, pois muitas vezes pessoas são "diagnosticadas" como depressivas, ou se autointitulam depressiva, quando na realidade o que estão apresentando são estados afetivos normais, como, por exemplo, tristeza, desânimo ou cansaço.
No Manual Diagnóstico e Estatístico de Doenças Mentais (DSM-IV-TR), a depressão é considerada um transtorno de humor, cuja sintomatologia inclui a presença de humor deprimido e/ou a perda de interesse na realização de atividades por um período mínimo para diagnóstico. Além disso, deve-se considerar a presença de quatro ou mais sintomas adicionais, sendo esses, alterações no apetite ou peso, sono e atividade psicomotora; diminuição da energia; sentimentos de desvalia ou culpa; dificuldades para pensar, concentrar-se ou tomar decisões, ou pensamentos recorrentes sobre morte ou ideação suicida, planos ou tentativas de suicídio (APA, 2002).
De acordo com Baptista (2004), a depressão tem sua etiologia por meio de diversos fatores, como, por exemplo, psicológicos, biológicos, sociais e econômicos, que podem desencadear o transtorno. O mesmo autor apontou, com base em estudos epidemiológicos, que a depressão pode ser encontrada em qualquer grupo etário, assim como se faz presente nos indivíduos, independentemente do sexo e outras variáveis, entretanto, o grupo com maior frequência de depressão se encontra entre 20 e 40 anos, assim como mulheres tendem a apresentar frequência maior de desenvolvimento do transtorno.
Quanto ao estado civil, pessoas que não possuem um relacionamento estável, com maior frequência para sujeitos separados, também se enquadram no grupo de maior probabilidade de desenvolvimento de quadros depressivos. Nessa mesma direção, possíveis variáveis contextuais podem estar relacionadas ao diagnóstico de depressão, pois, segundo o mesmo autor, doenças físicas, baixa autoestima, além de precário repertório de enfrentamento de problemas e baixa percepção de suporte familiar e social podem estar relacionados ao desenvolvimento do transtorno depressivo (Baptista, 2004).
Acerca da relação entre depressão e suporte social, Rodrigues e Madeira (2009), por meio de um estudo de revisão teórica entre suporte social e saúde mental, pontuaram que a deficitária percepção do suporte social pode contribuir para o aumento de sintomatologia depressiva, ou seja, pessoas que apresentam pouca vinculação social tendem a apresentar maior frequência de sintomatologia depressiva. Com base nas afirmações supracitadas, cabe, na presente pesquisa, a apresentação de estudos que tiveram como objetivos a avaliação entre suporte social e o construto depressão.
Bosworth et al. (2000) investigaram a relação entre percepção de suporte social, eventos de vida negativos e depressão em uma amostra de 335 pacientes com doença cardíaca. Para a coleta dos dados, os autores utilizaram a Duke Depression Evaluation Schedule(DDES), a Duke Social Support Index (DSSI) e, para avaliar percepção de eventos de vida negativos, 19 itens relacionados à família, matrimônio, saúde, dificuldades financeiras, trabalho, problemas interpessoais e judiciais. Com relação aos resultados entre os construtos depressão e suporte social, pacientes deprimidos relataram menor percepção de suporte social. Esse resultado é discutido pelos autores por meio de duas hipóteses, por um lado, a precária interação social pode deixar indivíduos mais vulneráveis a desenvolver depressão e a perceber eventos de vida de forma negativa. Por outro lado, pessoas deprimidas podem ter maiores dificuldades quanto a se relacionarem socialmente devido aos seus pensamentos negativos quanto a si próprios, aos outros e ao futuro e, consequentemente, menor tende a ser a percepção em relação ao suporte social.
No estudo de Horowitz, Reinhardt, Boerner e Travis (2003), um dos objetivos propostos foi de analisar a influência do suporte social e sintomatologia depressiva em uma amostra de 95 idosos atendidos por um serviço de reabilitação da visão de uma cidade dos Estados Unidos. Dos instrumentos utilizados, para se avaliar o suporte social, os autores utilizaram a Emotional Boudedness Scale (EBS), além de perguntas elaboradas com relação a casamento, suporte da família e estabilidade dos relacionamentos com os amigos. Para avaliar depressão, foi utilizado a Center for Epidemiological Studies Depression Scale (CES-D). Quanto aos resultados, de 95 idosos da amostra, 19 apresentaram sintomatologias depressivas, e desses, a maior parte percebeu pouco suporte familiar e social além de pouca percepção de saúde. Nesse sentido, os autores atentaram para algumas variáveis que podem ter contribuído para a não ocorrência de sintomatologia depressiva, como, por exemplo, bom relacionamento familiar e social, por meio de amigos, além de pertencerem à instituição de saúde onde eles têm a possibilidade de se encontrar e manter os vínculos sociais com pessoas que apresentam dificuldades semelhantes.
No estudo de Talaei, Fayyazi e Ardani (2009), 1.200 universitários foram avaliados no que tange à sintomatologia depressiva, percepção de suporte social e autoestima. Para a análise de sintomatologia depressiva, foi utilizado o Beck Depression Inventory (BDI), para a mensuração do suporte social, aplicou-se aCassidy Social Support Scale e a análise da autoestima se deu por meio da Eysenk Self-esteem Scale. Em relação às análises entre o suporte social e sintomatologia depressiva foi percebido que o grupo com maior percepção de suporte social foi o que relatou menor percepção de sintomatologia depressiva. Com base nos resultados os autores ressaltaram que sintomatologia depressiva e suporte social possuem uma relação inversa, ou seja, quanto maior a percepção de apoio do contexto, menor tende a ser a sintomatologia depressiva, e vice-versa.
Ceyhan, Ceyhan e Kurtyilmaz (2012)realizaram um estudo visando avaliar a autoimagem, suporte social, habilidades em resolver problemas, depressão e uso inadequado da internet em uma amostra com 492 universitários turcos. No que tange aos instrumentos utilizados para avaliação da autoimagem, foi utilizado a Pleasure of the Body Organs Scale, o suporte social foi avaliado pela Multidimensional Scale of Perceived Social Support (MSPSS), para a análise de resolução de problemas utilizou-se o Problem Solving Inventory, Form A (PSI-A). Sintomatologia depressiva foi investigada por meio doBeck Depression Inventory (BDI) e a avaliação do uso problemático da internet foi realizada pela Problematic Internet Usage Scale (PIUS). Os dados foram analisados por meio de correlações entre os instrumentos e, no que tange aos resultados entre suporte social e depressão, houve correlação negativa e estatisticamente significativa (r = -0,22).
Como pode ser visualizado por meio de diversos teóricos e estudos empíricos o relacionamento social, e, consequentemente, o apoio recebido por meio desse, é considerado fator de grande importância na vida das pessoas enquanto sujeitos relacionais. Dessa forma, a mensuração adequada desse construto por parte de profissionais torna-se pertinente, entretanto, o Brasil, atualmente não conta com instrumentos psicológicos disponíveis para o contexto profissional que avaliam o apoio social (Gonçalves, Pawlowski, Bandeira & Piccinini, 2011). Esses mesmos autores, por meio de um estudo de análise da literatura nacional em relação ao suporte social destacaram que no Brasil há poucos instrumentos, construídos ou adaptados, sendo essa uma lacuna para novos estudos. Nesse sentido, o presente estudo tem por objetivo buscar evidência de validade com base na relação com outras variáveis para a Escala de Percepção do Suporte Social (versão adulta) – EPSUS-A (Baptista, & Cardoso, 2010), por meio da análise de correlações entre o referido instrumento e dois outros que mensuram construtos relacionados, quais sejam, suporte familiar e sintomatologia depressiva. De acordo com Alves, Souza e Baptista (2011), essa evidência pode ser obtida uma vez que os dados obtidos no relacionamento entre os construtos investigados corroborem com a literatura. Em acréscimo, com base nas informações teóricas e dos estudos apresentados até o presente momento, algumas hipóteses podem ser formuladas:
H1: na análise de correlação entre a EPSUS-A e IPSF espera-se que o sentido seja positivo entre as dimensões dos instrumentos;
H2: é esperada correlação negativa entre a EPSUS-A e a EBADEP-A.
Método
Participantes
A amostra foi composta por 102 universitários, provenientes de duas instituições privadas do interior do estado de São Paulo, com idades entre 18 a 61 anos (M = 26,59, DP = 9,57), assim como, a maior parte da amostra foi composta pelo sexo feminino, 84 (82,4%) e solteiros, 75 (73,5%). No que tange à religião dos participantes, as maiores frequências foram de católicos, 64 (62,7%), seguido de espíritas, 11 (10,8%). Em relação à prática da religião, 54 (52,9%) responderam que são praticantes de alguma religião, enquanto 41 (40,2%) salientaram não serem praticantes de religião.
Instrumentos
a) Escala de Percepção do Suporte Social (versão adulta) – EPSUS-A(Baptista & Cardoso, 2010).
A EPSUS-A foi construída com base na teoria de suporte social de Rodriguez e Cohen (1998). Inicialmente o instrumento foi composto por 77 itens, respondidos por meio de uma escala do tipo Likert de quatro pontos, a saber, Sempre; Muitas Vezes; Poucas Vezes; Nunca. Por meio de um estudo de validação com base na estrutura interna com 533 universitários a escala foi submetida a um procedimento de análise fatorial, utilizando-se o modelo de Análise dos Componentes Principais e rotação Oblimin. A partir dessa análise a EPSUS-A ficou composta por 36 itens, agrupados em quatro fatores com adequadas propriedades psicométricas, quais sejam, Fator 1 – Afetivo, composto por 17 itens e índice de precisão alfa de Cronbach (α) igual a 0,92, o Fator 2 – Interações Sociais (cinco itens e α = 0,75), o Fator 3 – Instrumental (sete itens e α = 0,82) e o Fator 4 – Enfrentamento de Problemas (sete itens e α = 0,83). Em relação às interpretações do instrumento, a pontuação da EPSUS-A pode variar entre zero e 108, sendo que, quanto maior a pontuação, maior a percepção do suporte social.
b) Inventário de Percepção do Suporte Familiar - IPSF
O IPSF (Baptista, 2009) tem por objetivo avaliar a percepção do suporte familiar. O inventário é composto por 42 itens, respondidos por meio de uma escala do tipo Likert de três pontos. No que tange às qualidades psicométricas, atualmente o IPSF é reconhecido pelo Conselho Federal de Psicologia (CFP) como um teste psicológico que pode ser utilizado no contexto profissional, o que indica que o mesmo apresenta adequadas propriedades psicométricas no que se refere a evidências de validade, precisão, normatização e padronização. O IPSF é divido em três facetas do suporte, sendo essas, Afetivo-consistente (α = 0,91), Adaptação familiar (α = 0,90) e Autonomia (α = 0,77). No que tange à pontuação, o inventário pode variar entre zero a 84 pontos, sendo que, quanto maior a pontuação, maior será a percepção de suporte familiar.
c) Escala Baptista de Depressão – EBADEP-A
A EBADEP-A (Baptista, 2012) é um teste psicológico reconhecido pelo CFP que tem por objetivo analisar sintomatologia depressiva em amostras psiquiátricas e não psiquiátricas. A escala apresenta adequados parâmetros psicométricos, tendo índice de precisão alfa deCronbach de 0,94, e é composta por 45 itens, respondidos por meio de uma escala do tipo Likert de quatro pontos, pelos quais são verificadas as sintomatologias depressivas. A pontuação da EBADEP-A pode variar entre zero e 135, sendo que, quanto maior a pontuação, maior a sintomatologia em depressão.
Procedimentos
Após a aprovação do estudo pelo Comitê de Ética (protocolo nº 0240.0.142.000-11), os instrumentos foram aplicados em universitários que concordaram em participar da pesquisa por meio da assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE). O protocolo aplicado foi composto por duas vias do TCLE, seguidas pela EPSUS-A, IPSF e EBADEP-A. A aplicação dos instrumentos se deu de forma coletiva e tempo médio para coleta dos dados foi de vinte minutos.
Resultados
Como pode ser observado na Tabela 1, todas as correlações entre os instrumentos foram de sentido positivo e, em sua maioria, com significância estatística. A dimensão três da EPSUS-A apresentou apenas duas correlações com significância estatística (com a dimensão um do IPSF e IPSF total).
Utilizando como referência a categorização de correlação proposta por Dancey e Reidy (2006), os quais concebem correlações de magnitudes nulas (entre 0 e 0,20), baixa (0,21 e 0,40), moderada (041 e 0,60), alta (0,61 e 0,80) e muito alta (0,81 a 1), pode-se dizer que, dentre as correlações com significância estatística entre EPSUS-A e IPSF, treze correlações foram de magnitude baixa e três de magnitude moderada. Já em relação às análises entre EPSUS-A e EBADEP eram esperadas correlações de sentido negativo.
Pela Tabela 2, é possível confirmar tal hipótese, além disso, todas as associações entre EPSUS-A e EBADEP obtiveram sentido negativo e foram estatisticamente significativas. No que tange às classificações das correlações, três se apresentaram tendo baixa magnitude e duas correlações com magnitudes moderadas (Dancey, & Reidy, 2006).
Discussão
As correlações encontradas entre suporte social e suporte familiar estiveram de acordo com a hipótese formulada. No presente estudo, das 20 correlações entre as dimensões dos instrumentos, todas foram de sentido positivo, conforme a primeira hipótese, e dessas, 18 com significância estatística. Esses dados corroboram com afirmações de Parker, Tupling e Brown (1979)e Duru (2007), nas quais os autores ressaltaram que o suporte familiar é um construto relacionado ao suporte social, ou seja, de forma mais específica, o suporte social é uma esfera reduzida do suporte social. Em relação às análises correlacionais entre os instrumentos, há certa evidência na literatura de que são esperadas correlações positivas na avaliação dos construtos suporte social e familiar (Baptista et al., 2012; Compton et al., 2005;Duru, 2007; Parker et al., 1979; Procidano & Heller, 1983)
Outra análise realizada no estudo com vistas a evidenciar validade para a EPSUS-A foi a correlação entre suporte social e sintomatologia depressiva, por meio da EPSUS-A e EBADEP-A. Autores que estudam o construto depressão salientam que diversas variáveis podem ser consideradas protetivas em relação ao desenvolvimento de depressão e sintomatologia depressiva, dentre elas a percepção positiva do suporte social recebido (Bahls, & Bahls, 2002; Boyd, Diamond, & Bourjolly, 2006; Panzarella, Alloy, & Whitehouse, 2006). Com base nesses pressupostos foi elaborada a segunda hipótese desse estudo, a qual esperava-se por correlações negativas entre as dimensões da EPSUS-A e a EBADEP-A.
Todas as correlações entre as dimensões da EPSUS-A e EBADEP-A foram de sentido negativo e estatisticamente significativas, o que confirma a hipótese dois. Esses dados são corroborados por outros estudos que tiveram como propósito a análise correlacional entre suporte social e depressão (Baptista, Baptista, & Torres, 2006; Horowitz et al., 2003).
Acerca das correlações entre a EPSUS-A e os instrumentos IPSF e EBADEP-A, no que se refere a evidências de validade de um teste psicológico, autores, como, por exemplo, Primi, Muniz e Nunes (2009), pontuam que evidência de validade se refere à capacidade do teste medir aquilo que se propõe. Com base nas definições contemporâneas de validade para os testes psicológicos, os autores salientam que essas podem ser obtidas por meio de cinco fontes, evidência de validade com base no conteúdo, processo de resposta, estrutura interna, na relação com variáveis externas e evidências de validade baseadas nas consequências da testagem. No estudo em questão, pode-se dizer que a EPSUS-A apresentou evidência de validade com base na relação com variáveis externas, nesse caso, por meio dos instrumentos IPSF e EBADEP-A, uma vez que, ao encontro das informações trazidas por Alves et al. (2011), os dados da presente pesquisa foram justificados com base na literatura pertinente.
Considerações finais
A presente pesquisa teve como objetivo a busca por evidência de validade para a Escala de Percepção do Suporte Social (versão adulto) - EPSUS-A, por meio de análises das correlações com instrumentos que avaliam sintomatologia depressiva e suporte familiar. Os resultados encontrados foram coerentes com achados de outros estudos, apresentando correlações positivas entre suporte social e familiar e, em contrapartida, correlações negativas entre suporte social e sintomatologia depressiva, o que pode-se constatar evidência de validade com base na relação com outras variáveis para a EPSUS-A.
No que tange às limitações do estudo, apesar desse apresentar um número amostral baixo e pouco heterogêneo, uma vez em que a coleta se deu com 102 universitários, as correlações foram consideradas satisfatórias, o que remete à reflexão para novos estudos com a escala no sentido de buscar evidenciar validade para diferentes amostras, tais como grupos clínicos, sujeitos com diagnóstico confirmado de algumas patologias, dentre outras. Além disso, é importante salientar para o fato de que os estudos sequentes devam apresentar número amostral superior ao do estudo em questão.
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Datas de Publicação
-
Publicação nesta coleção
Jul-Sep 2015
Histórico
-
Recebido
15 Maio 2013 -
Revisado
20 Jan 2014 -
Aceito
22 Maio 2015