Resumo
O distanciamento social ocasionado pela pandemia de Covid-19 levou a profundas mudanças na rotina das famílias com crianças pequenas, aumentando o estresse no ambiente doméstico. Este estudo analisou a experiência de planejamento e implementação de um projeto de extensão universitária que ofereceu orientação a pais com filhos de 0 a 11 anos por meio de chamadas de áudio durante a pandemia. O protocolo de atendimento foi desenvolvido para atender às necessidades de famílias de baixa renda e listava problemas específicos relacionados ao confinamento em casa e ao fechamento das escolas seguidos por uma variedade de estratégias de enfrentamento. A análise de 223 queixas relatadas pelos usuários em 130 ligações revelou que 94% dos problemas referidos pelos pais foram contemplados pelo protocolo de atendimento e estavam relacionados aos problemas externalizantes (39%) ou internalizantes (26%) das crianças ou ao declínio do bem-estar subjetivo dos pais (29%). Serviços de apoio devem orientar os pais quanto ao uso de práticas responsivas e assertivas que promovam o bem-estar emocional da criança e estabeleçam expectativas comportamentais em contextos estressantes. A diminuição dos conflitos entre pais e filhos resultante do uso dessas estratégias tende a reduzir o sofrimento dos pais, aumentando sua sensação de bem-estar subjetivo. Recomenda-se ampla divulgação dessas iniciativas e seguimento dos casos.
Palavras-chave:
Covid-19; Orientação a Pais; Crianças; Problemas de Comportamento; Bem-Estar Subjetivo
Abstract
The social distancing the COVID-19 pandemic entailed has led to profound changes in the routine of families with young children, increasing stress in the home environment. This study analyzed the experience of planning and implementing a university extension program that offered support to parents with children from 0 to 11 years old via audio calls during the COVID-19 pandemic. The service protocol was developed to meet the needs of low-income families and listed specific problems related to home confinement and school closure followed by a variety of coping strategies. The analysis of 223 complaints reported by users in 130 calls revealed that 94% of the problems reported by parents were addressed by the protocol and were related to children’s externalizing (39%) or internalizing (26%) problems or to the decline in parents’ subjective well-being (29%). Support services should guide parents on the use of responsive and assertive practices that promote the child’s emotional well-being and set behavioral expectations in stressful contexts. The reduction in conflicts between parents and children resulting from the use of these strategies tends to reduce parents’ suffering, increasing their sense of subjective well-being. Wide dissemination of these initiatives and case follow-up are recommended.
Keywords:
COVID-19; Parents’ Support; Children; Behavior Problems; Subjective Well-being
Resumen
La distancia social causada por la pandemia de COVID-19 condujo a cambios profundos en la rutina de las familias con niños pequeños, aumentando el estrés en el entorno del hogar. Este estudio analizó la experiencia de planificar e implementar un proyecto de extensión universitaria que ofreció orientación a los padres con niños de cero a 11 años a través de llamadas de audio durante la pandemia COVID-19. El protocolo de atención se desarrolló para satisfacer las necesidades de las familias de bajos ingresos y enumeró problemas específicos relacionados con el confinamiento en el hogar y el cierre de la escuela, seguido de una variedad de estrategias de afrontamiento. El análisis de 223 quejas informadas por los usuarios en 130 llamadas reveló que el 94% de los problemas informados por los padres fueron abordados por el protocolo de atención y estaban relacionados con los problemas de externalización (39%) o internalización (26%) de los niños o la disminución del bienestar subjetivo de los padres (29%). Los servicios de apoyo deberían aconsejar a los padres sobre el uso de prácticas receptivas y asertivas que promuevan el bienestar emocional del niño y establezcan expectativas de comportamiento en contextos estresantes. La reducción de los conflictos entre padres e hijos como resultado del uso de estas estrategias tiende a reducir el sufrimiento de los padres, aumentando su sensación de bienestar subjetivo. Se recomienda una amplia difusión de estas iniciativas y seguimiento de casos.
Palabras-clave:
COVID-19; Orientación a los Padres; Niños; Problemas de Conducta; Bienestar Subjetivo
Introdução
A pandemia de Covid-19 e a necessidade de distanciamento social provocaram profundas mudanças na rotina de famílias com crianças pequenas. Inicialmente, a necessidade de conciliar o trabalho remoto aos cuidados com os filhos, a redução drástica e repentina do contato com parentes e amigos, o medo da doença e as preocupações com questões financeiras e com o futuro foram estressores experimentados pelas famílias. Com o passar do tempo, o tédio e a irritabilidade das crianças, expostas a uma rotina monótona, somados a novas responsabilidades transferidas para os pais em virtude do fechamento das escolas, aumentaram a tensão no ambiente doméstico. Este estudo analisou a experiência de planejamento e implementação de um projeto de extensão universitária que ofereceu orientação a pais com filhos de 0 a 11 anos por meio de chamadas de áudio durante a pandemia de Covid-19.
Saúde mental e relações familiares no contexto da Covid-19
A pandemia de Covid-19, uma doença infectocontagiosa que pode evoluir para quadros respiratórios graves e óbito (“Folha informativa sobre Covid-19”, 2020Folha informativa sobre COVID-19.(2020). Opas. https://www.paho.org/pt/covid19
https://www.paho.org/pt/covid19...
), teve o primeiro caso registrado na China no final de 2019. O rápido contágio observado em diferentes países e o risco de agravamento do quadro respiratório dos pacientes levaram a medidas de prevenção restritivas: o isolamento (separação de um indivíduo infectado para evitar a contaminação de outras pessoas), a quarentena (separação durante o período de incubação do vírus) e o distanciamento social (manutenção de uma distância segura, cerca de dois metros, entre as pessoas e evitação de aglomerações) (Agudelo et al., 2020Agudelo, H. A. M., Sacks, P. S., Almondes, K. M., Pérez, G. J. T., Liparoti, P., & Rey, M. J. M. (2020). Afrontamiento psicológico del COVID 19, documento consenso. Federación Latinoamericana de Sociedades de Sueño; Asociación Latinoamericana de Psicologia del Sueño. ). Essas medidas geraram consequências, como o aumento nas taxas de desemprego (Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico [OCDE], 2020aOrganização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico [OCDE]. (2020a). Global economy faces a tightrope walk to recovery. https://www.oecd.org/newsroom/global-economy-faces-a-tightrope-walk-to-recovery.htm
https://www.oecd.org/newsroom/global-eco...
), a redução da jornada de trabalho e dos salários (Kirzinger, Hamel, Muñana, Kearney, & Brodie, 2020Kirzinger, A., Hamel, L., Muñana, C., Kearney, A., & Brodie, M. (2020). KFF health tracking poll - late April 2020: Coronavirus, social distancing, and contact tracing. https://www.kff.org/report-section/kff-health-tracking-poll-late-april-2020-economic-and-mental-health-impacts-of-coronavirus/
https://www.kff.org/report-section/kff-h...
), a necessidade de conciliação de atividades profissionais em casa, devido ao fechamento das empresas, aos cuidados com os filhos (Harter, 2020Harter, J. (2020, abril 7). How leaders are responding to COVID-19 workplace disruption. Gallup. https://www.gallup.com/workplace/307622/leaders-responding-covid-workplacedisruption.aspx
https://www.gallup.com/workplace/307622/...
) e a interrupção total ou parcial no tratamento de outras doenças (“Rolling updates on coronavirus disease (COVID-19)”, 2020aRolling updates on coronavirus disease (COVID-19). (2020, jul. 31). OMS. https://www.who.int/emergencies/diseases/novel-coronavirus-2019/events-as-they-happen.
https://www.who.int/emergencies/diseases...
). Populações em situação de vulnerabilidade social sofrem de forma mais aguda com esses prejuízos (OCDE, 2020bOrganização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico [OCDE]. (2020b). OECD Policy Responses to Coronavirus (COVID-19): COVID-19, crises and fragility. http://www.oecd.org/coronavirus/policy-responses/covid-19-crises-and-fragility-2f17a262/
http://www.oecd.org/coronavirus/policy-r...
; “COVID-19”, 2020COVID-19: Number of children living in household poverty to soar by up to 86 million by end of year. (2020, maio 28). Unicef. https://www.unicef.org/press-releases/covid-19-number-children-living-household-poverty-soar-86-million-end-year
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) e, no Brasil, cerca de 50 milhões de pessoas vivem em situação de pobreza e extrema pobreza (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística [IBGE], 2019Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística [IBGE]. (2019). Síntese de indicadores sociais: Extrema pobreza atinge 13,5 milhões de pessoas e chega ao maior nível em 7 anos. https://agenciadenoticias.ibge.gov.br/agencia-noticias/2012-agencia-de-noticias/noticias/25882-extrema-pobreza-atinge-13-5-milhoes-de-pessoas-e-chega-ao-maior-nivel-em-7-anos
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), que tende a ser agravada pela crise decorrente da pandemia.
Esses problemas sociais e econômicos contribuem para o surgimento de transtornos mentais. Além das perdas reais, o medo do contágio, da morte e de ficar desempregado, assim como sentimentos de solidão, desamparo, desconfiança e raiva podem levar o indivíduo a evitar o contato social e a busca de serviços de saúde, o que, por sua vez, aumenta o risco de agravamento de sintomas de transtornos mentais (International Federation of Red Cross and Red Crescent Societies [IFRC], 2020International Federation of Red Cross and Red Crescent Societies [IFRC]. (2020). Mental Health and Psychosocial Support for Staff, Volunteers and Communities in an Outbreak of Novel Coronavirus.). No contexto específico da Covid-19, a literatura indica que a pandemia e variáveis associadas ao distanciamento social contribuem para elevação nos índices de sofrimento psíquico (Sibley et al., 2020Sibley, C. G., Greaves, L. M., Satherley, N., Wilson, M. S., Overall, N. C., Lee, C. H. J., Milojev, P., Bulbulia, J., Osborne, D., Milfont, T. L., Houkamau, C. A., Duck, I. M., Vickers-Jones, R., & Barlow, F. K. (2020). Effects of the COVID-19 pandemic and nationwide lockdown on trust, attitudes towards government, and wellbeing. American Psychologist, 75(5), 618-630. https://doi.org/10.1037/amp0000662
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) e aumento no consumo de álcool e de sintomas de ansiedade, depressão, insônia e estresse (OMS, 2020bSubstantial investment needed to avert mental health crisis. (2020b, maio 14). OMS. https://www.who.int/news/item/14-05-2020-substantial-investment-needed-to-avert-mental-health-crisis
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; Organização das Nações Unidas [ONU], 2020Organização das Nações Unidas [ONU]. (2020). Policy brief: COVID-19 and the need for action on mental health. https://www.un.org/sites/un2.un.org/files/un_policy_brief-covid_and_mental_health_final.pdf
https://www.un.org/sites/un2.un.org/file...
; Wang et al., 2020Wang, C., Pan, R., Wan, X., Tan, Y., Xu, L., Ho, C. S., & Ho, R. C. (2020). Immediate psychological responses and associated factors during the initial stage of the 2019 coronavirus disease (COVID-19) epidemic among the general population in China. International Journal of Environmental Research and Public Health, 17(5), 1-25 https://doi.org/10.3390/ijerph17051729
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;). Além disso, a pandemia está associada ao aumento dos níveis de irritabilidade, inquietação, nervosismo e dificuldades de concentração em crianças e adolescentes (OMS, 2020bSubstantial investment needed to avert mental health crisis. (2020b, maio 14). OMS. https://www.who.int/news/item/14-05-2020-substantial-investment-needed-to-avert-mental-health-crisis
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).
Esses sintomas, somados a outras alterações da vida cotidiana, estão associados a problemas para o funcionamento familiar, incluindo o aumento nas taxas de violência doméstica (Boserup & McKenney, 2020Boserup, B. & McKenney, M., & Elkbuli, A. (2020). Alarming trends in US domestic violence during the COVID-19 pandemic. American Journal of Emergency Medicine. 38(12), 2753-2755. https://doi.org/10.1016/j.ajem.2020.04.077
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; Fórum Brasileiro de Segurança Pública, 2020Fórum Brasileiro de Segurança Pública. (2020). Violência doméstica durante a pandemia de COVID-19 - ed.2. http://forumseguranca.org.br/wp-content/uploads/2020/06/violencia-domestica-covid-19-ed02-v5.pdf
http://forumseguranca.org.br/wp-content/...
; ONU Mulheres, 2020ONU Mulheres. (2020). COVID-19 and ending violence against women and girls. https://www.unwomen.org/-/media/headquarters/attachments/sections/library/publications/2020/issue-brief-covid-19-and-ending-violence-against-women-and-girls-en.pdf?la=en&vs=5006
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), de práticas parentais prejudiciais ao desenvolvimento infantil (Chung, Lanier, & Ju, 2020Chung, G., Lanier, P., & Ju, P. W. Y. (2020, jun. 3). Mediating Effects of Parental Stress on Harsh Parenting And Parent-child Relationship During Coronavirus (COVID-19) Pandemic in Singapore. OSF Preprints. https://doi.org/10.31219/osf.io/vnf4j
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) e do risco de crianças testemunharem ou sofrerem violência e abuso (OMS, 2020bSubstantial investment needed to avert mental health crisis. (2020b, maio 14). OMS. https://www.who.int/news/item/14-05-2020-substantial-investment-needed-to-avert-mental-health-crisis
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).
Outro desafio para o funcionamento familiar no contexto da pandemia de Covid-19 é o risco de sobrecarga, principalmente para as mulheres. Elas precisam lidar com novas demandas geradas pelo fechamento das escolas, com atividades profissionais em casa, devido ao fechamento das empresas, e tarefas domésticas, além de se responsabilizarem pelo cuidado de familiares com condições de saúde preexistentes (OMS, 2020bSubstantial investment needed to avert mental health crisis. (2020b, maio 14). OMS. https://www.who.int/news/item/14-05-2020-substantial-investment-needed-to-avert-mental-health-crisis
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). Essa sobrecarga de tarefas pode contribuir para elevação nos índices de estresse das mães e dos pais e acentuar os danos da pandemia ao funcionamento familiar. Por exemplo, um estudo com 258 pais mostrou que a percepção a respeito do impacto negativo da Covid-19 sobre as finanças, recursos (como alimento e remédio) e saúde psicológica foi preditora de maiores índices de práticas parentais severas e menor proximidade com os filhos, relações mediadas pelo estresse parental (Chung et al., 2020Chung, G., Lanier, P., & Ju, P. W. Y. (2020, jun. 3). Mediating Effects of Parental Stress on Harsh Parenting And Parent-child Relationship During Coronavirus (COVID-19) Pandemic in Singapore. OSF Preprints. https://doi.org/10.31219/osf.io/vnf4j
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).
Serviço de orientação a pais por chamadas de áudio durante a pandemia: desenvolvimento da proposta, do protocolo de atendimento e dados preliminares
À semelhança de outros serviços oferecidos durante a pandemia de Covid-19 (Arantes, 2020Arantes, P. H. (2020, abr. 13). CAASP lança plataforma de saúde mental exclusiva da advocacia paulista. Caasp. https://www.caasp.org.br/noticias.asp?cod_noticia=4492
https://www.caasp.org.br/noticias.asp?co...
; British Columbia Psychological Association [BCPA], 2020British Columbia Psychological Association [BCPA]. (2020). Covid-19 Psychological First Aid Service: Information and Signup. https://www.psychologists.bc.ca/covid-19-resources
https://www.psychologists.bc.ca/covid-19...
; “Psychological support in Serbia during the COVID-19 pandemic”, 2020Psychological support in Serbia during the COVID-19 pandemic. (2020, abril 24). Epale. https://epale.ec.europa.eu/en/blog/psychological-support-serbia-during-covid-19-pandemic
https://epale.ec.europa.eu/en/blog/psych...
; “Salvador ganha plataforma de apoio psicológico gratuito para cidadãos”, 2020Salvador ganha plataforma de apoio psicológico gratuito para cidadãos. (2020). Prefeitura Municipal de Salvador. http://www.sempre.salvador.ba.gov.br/salvador-ganha-plataforma-de-apoio-psicologico-gratuito-para-cidadaos/
http://www.sempre.salvador.ba.gov.br/sal...
), o Apoio Psicológico a Pais de Crianças de 0 A 11 Anos foi implementado como um serviço remoto. Trata-se de um projeto de extensão criado para oferecer orientações aos pais para o enfrentamento de problemas com os filhos, decorrentes do distanciamento social ocasionado pela pandemia de Covid-19. O serviço foi disponibilizado gratuitamente para todo o país, todavia a maioria das ligações (96%) foi proveniente do estado da Bahia, enquanto apenas 4% das chamadas foram oriundas de outras regiões.
A equipe que concebeu o projeto e trabalhou nos atendimentos foi formada por cinco psicólogos que tinham título de especialista, mestre ou doutor em Psicologia e que eram membros do PARAPAIS, Grupo de Pesquisa sobre Parentalidade e Desenvolvimento Socioemocional na Infância, vinculado ao Programa de Pós-Graduação em Psicologia da Universidade Federal da Bahia. Esta atividade de extensão deu continuidade aos projetos de avaliação da eficácia de intervenções que vêm sendo conduzidos pelo grupo de pesquisa em comunidades, escolas e hospitais de Salvador e da Região Metropolitana desde 2013. Os projetos têm como público-alvo famílias com crianças saudáveis e portadoras de doenças crônicas que vivem em condição de vulnerabilidade social. Contudo, devido às restrições ao contato físico impostas pelo distanciamento social, os atendimentos do Apoio Psicológico a Pais de Crianças de 0 a 11 Anos foram realizados por meio de chamadas telefônicas de áudio feitas pelos usuários. O serviço foi disponibilizado em 6 de abril de 2020 e continuou em funcionamento até 31 de agosto de 2020, com o início do relaxamento das medidas de distanciamento social na cidade de Salvador.
Os atendimentos eram realizados de segunda à sexta-feira, entre as 14 e as 16 horas. A duração das chamadas variou entre 15 minutos e 1 hora e 45 minutos. A divulgação do projeto foi feita por meio de um banner digital (Figura 1) e de um vídeo de dois minutos, que foram amplamente divulgados no site da Universidade Federal da Bahia e em redes sociais, além de reportagens e entrevistas concedidas pelos psicólogos do projeto a programas de televisão, rádios e jornais. Todo o material e as estratégias de divulgação do projeto esclareciam o fato de que o serviço não oferecia terapia ou acompanhamento psicológico regular, mas sim orientações específicas para que os pais pudessem lidar melhor com os problemas que surgissem no dia a dia com os filhos durante o período de distanciamento social.
Os atendimentos foram realizados com base em um protocolo orientado por problemas claramente definidos. Cada problema era seguido de orientações explicadas em linguagem simples e objetiva, descrevendo ações passíveis de serem implementadas em contextos domésticos com escassez de recursos (como casas pequenas, recursos financeiros limitados). O protocolo foi criado com base nos programas de intervenção previamente avaliados pelo grupo de pesquisa, na literatura das áreas de parentalidade e desenvolvimento socioemocional infantil, planejamento e avaliação de programas, intervenção em situações de crise e desastre (Alvarenga, Cerezo, Wiese, & Piccinini, 2019Alvarenga, P., Cerezo, M. A., Wiese, E., & Piccinini, C. A. (2019). Effects of a short video feedback intervention on enhancing maternal sensitivity and infant development in low-income families. Attachment & Human Development, 22(5), 1-21. https://doi.org/10.1080/14616734.2019.1602660
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; Haendel, 2018Haendel, T. C. C. (2018). Efeitos de uma intervenção baseada na atenção plena sobre a tolerância ao atraso do reforçador em crianças de educação infantil. [Tese de doutorado, Universidade Federal da Bahia]. Repositório Institucional UFBA. https://repositorio.ufba.br/ri/handle/ri/26735
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; Lins, 2018Lins, T. C. S. (2018). O Impacto das Práticas de Socialização Emocional sobre os Problemas Internalizantes na Infância. Tese de doutorado, Universidade Federal da Bahia]. Repositório Institucional UFBA. https://repositorio.ufba.br/ri/handle/ri/26734
https://repositorio.ufba.br/ri/handle/ri...
; Oliveira, 2018Oliveira, D. R. (2018). Crianças em situações de riscos e desastres: atenção psicossocial, saúde mental e direitos humanos [Tese de doutorado, Universidade de São Paulo]. Biblioteca Digital de Teses e Dissertações da USP. https://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/47/47131/tde-04092018-103504/publico/oliveira_do.pdf
https://www.teses.usp.br/teses/disponive...
; Oliveira & Alvarenga, 2015Oliveira, J. M & Alvarenga, P. (2015). Efeitos de uma intervenção com foco nas práticas de socialização parentais sobre os problemas internalizantes na infância. Revista Brasileira de Terapia Comportamental e Cognitiva, 17(2), 16-32. https://doi.org/10.31505/rbtcc.v17i2.747
https://doi.org/https://doi.org/10.31505...
; Paixão, 2020Paixão, C. (2020). Controle parental em contextos afetados pelo adoecimento de crianças com fibrose cística [Tese de doutorado, Universidade Federal da Bahia]. Repositório institucional UFBA. https://repositorio.ufba.br/ri/handle/ri/31875
https://repositorio.ufba.br/ri/handle/ri...
) e na literatura produzida até então a respeito do impacto da Covid-19 sobre a saúde mental e o funcionamento familiar (Brooks et al., 2020Brooks, S. K., Webster, R. K., Smith, L. E., Woodland, L., Wessely, S., Greenberg, N., & Rubin, G. J. (2020). The psychological impact of quarantine and how to reduce it: rapid review of the evidence. Lancet 2020, 395(10227), 912-920. https://doi.org/10.1016/S0140-6736(20)30460-8
https://doi.org/https://doi.org/10.1016/...
; Danese, Smith, Chitsabesan, & Dubicka, 2019Danese, A., Smith, P., Chitsabesan, P., & Dubicka, B. (2019). Child and adolescent mental health amidst emergencies and disasters. The British Journal of Psychiatry, 216(3), 159-162. https://doi.org/10.1192/bjp.2019.244
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; OMS, 2020aRolling updates on coronavirus disease (COVID-19). (2020, jul. 31). OMS. https://www.who.int/emergencies/diseases/novel-coronavirus-2019/events-as-they-happen.
https://www.who.int/emergencies/diseases...
). Ao orientar os usuários, os membros da equipe: a) coletavam dados sociodemográficos (região geográfica, idade e sexo do cuidador e da criança) e iniciavam as orientações com a “mensagem inicial”, que destacava os recursos emocionais e comportamentais dos pais ou da criança; b) descreviam as estratégias que poderiam ser utilizadas para lidar com o problema; c) explicavam porque as estratégias seriam eficazes para lidar com o problema; e d) perguntavam se havia dúvidas quanto às orientações; e e) concluíam as orientações com a “mensagem final”, que enfatizava a resiliência.
O protocolo descrevia queixas específicas seguidas das orientações que deveriam ser fornecidas, além de orientações gerais sobre onde encontrar informações confiáveis e atualizadas sobre a doença e como explicar para a criança os contextos da pandemia e do distanciamento social. Todas as orientações visavam promover práticas parentais sensíveis e eficazes que facilitam o manejo de conflitos do cotidiano e, consequentemente, favorecem o bem-estar da família e o desenvolvimento socioemocional da criança. As orientações também incluíam estratégias para a manutenção ou restabelecimento do bem-estar emocional dos pais.
As queixas foram delimitadas a partir da análise dos problemas relatados pelos pais referentes a cada um dos filhos. Em alguns casos, quando a criança apresentava queixas diferentes, foram computadas mais de uma queixa para a mesma criança. Em outras situações, quando a mesma queixa era relatada para mais de um filho, esta foi computada uma única vez. As queixas previstas na primeira versão do protocolo de atendimento, concluída antes da abertura do serviço, estavam ligadas aos conceitos de problemas externalizantes e internalizantes infantis e de bem-estar subjetivo dos pais. Os problemas internalizantes infantis são comportamentos da criança que indicam dificuldades emocionais como medo, ansiedade, preocupações ou tristeza persistentes, queixas somáticas como dores no corpo e retraimento social (Achenbach & Rescorla, 2000Achenbach, T. M. & Rescorla, L. A. (2000). Manual for the ASEBA Preschool Forms & Profiles. Aseba.). Além de sofrerem influência de fatores hereditários e culturais e de características de temperamento, os problemas internalizantes tendem a estar associados a práticas parentais superprotetoras ou autoritárias, assim como a práticas que não apoiam a expressividade emocional da criança, dificultando a aprendizagem da autorregulação emocional (Callahan, Scaramella, Laird, & Sohr-Preston, 2011Callahan, K. L., Scaramella, L. V., Laird, R. D., & Sohr-Preston, S. L. (2011). Neighborhood disadvantage as a moderator of the association between harsh parenting and toddler-aged children’s internalizing and externalizing problems. Journal of Family Psychology, 25(1), 68-76. https://psycnet.apa.org/doi/10.1037/a0022448
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; Kiel & Maack, 2012Kiel, E. J. & Maack, D. J. (2012). Maternal BIS sensitivity, overprotective parenting, and children’s internalizing behaviors. Personality and Individual Differences, 53(3), 257-262. https://doi.org/10.1016/j.paid.2012.03.026.
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; O’Neal & Magai, 2005O’Neal, C. R. & Magai, C. (2005). Do parents respond in different ways when children feel different emotions? The emotional context of parenting. Development and Psychopathology, 17(2), 467-487 (2005). https://doi.org/10.1017/S0954579405050224
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).
No contexto da Covid-19, as queixas internalizantes estiveram particularmente associadas ao medo da doença, à tristeza pelo distanciamento de parentes, amigos e professores e à ansiedade relacionada a uma rotina diária monótona com predomínio de atividades passivas, como assistir televisão ou navegar na internet. Nesse sentido, as orientações aos pais incluíam: a) estabelecer uma rotina familiar com horários fixos para refeições, tarefas escolares, trabalho dos pais, tarefas domésticas, exercícios físicos e atividades lúdicas variadas e criativas; b) estimular o contato da criança com parentes e amigos pelas redes sociais ou telefone sempre que possível; c) explicar à criança em linguagem acessível como acontecia o contágio pela doença e a necessidade de distanciamento social; d) ajudar a criança a expressar suas emoções e preocupações, evitando distraí-la ou minimizar seus sentimentos e dando afeto físico (abraços, beijos, cafuné) a ela nesses momentos; e e) praticar a respiração lenta e o relaxamento corporal junto com a criança em momentos de ansiedade ou medo, especialmente, na preparação para o sono.
Os problemas externalizantes são dificuldades comportamentais que se manifestam nas relações interpessoais da criança, como agressividade, desobediência, oposicionismo, temperamento exaltado e impulsividade (Achenbach & Rescorla, 2000Achenbach, T. M. & Rescorla, L. A. (2000). Manual for the ASEBA Preschool Forms & Profiles. Aseba.). O desenvolvimento dos problemas externalizantes está associado à genética, ao temperamento e às práticas culturais. No que se refere à parentalidade, práticas coercitivas e permissivas, além da disponibilidade emocional e afetividade reduzidas dos pais costumam estar associadas aos problemas externalizantes (Pinquart, 2017Pinquart, M. (2017). Associations of parenting dimensions and styles with externalizing problems of children and adolescents: An updated meta-analysis. Developmental Psychology, 53(5), 873-932. https://doi.org/10.1037/dev0000295
https://doi.org/https://doi.org/10.1037/...
). Em muitos casos, a inconsistência nas práticas, que ora são autoritárias, ora são permissivas, é uma característica determinante do ambiente familiar que explica o perfil externalizante (Duncombe, Havighurst, Holland, & Frankling, 2012Duncombe M.E., Havighurst S.S., Holland K.A., & Frankling E.J. (2012). The contribution of parenting practices and parent emotion factors in children at risk for disruptive behavior disorders. Child Psychiatry & Human Development, 43(5), 715-733. https://doi.org/10.1007/s10578-012-0290-5.
https://doi.org/https://doi.org/10.1007/...
).
No contexto da pandemia, irritabilidade, birras ou crises de raiva, brigas entre irmãos e desobediência, especialmente no que se refere a tarefas escolares, foram problemas externalizantes típicos. Para as queixas externalizantes as principais orientações foram: a) estabelecer uma rotina familiar (anteriormente descrita na orientação “a” para queixas relacionadas a problemas internalizantes); b) reforçar diferencialmente o comportamento infantil (ignorar comportamentos irritantes e desagradáveis da criança que não oferecem risco para ela ou para a família e incentivar com atenção genuína, afeto e elogios a seus comportamentos adequados); c) privar a criança de atenção e privilégios contingentemente a comportamentos agressivos e desafiadores (imediatamente colocar a criança sentada em uma cadeira sem acesso a brinquedos, TV, celular ou atenção dos pais por 10 minutos); e d) ajudar a criança a expressar suas emoções, sobretudo as frustrações que tendem a gerar irritabilidade e agressividade (estratégia anteriormente descrita na orientação “d” para queixas relacionadas a problemas internalizantes).
Por fim, o bem-estar subjetivo dos pais aproxima-se da noção de felicidade e pode ser definido como a avaliação subjetiva que a pessoa faz da sua satisfação com a vida, e do seu equilíbrio entre afetos positivos (alegria, prazer, autoconfiança, entusiasmo etc.) e negativos (raiva, desprezo, culpa, medo/ansiedade etc.) (Diener, 2020Diener, E. (2020). Happiness: the science of subjective well-being. Noba. http://noba.to/qnw7g32t
http://noba.to/qnw7g32t...
; Schimmack, 2008Schimmack, U. (2008). The structure of subjective well-being. In M. Eid & R. J. Larsen (Eds.), The science of subjective well-being (p. 97-123). Guilford Press.). Pessoas com bom nível de bem-estar subjetivo descrevem sua vida como satisfatória, com boa qualidade nas interações sociais e experiências agradáveis e gratificantes. A literatura indica que os níveis de bem-estar subjetivo de uma pessoa podem ser prejudicados por ameaças à sobrevivência e subsistência, por perdas materiais e afetivas e por sintomas de transtornos mentais comuns como depressão, ansiedade e estresse. Por outro lado, ter a satisfação de necessidades básicas assegurada, manter hábitos saudáveis, e cultivar interações sociais baseadas em cooperação e apoio recíproco contribuem para aumentar a sensação de bem-estar subjetivo (Lee & Choi, 2020Lee, S. & Choi, H. (2020). Impact of older adults’ mobility and social participation on life satisfaction in South Korea. Asian Social Work and Policy Review, 14(1), 4-10. https://doi.org/10.1111/aswp.12187
https://doi.org/https://doi.org/10.1111/...
; Lee, Sirgy, Yu., & Chalamon, 2015Lee, D.J., Sirgy, M.J., Yu., G. B., & Chalamon, I. (2015). The well-being effects of self-expressiveness and hedonic enjoyment associated with physical exercise. Applied Research in Quality of Life, 10(1), 141-159. https://doi.org/10.1007/s11482-014-9305-7
https://doi.org/https://doi.org/10.1007/...
; Tay & Diener, 2011Tay, L. & Diener, E. (2011). Needs and subjective well-being around the world. Journal of Personality and Social Psychology, 101(2), 354-365. https:/doi.org/10.1037/a0023779
https://doi.org/https:/doi.org/10.1037/a...
).
No contexto da Covid-19, o declínio no bem-estar subjetivo das mães e dos pais esteve particularmente relacionado a queixas de desânimo, pessimismo, ansiedade, ou irritabilidade referentes à dificuldade de conciliar a rotina de trabalho remoto com as tarefas domésticas e ao cuidado com os filhos, às preocupações financeiras e a problemas de saúde mental pré-existentes que haviam se agravado. As principais orientações para essas queixas foram: a) aceitar como sendo naturais as mudanças no próprio estado emocional, que indicam um processo de adaptação às potenciais ameaças e às perdas decorrentes da pandemia; b) estabelecer uma rotina diária ativa e recompensadora; c) regular a exposição a notícias sobre a pandemia; e d) conversar com pessoas queridas que pudessem ser referências sociais de otimismo, positividade e superação, assim como procurar pelos parentes e amigos para oferecer apoio e conforto.
As queixas e orientações do protocolo relacionadas a esses três conceitos-chave contemplaram grande parte das situações relatadas pelos pais nas primeiras semanas de atendimento. Contudo, foi necessário elaborar uma segunda versão do protocolo, que incluísse queixas e orientações relacionadas ao desenvolvimento atípico (autismo e outras síndromes) e à preparação da criança para lidar com notícias de morte de familiares ou pessoas conhecidas e com o luto decorrente dessas situações. A elaboração das orientações para essas novas queixas envolveu a consulta da literatura sobre desenvolvimento atípico, luto na infância e situações de crise e desastre. Assim, a versão final do protocolo de atendimento incluiu um total de 14 queixas e orientações específicas relacionadas a problemas internalizantes, incluindo o luto, problemas externalizantes e desenvolvimento atípico da criança e sete queixas e orientações específicas relacionadas ao declínio do bem-estar subjetivo dos pais. O protocolo incluía ainda informações sobre auxílios materiais e financeiros disponíveis, assistência médica em caso de sintomas de Covid-19 e assistência para urgências ligadas à violência doméstica e saúde mental. Adicionalmente, no caso de problemas emocionais ou comportamentais da criança ou de problemas de saúde mental dos pais preexistentes ao período da pandemia ou que indicassem necessidade de avaliação e acompanhamento psicológico regular, os usuários recebiam indicações de serviços gratuitos ou de baixo custo online ou de serviços que poderiam ser procurados após o fim do período de distanciamento social. A Tabela 1 apresenta um trecho do protocolo de atendimento que ilustra um problema (criança irritada ou agitada) e as respectivas orientações.
Após finalizar a chamada, o psicólogo enviava material psicoeducativo relacionado à queixa do usuário por mensagens de texto (SMS ou WhatsApp). Esses materiais foram criados pelo grupo de pesquisa e consistiam em arquivos em formato JPEG e PDF que resumiam as orientações ou informações fornecidas durante as chamadas. Um exemplo é o material psicoeducativo intitulado (título e referência dos autores omitidos durante a avaliação por pares). Ao longo de todo o período em que o serviço esteve disponível, a equipe de psicólogos teve supervisão semanal de 1 hora e 30 minutos com a primeira autora do estudo para a discussão dos casos atendidos e atualização do protocolo de atendimento.
Análise das queixas relatadas pelos usuários
No período de 6 de abril a 15 de julho de 2020, 130 chamadas foram atendidas. Desse total, 95% das chamadas foram feitas por mulheres, sendo que 87% eram mães. Sessenta e sete por cento (67%) das chamadas foram feitas de capitais. As queixas que motivaram a busca do serviço pelos usuários foram acessadas a partir da pergunta “em que eu posso lhe ajudar?”, que era seguida por outras perguntas simples e diretas com o objetivo de ajudar os usuários a descreverem o problema em detalhes. Estes são alguns exemplos de perguntas feitas pelos psicólogos: “o que lhe faz pensar que sua filha está escondendo o que sente?”; “como é a irritação do seu filho?”; “o que sua filha faz quando está ansiosa?”; “o que está preocupando você?”; “me conte como foi da última vez em que isso aconteceu?”; “como é o desânimo que você sente?”. As respostas dos pais que descreviam as queixas ou problemas que haviam motivado a chamada foram registradas após os atendimentos e submetidas à análise de conteúdo (Bardin, 1977/2011Bardin, L. (2011). Análise de Conteúdo. Edições 70. (Trabalho originalmente publicado em 1977).), realizada por consenso entre três codificadores treinados pela primeira autora deste estudo. O processo de consenso entre os codificadores ocorreu a partir de categorização em separado com discussão conjunta das categorias em que ocorreram divergência. Não foi calculada a fidedignidade inter-juízes.
A estrutura de três categorias utilizada para a análise derivou-se dos três conceitos centrais utilizados na elaboração do protocolo de atendimento (problemas externalizantes infantis, problemas internalizantes infantis e declínio do bem-estar subjetivo dos pais) e as seis subcategorias foram definidas com base em agrupamentos mais específicos formados pela semelhança temática dos relatos feitos pelos usuários. Desse modo, as categorias foram geradas de forma dedutiva enquanto as subcategorias de forma indutiva. A categoria problemas internalizantes infantis incluiu queixas cuja ênfase estava em emoções perturbadoras que foram expressas pelas crianças e foi formada por duas subcategorias: a) tristeza/tédio infantil: relatos que descreviam aborrecimento, inatividade, apatia, comportamento queixoso, choro e desânimo da criança, por vezes relacionado à falta de espaço físico na casa ou à falta de contato com outras pessoas; queixas sobre a necessidade constante de auxílio, de contato físico ou de presença dos pais e sobre o luto por parte da criança também foram incluídas nesta subcategoria; e b) ansiedade/medo infantil: relatos sobre sinais de ansiedade identificados na criança (comer em excesso, inquietação e agitação motora, preocupações excessivas) e demonstrações de medo em relação à doença, ao adoecimento dos pais ou de pessoas queridas, ao escuro, à noite e a outros estímulos ligados ao dormir.
A categoria de problemas externalizantes infantis incluiu queixas cuja ênfase estava em comportamentos desobedientes, irritantes, provocativos, agressivos, desafiadores ou problemas atencionais da criança que repercutiam negativamente em outros membros da família ou causavam conflitos com pais, irmãos ou outros parentes. Esta categoria foi composta por duas subcategorias: a) recusa a realizar tarefas escolares: relatos dos pais sobre a baixa capacidade da criança de manter a atenção durante as atividades da escola ou sobre a recusa ou baixa tolerância à frustração da criança ao executá-las; e b) irritabilidade/agressividade infantil: relatos de comportamentos da criança que indicavam raiva, frustração ou irritabilidade, expressos de forma agressiva ou disruptiva como provocar, xingar, gritar, bater, chutar ou jogar objetos, podendo esses comportamentos ser acompanhados de choro; brigas entre irmãos também foram incluídas.
A categoria declínio no bem-estar subjetivo dos pais também foi formada por duas subcategorias que refletiram duas dimensões do construto, a satisfação com a vida (que pode diminuir com a exposição a eventos adversos) e o afeto negativo (problemas emocionais relacionados a sentimentos aflitivos): a) eventos de vida adversos dos pais: relatos sobre problemas decorrentes da pandemia e do distanciamento social ou de outras circunstâncias de vida que não fossem o comportamento dos filhos, tais como a sobrecarga de atividades, problemas financeiros, violação de direitos, violência doméstica, divórcio e guarda dos filhos; e b) sofrimento psíquico dos pais: inclui relatos acerca de emoções aflitivas experimentadas pelos pais como tristeza, desânimo, depressão, preocupações excessivas, ansiedade, angústia, estresse, pessimismo, luto ou revolta pela morte de parente ou ainda medo do futuro. Por fim, relatos que não puderam entrar em nenhuma das subcategorias anteriores foram classificados como outras queixas e corresponderam a 6% do total de relatos. Exemplos de relatos categorizados como outras queixas foram problemas de saúde mental anteriores à pandemia, comportamentos autolesivos e pensamentos e comportamentos obsessivo-compulsivos.
Um total de 223 queixas foram registradas nas 130 ligações atendidas. A Figura 2 apresenta os percentuais das três categorias amplas de queixas. É possível constatar que a categoria problemas externalizantes infantis foi a mais frequente (39%), seguida pelo declínio do bem-estar subjetivo dos pais (29%) e pelos problemas internalizantes infantis (26%).
A Figura 3 ilustra os percentuais nas seis subcategorias de queixas. Os dados mostram que as queixas de irritabilidade/agressividade infantil foram as mais frequentes (25%), seguidas pelas queixas relacionadas ao sofrimento psíquico dos pais (19%).
Por fim, a Figura 4 apresenta os percentuais das três categorias de queixas na primeira, sexta, décima primeira e décima quinta semana de funcionamento do serviço. Os dados evidenciam que, comparando os quatro períodos analisados, houve uma diminuição das queixas referentes ao declínio do bem-estar subjetivo dos pais, entre a primeira e a décima quinta semana. As queixas de problemas internalizantes infantis mantiveram-se relativamente estáveis, enquanto as queixas de problemas externalizantes infantis aumentaram da primeira para a sexta semana, com um decréscimo na décima primeira e novo aumento na décima quinta semana de atendimento.
Os resultados desta breve análise mostram que 94% das queixas relatadas pelos usuários estiveram relacionadas aos três conceitos centrais contemplados pelo protocolo de atendimento, que se derivou de uma análise cuidadosa de programas prévios já avaliados pelo grupo de pesquisa proponente e da literatura relacionada à área do projeto. Embora os efeitos das orientações fornecidas aos pais não tenham sido avaliados, esta breve análise indica que o protocolo elaborado contemplou adequadamente a maior parte dos problemas que motivaram a busca do serviço pelos usuários. De qualquer modo, os 6% de queixas não contempladas pela proposta inicial indicam a necessidade de que o protocolo seja flexível e aberto para a inclusão de problemas não previstos ou derivados de novos eventos ligados à crise.
Possibilidades e limites da orientação a pais por chamadas de áudio em contexto de crise
A experiência de orientação a pais por meio de chamadas de áudio durante a pandemia de Covid-19 revelou aspectos positivos e desafiadores, assim como as limitações desse tipo de iniciativa. Um ponto forte deste projeto de extensão foi a delimitação clara do seu objetivo e da população-alvo: ajudar os pais de crianças de 0 a 11 anos a lidar com problemas decorrentes do distanciamento social durante a pandemia. Esta decisão permitiu a rápida estruturação do serviço, que foi baseada fundamentalmente na experiência prévia do grupo de pesquisa em programas de intervenção com pais e na literatura recente sobre crises e desastres. O estudo da literatura de áreas do conhecimento que pudessem apoiar esse tipo de trabalho permitiu a adaptação de estratégias utilizadas em programas presenciais de orientação a pais para o formato remoto e a incorporação de novas estratégias que atendessem demandas familiares novas e particularmente ligadas ao contexto da pandemia.
Também merece destaque a elaboração de um protocolo de atendimento orientado por problemas específicos seguidos de orientações claras e objetivas. Essa característica do serviço facilitou o treinamento da equipe e a fidelidade ao modelo de intervenção proposto. O protocolo também contribuiu para o uso de uma linguagem simples e direta durante as chamadas, facilitando a comunicação psicólogo-usuário e a compreensão das orientações por parte de pais com baixa escolaridade. Também, merece destaque o uso de materiais informativos e psicoeducativos em formato PDF e JPEG enviados por aplicativos de mensagens de texto que foi uma forma eficaz de fornecer informações de apoio e de reforçar as orientações transmitidas durante as chamadas. Receber informações por escrito, de forma simples e organizada no momento que elas são necessárias, aumenta a probabilidade de que os pais consigam colocar em prática as estratégias sugeridas e buscar serviços para suprir outras necessidades, especialmente em situações em que seu equilíbrio emocional se encontra abalado. Por fim, assistir os usuários por meio de chamadas de áudio pode ter facilitado o acesso de famílias em vulnerabilidade social, que muitas vezes possuem recursos limitados de internet, telefonia e dispositivos digitais para videochamadas.
A divulgação do serviço foi um aspecto crucial e um grande desafio para a equipe. Houve um maior número de chamadas logo após o início da divulgação do serviço por meio do banner digital e de uma reportagem veiculada em um programa de grande audiência na cidade de Salvador, assim como após a disseminação do vídeo de 2 minutos pelas redes sociais. Essas constatações indicaram a importância da divulgação em veículos de comunicação atraentes e sinalizaram para a equipe a necessidade de investir em esforços de divulgação periodicamente. É importante mencionar, também, a possibilidade de que grande parte da população de baixa renda não tenha acessado o serviço devido à proibição da divulgação quanto à gratuidade, ainda que fosse um projeto de extensão universitária oferecido por uma universidade pública.
Como indicaram os resultados da análise de conteúdo das queixas dos usuários, a grande maioria dos problemas relatados foram contemplados pelo protocolo de atendimento. Contudo, a necessidade de disponibilizar o serviço o mais prontamente possível e a equipe reduzida de profissionais envolvidos impossibilitou a realização de pesquisa de satisfação e o seguimento dos casos. As mães, pais e cuidadores frequentemente manifestaram sua satisfação com o serviço prestado ao final das chamadas e a maioria dos usuários demonstrou compreender as orientações e as razões para implementá-las. Contudo, em algumas chamadas, ficava evidente a necessidade de seguimento para orientações e apoio adicionais. Embora o seguimento não tenha sido possível devido à capacidade limitada do serviço em termos de tempo e número de profissionais, nesses casos, os usuários foram estimulados a voltar a ligar para o serviço em caso de dificuldades ou para dar retorno sobre os resultados da implementação das estratégias. De quaquer modo, recomenda-se a realização de pesquisas de satisfação e o seguimento dos casos sempre que possível. Ainda no que se refere aos problemas relatados pelos usuários e às orientações ou estratégias de enfrentamento, é importante analisar a relação entre as queixas relacionadas ao comportamento e às emoções dos filhos e aquelas associadas ao bem-estar subjetivo dos pais. O declínio no bem-estar subjetivo dos pais claramente sofreu forte influência dos eventos de vida adversos ocasionados pela pandemia. O percentual elevado de queixas de declínio no bem-estar subjetivo dos pais constatado na primeira semana de implementação do serviço, por exemplo, possivelmente esteve associado às diversas preocupações causadas pelas mudanças bruscas motivadas pela pandemia (Harter, 2020Harter, J. (2020, abril 7). How leaders are responding to COVID-19 workplace disruption. Gallup. https://www.gallup.com/workplace/307622/leaders-responding-covid-workplacedisruption.aspx
https://www.gallup.com/workplace/307622/...
; Kirzinger et al., 2020Kirzinger, A., Hamel, L., Muñana, C., Kearney, A., & Brodie, M. (2020). KFF health tracking poll - late April 2020: Coronavirus, social distancing, and contact tracing. https://www.kff.org/report-section/kff-health-tracking-poll-late-april-2020-economic-and-mental-health-impacts-of-coronavirus/
https://www.kff.org/report-section/kff-h...
), que por sua vez levaram à sobrecarga de tarefas, sobretudo, para as mulheres (OMS, 2020bSubstantial investment needed to avert mental health crisis. (2020b, maio 14). OMS. https://www.who.int/news/item/14-05-2020-substantial-investment-needed-to-avert-mental-health-crisis
https://www.who.int/news/item/14-05-2020...
; ONU, 2020Organização das Nações Unidas [ONU]. (2020). Policy brief: COVID-19 and the need for action on mental health. https://www.un.org/sites/un2.un.org/files/un_policy_brief-covid_and_mental_health_final.pdf
https://www.un.org/sites/un2.un.org/file...
), que foram as principais usuárias do serviço ofertado.
É possível, também, que parte dos usuários já tivesse problemas de saúde mental pré-existentes que se agravaram com os problemas decorrentes da crise. De qualquer modo, houve uma mudança marcante nos percentuais de tipos de queixas relatadas no primeiro e no último mês, com queda no percentual de queixas de declínio do bem-estar subjetivo dos pais e aumento expressivo nos percentuais de queixas de problemas externalizantes infantis. Esses achados sugerem que os pais podem ter passado por um processo de adaptação às mudanças causadas pela pandemia, fazendo com que os índices de bem-estar subjetivo se reaproximassem de sua linha de base (Frederick & Loewenstein, 1999Frederick, S., & Loewenstein, G. (1999). Hedonic adaptation. In D. Kahneman, E. Diener, & N. Schwarz (Eds.), Well-being: The foundations of hedonic psychology (p. 302-329). Russell Sage Foundation.; Kettlewell et al., 2020Kettlewell, N., Morris, R. W.Ho, N., Cobb-Clark, D. A., Cripps, S., & Glozier, N. (2020). The differential impact of major life events on cognitive and affective wellbeing. SSM: Population Health, 10, 1-9. https://doi.org/10.1016/j.ssmph.2019.100533
https://doi.org/https://doi.org/10.1016/...
). Por outro lado, o aumento na frequência de queixas de problemas externalizantes infantis ao longo do período examinado pode ser um indicador de que as crianças apresentaram maior dificuldade de adaptação às mudanças desencadeadas pela crise se comparadas aos pais.
É possível que, devido à situação de confinamento no ambiente doméstico em que se encontravam, o declínio no bem-estar subjetivo dos pais e os problemas emocionais e comportamentais da criança exercessem forte influência recíproca. Esta hipótese é corroborada, em parte, pelos resultados do estudo de Chung et al. (2020Chung, G., Lanier, P., & Ju, P. W. Y. (2020, jun. 3). Mediating Effects of Parental Stress on Harsh Parenting And Parent-child Relationship During Coronavirus (COVID-19) Pandemic in Singapore. OSF Preprints. https://doi.org/10.31219/osf.io/vnf4j
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), no qual o estresse parental relacionado à Covid-19 contribuiu para práticas parentais severas e menor proximidade com os filhos. Aos achados do estudo citado, somam-se as evidências de que os problemas internalizantes e externalizantes infantis são explicados em grande parte pela baixa qualidade das práticas parentais e da interação pais-criança (Callahan et al. 2011Callahan, K. L., Scaramella, L. V., Laird, R. D., & Sohr-Preston, S. L. (2011). Neighborhood disadvantage as a moderator of the association between harsh parenting and toddler-aged children’s internalizing and externalizing problems. Journal of Family Psychology, 25(1), 68-76. https://psycnet.apa.org/doi/10.1037/a0022448
https://doi.org/https://psycnet.apa.org/...
; Duncombe et al., 2012Duncombe M.E., Havighurst S.S., Holland K.A., & Frankling E.J. (2012). The contribution of parenting practices and parent emotion factors in children at risk for disruptive behavior disorders. Child Psychiatry & Human Development, 43(5), 715-733. https://doi.org/10.1007/s10578-012-0290-5.
https://doi.org/https://doi.org/10.1007/...
; Kiel & Maack, 2012Kiel, E. J. & Maack, D. J. (2012). Maternal BIS sensitivity, overprotective parenting, and children’s internalizing behaviors. Personality and Individual Differences, 53(3), 257-262. https://doi.org/10.1016/j.paid.2012.03.026.
https://doi.org/https://doi.org/10.1016/...
; O’Neal & Magai, 2005O’Neal, C. R. & Magai, C. (2005). Do parents respond in different ways when children feel different emotions? The emotional context of parenting. Development and Psychopathology, 17(2), 467-487 (2005). https://doi.org/10.1017/S0954579405050224
https://doi.org/https://doi.org/10.1017/...
; Pinquart, 2017Pinquart, M. (2017). Associations of parenting dimensions and styles with externalizing problems of children and adolescents: An updated meta-analysis. Developmental Psychology, 53(5), 873-932. https://doi.org/10.1037/dev0000295
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). Assim, a queda no bem-estar subjetivo dos pais pode levar a práticas parentais de baixa qualidade, que, por sua vez, estão ligadas a problemas emocionais e comportamentais nas crianças.
Em contrapartida, quando os pais utilizam práticas assertivas e responsivas para regular o comportamento dos filhos, as crianças apresentam melhores índices de competência social e emocional (Denham, 2007Denham, S. A. (2007). Dealing with feelings: How children negotiate the worlds of emotions and social relationships. Cognition, Brain, Behavior, 11(1), 1-48.; Denham, Bassett, & Wyatt, 2015Denham, S. A., Bassett, H. H., & Wyatt, T. (2015). The socialization of emotional competence. In J. E. Grusec & P. D. Hastings (Eds.), Handbook of Socialization: theory and research (2nd ed., pp. 590-613). The Guilford Press.; Distefano, Galinsky, McClelland, Zelazo, & Carlson, 2018Distefano, R., Galinsky, E., McClelland, M. M., Zelazo, P. D., & Carlson, S. M. (2018). Autonomy-supportive parenting and associations with child and parent executive function. Journal of Applied Developmental Psychology, 58, 77-85. https://doi.org/10.1016/j.appdev.2018.04.007
https://doi.org/https://doi.org/10.1016/...
; Lerner & Grolnick, 2020Lerner, R.E. & Grolnick, W.S. (2020). Maternal involvement and children’s academic motivation and achievement: The roles of maternal autonomy support and children’s affect. Motivation and Emotion, 44, 373-388. https://doi.org/10.1007/s11031-019-09813-6
https://doi.org/https://doi.org/10.1007/...
; Xiao, Spinrad, & Carter, 2018Xiao, S. X., Spinrad, T. L., & Carter, D. B. (2018). Parental emotion regulation and preschoolers’ prosocial behavior: The mediating roles of parental warmth and inductive discipline. The Journal of Genetic Psychology, 179(5), 246-255. https://doi.org/10.1080/00221325.2018.1495611
https://doi.org/https://doi.org/10.1080/...
), que favorecem a melhoria da qualidade das interações pais-filhos (Lang, Jeon, Schoppe-Sullivan, & Wells, 2020Lang, S. N., Jeon, L., Schoppe-Sullivan, S. J., & Wells, M. B. (2020). Associations between parent-teacher cocaring relationships, parent-child relationships, and young children’s social emotional development. Child & Youth Care Forum, 49, 623-646. https://doi.org/10.1007/s10566-020-09545-6
https://doi.org/https://doi.org/10.1007/...
; Zhang, 2011Zhang, X. (2011). Parent-child and teacher-child relationships in Chinese preschoolers: The moderating role of preschool experiences and the mediating role of social competence. Early Childhood Research Quarterly, 26(2), 192-204. https://doi.org/10.1016/j.ecresq.2010.09.001
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) a qual, por sua vez, contribui para o aumento dos níveis parentais de bem-estar subjetivo (Mauno, Hirvonen, & Kiuru, 2018Mauno, S., Hirvonen, R., & Kiuru, N. (2018). Children’s life satisfaction: The roles of mothers’ work engagement and recovery from work. Journal of Happiness Studies 19(5), 1373-1393. https://doi.org/10.1007/s10902-017-9878-6
https://doi.org/https://doi.org/10.1007/...
; Richter, Bondü, Spiess, Wagner, & Trommsdorff, 2018Richter, N., Bondü, R., Spiess, C. K., Wagner, G. G., & Trommsdorff, G. (2018). Relations Among Maternal Life Satisfaction, Shared Activities, and Child Well-Being. Frontiers in Psychology, 9, 1-12. https://doi.org/10.3389/fpsyg.2018.00739
https://doi.org/https://doi.org/10.3389/...
; Silverberg & Steinberg, 1987Silverberg, S. B. & Steinberg, L. (1987). Adolescent autonomy, parent-adolescent conflict, and parental well-being. Journal of Youth and Adolescence, 16(3), 293-312. https://doi.org//10.1007/bf02139096
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). Esse novo padrão dá início a um ciclo positivo de trocas interativas que pode melhorar o clima no ambiente doméstico, especialmente no contexto de distanciamento social.
Diante do exposto, é possível que as orientações do protocolo de atendimento, que priorizaram instrumentalizar os pais para o uso de práticas assertivas e responsivas, tenham impactado positivamente a saúde mental tanto da criança, quanto dos pais. Assim, serviços oferecidos a pais de crianças pequenas em contextos semelhantes ao da pandemia de Covid-19 devem priorizar a qualidade da interação pais-filhos e das práticas educativas parentais. Práticas responsivas e assertivas que promovem o bem-estar emocional da criança e estabelecem expectativas comportamentais claras em contextos estressantes contribuem para a diminuição nos conflitos entre pais e filhos e, consequentemente, podem reduzir o sofrimento dos pais e aumentar sua sensação de bem-estar.
Em resumo, diante do horizonte de restrições econômicas e da eventual necessidade de prolongamento das medidas de distanciamento social, serviços no formato do projeto de extensão aqui descrito podem representar uma alternativa de baixo custo para a promoção da saúde mental de mães e pais de crianças pequenas. Projetos e serviços de apoio psicológico com características semelhantes podem ser articulados às estratégias de respostas à crise do sistema público de saúde, visando minimizar os impactos psicológicos da pandemia sobre a população. Articulações entre instituições de ensino e serviços públicos de saúde podem proporcionar a ampla divulgação de trabalhos dessa natureza e favorecer o desenvolvimento de projetos com um maior número de profissionais, possibilitando o seguimento de casos que apresentem necessidade de orientações e suporte adicionais.
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Datas de Publicação
-
Publicação nesta coleção
26 Jun 2023 -
Data do Fascículo
2023
Histórico
-
Recebido
29 Jul 2020 -
Aceito
03 Maio 2021