RESUMO
Para auxiliar no desenvolvimento dos estudantes, é importante que os professores atinjam a autonomia. A formação docente pode estimular experiências favoráveis à adesão à justiça, respeito, solidariedade e convivência democrática. Este estudo investiga se a qualidade da formação - inicial e continuada - de professores dos Anos Finais do Ensino Fundamental, em [nome da cidade], relaciona-se à adesão a valores essenciais para uma educação moral. Participaram 260 docentes, de 23 a 70 anos, majoritariamente mulheres. Utilizaram-se: (a) Ficha de Perfil do Professor, (b) QFI, (c) QFC e (d) EVSM. Realizaram-se: (a) análise de clusters, (b) ANOVAS e (c) Kruskal-Wallis. Os professores apresentaram maior adesão à justiça e convivência democrática; menor ao respeito. Para a justiça, houve diferença entre formação continuada de alta e baixa qualidade. Formação continuada de alta qualidade pode promover adesão a valores. É relevante que as iniciativas de formação abordem valores de forma não dogmática, promovendo diálogo e criticidade.
Palavras-chave: valores; formação de professores; educação moral
RESUMEN
Para ayudar en el desarrollo de los estudiantes, es importante que los profesores alcancen la autonomía. La formación docente puede estimular experiencias favorables a la adhesión a la justicia, respeto, solidaridad y convivencia democrática. En este estudio se investiga si la calidad de la formación - inicial y continuada - de profesores de los Cursos Finales de la Enseñanza Primaria, en [nombre de la ciudad], se relaciona a la adhesión a valores esenciales a una educación moral. Participaron 260 docentes, de 23 a 70 años, mayoritariamente mujeres. Se utilizaron: (a) Ficha de Perfil del Profesor, (b) QFI, (c) QFC y (d) EVSM. Se realizaron: (a) análisis de clusters, (b) ANOVAS y (c) Kruskal-Wallis. Los profesores presentaron mayor adhesión a la justicia y convivencia democrática; menor al respeto. Para la justicia, hubo diferencia entre formación continuada de alta y baja calidad. Formación continuada de alta calidad puede promover adhesión a valores. Es relevante que las iniciativas de formación aborden valores de forma no dogmática, promoviendo diálogo y criticidad.
Palabras clave: valores; formación de profesores; educación moral
ABSTRACT
In order to help students’ development, it is important for teachers to achieve autonomy. Teacher training can stimulate experiences that favor adherence to justice, respect, solidarity and democratic coexistence. This study investigates whether the quality of training - initial and continuing - of teachers in the Final Years of Elementary School, in , is related to adherence to essential values for moral education. total of 260 professors, aged 23 to 70, mostly women, participated. The following were used: (a) Teacher Profile Questionnaire, (b) IEQ, (c) CEQ and (d) SMVS. The following were performed: (a) cluster analysis, (b) ANOVAS and (c) Kruskal-Wallis. Teachers showed greater adherence to justice and democratic coexistence; minor to respect. For justice, there was a difference between high and low quality continuing education. High quality continuing education can promote adherence to values. It is important that training initiatives address values in a non-dogmatic way, promoting dialogue and criticism.
Keywords: values; teacher training; moral education
INTRODUÇÃO
Um indivíduo constrói sua moral (Piaget, 1932/1994) na interação com pessoas, ideias e valores. A escola é um importante espaço para o desenvolvimento de crianças e adolescentes, uma vez que propicia interações com indivíduos fora do círculo familiar, possibilitando que valores e regras sejam ampliados para a sociedade como um todo (Couto, 2019). Os professores participam do ambiente dos jovens, podendo auxiliar no seu desenvolvimento. Entretanto, os docentes não são apenas formadores, mas também indivíduos em constante formação. Cabe, então, investigar possíveis relações entre a formação dos professores - inicial e continuada - e seus valores.
Valores Essenciais para uma Educação Moral
Possibilitar o desenvolvimento moral dos jovens inclui incentivar a construção de seus valores. Conforme Cortina (1997), alguns desses merecem atenção especial na educação, uma vez que são essenciais para a constituição dos jovens enquanto cidadãos: (a) a justiça, expressa pelo princípio de igualdade, (b) o respeito, (c) a solidariedade e (d) a convivência democrática, instrumentalizada pelo diálogo. Esses valores são apontados pelos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN) (Secretaria de Educação Fundamental, 1998) como fundamentais para a educação moral em uma sociedade democrática.
Segundo Piaget (1932/1994), Piaget justiça é essencial para a vida moral. Em suas pesquisas, esse autor investigou dois tipos de justiça: retributiva e distributiva. A justiça retributiva refere-se às relações estabelecidas entre uma infração e suas consequências. A primeira noção de justiça retributiva a surgir no desenvolvimento é a sanção expiatória: arbitrária e sem relação entre o conteúdo da sanção e a natureza do ato sancionado. A segunda é a sanção por reciprocidade, a qual guarda relação de conteúdo e de natureza entre a falta e a punição. A justiça distributiva é delimitada por ideias de igualdade e equidade. A primeira noção de distribuição no desenvolvimento é a de que o justo está de acordo com as determinações das figuras de autoridade (e.g., pais e professores). Depois, surge a ideia da divisão dos bens em partes exatamente iguais, garantindo que ninguém seja prejudicado. Essa noção é conhecida como igualdade matemática. Por fim, o justo torna-se a divisão dos bens de acordo com as condições e características singulares de quem vai recebê-los. Esse é o princípio equitativo de distribuição: a igualdade que leva em conta as diferenças.
Em um estudo (Couto, Alencar, & Salgado, 2017) realizado em Vitória - ES com seis professoras do Ensino Fundamental, evidenciou-se que a justiça foi considerada por elas próprias como um valor importante a ser ensinado, visto que tem o potencial de organizar a sociedade e solucionar conflitos. Em outra pesquisa (D’Aurea-Tardeli, Fittipaldi, Postal, & Reis, 2012) realizada em São Paulo - SP com 72 alunos do Ensino Médio, foram os estudantes que atribuíram importância à justiça. Como eles relataram viver em um mundo injusto, esse valor poderia auxiliar a resolver conflitos e a combater a violência. De fato, no Brasil, são recorrentes injustiças que envolvem questões de desigualdade social, racial e sexual (Madeira & Gomes, 2018).
Conforme Piaget (1932/1994), o respeito é fundamental para a formação dos jovens. O respeito unilateral - o primeiro tipo a aparecer no desenvolvimento - destina-se a figuras de autoridade e baseia-se em um misto de amor e medo por tais figuras. Os jovens reconhecem o direito de pais e professores lhe darem ordens sem que a recíproca seja verdadeira. Por exemplo, caso um aluno decida ordenar seu professor a fazer algo, esse profissional não irá se sentir obrigado a fazê-lo. O respeito mútuo - o qual sucede o unilateral - consiste no medo de decair aos olhos do indivíduo respeitado. Esse tipo é possibilitado pelas relações de cooperação que a criança estabelece com seus iguais. Além de demandar que os jovens exercitem a reciprocidade, o respeito mútuo atua diretamente na construção da cidadania (Secretaria de Educação Fundamental, 1998).
De modo geral, o respeito avalia uma pessoa como distinta de outras, considerando-a como um todo único. Em estudo (Alencar, De Marchi, Couto, Romaneli, & Lima, 2014) realizado no Espírito Santo com professores do Ensino Fundamental e Médio, esse valor foi considerado o mais importante para a educação. Sendo assim, é possível que essa relevância se deva, pelo menos em parte, às constantes reclamações sobre a falta de respeito na escola. O bullying, por exemplo, é bastante frequente entre os alunos (Magalhães, Cameira, Rodrigues, & Nogueira, 2019). Além disso, os professores se queixam de desrespeito por parte dos estudantes (Marques, Venturin, Santos, & Zinelli, 2017). No entanto, a recíproca também ocorre: muitas vezes, os docentes são autoritários e faltam com respeito aos alunos (Tognetta & Daud, 2018). Não é incomum, por exemplo, que professores coloquem estudantes em situações vexatórias como uma forma de punir a falta de atenção em sala de aula.
A solidariedade é essencial na escola, visto que remete à cooperação (Secretaria de Educação Fundamental, 1998). Em estudo (Tognetta & Assis, 2006) realizado em Campinas - SP com 23 alunos de 6 e 7 anos, verificou-se que a solidariedade é estimulada quando o professor propicia um ambiente com relações cooperativas. Nessa pesquisa, a sala de aula cooperativa apresentou estudantes com um nível de desenvolvimento moral mais alto comparada à coercitiva. Além disso, quase metade dos alunos imersos no ambiente cooperativo demonstrou capacidade de realizar operações, enquanto que o mesmo não ocorreu com os estudantes na sala coercitiva. Evidenciou-se, assim, uma evolução na solidariedade, a qual está vinculada à vivência da reciprocidade e do respeito mútuo.
A convivência democrática - instrumentalizada pelo diálogo - é fundamental ao ambiente escolar, visto que permite o estabelecimento de relações interpessoais mais respeitosas (Vinha, Nunes, Silva, Vivaldi, & Moro, 2017). Segundo os PCN (Secretaria de Educação Fundamental, 1998), “o fundamento da sociedade democrática é a constituição e o reconhecimento de sujeitos de direito- (p. 19). Em estudo (Vinha & Tognetta, 2006) realizado no interior de São Paulo com duas professoras do Ensino Fundamental, evidenciou-se que salas de aulas autocráticas - isto é, com práticas essencialmente coercitivas - favorecem a manutenção da heteronomia (a moral cujas normas provêm do outro; Piaget, 1932/1994) entre os alunos, enquanto que classes democráticas contribuem para o fomento da autonomia. O meio democrático possibilitou a apropriação de normas por meio da reflexão, discussão e ação, permitindo que os estudantes percebessem as consequências de suas atitudes.
A justiça, o respeito, a solidariedade e a convivência democrática apresentam diferentes níveis de descentração. A seguir, serão discutidas suas evoluções a partir do conceito de adesão a valores e de estudos sobre esse assunto.
Adesão a Valores
Adesão a valores refere-se à maneira de um indivíduo ver outras pessoas, interpretar seus sentimentos e considerar o papel que ocupam na sociedade (Marques, Tavares, & Menin, 2017). Trata-se de como ele se coloca em relação aos outros quando determinados valores são adotados. Existem diferentes níveis de adesão, os quais se sucedem no desenvolvimento: (a) perspectiva egocêntrica, voltada à busca de satisfazer as próprias necessidades e à incapacidade de assumir diferentes pontos de vista; (b) sociocêntrica, centrada nas relações grupais, familiares e em normas sociais; e (c) propriamente moral, fundamentada em contratos estabelecidos democraticamente por procedimentos justos (Tavares et al., 2016).
Estudos (Marques, Tavares et al., 2017; Tavares et al., 2016) realizados no estado de São Paulo com professores da Educação Básica investigaram a adesão aos valores justiça, respeito, solidariedade e convivência democrática. Os docentes foram classificados em quatro níveis crescentes de descentração: (a) nível I, contravalor, ou seja, posicionamento contrário ao valor em questão (b) nível II, pró-valor egocêntrico, (c) nível III, pró-valor sociocêntrico, e (d) nível IV, pró-valor propriamente moral. Os professores apresentaram maior adesão à solidariedade, distribuídos nos níveis IV (71%) e III (29%), e menor à justiça, dispostos nos níveis III (93,7%), II (6%) e I (0,3%). A adesão ao respeito e à convivência democrática foi intermediária, com todos os docentes no nível III. Em síntese, os docentes atingiram a autonomia moral apenas na solidariedade. Nos outros valores, predominou a adesão sociocêntrica. Na justiça, alguns professores apresentaram inclusive nível egocêntrico e de contravalor. Esses docentes ainda se encontram bastante presos às convenções sociais, especialmente quando adotam os valores justiça, respeito e convivência democrática.
Nesses estudos, identificaram-se associações entre formação continuada e os valores investigados. Professores que realizaram cursos sobre (a) metodologias de ensino e (b) valores e atitudes tiveram médias de adesão superiores aos outros docentes em relação à justiça, à solidariedade e à convivência democrática. Em função disso, a seguir, será abordada a formação dos docentes e possíveis relações com valores.
Relações entre Formação de Professores e Adesão a Valores
Conforme Tognetta e Daud (2018), a formação dos docentes pode estimular reflexões e experiências que contribuem para a adesão aos valores justiça, respeito, solidariedade e convivência democrática. Além disso, auxilia a compreender a necessidade de proporcionar ambientes cooperativos e utilizar estratégias mais assertivas para resolver conflitos. A preparação dos professores é essencial para promover o desenvolvimento moral dos alunos. Entretanto, é importante que os educadores sejam autônomos para fomentar a autonomia (Tognetta, Martinez, & Daud, 2017). Dessa forma, eles podem reconhecê-la nos alunos e incentivar as discussões para essa direção (Menin & Bataglia, 2017).
As formações inicial e continuada têm o papel de preparar os professores para o magistério na Educação Básica, contemplando tanto conteúdos específicos quanto valores para a cidadania. A formação inicial - ou seja, a graduação - é indispensável para que os docentes cumpram seu papel adequadamente (Conselho Nacional de Educação, 2015). Entretanto, existem algumas condições mínimas para isso ocorrer: (a) domínio de conteúdos importantes da sua área, (b) conhecimento sobre desenvolvimento moral, (c) qualificação para relacionar teoria e prática, (d) preparação para cooperação na escola e com a família, (e) conhecimento para além da própria área, (f) mobilização de conhecimentos e valores, (g) responsabilidade sobre educação em valores e (h) preparo didático-pedagógico (Mello, 2000; Santos, 2012).
Um estudo do Instituto Brasileiro de Opinião Pública e Estatística Inteligência (2018), com 2.160 professores da Educação Básica do país, evidenciou que a maioria deles considera sua formação inicial insuficiente. Na pesquisa de Santos (2012), com 10 professoras do Ensino Infantil, foi examinado se as profissionais tiveram contato com temas relacionados à moralidade durante a graduação. Sete relataram ter estudado o assunto, mas apenas quatro se lembraram de algum autor da área. A maioria das professoras concebeu a autonomia de maneira limitada e nenhuma delas considerou a cooperação como relevante para a autonomia. Desse modo, evidenciou-se que a formação inicial dessas professoras era deficitária no que tange o entendimento sobre desenvolvimento moral. Isso está de acordo com a ideia de que, segundo Tognetta et al. (2017), "a formação de professores no Brasil é insuficiente no que diz respeito ao calcanhar de Aquiles da escola, ou seja, a moral” (p. 37).
A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) (Secretaria Especial de Editoração e Publicações, 2005) determina a exigência de os professores realizarem atividades de formação continuada. Essa formação supre as deficiências provenientes da graduação, além de aprofundar e atualizar alguns conteúdos (Magalhães Júnior, Tomanik, & Carvalho, 2016). Atividades de formação continuada de boa qualidade necessitam: (a) valorizar a troca de experiências, além das particularidades e opiniões dos docentes; (b) ser voltadas para atitudes, valores e ao contexto de trabalho; (c) possuir formadores com conhecimento e que estimulem a reflexão; (d) ser relevantes e aplicáveis à prática educativa; e (e) ter foco em disciplinas e metodologias de ensino (Souza, 2007).
Um estudo (Zechi, 2014) investigou 193 projetos de educação em valores, em todas as regiões brasileiras, e seus resultados evidenciaram que as escolas não costumam investir adequadamente na formação continuada de seus professores. Isso ocorre, sobretudo, no que se refere ao desenvolvimento profissional para auxiliar na construção de valores dos estudantes. Todavia, as atividades de formação parecem contribuir para a adesão dos professores a valores essenciais para uma educação moral (Marques, Tavares et al., 2017; Tavares et al., 2016). Tognetta e Daud (2018) afirmam inclusive que a qualidade da formação é importante para a adesão a valores. Entretanto, os autores não examinaram essas variáveis empiricamente. Diante disso, cabe investigar possíveis relações entre a qualidade da formação e a adesão a valores.
O PRESENTE ESTUDO
Para que os professores possam contribuir para o desenvolvimento moral de seus alunos, é importante que eles atinjam a autonomia (Tognetta et al., 2017), aderindo à justiça, ao respeito, à solidariedade e à convivência democrática de maneira descentrada (Tognetta & Daud, 2018). Dessa forma, podem estimular valores essenciais para a educação moral em uma sociedade democrática (Secretaria de Educação Fundamental, 1998; Cortina, 1997). Atentar para valores de professores dos Anos Finais do Ensino Fundamental é particularmente relevante, visto que seus alunos estão ingressando na adolescência. Nesse período, os estudantes adquirem a capacidade de constituir uma escala de valores e elaborar projetos de vida (Palhares & Freitas, 2017). Assim, podem hierarquizar valores a partir de suas próprias convicções internas, não ficando mais à mercê de impulsos imediatos ou pressões sociais.
Mesmo que alguns estudos (Marques, Tavares et al., 2017; Tavares et al., 2016) tenham apresentado evidências da relação entre formação e adesão a valores, a qualidade da formação dos professores não foi levada em consideração. Diante disso, esta pesquisa tem como objetivo principal investigar se a qualidade da formação - inicial e continuada - de professores dos Anos Finais do Ensino Fundamental, em Porto Alegre-RS, relaciona-se à adesão a valores essenciais para uma educação moral. Os objetivos específicos são investigar: (a) a adesão de professores à solidariedade, ao respeito, à justiça e à convivência democrática; e (b) possíveis diferenças na adesão a valores quando se considera a qualidade da formação dos professores.
Em estudos anteriores (Marques, Tavares et al., 2017; Tavares et al., 2016), os docentes apresentam maior adesão à solidariedade e menor à justiça. Como esta pesquisa também avalia professores e utiliza o mesmo instrumento, considerou-se a hipótese de que os docentes terão maior adesão à solidariedade, menor à justiça e intermediária ao respeito e à convivência democrática. Como Tognetta e Daud (2018) sugeriram uma possível relação entre qualidade da formação e adesão à justiça, ao respeito, à solidariedade e à convivência democrática, levantou-se a hipótese de que haverá diferenças na adesão aos valores considerando-se a formação: a maior adesão se relacionará à formação de alta qualidade.
MÉTODO
Participantes
Participaram 260 professores dos Anos Finais do Ensino Fundamental de [nome da cidade], selecionados por conveniência. Utilizaram-se como critérios de inclusão: (a) trabalhar como professor; (b) atuar no Ensino Fundamental II; (c) ensinar em [nome da cidade]; e (d) lecionar alguma disciplina. Os critérios de exclusão foram: (a) trabalhar somente como estagiário; (b) realizar exclusivamente gestão pedagógica; e (c) atuar apenas na Educação de Jovens e Adultos (EJA).
Os professores tinham entre 23 e 70 anos (M = 40,68; DP = 10,09) e eram, na maioria, do sexo feminino (68,5%). Trabalhavam em escola privada (46,5%), municipal (16,5%), estadual (38,5%) e federal (5,8%). Quanto à escolaridade: (a) 61,5% possuía Ensino Superior completo, (b) 6,5% Mestrado incompleto, (c) 20,4% Mestrado completo, (d) 4,2% Doutorado incompleto e (e) 5,8% Doutorado completo; 1,5% da amostra não informou. Mais da metade (55%) realizou pós-graduação lato sensu.
Instrumentos
Utilizaram-se instrumentos elaborados pelos próprios autores com base em outros estudos (Mello, 2000; Marques, Tavares et al., 2017; Santos, 2012; Souza, 2007): (a) Ficha de Perfil do Professor; (b) Questionário de Formação Inicial (QFI); e (c) Questionário de Formação Continuada (QFC). Utilizou-se, ainda, a Escala de Valores Sociomorais (EVSM), construída por Tavares et al. (2016).
Ficha de perfil do professor. Consiste no total de 15 questões objetivas e uma subjetiva para obtenção dos seguintes dados: (a) sexo, (b) data de nascimento, (c) renda individual, (d) renda familiar, (e) escolaridade, (f) tipo de formação, (g) tipo de universidade na graduação, (h) área de graduação, (i) pós graduação lato sensu, (j) tempo de profissão, (k) anos em que trabalha no Ensino Fundamental II, (l) disciplinas que leciona, (m) quantidade de escolas, (n) tipo de escola, (o) exercício de gestão pedagógica e (p) concepções sobre o papel da escola.
Questionário de Formação Inicial (QFI). Nove questões abordam as características consideradas desejáveis para uma boa formação inicial. Um exemplo de item é: "Meu curso preparou-me para mobilizar conhecimentos e valores para enriquecer situações de ensino aprendizagem". As questões são seguidas de uma escala Likert de cinco pontos para que os professores avaliem o quanto concordam ou não com as afirmações (α = 0,82). O questionário apresenta estrutura unifatorial para os itens. A esfericidade de Bartlett (χ² = 566,75; gl = 28; p < 0,05) e o índice Kaiser-Meyer-Olkin (KMO = 0,84) indicam a adequação da matriz de dados.
Questionário de Formação Continuada (QFC). Nove itens avaliam, em escala Likert de sete pontos, a frequência dos professores em atividades de formação continuada que lhes propiciam um bom desempenho em sua prática escolar (α = 0,94). Exemplo: “Atividades com formadores/capacitadores que possuam conhecimento adequado e estimulem a reflexão dos participantes”. O questionário apresenta estrutura unifatorial para os itens. A esfericidade de Bartlett (χ² = 1793,84; gl = 36; p < 0,05) e o Kaiser-Meyer-Olkin (KMO = 0,91) apontam a adequação da matriz de dados.
Escala de Valores Sociomorais (EVSM). Investiga a adesão aos valores justiça, respeito, solidariedade e convivência democrática. Há um total de 24 questões, sendo 6 para cada valor. Tratam-se de pequenas histórias nas quais há cinco alternativas; duas contrárias ao valor investigado (contravalores) e três favoráveis (pró-valores). As vinhetas se passam em quatro contextos (família, escola, comunidade e internet). Assim, é possível obter um escore geral e classificar o participante em um dentre quatro níveis crescentes de descentração: (a) nível I, contravalores; (b) nível II, perspectiva egocêntrica; (c) nível III, sociocêntrica; e (d) nível IV, propriamente moral.
Procedimentos de Coleta de Dados
Realizou-se um estudo piloto com 18 educadores (professores e coordenadores pedagógicos) da Educação Básica para refinar os instrumentos. Na coleta principal, contactaram-se os professores por intermédio de 18 escolas (13 públicas e cinco privadas). Além disso, utilizou-se a estratégia bola de neve, na qual solicitaram-se indicações de outros educadores aos participantes da pesquisa.
Inicialmente, selecionaram-se escolas que trabalhassem com os Anos Finais do Ensino Fundamental. Em seguida, entrou-se em contato, por telefone ou e-mail, com os coordenadores, explicando-lhes o estudo e convidando-os a fazer parte. Quando o convite foi aceito, agendou-se uma reunião. Alguns coordenadores autorizaram que a equipe de pesquisa entregasse pessoalmente os questionários aos professores; outros preferiram realizar eles mesmos a entrega. Nos dois casos, acordou-se uma data para devolução dos instrumentos. Quando os questionários foram devolvidos, solicitou-se a indicação de outros possíveis participantes. Após, entrou-se em contato com cada um dos professores indicados, de forma individual. Ao aceitarem participar do estudo, agendou-se horário e local para a entrega e o recebimento dos questionários. Todos os profissionais puderam optar por preencher os instrumentos no local de preferência.
Procedimentos de Análise de Dados
Inspecionaram-se os missings, realizando-se a substituição dos dados faltantes por medidas de tendência central (moda e média). Para caracterizar a amostra, realizaram-se estatísticas descritivas de variáveis sociodemográficas. Com o intuito de examinar as características da adesão aos valores, rodaram-se estatísticas descritivas dos escores gerais e realizou-se o levantamento de frequências dos níveis de descentração.
Para distinguir a qualidade da formação, constituíram-se grupos com a análise de clusters (método Two Step). Rodou-se análise preliminar com todas as questões do QFI e do QFC. Como os itens do QFI não contribuíram para a criação de grupos, realizou-se novamente a análise apenas com as questões do QFC. Para avaliar os clusters, utilizou-se o índice S. Com o intuito de verificar possíveis diferenças entre os grupos de formação na adesão aos valores, realizaram-se: (a) ANOVAS unidirecionais para as variáveis com homogeneidade de variâncias (post hoc de Bonferroni); e (b) Kruskal-Wallis para as que não apresentaram homocedasticidade.
Considerações Éticas
Este estudo seguiu as diretrizes e normas da Resolução 466/2012 do Ministério da Saúde e foi enviado ao Comitê de Ética do Instituto de Psicologia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), aprovado sob o número 2.273.966. A direção das escolas assinou um documento de autorização para realização da pesquisa. Todos os participantes assinaram um Termo de Consentimento Livre e Esclarecido. Os professores foram informados de que possuíam o direito de escolher participar ou não do estudo, sendo sua saída assegurada a qualquer momento, sem qualquer prejuízo ou penalização. O conteúdo do projeto foi explicitado aos envolvidos. Eles foram informados de que o preenchimento dos instrumentos duraria em torno de 45 minutos. Os principais resultados foram apresentados ao fim da pesquisa através de curso de extensão gratuito realizado na UFRGS. Todos os participantes, ao devolverem os questionários, foram avisados sobre a realização do curso. Quando a data deste foi agendada, eles receberam um e-mail com informações detalhadas. Houve, ainda, divulgação do curso em redes sociais e boletins institucionais.
RESULTADOS
Adesão aos Valores Essenciais para uma Educação Moral
A primeira hipótese foi a de que os professores teriam maior adesão à solidariedade, menor à justiça e intermediária para o respeito e a convivência democrática. As estatísticas descritivas consideraram os valores separadamente: (a) justiça (M = 13,73; DP = 3,11); (b) respeito (M = 12,61; DP= 2,35); (c) solidariedade (M = 14,80; DP = 2,34); e (d) convivência democrática (M = 14,44; DP = 3,14).
Para o levantamento de frequências, levaram-se em conta apenas os participantes que puderam ser classificados em algum nível de adesão: (a) justiça (n = 183), (b) respeito (n = 110), (c) solidariedade (n = 184) e (d) convivência democrática (n = 199). A Figura 1 apresenta a frequência dos níveis de adesão aos valores.
A primeira hipótese não foi confirmada. A despeito de a solidariedade apresentar a maior média, os valores com maior frequência no nível IV foram justiça e convivência democrática. A menor adesão foi ao respeito, tanto em relação à média quanto às frequências. Os valores intermediários foram solidariedade, considerando-se as frequências, além de justiça e convivência democrática, no tocante às médias.
Relação entre a Qualidade da Formação e a Adesão aos Valores
A segunda hipótese do estudo foi a de que haveria diferenças na adesão aos valores considerando-se a formação: a maior adesão se relacionaria à formação de alta qualidade. Para realizar a comparação, estabeleceram-se grupos através da análise de clusters. O grupo 1 (z = -1,40; n = 43) refere-se à formação de baixa qualidade; o grupo 2 (z = -0,10; n = 148) à intermediária; e o grupo 3 (z = 1,09; n = 69) à formação de alta qualidade. A silhueta de coesão e separação dos clusters é 0,4. A qualidade de cluster é considerada razoável.
A justiça, o respeito e a convivência democrática apresentaram homogeneidade de variâncias. Realizaram-se, então, ANOVAS unidirecionais. Utilizou-se teste não paramétrico (Kruskal-Wallis) com a solidariedade, visto que, nesse caso, o pressuposto foi violado. Evidenciou-se efeito significativo para a justiça, F (2, 257) = 4,17, p < 0,05. O post-hoc de Bonferroni apontou diferença média de -1,72 (EP = 0,60; p < 0,05) entre o grupo 1 (baixa qualidade; M = 12,63) e o grupo 3 (alta qualidade; M = 14,35). Os testes para respeito, solidariedade e convivência democrática não apresentaram efeitos significativos (p > 0,05). A Figura 2 apresenta os resultados sobre a relação entre qualidade de formação e adesão aos valores.
A segunda hipótese foi parcialmente confirmada. A adesão à justiça apresentou diferença em relação aos grupos de formação de alta e de baixa qualidade. O grupo com boa formação teve média maior que o outro grupo. No entanto, não se evidenciaram diferenças significativas para a adesão ao restante dos valores.
DISCUSSÃO
Adesão aos Valores Essenciais para uma Educação Moral
Os professores deste estudo apresentaram adesão mais descentrada à justiça e à convivência democrática. Eles atingiram a autonomia moral nesses valores, aderindo-lhes a partir de uma perspectiva propriamente moral (Marques, Tavares et al., 2017). Ser justo e democrático foi concebido pelos docentes com um bem, não apenas para eles próprios, mas para qualquer pessoa.
A adesão propriamente moral a valores é importante para os professores. Assim, eles podem estimular a construção autônoma de tais valores em seus alunos (Tognetta et al., 2017). Como a justiça é essencial para a vida moral (Piaget, 1932/1994), seu desenvolvimento é desejável aos estudantes. Inclusive, estudos (Couto et al., 2017; D’Aurea-Tardeli et al., 2012) mostram que os próprios professores e alunos reconhecem a importância da justiça. A educação para a justiça possibilita a evolução dos juízos sobre direitos e deveres. Como o Brasil é repleto de desigualdades (Madeira & Gomes, 2018), tratar dessa temática nas escolas pode contribuir para tornar o país um local mais igualitário. Conforme Piaget (1932/1994), "é bem frequente que a injustiça sofrida faça tomar consciência das leis da igualdade" (p. 209). Docentes e estudantes podem desenvolver suas noções de justiça retributiva e distributiva, auxiliando assim na construção de uma sociedade menos excludente.
Professores com alta adesão à convivência democrática também são fundamentais para a educação dos jovens. Eles têm a capacidade de resolver conflitos escolares, favorecendo o estabelecimento de melhores relações interpessoais entre eles e os alunos e entre os próprios estudantes (Vinha et al., 2017). Além disso, um ambiente escolar democrático oportuniza o desenvolvimento da autonomia dos alunos (Vinha & Tognetta, 2006), o que é especialmente relevante quando se considera os jovens que estão passando pela adolescência. Indivíduos que convivem em ambiente democrático tendem a combater o autoritarismo e a segregação. Assim, torna-se possível fortalecer as instituições democráticas da nação.
Apesar de a solidariedade não ser o valor mais descentrado, como em estudos anteriores (Marques, Tavares et al., 2017; Tavares et al., 2016), a maioria dos professores aderiu-lhe de maneira propriamente moral. Apenas poucos apresentaram perspectiva sociocêntrica. De fato, na escola, esse valor parece se apresentar com frequência (Martins, Braga, Silva, & Lucatto, 2017). Os docentes costumam ser solidários uns com os outros e com a família dos alunos para buscar soluções de problemas do cotidiano. É importante, então, que os professores estimulem esse valor junto aos estudantes para permitir o exercício da cooperação. Desse modo, os jovens podem se colocar em reciprocidade com seus iguais, compreendendo o auxílio aos outros como algo bom em si mesmo. Se, ao contrário, o profissional agir de forma autoritária, impedindo a solidariedade, ele incentiva o individualismo ou, no máximo, a simples colaboração entre os alunos.
O respeito foi o único valor que não atingiu a autonomia. Apesar de os professores frequentemente considerarem esse valor como importante para a educação (Alencar et al., 2014) e lamentarem não serem respeitados pelos alunos (Marques, Venturin et al., 2017), a maior parte não lhe aderiu de maneira propriamente moral. No estudo de Tavares et al. (2016), também houve predominância de docentes no nível sociocêntrico. Uma possível explicação para esse resultado seria que os profissionais compreendem respeito como sinônimo de obediência. Os alunos que questionam ordens são vistos como desrespeitosos. Todavia, na adolescência, é normal e desejável que os jovens questionem a autoridade (Piaget, 1932/1994). Para lidar com a falta de obediência, os docentes muitas vezes se mostram permissivos ou autoritários (Silva & Abud, 2016). Alguns buscam ser amados, outros, temidos; poucos procuram realmente ser respeitados. Conforme Piaget, o respeito é um misto de amor e medo; não só um ou outro, mas a síntese de ambos. Todavia, os docentes parecem não conceber o respeito desse modo.
Relação entre a Qualidade da Formação e a Adesão aos Valores
A associação entre formação e adesão à justiça encontrada neste estudo parece ser reflexo do contexto brasileiro. As desigualdades presentes no Brasil (Madeira & Gomes, 2018) provavelmente são debatidas em atividades de formação de alta qualidade. Com isso, os profissionais têm a oportunidade de refletir sobre temas como o bullying, a indisciplina e a evasão escolar, podendo discutir sobre as formas mais justas de resolver esses problemas. Assim, é possível que a justiça esteja sendo abordada, não necessariamente com caráter moral, mas político. Segundo La Taille (2006), "a justiça é tema tanto moral quanto político: fala-se em pessoas justas, mas também em instituições justas e em leis jurídicas justas" (pp. 61-62). É atitude política, por exemplo, falar sobre a valorização dos professores, tratando de assuntos como um piso salarial justo, boas condições de trabalho, segurança nas escolas, etc. Quando isso é discutido apropriadamente em atividades de formação, estimula-se o desenvolvimento de uma concepção mais descentrada da justiça.
A formação continuada, então, serve, não apenas para a aquisição de conhecimentos sobre áreas específicas (Mello, 2000), mas também como um ambiente adequado à construção da moralidade. Boas iniciativas de formação permitem que os professores tomem consciência de seus valores e reflitam sobre o papel que lhes cabe enquanto agentes de formação moral. Dessa maneira, tornam-se capazes de fomentar o desenvolvimento dos estudantes (Tognetta et al., 2017). Documentos brasileiros (Secretaria de Educação Fundamental, 1998; Secretaria Especial de Editoração e Publicações 2005) já explicitam a necessidade da formação continuada e a importância da cidadania. De toda forma, vale ressaltar a relevância de se estimular cada vez mais esse tipo de formação aos profissionais da educação.
Neste estudo, não foram evidenciadas relações entre formação e adesão ao respeito, à solidariedade e à convivência democrática. Sendo assim, é importante que esses valores sejam abordados durante a formação dos professores. Do mesmo modo que a justiça, eles podem ser discutidos a partir de situações do cotidiano. Entretanto, parece que sequer a justiça é abordada de maneira intencional, assim como no estudo de Zechi (2014). Para que se alcancem melhores resultados, é necessário que todos os valores essenciais para uma educação moral sejam tratados deliberadamente.
Os dados, então, estão de acordo com a ideia de Tognetta e Daud (2018) de que a formação de qualidade pode contribuir para a adesão aos valores; notadamente em relação à justiça. Todavia, não se pode desconsiderar uma explicação alternativa: os professores com maior adesão a esse valor são os que mais procuram boas atividades de formação continuada. Por entenderem que é justo exercer sua profissão da melhor maneira possível, eles buscam investir na regularidade e qualidade de sua formação.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Este estudo teve como objetivo investigar se a qualidade da formação - inicial e continuada - de professores dos Anos Finais do Ensino Fundamental, em Porto Alegre-RS, relaciona-se à adesão a valores essenciais para uma educação moral. Evidenciou-se que a formação continuada de alta qualidade se relaciona à adesão mais descentrada à justiça e, a de baixa qualidade, à menos descentrada. No entanto, não se evidenciaram associações com os outros valores (respeito, solidariedade e convivência democrática). Outros estudos (Marques, Tavares et al., 2017; Tavares et al., 2016) apontam para uma relação entre formação dos docentes e adesão a valores. Todavia, a qualidade da formação não foi considerada nesses casos. Este estudo avança na medida em que apresenta evidências empíricas sobre o assunto.
A formação, então, parece ser um caminho para engajar os professores no processo de construção dos valores dos alunos. É importante que as iniciativas de formação - tanto inicial quanto continuada - realizem discussões sobre moralidade, não de maneira dogmática, mas incentivando o diálogo e a postura crítica dos docentes. Assim, possibilita-se que esses profissionais tematizem o assunto nas escolas, estimulando os estudantes a refletir sobre os valores presentes na atualidade. Dessa forma, promove-se uma educação que não se reduz à escolarização, mas que beneficia professores, alunos e a sociedade como um todo.
A graduação tem-se mostrado insuficiente (IBOPE Inteligência, 2018; Muttão & Lodi, 2018; Santos, 2012; Tognetta et al., 2017); resta à formação continuada suprir as deficiências de conhecimento dos docentes (Magalhães Júnior et al., 2016). O ideal seria que, na graduação, os profissionais já se desenvolvessem para superar os desafios do cotidiano. Enquanto isso não ocorre, é necessário que o poder público e as instituições escolares estimulem os professores a participar de iniciativas de formação continuada. Através dessas iniciativas, é possível atualizar conhecimentos e, inclusive, construir a moralidade. Neste estudo, o respeito foi o valor menos desenvolvido pelos docentes, o que sugere que a formação continuada precisa se dedicar também a esse valor, ensinando não apenas a obediência, mas desenvolvendo a capacidade de se colocar no ponto de vista do outro.
Outra contribuição deste estudo diz respeito aos instrumentos construídos para avaliar a qualidade da formação dos professores (QFI e QFC), os quais se mostraram adequados ao contexto brasileiro. Ademais, a EVSM funcionou para os testes realizados. Todavia, esse último instrumento foi tratado como questionário e não conforme havia sido inicialmente proposto, ou seja, como escala. Como os valores possuem diferentes tipos (e.g., justiça distributiva, retributiva) e aparecem em diferentes contextos (família, escola, internet e comunidade), considerou-se que as questões de cada subescala possuem diferentes características, mas abordam um mesmo valor. De todo modo, a EVSM significa um grande avanço para a área da psicologia moral no país, uma vez que contribui para o desenvolvimento da pesquisa brasileira e incentiva os pesquisadores a elaborarem outros instrumentos.
Vale ressaltar, ainda, que é necessário ter cautela quanto à generalização dos resultados. Os dados aqui encontrados podem ser reflexo da constituição da amostra. Os professores participaram de maneira voluntária e sem receber benefícios. Assim, é possível que só tenham participado aqueles que tenham uma consciência moral mais desenvolvida. Sugere-se, então, a replicação da pesquisa com amostras aleatórias. Além disso, é importante que as mesmas variáveis sejam investigadas em outros locais para verificar se as relações se mantêm. Pode-se pensar, ainda, em examinar essas relações com docentes de outras etapas do ensino e não apenas nos Anos Finais do Ensino Fundamental.
Por fim, o objetivo do estudo foi investigar a existência de relações entre formação e adesão a valores; e não a direção dessas relações. Admitiu-se, como Tognetta e Daud (2018), que a formação de qualidade pode contribuir para a adesão aos valores. Entretanto, é possível que o sentido seja o inverso: os professores com maior adesão a valores são aqueles que mais procuram atividades de formação de alta qualidade. Essa é uma questão a ser investigada em estudos futuros.
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Datas de Publicação
-
Publicação nesta coleção
15 Jul 2022 -
Data do Fascículo
2022
Histórico
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Recebido
09 Fev 2020 -
Aceito
16 Nov 2020