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Psicologia escolar: o desafio da crítica em tempos de cinismo

School psychology: the challenge of criticism in cynicism times

Psicología escolar: el desafío de la crítica en tiempos de cinismo

Resumos

O artigo recupera elementos fundamentais do movimento de crítica da ideologia que se instaurou no interior da psicologia escolar brasileira a partir dos anos 80 e sugere uma reflexão sobre os desafios que se impõem ao pensamento crítico na atualidade, visando o âmbito da formação de psicólogos. Para isso, oferece como operador de leitura desses desafios o conceito de racionalidade cínica - discutido principalmente por autores da filosofia (Žižek, 1989; Sloterdijk, 2003; Safatle, 2008) - que trata de um novo modo de funcionamento ideológico no capitalismo tardio, caracterizado pela justificação resignada da realidade, e não somente pelos mecanismos de alienação em relação aos quais se dirigiu a crítica no decorrer da história. Conclui-se pela necessidade de manutenção do debate acerca das armadilhas que favorecem a permanência do discurso ideológico e pelo valor da atitude crítica necessária à psicologia escolar, remetendo-a aos problemas de seu tempo e lugar.

Ideologia; pensamento crítico; formação do psicólogo


In this article we propose to recover key elements of the critical movement against ideology that was restored in Brazilian school psychology from the 80's and suggests a reflection about new challenges that are placed to the critical thought in the present time, considering psychologist's graduation scope. We offer the concept of cynical rationality as a reading operator for these challenges Authors such as Žižek, 1989; Sloterdijk, (2003); Safatle, ( 2008), are important as they deal with a new way of ideological functioning in late capitalism. This , we argue is characterized by a resigned justification of reality, not only by mechanisms of alienation in relation with the historically directed critical thought . We draw a conclusion that it is necessary to keep a discussion about the traps that favor the permanence critique of ideological discourse and a critical attitude in school psychology, paying attention to its problems to its specific time and place.

Ideology; critical thinking; psychologist education


El artículo recupera elementos fundamentales del movimiento de crítica de la ideología, que se instauró en la psicología escolar brasileña a partir de los años 80, y plantea una reflexión sobre los desafíos que enfrenta el pensamiento crítico en la actualidad al tener como foco la formación de psicólogos. Ofrece como operador de lectura de estos desafíos el concepto de racionalidad cínica - discutido principalmente por autores de filosofía (Žižek, 1989; Sloterdijk, 2003; Safatle, 2008) - que trata de un nuevo modo de funcionamiento ideológico en el capitalismo tardío, caracterizado por la justificación resignada de la realidad y no apenas por los mecanismos de alienación para los que se ha dirigido la crítica a lo largo de la historia. Se concluye la necesidad de mantener el debate acerca de las trampas que colaboran con la continuidad del discurso ideológico y el valor de la actitud crítica necesaria a la psicología escolar al referirse a los problemas de su tempo y lugar.

Ideología; pensamiento crítico; formación del psicólogo


ARTIGOS

Psicologia escolar: o desafio da crítica em tempos de cinismo

School psychology: the challenge of criticism in cynicism times

Psicología escolar: el desafío de la crítica en tiempos de cinismo

Ricardo Taveiros Brasil

Graduado em Psicologia pela Universidade São Judas Tadeu e mestrando em Psicologia Escolar e do Desenvolvimento Humano pelo Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo

Endereço para Correspondência Endereço para Correspondência Ricardo Taveiros Brasil Avenida Ajarani, nº 491, apto. 83, bloco 3 Jardim Assunção, São Paulo - SP / CEP 03548-000 E-mail: ricardobra2006@gmail.com

RESUMO

O artigo recupera elementos fundamentais do movimento de crítica da ideologia que se instaurou no interior da psicologia escolar brasileira a partir dos anos 80 e sugere uma reflexão sobre os desafios que se impõem ao pensamento crítico na atualidade, visando o âmbito da formação de psicólogos. Para isso, oferece como operador de leitura desses desafios o conceito de racionalidade cínica - discutido principalmente por autores da filosofia (Žižek, 1989; Sloterdijk, 2003; Safatle, 2008) - que trata de um novo modo de funcionamento ideológico no capitalismo tardio, caracterizado pela justificação resignada da realidade, e não somente pelos mecanismos de alienação em relação aos quais se dirigiu a crítica no decorrer da história. Conclui-se pela necessidade de manutenção do debate acerca das armadilhas que favorecem a permanência do discurso ideológico e pelo valor da atitude crítica necessária à psicologia escolar, remetendo-a aos problemas de seu tempo e lugar.

Palavras-chave: Ideologia, pensamento crítico, formação do psicólogo.

ABSTRACT

In this article we propose to recover key elements of the critical movement against ideology that was restored in Brazilian school psychology from the 80's and suggests a reflection about new challenges that are placed to the critical thought in the present time, considering psychologist's graduation scope. We offer the concept of cynical rationality as a reading operator for these challenges Authors such as Žižek, 1989; Sloterdijk, (2003); Safatle, ( 2008), are important as they deal with a new way of ideological functioning in late capitalism. This , we argue is characterized by a resigned justification of reality, not only by mechanisms of alienation in relation with the historically directed critical thought . We draw a conclusion that it is necessary to keep a discussion about the traps that favor the permanence critique of ideological discourse and a critical attitude in school psychology, paying attention to its problems to its specific time and place.

Keywords: Ideology, critical thinking, psychologist education.

RESUMEN

El artículo recupera elementos fundamentales del movimiento de crítica de la ideología, que se instauró en la psicología escolar brasileña a partir de los años 80, y plantea una reflexión sobre los desafíos que enfrenta el pensamiento crítico en la actualidad al tener como foco la formación de psicólogos. Ofrece como operador de lectura de estos desafíos el concepto de racionalidad cínica - discutido principalmente por autores de filosofía (Žižek, 1989; Sloterdijk, 2003; Safatle, 2008) - que trata de un nuevo modo de funcionamiento ideológico en el capitalismo tardío, caracterizado por la justificación resignada de la realidad y no apenas por los mecanismos de alienación para los que se ha dirigido la crítica a lo largo de la historia. Se concluye la necesidad de mantener el debate acerca de las trampas que colaboran con la continuidad del discurso ideológico y el valor de la actitud crítica necesaria a la psicología escolar al referirse a los problemas de su tempo y lugar.

Palabras clave: Ideología, pensamiento crítico, formación del psicólogo.

Introdução

As concepções teóricas e práticas profissionais em psicologia que não chegam a reconhecer a questão do fracasso escolar como efeito de uma determinada estrutura de sociedade (marcada por tensões e conflitos de classe) têm sido alvo de questionamentos há mais de duas décadas. Trata-se de um debate ético-político que foi iniciado a partir da publicação de Psicologia e ideologia: uma introdução crítica à psicologia escolar (Patto, 1987), que impulsionou uma série de pesquisas fundamentadas em referenciais teórico-críticos. A publicação do livro anunciava um novo momento para a área, no qual se buscava tomar a psicologia escolar enquanto objeto e como primeiro passo para a instauração de um exercício que permitisse reconhecê-la como psicologia instrumental - a serviço da dominação ideológica - para transformá-la, posteriormente, em psicologia crítica, na medida do possível. O livro fala da impossibilidade de discutir criticamente a psicologia escolar e o papel profissional do psicólogo fora do marco de uma concepção também crítica das relações entre educação escolar e sociedade.

O trabalho empreendido por Patto (1987) abriu um campo de abordagem crítica à psicologia, na tentativa de chegar ao discurso ideológico que, nas palavras da autora, fundamentou o edifício desta ciência. Subjacente ao que poderia ser considerado como a diversidade teórica da psicologia, foi possível reconhecer que havia um tipo de unidade ideológica no discurso psicológico. Porém, a crítica da autora foi além das constatações dos "enganos" na psicologia, na medida em que tais "enganos" de maneira alguma eram inconsequentes em relação à ordem social capitalista; ao contrário, contribuíam para a manutenção dessa ordem; ou seja, a psicologia, ao lado de outros aparelhos ideológicos - usando o termo de Althusser (1974) -, estaria andando de mãos dadas com a dominação. Ao traçar o perfil psicológico dos "marginalizados", fazendo-os acreditar numa suposta oferta de condições que lhes permitissem galgar outras posições na estrutura social, os psicólogos estariam legitimando a manutenção da sociedade de classes. Sendo assim, havia inversão ideológica, por exemplo, na utilização do termo "carente" (na medida em que não se entendia a carência enquanto um efeito do modo de produção capitalista). O desmascaramento da ideologia exigia que se passasse a falar do oprimido e da opressão.

Considerem-se os objetivos inconfessos da psicologia que Patto (1987) começou a criticar: selecionar. orientar. adaptar e racionalizar. Isto é, selecionar os mais aptos, orientá-los de acordo com os padrões vigentes, adaptar o homem a uma sociedade que lhe furta sua própria humanidade e, como consequência desse processo, racionalizar a existência de uma sociedade dividida e injusta, justificando-a por meio de instrumentos e procedimentos supostamente neutros em termos políticos.

As relações de cumplicidade entre ciência e ideologia no campo da psicologia escolar vêm sendo, desde então, interpeladas por um discurso que vai à contramão das tendências instrumentalistas, do ideário higienista, do organicismo presente nas noções de distúrbios e disfunções - e o consequente processo de medicalização da educação e da sociedade1 1 . Para uma discussão recente e aprofundada sobre o fenômeno da medicalização, sugere-se a leitura dos textos reunidos no livro organizado pelo Conselho Regional de Psicologia SP e pelo Grupo Interinstitucional Queixa Escolar (2010). - e dos preconceitos encobertos pelas teses da carência cultural. A rota traçada por aqueles que se dispuseram a refletir sobre o lugar ético-político do discurso psicológico aplicado à educação escolar passa, portanto, por questionamentos internos ao próprio corpo conceitual da ciência psicológica, reconhece o reducionismo individualizante de questões sociais, revela armadilhas ideológicas e compromissos com a dominação de classe, e questiona a razão instrumental que perpassa os instrumentos padronizados de avaliação psicológica como via inequívoca de apreensão do real. Em outro texto, a autora supracitada aprofunda a crítica a esses instrumentos (Patto, 1997).

Segundo Patto (1997), o exame que um número significativo de psicólogos se presta a realizar conclui, via de regra, pela presença de deficiências e distúrbios mentais nos examinandos. Essa prática implicará em consequências diversas, conforme a classe social a que pertencem os que são submetidos a tais avaliações. No caso dos de classe média e alta, os procedimentos diagnósticos geralmente conduzem a orientações a pais e professores, psicoterapias e terapias pedagógicas. Em relação aos de classes populares, a conclusão, em boa parte dos casos, resume-se ao laudo que, cedo ou tarde, justificará o fracasso desse aluno. Desigualdades sociais justificadas cientificamente (com pretensa isenção e objetividade) por uma série de explicações que deixam à distância a dimensão política de um saber que, por sua vez, informa uma determinada prática profissional.

Os esforços empreendidos por aqueles que se dedicaram à crítica da psicologia escolar puderam mostrar que os trâmites dos processos de avaliação e intervenção que caracterizam abordagens tradicionais da área iludem, desrespeitam e silenciam alunos, familiares e educadores (Patto, 2008). Uma ciência que toma a divisão estrutural da sociedade como "variável", não por acaso, é uma ciência que fala da criança em termos de "anormalidades", "carências", "distúrbios" e "imaturidade", assim como fala das famílias em termos de "desestrutura familiar" e "ignorância", e dos professores como "despreparados" e "pouco afetivos com os seus alunos". É a ciência da aparência, das concepções abstratas, idealizadas e naturalizadas sobre um suposto indivíduo que não chega a ser pensado em relação ao seu contexto histórico e social. Portanto, é mais que razoável problematizar o caráter ideológico desses discursos socialmente promovidos na qualidade de ciência e que obstaculizam a escuta do sofrimento psíquico das pessoas.

A partir da década de 80, diversos pesquisadores passaram a pensar a relação entre fracasso escolar e pobreza - não apenas na área da psicologia escolar. Machado e Souza (2004) citam Leser e Freire (1986) na psicologia social, Cagliari (1985) e Soares (1986) na área da linguística, Moysés e Lima (1982) na medicina e Collares (1989) na pedagogia. Esses estudos problematizaram concepções que culpabilizam as vítimas pelo fracasso escolar, deslocando a atenção para a má qualidade do ensino e para a presença de estereótipos e preconceitos sobre alunos e famílias pobres.

A incorporação dessa crítica à psicologia escolar consistiu, portanto, em desvelar os mecanismos por meio dos quais o discurso competente2 2 . Segundo Chaui (1980, p. 7), o discurso competente é o discurso instituído e por meio do qual a restrição da linguagem opera da seguinte forma: não é qualquer um que pode dizer qualquer coisa, em qualquer lugar e em qualquer circunstância. A consequência desse tipo de raciocínio aponta para a produção dos "incompetentes sociais", subordinados aos ditames do discurso competente como discurso do conhecimento, que, por sua vez, promove seu prestígio e eficácia por meio da dependência, afirmação e aceitação tácita da incompetência dos homens enquanto sujeitos políticos, históricos e sociais. da psicologia se apresentou como neutro numa realidade historicamente determinada (numa perspectiva materialista histórica, ideias em si não explicam a realidade; é a concretude das relações sociais que exprime a própria produção de ideias). Uma psicologia crítica seria aquela que aceita o desafio de ir além do aparente, a fim de captar a essência dos fenômenos da realidade cotidiana e concreta de sujeitos historicamente determinados.

Patto (1998) fala da impossibilidade de se formar intelectualmente os psicólogos sem prepará-los para refletir criticamente sobre os diversos problemas epistemológicos e éticos da própria psicologia. A mesma autora, em outro texto (Patto, 2007), afirma que um ideal de cientifização das ciências humanas teria levado à produção em massa de cientistas que, embora fixados nos domínios de seus campos de pesquisa, integraram-se cada vez mais ao espírito mercantilista do capital. Nas palavras da autora, a pretensão de neutralidade política é, ela própria, uma posição política e conservadora a serviço da manutenção do estado de coisas. Sendo assim, o compromisso (com a manutenção ou com a transformação da sociedade) nunca seria dimensão externa à teoria e à técnica, na medida em que lhe é inerente. Daí as preocupações com a necessidade de uma atitude filosófica diante de abordagens teóricas e práticas profissionais. Daí a posição de que a escrita da história da psicologia numa chave crítica represente, em última instância, um compromisso político com a ciência e com a profissão do psicólogo.

À psicologia como técnica, comprometida com uma classe social específica - a dominante, material e espiritualmente - é preciso opor uma psicologia que, embora focalizando especializadamente os processos psíquicos, não perca de vista a totalidade social concreta que lhes dá sentido. Nesta perspectiva, fazer psicologia continua sendo um ato político como sempre foi, mas agora um ato político comprometido com os agentes da transformação da estrutura social e não mais com os interessados pela sua conservação. (Patto, 1987, p. 3)

A tentativa de eliminação da dimensão política na produção científica por meio do ideal de uma suposta neutralidade remete ao conceito de ideologia, que, segundo Chaui (1997), seria um corpo explicativo e prático de caráter prescritivo, normativo e regulador, cuja função é dar aos membros de uma sociedade dividida em classes uma explicação racional para as diferenças sociais, sem atribuir tais diferenças à divisão da sociedade em classes. Para Patto (2008), a psicologia foi uma das ciências a participar desse ilusionismo que transformou desigualdades sociais (historicamente determinadas) em desigualdades pessoais (biológicas, de desenvolvimento ou de ajustamento).

Segundo Antunes (2003), a questão da ética em psicologia escolar toma maiores proporções a partir da crítica. Não restrita ao âmbito da atuação profissional balizada por resoluções normativas, a ética passaria a designar também (e principalmente) uma questão de posição política no que diz respeito à produção de conhecimento e exercício profissional do psicólogo. Os resultados das pesquisas realizadas por autores que deram a si mesmos a tarefa de análise da escola mostraram (e continuam a mostrar de maneira insistente) que o fracasso escolar que gera sofrimento psíquico é mantido por condições concretas de funcionamentos institucionais que produzem e reproduzem tensões sociais.

Diante das discussões motivadas por esse tipo de leitura do fenômeno que passa a ser chamado fracasso escolar, os lugares da psicologia na educação também começam a ser questionados e ressignificados. Checchia e Souza (2003) falam dos pressupostos que fundamentam a ação do psicólogo escolar numa perspectiva crítica: compromisso com a defesa da escola de boa qualidade para todos, atitude de ruptura com concepções adaptacionistas e construção de uma práxis que faça frente à queixa escolar e que se proponha a deslocar o foco de sujeitos isolados para o contexto de uma rede de relações. O trabalho do psicólogo consistiria, segundo Tanamachi e Meira (2003), em favorecer o encontro entre sujeito e educação, assumindo como finalidade central a mediação na construção de uma educação capaz de socializar o conhecimento acumulado.

Quase três décadas após a introdução da crítica no campo da psicologia escolar, ainda se verifica a permanência de abordagens teóricas e de práticas profissionais que insistem em distanciar determinantes sociais e políticos do fracasso escolar, como diz M. P. R. Souza (2010). Para B. P. Souza (2007), o corte paradigmático operado pelos que fizeram a crítica da psicologia escolar parece ainda não ter ocorrido de forma ampla, por exemplo, na área clínica; como se os avanços teóricos da psicologia (em interlocução com as outras ciências humanas e sociais) que permitem uma leitura contextualizada do fenômeno psicológico na educação não tivessem sido acompanhados pela prática clínica de atendimento às queixas escolares.

Ora, como responder às indagações que surgem a partir da constatação de que, muito embora já se observem significativas mudanças conceituais e práticas3 3 . Patto (2005) destaca avanços no campo da psicologia em relação às questões da educação. A autora fala, por exemplo, das contribuições da psicanálise e da teoria crítica frankfurtiana, além dos dispositivos de atendimento às queixas escolares que fogem à lógica individualizante tradicional. , o trabalho de desvelamento da ideologia nas relações entre psicologia e educação pareça ainda não ter repercutido de maneira abrangente nos contextos de atuação do psicólogo escolar?

Responder a tais indagações implica considerar algumas mediações presentes na relação entre a realidade social e a produção de conhecimentos. A primeira refere-se ao lugar contraditório da escola na sociedade de classes, considerando-se a promessa de inclusão numa sociedade de lógica excludente. A sutileza dos discursos ideológicos obscurece, por exemplo, a realidade dos processos de inclusão marginal na escola.

Uma segunda questão trataria da impossibilidade de se desconsiderar que uma operação de passagem do plano teórico ao plano da ação é uma operação encarnada, ou seja, por mais que a teoria possa ser ação teórica, é necessário ir além, pisar o chão da escola, conhecer os bastidores desse cenário, tomar ciência dos mecanismos sistêmicos que regem as políticas públicas educacionais. Quanto à psicologia, será sempre válido enfatizar a importância de se conhecer a história dessa ciência e desse campo de atuação profissional. Segundo Ramos (2002), o pensar histórico do psicólogo não deve dirigir-se apenas ao objeto da psicologia, mas à própria psicologia enquanto objeto; nesse sentido, se compreendida no decurso histórico de sua constituição, a psicologia acaba por revelar uma dimensão legitimadora das desigualdades sociais. Essa legitimação é inerente ao modo de produção capitalista, desde que a história seja entendida como um processo em que homens determinados em determinadas condições criam seus próprios meios de existência social, reproduzindo-os ou transformando-os (Chaui, 1997).

A referida crítica no campo da psicologia escolar foi construída no sentido de interpelar um discurso ideológico caracterizado por aquilo que encobre a realidade (um véu, um sintoma). Autores como Žižek (1989a), Sloterdijk (2003), Safatle (2008) e Ramos (no prelo) têm mostrado, no entanto, uma nova face da ideologia que, ao invés de ocultar seus compromissos com a manutenção do estado de coisas na fase atual do capitalismo, legitima a barbárie de várias formas. Quando se conhece os determinantes sociais do fracasso escolar e, ainda assim, se insiste em pensá-los como variáveis, o alvo da crítica já não é apenas a alienação.

Embora a crítica à ideologia no sentido do velamento e alienação na dimensão de uma falsa consciência ainda seja necessária, ela já não parece suficiente diante dos desafios que se impõem ao pensamento crítico na contemporaneidade. Como é possível questionar os discursos ideológicos que não encobrem, mas que reafirmam a realidade? Sugerem-se acréscimos ao dispositivo crítico, pois, se uma das suas principais tarefas consiste no desvelamento dos mecanismos e dos pressupostos ideológicos da ação dos homens (não sabem, mas fazem), coloca-se hoje a questão sobre como manter o vigor da crítica quando os discursos ideológicos já são conhecidos por muitos (Safatle, 2008).

A crítica da razão cínica e a psicologia escolar

Que acontece quando os progressos esboçados pela teoria não ocorrem, quando as forças que deveriam levar à transformação são repelidas e parecem derrotadas? A verdade da teoria é tão pouco contraditada por isso que, ao contrário, surge sob um novo prisma e esclarece novas facetas e partes de seu objeto. (...) A função cambiante da teoria, na nova situação, confere-lhe um caráter de teoria crítica num sentido mais contundente. (Marcuse, 1937, p. 636-637, citado por Benhabib, 1996, p. 73)

Antes de iniciar a discussão sobre o cinismo enquanto modo de funcionamento da ideologia, será válido trazer uma ideia marxiana aqui destacada por Žižek (1989b, p. 312) a fim de explicitar a diferença entre a crítica tradicional e a crítica da razão cínica:

A definição mais elementar da ideologia é, provavelmente, a famosa frase de 'O capital', de Marx: "Sie wissen das nicht, aber sie tun es" - "disso não sabem, mas o fazem". O próprio conceito de ideologia implica uma espécie de ingenuidade constitutiva básica: o desconhecimento dos seus pressupostos, de suas condições efetivas, a distância, a divergência entre a chamada realidade social e nossa representação distorcida, nossa falsa consciência dela. É por isso que tal 'consciência ingênua' pode ser submetida a um processo crítico-ideológico. A meta desse processo é levar a consciência ideológica ingênua a um ponto em que ela possa reconhecer suas próprias condições efetivas, a realidade social que distorce e, mediante esse ato mesmo, dissolver-se.

As estruturas retóricas da crítica da ideologia estiveram normalmente vinculadas ao desvelamento das ilusões de uma falsa consciência. A tarefa da crítica consistiria na revelação daquilo que a consciência não seria capaz de apreender sem abalar sua própria forma, isto é, naquilo que ela necessariamente reifica ou luta para não saber. Tal modo de elaboração da crítica foi orientado pela identificação de déficits na realização dos critérios normativos referentes a valores intersubjetivamente partilhados (Safatle, 2008).

Segundo Žižek (1989a), a ideologia (como doutrina, conjunto de ideias, crenças e conceitos) está destinada a convencer o sujeito de sua "veracidade", mas na verdade serviria a inconfessos interesses de poder. A modalidade de crítica da ideologia que corresponderia a essa noção é a de uma leitura sintomal, ou seja, o objetivo da crítica seria discernir a tendenciosidade não reconhecida do texto oficial, por meio da análise de suas rupturas, lacunas e lapsos. Entretanto, o autor defende ainda a probabilidade de que uma tendência muito prestigiosa da crítica da ideologia na contemporaneidade (nascida a partir da análise do discurso) aponte para um tipo de inversão dessa lógica: o que a tradição do esclarecimento descartaria como se fosse uma mera perturbação da comunicação "normal" converte-se na própria condição positiva dessa comunicação.

Para além do caráter alienante da falsa consciência - discutido por Chaui (1997) e por Marx e Engels (1974) -, Žižek (1989), Sloterdijk (2003), Safatle (2008) e Ramos (no prelo) chamam a atenção para uma forma particular de funcionamento da ideologia que se caracteriza por uma justificação resignada da realidade. Após rasgar o véu de ilusões e revelar os escondidos por trás do sintoma, restaria ainda ao pensamento crítico a tarefa de se haver com uma racionalidade cínica que tudo releva e favorece a manutenção de desigualdade e injustiça. Patto (2009) fala sobre a transição da alienação para o cinismo:

Em tempos de evidente desigualdade, injustiça e barbárie, que já não são coisas que precisam ser mostradas, porque se mostram por si mesmas; tempos de narcisismo sombrio, de individualismo feroz, de instrumentalismo espantoso... transita-se da consciência alienada para a consciência cínica (...) Se vê e se percebe a desigualdade, a injustiça e a barbárie, mas se insiste em não considerá-las, pois esse conhecimento pede um compromisso com o outro, com o humano-genérico, quando tudo convida ao individualismo assustador. Fazemos de conta que não sabemos da frieza, da impostura e da iniquidade do mundo atual e fazemos de conta que nada sabemos da nossa própria frieza e da nossa própria impostura. E nos justificamos: sinto muito, eu sei que é assim, mas eu preciso me defender. (Patto, 2009)

A questão do cinismo, para Safatle (2008), está relacionada às formas de vida hegemônicas do atual momento das sociedades capitalistas que, por sua vez, parecem refletir a aceitação proveniente da crença de que o sistema opera por meio de critérios racionais. Haveria, assim, um modo cínico de funcionamento da ideologia permeando as diversas instâncias do laço social e que se refere ao próprio tipo de sujeito do qual o capitalismo necessita para se sustentar e se fortalecer nessa dobra da modernidade: um sujeito fechado em si mesmo, convocado a se resignar e a não abrir mão de seu gozo e de suas fatias de mercado por nenhum tipo de compromisso com a coletividade. Ramos (no prelo) fala do cínico como sujeito voltado unicamente à gestão do próprio sucesso a qualquer custo e questiona: "de que forma os psicólogos de nosso tempo são afetados pela lógica da esperteza no mundo do vale tudo em seu cotidiano profissional?".

De acordo com Žižek (1989a), é como se, no capitalismo tardio, palavras já não importassem tanto, uma vez que não geram compromisso; como se, cada vez mais, elas perdessem seu poder de execução, pois o que quer que se diga acaba se dissolvendo na indiferença geral - o rei está nu, mas continua-se a agir como se o rei não estivesse nu.

Safatle (2008) sugere uma reflexão que consiste em esclarecer de que forma, na contemporaneidade, a transparência (a nudez do rei) se caracteriza como um obstáculo. Para Adorno (1980), citado por Safatle (2008), tal transparência, advinda após uma longa noite de cegueira ideológica, tornou-se o cerne da opacidade constitutiva da realidade partilhada, pois as formas de vida fundam-se na partilha dos padrões de racionalidade encarnados em instituições, disposições de condutas valorativas e hábitos (p. 12).

Žižek (1989a) fala da ideologia como matriz geradora e reguladora das relações entre visível e invisível, imaginável e inimaginável, e também das eventuais mudanças nessas relações. Para ele, a atitude de evocar a "complexidade da situação" pode servir para livrar o sujeito da responsabilidade de seus atos. Note-se que a ideologia ainda é presente, na medida em que serve à justificação da realidade. Entretanto, seu modus operandi já não se restringe a ocultar algo. Manter os sujeitos convencidos de que não há outra realidade possível e que, portanto, não há o que se fazer frente aos impasses parece a grande questão do discurso ideológico cínico. A entrega ao "cruzar de braços" é, ao mesmo tempo, um elogio à desresponsabilização. E é justamente nesse sentido que se poderia, nas palavras de Ramos (2008), compreender o cinismo como a própria ideologia, na medida em que seu problema consistiria em fazer acreditar que não há realidade alternativa, e o sujeito, alvo fácil da cooptação, a reproduziria. Para Žižek (1989b), não se trata de deixar de enxergar a realidade através da lente da ideologia, mas entender de que maneira a própria realidade não poderia se reproduzir sem uma mistificação ideológica. Como diz Adorno (1968, p. 340-341), "quanto mais os sujeitos são presas da sociedade, quanto mais intensa e completamente eles são determinados pelo sistema, tanto mais o sistema se conserva não apenas mediante a aplicação de coações aos sujeitos, mas até por intermédio deles".

Para Ramos (no prelo), a posição cínica é a que se encontra quando o contorno entre ideologia e realidade perde nitidez. Diz ele que, se toda realidade é ideologia, não há mais esperança e caímos numa espécie de vale tudo (uma vez que não haveria mais uma verdade); por outro lado, bastaria não abrir mão do valor ético da verdade para desmantelar a falsidade do existente como única realidade possível. A questão, para esse autor, é que cada vez menos a crítica que revela o que há por trás da ideologia encontra seu destinatário (alienado). O alienado de hoje pode ser aquele que sabe, mas encena (impostor). Assim, só se pode levar o sujeito cínico à ética colocando-o frente a frente com as suas imposturas (que são suas, mas que também lhe foram socialmente impostas, na medida em que, enquanto sujeito, ele foi interpelado pela ideologia; trata-se da internalização histórica de imperativos sociais).

Para Sloterdijk (2003), o cinismo poderia ser pensado nos paradoxos de uma ideologia reflexiva ou de uma falsa consciência esclarecida. Segundo Žižek (1989b), no cinismo tem-se plena ciência de determinado interesse oculto por trás da universalidade ideológica, mas não se renuncia a ele, ou seja, os pressupostos ideológicos da ação são conhecidos, mas não se encontra, a partir daí, as razões para a reorientação da conduta. Sloterdijk (2003) afirma que, na razão cínica, eles sabem o que fazem e continuam a fazê-lo. Eis a questão: operar um tipo de deslocamento do campo do saber (nãosabem, mas fazem) para o do fazer - sabem o que fazem e continuam fazendo. O cinismo surge, portanto, como elemento do diagnóstico de uma época na qual o poder já não teme críticas desveladoras, pois aprendeu a rir de si mesmo - o que o permitiu revelar o segredo de seu funcionamento e continuar funcionando enquanto tal (Safatle, 2008). O cinismo seria, segundo Žižek (1989a), um modo destacado de mentir sob o disfarce da verdade: com desconcertante franqueza, "admite-se tudo", mas o pleno reconhecimento dos interesses não impede, de maneira alguma, a perseguição dos mesmos.

Safatle (2008) defende que é preciso dar um passo além na crítica, pois ela não poderia se sustentar somente pelos dispositivos que a sustentaram outrora. A crítica será infrutífera se guiada somente pelas exigências de realização dos já existentes ideais normativos de justiça e consenso, posto que a existência de acordos acerca de valores normativos não garante a aplicação desses valores. Tal ideia parece aplicável ao caso da psicologia escolar, uma vez que se poderia dizer da existência de "núcleos de consenso" entre profissionais no que tange, por exemplo, ao ideal do direito de todos à educação. Ora, é sabido que a prática de muitos psicólogos distancia-se do valor compartilhado, na medida em que se continua a avaliar e a trabalhar numa perspectiva individual, mesmo após tantos anos de denúncia do caráter ideológico das concepções individualizantes. Ao comentarem sobre o lugar-comum da reprodução dos estereótipos e preconceitos de classe nas práticas de avaliação psicodiagnóstica, Mello e Patto (2008) acrescentam o fato de que estudos já denunciaram e revelaram à exaustão a precariedade do processo e do produto das avaliações diagnósticas feitas por psicólogos que atendem alunos com dificuldades em seus processos de escolarização.

Do ponto de vista científico e político, Patto (2005) instiga uma reflexão que também poderia conduzir à discussão que aqui se faz sobre a razão cínica. A autora fala sobre desconsideração de governantes em relação às pesquisas realizadas com dinheiro público (quando decidem sobre os rumos da política educacional brasileira) e sobre as imposturas das declarações oficiais em propagandas governamentais sobre as políticas públicas educacionais veiculadas pela mídia. Como é possível, por exemplo, sustentar o argumento de que a política de progressão continuada beneficia alunos da rede pública?

Ao analisar o discurso oficial sobre a política da progressão continuada4 4 . Política implantada na rede estadual paulista em 1998, que reorganizou o ensino fundamental em dois ciclos, sendo que o aluno não poderia ser reprovado ao final de cada série/ano, mas ao final do ciclo. O objetivo incidiria na alteração dos índices de reprovação, defasagem série-idade e evasão, melhorando as estatísticas oficiais, mas comprometendo os processos de escolarização dos alunos que, em muitos casos, são promovidos sem, contudo, terem se apropriado dos conteúdos escolares básicos. Ver Viégas (2007). , Viégas (2007) reconhece que já não bastaria confrontar o texto ideológico com suas lacunas e com o que ele precisa reprimir para poder se organizar e preservar sua coerência, tendo em vista que tais lacunas do discurso ideológico são consideradas antecipadamente pela razão cínica. É aqui que se encontra o ponto de ancoragem para as discussões sugeridas no presente texto: como levar adiante a crítica da ideologia na relação entre psicologia e educação em tempos de cinismo?

Segundo Mello e Patto (2008), as análises da ideologia nas concepções teóricas e práticas profissionais da psicologia que encobrem e justificam as mazelas sociais já são antigas, mas estão ausentes de grande parte dos cursos de formação de psicólogos. Essa negação no sentido da formação intelectual parece ampliar-se, segundo as autoras, com o crescimento de uma rede de instituições universitárias que não passam de empresas que vendem cursos de psicologia sem preocupações com a responsabilidade na outorga de diplomas a pessoas treinadas para dizer arbitrariedades e absurdos como verdades.

Para Ramos (no prelo), o esvaziamento crítico de cursos de psicologia encontra-se alinhado com dinâmicas pós-fordistas do gerenciamento da produção e das relações de trabalho. Ao invés de profissionais criticamente envolvidos com os temas e objetos de seu trabalho, o que se vê é um movimento de flexibilização profissional que favorece a adaptação do indivíduo a uma realidade inquestionada e às necessidades do mercado, sem revelar o que isso significa em termos de adesão às condições de opressão social.

Trazer a questão da razão cínica para o interior das discussões sobre a formação de psicólogos pode ser uma possibilidade de colocar os sujeitos diante de uma questão de extrema importância para o enfrentamento dos desafios postos ao pensamento crítico na atualidade, qual seja, a da responsabilidade e implicação ética. Ramos (no prelo) destaca a importância de marcar a responsabilidade de professores que carregam e constituem, em si mesmos, a memória viva de uma universidade que se quer deixar para trás em nome de uma imediata comercialização e consumo acríticos de cursos pasteurizados. O autor afirma que a fase histórica de esclarecimento alcançada não pode ser arbitrariamente revogada - o que, por sua vez, sugere que os sujeitos aderidos à razão cínica devem ser interrogados em sua impostura. Para esse autor, não se trata mais apenas de apontar os compromissos da psicologia com a dominação como forma de alertar os professores e estudantes para as armadilhas da alienação (uma vez que isso já foi muito mencionado e, de tal forma, que não é possível que os destinatários nunca tenham ouvido falar).

Em que medida parte da psicologia ainda se encontra perdida no Jardim do Paraíso? Não se perceberam nus e não descobriram a vergonha da ingenuidade de suas ideias ou apenas sustentam sua colônia de nudismo, isolados da história e, por isso, do mundo? (Ramos, 2002, p. 114)

Será possível afirmar que os estudantes e estagiários dos cursos de psicologia e seus supervisores nada sabem sobre o movimento de crítica nas relações entre ciência e ideologia? Nada saberiam sobre a realidade educacional do país? Passam incólumes por experiências que revelam, de muitas formas, o descaso político pela educação? Ou será que, apesar de saberem disso tudo, se afastam das implicações decorrentes desse saber e das consequências que uma mudança de olhar e uma revisão de práticas exigiriam?

Safatle (2008) entende ser necessário ao momento presente certo desespero conceitual produtor de uma ação que satisfaça a urgência. Para ele, se não há uma ação que satisfaça a urgência, é porque o desespero não foi suficiente. Ao mesmo tempo, fala da importância em se demorar na reflexão frente a essas questões, uma vez que a atitude de responder sem se demorar constitui defesa contra o trabalho de desarticulação que, por sua vez, só pode ser efetuado pela pulsação demorada das questões. As perguntas a que se referem tais problemas só se respondem pela sua dissolução, afirma o autor.

Ramos (no prelo), por sua vez, diz que o objetivo de trazer à tona essa discussão não consiste em imobilizar os destinatários, mas gerar um nível de angústia que leve à reflexão e, quiçá, a algum ato transformador. Por mais que seja diante do impossível que se encontre quando se questiona sobre como fazer frente à razão cínica, o impossível e a utopia representam a própria história enquanto potencialidade, ou seja, a história em seu devir. É a dialética a ser recuperada, trazendo à política a teoria que ela revela precisar. Portanto, se a ruptura com a racionalidade cínica parece impossível, é chegada a hora de dar um estatuto político à categoria do impossível.

Ainda segundo Ramos (no prelo), após o desmascaramento das imposturas do cínico, surgiria angústia, vergonha e a questão sobre outra realidade possível, sem o que não haveria ato transformador, mas apenas resignação. O autor se lembra de Karl Marx e de como este se referia ao sentimento de vergonha em seu caráter revolucionário. O cinismo que hoje se denuncia teria raízes históricas articuladas ao capitalismo, porque é burguês e pode ser reconhecido na forma da vergonha política.

No entanto, é preciso lembrar que, nos tempos de Marx, embora a vergonha já pudesse ser vista como um tipo de revolução, era entendida como sentimento capaz de vir à tona mediante uma crítica sustentada pelos padrões normativos de justiça de que fala Safatle (2008). Hoje, segundo Ramos (no prelo), numa sociedade sem vergonha, o apelo aos valores eternos já não é suficiente. O autor questiona: será que os cursos de psicologia, fundados na racionalidade pedagógica das competências e habilidades, não estariam comprometidos até o pescoço com aquilo que deveriam desmascarar? Essa pergunta sugere, de um lado, a consideração dos limites do esclarecimento (se os cursos estão comprometidos com o que deveriam desmascarar, de que forma a reflexão poderia conduzir ao ato transformador?) e, por outro lado - justamente para que não se renda à lógica dos cínicos -, a mobilização por estudos e pesquisas que aprofundem as discussões sobre as novas formas de resistência e luta que a realidade impõe ao pensamento crítico.

É preciso reconhecer e valorizar o esforço dos que se debruçaram sobre a crítica da ideologia na relação entre psicologia e educação. Mais que isso, é preciso continuar o trabalho, explorando novas questões com as quais o pensamento se defronta em cada momento de seu movimento, e promovendo a transmissão de saberes com o cuidado de não reduzir a noção de psicologia crítica a uma acepção de slogan que, de tanto repetir-se, adquire valor icônico, torna-se imagética e perde em significação (Ramos, 2002).

Buscou-se, no presente texto, instigar uma reflexão sobre os alcances e os efeitos da razão cínica na relação entre psicologia e educação, do ponto de vista da formação de psicólogos. Mello e Patto (2008) falam da ausência de conteúdos críticos nos cursos de psicologia. Se ainda persiste essa ausência, parece justificável questionar as razões da persistência, uma vez que, para Ramos (no prelo), a fase de esclarecimento alcançada não pode ser arbitrariamente revogada. Na transição da alienação para o cinismo, faz-se necessário explorar ao máximo as contradições, para que a indignação frente ao estado de coisas não seja, como na composição de Rosa e Amaral (1993), "uma mosca sem asas que não ultrapassa as janelas de nossas casas".

Referências

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Recebido em: 26/07/2011

Reformulado em: 31/07/2012

Aprovado em: 27/09/2012

Texto extraído das discussões e reflexões teóricas empreendidas no Trabalho de Conclusão do Curso de Psicologia do autor.

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  • Endereço para Correspondência

    Ricardo Taveiros Brasil
    Avenida Ajarani, nº 491, apto. 83, bloco 3
    Jardim Assunção, São Paulo - SP / CEP 03548-000
    E-mail:
  • 1
    . Para uma discussão recente e aprofundada sobre o fenômeno da medicalização, sugere-se a leitura dos textos reunidos no livro organizado pelo Conselho Regional de Psicologia SP e pelo Grupo Interinstitucional Queixa Escolar (2010).
  • 2
    . Segundo Chaui (1980, p. 7), o discurso competente é o discurso instituído e por meio do qual a restrição da linguagem opera da seguinte forma: não é qualquer um que pode dizer qualquer coisa, em qualquer lugar e em qualquer circunstância. A consequência desse tipo de raciocínio aponta para a produção dos "incompetentes sociais", subordinados aos ditames do discurso competente como discurso do conhecimento, que, por sua vez, promove seu prestígio e eficácia por meio da dependência, afirmação e aceitação tácita da incompetência dos homens enquanto sujeitos políticos, históricos e sociais.
  • 3
    . Patto (2005) destaca avanços no campo da psicologia em relação às questões da educação. A autora fala, por exemplo, das contribuições da psicanálise e da teoria crítica frankfurtiana, além dos dispositivos de atendimento às queixas escolares que fogem à lógica individualizante tradicional.
  • 4
    . Política implantada na rede estadual paulista em 1998, que reorganizou o ensino fundamental em dois ciclos, sendo que o aluno não poderia ser reprovado ao final de cada série/ano, mas ao final do ciclo. O objetivo incidiria na alteração dos índices de reprovação, defasagem série-idade e evasão, melhorando as estatísticas oficiais, mas comprometendo os processos de escolarização dos alunos que, em muitos casos, são promovidos sem, contudo, terem se apropriado dos conteúdos escolares básicos. Ver Viégas (2007).
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      08 Jan 2013
    • Data do Fascículo
      Dez 2012

    Histórico

    • Recebido
      26 Jul 2011
    • Aceito
      27 Set 2012
    • Revisado
      31 Jul 2012
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