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Habilidades de consciência fonológica promovidas pelo ensino de leitura e escrita

Habilidades de consciencia fonológica promovidas por la enseñanza de lectura y escritura

Resumo

O objetivo do estudo foi verificar o desenvolvimento de habilidades de consciência fonológica a partir da aquisição de leitura e escrita em crianças empregando um programa informatizado de ensino de leitura e escrita. Três alunos com dificuldade de aprendizagem, matriculados no segundo ano do Ensino Fundamental, participaram da pesquisa. Foi utilizado um delineamento de pré e pós-teste, empregando a Prova de Consciência Fonológica (PCF) e o Diagnóstico de Leitura e Escrita (DLE) antes e após a realização do Módulo 1 do currículo Aprendendo a Ler e a Escrever em Pequenos Passos. Os resultados mostraram que os três participantes completaram o programa de ensino, demonstrando melhora no repertório de leitura e de escrita. Na PCF, os participantes apresentaram melhora no desempenho de rima, aliteração e nas habilidades silábicas; mas não apresentaram melhora consistente nas habilidades fonêmicas. A partir dos resultados verifica-se a necessidade do desenvolvimento e aprimoramento de procedimentos para o ensino das habilidades de consciência fonológica, principalmente, as habilidades fonêmicas.

Palavras-chave:
Consciência fonológica; leitura; escrita

Resumen

El objetivo del estudio fue verificar el desarrollo de habilidades de consciencia fonológica a partir de la adquisición de lectura y escritura en niños empleándose un programa informatizado de enseñanza de lectura y escritura. Tres alumnos con dificultad de aprendizaje, matriculados en el segundo curso de la Enseñanza Primaria participaron de la investigación. Se utilizó un delineamiento de pre y post-test, empleando la Prueba de Consciencia Fonológica (PCF) y el Diagnóstico de Lectura y Escritura (DLE) antes y tras la realización del Módulo 1 del currículo Aprendiendo a Leer y a Escribir en Pequeños Pasos. Los resultados mostraron que los tres participantes completaron el programa de enseñanza, demostrando mejora en el repertorio de lectura y de escritura. En la PCF, los participantes presentaron mejora en el desempeño de rima, aliteración y en las habilidades silábicas; pero no presentaron mejora consistente en las habilidades fonémicas. A partir de los resultados se verifica la necesidad del desarrollo y perfeccionamiento de procedimientos para la enseñanza de las habilidades de consciencia fonológica, principalmente, las habilidades fonémicas.

Palabras clave:
Consciencia Fonológica; lectura; escritura

Abtract

The objective of the study was to verify the development of phonological awareness skills duringthe process of children learning reading and writing by means of a computer program.Three students with learning difficulties, enrolled in the second year of elementary school, took part in this research. Pre and post-test were employed by means of the Phonological Awareness Test and the Reading and Writing Diagnostic Test before and after the realization of Module 1 of the program named Learning to Read and Write by Small Steps, or “Aprendendo a Ler e a Escrever em Pequenos Passos.” Results show that the three participants reached the end of the learning program and demonstrated improvement in their reading and writing repertoire. On the Phonological Awareness Test, participants presented improvement in their performance at rhyme, alliteration, and syllabic skills but did not present consistent improvement in their phonemic skills. Results point at the necessity to develop and enhance procedures for the teaching of phonological awareness, especially phonemic skills.

Keywords:
phonological awareness; reading; writing

Introdução

As estatísticas oficiais brasileiras mostram que a taxa de analfabetismo no Brasil é de 8,0% (12,9 milhões de pessoas), entre brasileiros de 15 anos ou mais anos de idade (IBGE, 2015Instituto Brasileiro de Geografia Estatística[IBGE] (2015). Síntese de Indicadores Sociais - SIS (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios 2015). Recuperado: https://www.ibge.gov.br/estatisticas-novoportal/sociais/educacao/9221-sintese-de-indicadores-sociais.html?&t=resultados
https://www.ibge.gov.br/estatisticas-nov...
). Segundo o Indicador de Analfabetismo Funcional (INAF) do Instituto Paulo Montenegro, apesar de considerados alfabetizados pelos índices oficiais, muitos indivíduos podem ler e interpretar apenas textos com informações explícitas e com pequeno número de palavras. De acordo com a pesquisa realizada pelo Instituto Paulo Montenegro (2016)Instituto Paulo Montenegro(2016). Indicador de Alfabetismo Funcional. Recuperado:https://drive.google.com/file/d/0B5WoZxXFQTCRRWFyakMxOTNyb1k/view
https://drive.google.com/file/d/0B5WoZxX...
, a maior parte dos respondentes (42%) foi classificada no grupo elementar, ou seja, realiza a leitura de uma ou mais unidades de informação em textos diversos de extensão média efetuando pequenas inferências e resolve problemas envolvendo operações básicas com exigência de algum grau de planejamento e controle. Mais do que isso, apenas 8% dos respondentes estão no último grupo de alfabetismo, revelando domínio de habilidades que, praticamente, não mais impõem restrições para compreender e interpretar textos em situações usuais e resolvem problemas envolvendo múltiplas etapas, operações e informações.

Diante desse problema, muitos estudos vêm sendo realizados para que a aquisição dos comportamentos de leitura e de escrita seja melhor compreendida e, consequentemente, propor procedimentos de ensino mais eficazes. Estudos que buscam o desenvolvimento de procedimentos de ensino de leitura a partir do ensino de uma rede de relações entre estímulos e entre estímulos e respostas (cf. de Rose, 2005de Rose, J. C. (2005). Análise comportamental da aprendizagem de leitura e escrita. Revista Brasileira de Análise do Comportamento, 1, 29-50.; de Souza & de Rose, 2006de Souza, D. G.; de Rose J. C. (2006). Desenvolvendo programas para o ensino individualizados para o ensino de leitura. Acta Comportamentalia, 14, 77-98.; Sidman, 1994Sidman, M. (1994). Equivalence relations and behavior: A research story. Boston, MA: Authors Cooperative.; Sidman & Tailby, 1982Sidman, M.; Tailby, W. (1982). Conditional discrimination vs. matching- to-sample: an expansion of the testing paradigm.Journal of the Experimental Analysis of Behavior, 37, 5-22.) vêm produzindo um corpo sólido de conhecimento que indica quais os requisitos básicos para aquisição do comportamento de ler e, dessa forma, possibilitando a programação eficiente do ensino.

Buscando investigar os efeitos do ensino de habilidades de leitura e de escrita no desenvolvimento das habilidades de consciência fonológica, o presente estudo empregou o Módulo 1 do currículo de ensino de leitura e de escrita, Apredendo a Ler e a Escrever em Pequenos Passos, desenvolvido por de Rose e colaboradores (de Souza, de Rose, Hanna, Calcagno, & Galvão, 2004de Souza, D. G.; de Rose, J. C. C.; Hanna, E. S.; Calcagno, S.; Galvão, O. F. (2004). Análise comportamental da aprendizagem de leitura e escrita e a construção de um currículo suplementar. In Hubner, M. M. C.; Marinotti, M. (Orgs.), Análise do comportamento para a educação: Contribuições recentes (pp. 177-203). Santo André (SP): ESETec, Editores Associados.; de Souza & de Rose, 2006de Souza, D. G.; de Rose J. C. (2006). Desenvolvendo programas para o ensino individualizados para o ensino de leitura. Acta Comportamentalia, 14, 77-98.). O currículo de ensino é composto por três “módulos”, o Módulo 1 tem como objetivo o ensino de palavras regulares do tipo consoante-vogal; o Módulo 2 tem como objetivo ensinar palavras compostas de encontros consonantais, dígrafos e grafemas cujo fonema correspondente depende do contexto. Por fim, o Módulo 3 é desenvolvido com livros de histórias. Os procedimentos foram planejados em pequenos passos, com o objetivo de que o aprendiz realizasse a atividade sem dificuldades e no seu próprio ritmo. O primeiro Módulo de ensino foi aplicado amplamente e com diferentes populações e seus resultados demonstram a eficácia no ensino de leitura e de escrita para crianças com dificuldades de aprendizagem (cf. de Souza & de Rose, 2006de Souza, D. G.; de Rose J. C. (2006). Desenvolvendo programas para o ensino individualizados para o ensino de leitura. Acta Comportamentalia, 14, 77-98.; de Souza et al., 2009de Souza, D. G.; de Rose, J. C.; Faleiros, T. C.; Bortoloti, R.; Hanna, E. S.; McIlvane, W. J. (2009). Teaching generative reading via recombination of minimal textual units: a legacy of verbal behavior to children in Brazil. International Journal of Psychology and Psychological Therapy, 9, 19-44.; de Rose, de Souza, & Hanna, 1996de Souza, D. G.; de Rose, J. C.; Hanna, E. S. (1996). Diagnóstico de leitura e escrita: tarefas para avaliação de repertórios rudimentares de leitura e escrita. Produção técnica para avaliação de alunos candidatos ao ensino pelo Programa Aprendendo a ler e a escrever em pequenos passos.; Reis, de Souza, de Rose, 2009Reis, T.; de Souza, D. G.; de Rose, J. C. (2009). Avaliação de um programa para o ensino de leitura e escrita.Estudos de Avaliação Educacional, 20, 425-449.).

Desde a proposta incial na década de 1980, o programa de ensino vem sendo aprimorado (cf. de Souza & de Rose, 2006de Souza, D. G.; de Rose J. C. (2006). Desenvolvendo programas para o ensino individualizados para o ensino de leitura. Acta Comportamentalia, 14, 77-98.). O controle de estímulos pelas unidades menores das palavras ensinadas érelevante para a generalização, ou seja, a leitura de novas palavras compostas por sílabas de palavras diretamente ensinadas. O ensino da relação entre sílabas ditadas e sílabas impressas das palavras ensinadas (de Souza et al., 2009) e o emprego da procedimento de CRMTS (constructed response matchingtosample) para tarefa de construção de palavras impressas com letras móveis (de Rose et al., 1996de Rose, J. C.; de Souza, D. G.; Hanna, E. S. (1996). Teaching reading and spelling: exclusion and stimulus equivalence. Journal of Applied Behavior Analysis, 29(4), 451-469.) foram estratégias de ensino empregadas que favoreceram a discriminação das unidades que compõem as palavras, aumentando os índices de leitura de palavras ensinadas e palavras de generalização (leitura de palavras novas, formadas a partir de letras e sílabas das palavras ensinadas).

Estudos indicam que o desenvolvimento da consciência fonológica (consciência dos sons que compõem a fala) está relacionado com o sucesso da aprendizagem da leitura e da escrita (Barrera & Maluf, 2003Barrera, S. D.; Maluf, M. R. (2003). Consciência metalinguística e alfabetização: um estudo com crianças da primeira série do ensino fundamental. Psicologia, Reflexão e Crítica, 16(3), 491-502.; Capovilla, Gütschow, & Capovilla, 2004Capovilla, A. G. S.; Gutschow, C. R. D.; Capovilla, F. C. (2004). Habilidades que predizem competência de leitura e escrita. Psicologia: Teoria e Prática, 6, 13-26.; Justino & Barrera, 2012Justino, M. I. S. V.; Barrera, S. D. (2012). Efeitos de uma intervenção na abordagem fônica em alunos com dificuldades de alfabetização. Psicologia: Teoria e Pesquisa, 28(4), 399-407.; Moreschi & Barrera, 2017Moreschi, M. S. M.; Barrera, S. D. (2017). Programa Multissensorial/Fônico: Efeitos em pré-escolares em risco de apresentarem dificuldades de alfabetização. Psico, 48(1), 70-80.; Nunes, Frota, & Mousinho 2009Nunes, C.; Frota, S.; Mousinho, R. (2009). Consciência fonológica e o processo de aprendizagem de leitura e escrita: implicações teóricas para o embasamento da prática fonoaudiológica. Revista CEFAC, 11(2), 207-212.; Puliezi & Maluf, 2012Puliezi, S.; Maluf, M. R. (2012). A contribuição da consciência fonológica, memória de trabalho e velocidade de nomeação na aquisição inicial da leitura. Boletim Academia Paulista de Psicologia, 32(82), 213-227.; Santos & Maluf, 2010Santos, M. J.; Maluf, M. R. (2010). Consciência fonológica e linguagem escrita: efeitos de um programa de intervenção. Educar em Revista, 38, 57-71.; Santos & Barrera, 2017Santos, M. J.; Barrera, S. D. (2017). Impacto do treino em habilidades de consciência fonológica na escrita de pré-escolares. Psicologia Escolar e Educacional, 21(1), 93-102.).

Considerando a importância e o interesse em investigar a aquisição de repertório das habilidades discriminativas e manipulativas relativas aos sons (consciência fonológica) a partir da aquisição de leitura e de escrita, o presente estudo teve como objetivo verificar o desenvolvimento de habilidades de consciência fonológica a partir da aquisição de leitura e de escrita em crianças com dificuldades de aprendizagem empregando o Módulo 1 do programa de ensino de leitura e de escrita “Aprendendo a ler e a escrever em pequenos passos” (cf. de Souza & de Rose, 2006de Souza, D. G.; de Rose J. C. (2006). Desenvolvendo programas para o ensino individualizados para o ensino de leitura. Acta Comportamentalia, 14, 77-98.; de Souza et al., 2004de Souza, D. G.; de Rose, J. C. C.; Hanna, E. S.; Calcagno, S.; Galvão, O. F. (2004). Análise comportamental da aprendizagem de leitura e escrita e a construção de um currículo suplementar. In Hubner, M. M. C.; Marinotti, M. (Orgs.), Análise do comportamento para a educação: Contribuições recentes (pp. 177-203). Santo André (SP): ESETec, Editores Associados.).

Método

Participantes

Participaram da pesquisa três crianças, dois meninos e uma menina, com idades entre sete e nove anos, com baixo repertório em leitura (leitura de, no máximo, duas das 15 palavras avaliadas no Diagnóstico de Leitura e Escrita inicial) e em consciência fonológica (desempenho entre 12 e 15 dos 40 pontos na Prova de Consciência Fonológica). Todos os participantes estavam matriculados no segundo ano do Ensino Fundamental em uma escola pública de uma cidade do interior do Estado de São Paulo. Nomes fictícios foram atribuídos aos participantes com o objetivo de proteger as identidades dos envolvidos na presente pesquisa. O projeto de pesquisa foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa (CAEE 34223314.4.0000.5504).

Local

A coleta de dados foi realizada em um laboratório de pesquisa em uma universidade pública do interior do Estado de São Paulo. Os participantes eram conduzidos para o local da pesquisa todos os dias úteis da semana no contraturno do horário de aula. O tempo médio para a realização das atividades diárias foi de 45 a 60 minutos.

Material e Equipamentos

Para o ensino de leitura e escrita foi empregada a versão 2.1 do Módulo 1 do programa de ensino de leitura e de escrita informatizado Aprendendo a Ler e a Escrever em Pequenos Passos (cf. de Souza & de Rose, 2006de Souza, D. G.; de Rose J. C. (2006). Desenvolvendo programas para o ensino individualizados para o ensino de leitura. Acta Comportamentalia, 14, 77-98.). A aplicação do procedimento de ensino ocorreu via o Gerenciador de Ensino Individualizado por Computador (GEIC). Trata-se de uma plataforma que viabiliza a aplicação remota (à distância) de programas de ensino. Para a aplicação do programa de ensino, foram utilizados computadores e fones de ouvido para garantir a qualidade dos estímulos auditivos utilizados. O registro das respostas era realizado pelo próprio programa de ensino.

Instrumentos

Prova de Consciência Fonológica por Produção Oral (Capovilla & Capovilla, 1998Capovilla, A. G. S.; Capovilla, F. (1998). Prova de Consciência Fonológica: desenvolvimento de dez habilidades da pré-escola à segunda série. Temas em Desenvolvimento, 7(40), 5-14.). Tem como objetivo avaliar as habilidades de discriminar e manipular os sons da fala. A prova é dividida em 10 subtestes (rima, aliteração, síntese silábica, síntese fonêmica, segmentação silábica, segmentação fonêmica, manipulação silábica, manipulação fonêmica, transposição silábica e transposição fonêmica) e cada subteste contém quatro tentativas. Para cada tentativa correta é acrescido um ponto, podendo o participante obter no máximo 40 pontos.

Diagnóstico de Leitura e Escrita (Fonseca, 1997Fonseca, M. L. (1997). Diagnóstico de repertórios iniciais de leitura e escrita: uma análise baseada na concepção de relações de equivalência(Dissertação de Mestrado). Universidade Federal de São Carlos, São CarlosSP.; de Souza, de Rose, & Hanna, 1996de Souza, D. G.; de Rose, J. C.; Hanna, E. S. (1996). Diagnóstico de leitura e escrita: tarefas para avaliação de repertórios rudimentares de leitura e escrita. Produção técnica para avaliação de alunos candidatos ao ensino pelo Programa Aprendendo a ler e a escrever em pequenos passos.). Tem como objetivo avaliar habilidades relacionadas ao repertório de leitura e de escrita. O DLE é composto por três passos e 16 tipos de tarefas. A avaliação é composta por tarefas de emparelhamento de acordo com o modelo de identidade entre figuras e entre palavras impressas; emparelhamento de acordo com o modelo arbitrário entre palavra falada e figura, entre palavra falada e palavra impressa, entre figura e palavra impressa, entre palavra impressa e figura; nomeação de figura, nomeação de palavra impressa; ditado e cópia em duas modalidades de resposta (manuscrita e por composição). A Figura 1 apresenta a representação ilustrativa de cada tipo de tarefa que compõe o DLE.

Figura 1
Representação ilustrativa de cada tipo de tarefa que compõe o DLE. O balão apresenta a instrução apresentada via fone de ouvido. A ilustração foi retirada da apostila de treinamento Unidade de Inciação à Leitura para o desenvolvimento de currículo para ensinar leitura e seus requisitos imediatos.

Programa informatizado de ensino de leitura e de escrita - Módulo 1

O programa informatizado de ensino de leitura e de escrita - Módulo 1 - ensina 51 palavras compostas por sílabas regulares da língua portuguesa (palavras do tipo consoante/vogal). O ensino das palavras foi organizado em quatro unidades. Cada unidade foi composta por quatro passos de ensino (exceto a primeira unidade, composta por cinco passos), totalizando 17 passos de ensino. Antes e após cada unidade de ensino foram conduzidos testes para avaliar a leitura, escrita e relações entre palavra e figura de todas as palavras da unidade. Cada passo foi composto por três palavras de ensino. Em cada passo foram programadas tentativas de ensino de palavras e sílabas componentes das palavras.

Para ensino e teste, foram utilizadas palavras ditadas, palavras impressas e figuras; também sílabas impressas e sílabas ditadas; letras impressas. O procedimento de ensino empregou: o emparelhamento de acordo com o modelo (matching to sample - MTS) para ensino das relações entre palavras ditadas e palavras impressas e entre sílabas ditadas e sílabas impressas; a construção de respostas (constructed-response matching-to-sample - CRMTS) para ensino das relações entre palavra ditada e escrita por composição (ditado); palavra impressa e escrita por composição (cópia). A primeira estratégia envolveu a seleção de um estímulo de comparação a partir de um estímulo modelo e a segunda estratégia envolveu a construção de palavras por meio de sílabas e/ou letras isoladas diante de um estímulo modelo.

Foi utilizado o procedimento de exclusão para ensino das relações entre palavra ditada e palavra impressa; nessa condição, quando uma palavra nova era apresentada como modelo, o estímulo de comparação correspondente era apresentado com outro estímulo impresso já conhecido pelo participante. Sendo assim, o participante poderia selecionar a palavra nova, excluindo o estímulo de comparação conhecido. Tentativas de linha base para o aluno apontar a palavra ‘antiga’ (conhecida) eram intercaladas, como tentativas de controle de novidade. Escolhas corretas foram seguidas por mensagens de elogio e escolhas incorretas, seguidas por mensagem de sinalização do erro e reapresentação da tentativa.

Durante o ensino da relação entre palavras ditadas e palavras impressas, também foram apresentadas tentativas de cópia e ditado. O aluno foi requisitado a escrever selecionando (com um clique) as letras dispostas na parte inferior da tela do computador, formando a palavra diante da palavra impressa (cópia) ou da palavra ditada (ditado). Após finalizar a escrita, o aluno deveria clicar em uma figura neutra que sinalizava o encerramento da tentativa. Se a resposta estivesse correta era apresentada, pelo computador, consequências, como por exemplo, “muito bem!”, “ótimo!”, som de palmas ou som de guitarra; se a resposta estivesse incorreta, havia reapresentação da tentativa na tarefa de cópia, ou a apresentação de uma nova tentativa de emparelhamento com o modelo após a tarefa de ditado.

Após o ensino de palavras, no mesmo passo de ensino eram programadas tentativas para o ensino das sílabas das palavras. O ensino das sílabas constituintes de cada palavra foi feito separadamente, ou seja, foram ensinadas as sílabas de uma palavra e somente após a obtenção do critério, as sílabas da palavra seguinte foram ensinadas. Caso o participante atingisse 100% de acertos, foi iniciado o ensino das sílabas da próxima palavra. Caso o desempenho fosse inferior a 100% de acertos, o aluno repetia o mesmo passo na próxima sessão. Após o treino silábico das três palavras, foi realizada sonda composta por três tentativas de emparelhamento entre palavra ditada e palavra impressa (uma tentativa com cada palavra). Em seguida, foi conduzido o pós-teste do passo, composto por três tentativas de emparelhamento entre palavra ditada e palavra impressa (uma tentativa com cada palavra). Se o participante atingisse 100% de acertos, ele realizaria um novo passo de ensino; caso não atingisse 100% de acertos, realizaria novamente o passo.

No início de cada passo de ensino, foram apresentadas as relações entre palavra ditada e palavra impressa e palavra ditada e escrita por composição (ditado) com as palavras ensinadas no passo anterior para avaliar a retenção/manutenção da aprendizagem das palavras ensinadas no passo anterior. Se o participante não atingisse 100% de acertos nas tentativas da relação entre palavra ditada e palavra impressa, ele realizava o passo de ensino dessas palavras. Caso atingisse 100% de acertos, ele realizava o passo com novas três palavras.

Procedimento geral

A pesquisa foi desenvolvida em quatro etapas: (1) aplicação concomitante dos testes para avaliação inicial do repertório de leitura, de escrita e de consciência fonológica; (2) aplicação do programa de ensino de leitura e escrita informatizado (Módulo 1, versão 2.1, via GEIC); (3) após completar as duas primeiras unidades de ensino do Módulo 1, os testes gerais de avaliação de leitura, de escrita e de consciência fonólogica foram reaplicados para acompanhamento dos avanços em leitura e em consciência fonológica (sondagem); e (4) ao completar todas as unidades de ensino foram reaplicados os mesmos testes aplicados no início e na metade para avaliação final de leitura e de escrita e de consciência fonológica.

Resultados

Os participantes Vanessa e Laercio completaram o Módulo 1 realizando 21 e 23 sessões, respectivamente. O participante Mario foi exposto duas vezes ao programa de ensino. Na primeira exposição, realizada no segundo semestre do ano 2013, o participante Mario foi exposto à primeira e segunda unidades, realizando 28 sessões, apresentando um alto índice de repetição de um mesmo passo de ensino, por exemplo, oito repetições do passo 2 na Unidade 1. Na segunda exposição, realizada na presente pesquisa (conduzida no segundo semestre de 2014), o participante realizou 23 sessões para completar o programa de ensino. De modo geral, os participantes necessitaram de 1,2 e 1,3 realizações de sessões de ensino para completar o Módulo de ensino. As repetições ocorreram, principalmente, nos primeiros passos de ensino.

A Figura 2 apresenta o desempenho geral no DLE nas três aplicações (pré-teste/barras brancas, teste intermediário/barras cinzas e pós-teste/barras pretas). Pode ser observado que nas tarefas de seleção (relações entre estímulos), os participantes apresentaram altos níveis de acertos no pré-teste e mantiveram os desempenhos altos nas avaliações subsequentes.

Figura 2
Porcentagem de acertos nas relações do DLE: (1) figura-figura; (2) palavra impressa-palavra impressa; (3) palavra falada-figura; (4) palavra falada-palavra impressa; (5) figura-palavra impressa; (6) palavra impressa-figura; (7) nomeação de figuras; (8) nomeação da palavra impressa; (9) nomeação de sílabas; (10) nomeação de letras; (11) nomeação de vogais; (12) cópia por composição; (13) ditado por composição; (14) cópia manuscrita; e (15) ditado manuscrito da primeira (pré-teste/barras claras), segunda (sonda/barras cinza) e terceira aplicação (pós-teste/barras pretas).

Quanto ao desempenho nas tarefas de produção, os participantes nomearam corretamente a maioria das figuras e mantiveram ou melhoraram o desempenho nas aplicações seguintes. Em relação à leitura de palavra, pode ser observado que o desempenho inicial é baixo ou nulo para os três participantes. Após completar metade do programa de leitura, os participantes foram reavaliados e apresentaram mais de 75% de acertos na leitura de palavras no teste intermediário (barras cinzas). Após completar o programa, no pós-teste, dois (Mario e Vanessa) participantes apresentaram 100% de acertos em leitura no pós-teste e o participante Laercio apresentou 80% de acertos. Em relação à nomeação de sílabas, letras e vogais, os três participantes apresentaram altas porcentagens de acertos e mantiveram ou melhoraram o desempenho na última avaliação.

Nas tarefas de escrita, os participantes apresentaram altas porcentangens de acertos nas tarefas de cópia manuscrita ou por composiçãono pré-teste e mantiveram nos demais testes. Nas tarefas de ditado manuscrito ou por composição, a maioria dos participantes apresentou repertório inicial de 50% de acertos e atingiu mais de 80% de acertos ao final do programa.

A Figura 3 apresenta os resultados obtidos na Prova de Consciência Fonológica por Produção Oral (PCF) na primeira (pré-teste/barras brancas), segunda (sonda/barras cinza) e terceira aplicação (pós-teste/barras pretas).

Figura 3
Resultados obtidos na Prova de Consciência Fonológica por Produção Oral (PCF) na primeira (pré-teste/barras brancas), segunda (sonda/barras cinza) e terceira aplicação (pós-teste/barras pretas). As habilidades avaliadas foram: 1) rima; 2) aliteração; 3) síntese silábica; 4) segmentação silábica; 5) manipulação silábica; 6) transposição silábica; 7) síntese fonêmica; 8) segmentação fonêmica; 9) manipulação fonêmica; 10) transposição fonêmica.

Para habilidades suprassegmentares (rima e aliteração), a maioria dos participantes apresentou um acerto nas habilidades de rima e aliteração. Nas avaliações seguintes, os participantes apresentaram melhora no desempenho. Na sonda intermediária (realizada após completar as duas primeiras unidades de ensino), dois participantes (Vanessa e Laercio) apresentaram dois acertos na habilidade de rima e mantiveram os desempenhos na habilidade de aliteração; o participante Mario apresentou dois acertos em rima e três de acertos em aliteração. No pós-teste (realizado ao completar as quatro unidades de ensino), dois (Mario e Laercio) participantes apresentaram três acertos em rima e a participante Vanessa apresentou o desempenho inicial (um acerto). Na habilidade de aliteração, dois participantes (Mario e Vanessa) atingiram a pontuação máxima (quatro acertos) e Laercio apresentou três acertos.

Nas habilidades silábicas (habilidades de 3 a 6 indicadas na Figura 3), os participantes apresentaram alto índice de acertos desde a avaliação inicial (pré-teste). No pré-teste, os três participantes apresentaram dois ou mais acertos para três habilidades desta categoria (exceto para transposição silábica). Nas avaliações seguintes, os participantes Mario e Vanessa atingiram pontuação máxima nas habilidades de síntese e segmentação silábica. O participante Laercio manteve os índices de acertos na avaliação intermediária e final.

Nas habilidades fonêmicas (habiliaddes de 7 a 10 indicadas na Figura 3), dois (Mario e Laercio) participantes apresentaram um acerto nas habilidades de segmentação e manipulação fonêmica; nas avaliações seguintes, apresentaram melhora (dois acertos) nessas habilidades; a participante Vanessa apresentou desempenho de, no máximo, dois acertos, nas habilidades de síntese, segmentação e manipulação fonêmica. Nenhum dos participantes apresentou acerto na habilidade de transposição fonêmica.

A Figura 4 mostra os desempenhos em leitura, escrita e consciência fonológica. Como pode ser observado, os três participantes apresentaram desempenhos crescentes nas três habilidades ao longo das avaliações. Em relação à leitura, os participantes apresentaram baixos níveis de leitura inicialmente e após serem expostos ao Módulo 1 do programa de leitura apresentaram melhora significativa na leitura de palavras. Quanto ao desempenho em escrita, dois participantes apresentavam repertório de escrita, observou-se um ganho semelhanteaorepertório de leitura, ou seja, quanto mais os participantes foram expostos ao ensino, mais palavras eles aprenderam a escrever. Em relação ao desempenho de consciência fonológica, os participantes apresentaram aumento no número de acertos ao longo do procedimento de ensino.

Figura 4
Porcentagem de acertos de leitura e escrita do DLE (eixo vertical da esquerda) e número de acertos do total geral da Prova de Consciência Fonológica (PCF) (eixo vertical da direita).

Discussão

A presente pesquisa teve como objetivo investigar o desenvolvimento de habilidades de consciência fonológica a partir da aquisição de leitura e de escrita em crianças com dificuldades de aprendizagem empregando o Módulo 1 do programa de ensino de leitura e de escrita informatizado e individualizado “Aprendendo a ler e a escrever em pequenos passos” (cf. de Souza & de Rose, 2006de Souza, D. G.; de Rose J. C. (2006). Desenvolvendo programas para o ensino individualizados para o ensino de leitura. Acta Comportamentalia, 14, 77-98.; de Souza et al., 2004de Souza, D. G.; de Rose, J. C. C.; Hanna, E. S.; Calcagno, S.; Galvão, O. F. (2004). Análise comportamental da aprendizagem de leitura e escrita e a construção de um currículo suplementar. In Hubner, M. M. C.; Marinotti, M. (Orgs.), Análise do comportamento para a educação: Contribuições recentes (pp. 177-203). Santo André (SP): ESETec, Editores Associados.). Os resultados mostraram que os três participantes apresentaram aquisição de leitura de palavras compostas por sílabas simples (consoante e vogal) e apresentaram melhora e mantiveram o desempenho acima de 50% de acertos nas habilidades suprassegmentares e silábicas. Quanto às habilidades fonêmicas, não foi observado a mesma evolução, o desempenho continuou baixo e inconsistente.

Os resultados obtidos nas habilidades suprasssegmentares e silábicas poderiam ser esperados, uma vez que a habilidade de rima (discriminar os sons finais das palavras) é considerada de baixa complexidade e a habilidade de aliteração (discriminar os sons iniciais das palavras) de média complexidade (Puliezi & Maluf, 2012Puliezi, S.; Maluf, M. R. (2012). A contribuição da consciência fonológica, memória de trabalho e velocidade de nomeação na aquisição inicial da leitura. Boletim Academia Paulista de Psicologia, 32(82), 213-227.). Os participantes apresentaram alta porcentagem de acertos nas habilidades silábicas desde o início da pesquisa, mesmo com baixo repertório de leitura. Esse desempenho pode estar relacionado às atividades realizadas na sala de aula desde as séries iniciais, por exemplo, dividir as palavras em unidades menores (Bandini, 2003Bandini, H. H. M. (2003). Um programa para promoção de Consciência Fonológica em pré-escolares aplicado em sala de aula (Dissertação de mestrado). Universidade Federal de São Carlos, São Carlos, SP.; Freitas, 2008Freitas, F. R. (2008). Desenvolvimento de habilidades de Consciência Fonológica: independência e interdependência funcional no repertório de leitores iniciantes (Dissertação de mestrado). Universidade Federal de São Carlos, São Carlos, SP.).

Em relação às habilidades fonêmicas, os resultados foram baixos desde o pré-teste e não apresentaram melhora de forma consistente na sonda e pós-teste. Considerando que as habilidades de consciência fonológica se desenvolvem em um contínuo de complexidade, os resultados sugerem que a habilidade de manipular fonemasse desenvolve com a exposição a instruções explícitas (Capovilla, Dias, & Montiel, 2007Capovilla, A. G. S.; Dias N. M.; Montiel J. M. (2007). Desenvolvimento dos componentes da consciência fonológica no ensino fundamental e correlação com nota escolar. Psico-UFS, 12, 55-64.; Morais, 1995Morais, J. (1995). A arte de ler. São Paulo, SP: Editora Unesp.; Puliezi & Maluf, 2012Puliezi, S.; Maluf, M. R. (2012). A contribuição da consciência fonológica, memória de trabalho e velocidade de nomeação na aquisição inicial da leitura. Boletim Academia Paulista de Psicologia, 32(82), 213-227.). Sugere-se que estudos futuros selecionem participantes com repertório de leitura e de escrita (leitura e escrita de palavras simples compostas por consoante-vogal) para verificar o desempenho nas habilidades de consciência fonológica, principalmente das habilidades fonêmicas ao longo da aprendizagem de palavras complexas (por exemplo, hiatos, encontros consonantais, entre outros), verbos entre outros.

Torna-se importante destacar que apesar dos desempenhos em consciência fonológica não terem atingido níveis elevados, foi possível observar que os participantes apresentaram desempenhos crescentes ao longo das avaliações. Os avanços crescentes também foram observados nas habilidades de leitura e de escrita (cf. Figura 4). No geral, observou-se ao longo das avaliações que os desempenhos obtidos em leitura e em escritaapresentaram melhoras acentuadas e o desempenho em consciência fonológica, apesar de ficar abaixo do esperado, apresentou melhora, sugerindo que as habilidades de leitura e de escrita podem ter influenciado na melhoradas habilidades discriminativas e manipulativas relativas aos sons que compôem a fala (consciência fonológica).

Capovilla et al. (2007Capovilla, A. G. S.; Dias N. M.; Montiel J. M. (2007). Desenvolvimento dos componentes da consciência fonológica no ensino fundamental e correlação com nota escolar. Psico-UFS, 12, 55-64.) destacaram que os escores na PCF de alunos da 1ª à 3ª série do Ensino Fundamental aumentaram de forma significativa com a progressão escolar. Os autores indicaram que os resultados estão de acordo com estudos prévios que demonstraram que a consciência fonológica se desenvolve gradualmente, conforme a criança é capaz de discriminar palavras, sílabas e fonemas. Em relação às habilidades de segmentação fonêmica, por exemplo, Capovilla et al. (2007)Capovilla, A. G. S.; Dias N. M.; Montiel J. M. (2007). Desenvolvimento dos componentes da consciência fonológica no ensino fundamental e correlação com nota escolar. Psico-UFS, 12, 55-64. demonstraram não haver qualquer diferença significativa entre as séries, entretanto indicaram que os escores aumentaram de forma linear ao longo das quatro séries. De modo geral, os autores destacaram que os resultados obtidos na pesquisa estão de acordo com pesquisasinternacionais, que sugerem que a consciência fonêmicase desenvolve posteriormente àshabilidades silábicas.

Destaca-se que embora o programa de ensino de leitura e de escrita utilizado na presente pesquisa não inclua instrução específica para a correspondência entre grafemas e fonemas, o controle por unidades menores (letras) pode ser desenvolvido a partir da relação de controle de estímulos pela relação entre unidades sonoras e impressas maiores (as palavras) e das sílabas (de Rose et al., 1996de Rose, J. C.; de Souza, D. G.; Hanna, E. S. (1996). Teaching reading and spelling: exclusion and stimulus equivalence. Journal of Applied Behavior Analysis, 29(4), 451-469.; Mueller, Olmi, & Saunders, 2000Mueller, M. M.; Olmi, D. J.; Saunders, K. J. (2000). Recombinative generalization of within-syllable units in prereading children.Journal of Applied Behavior Analysis, 33, 515-531.; Skinner, 1957Skinner, B.F. (1957). Verbal Behavior. Englewood Cliffs: Prentice Hall.; Yoo & Saunders, 2014Yoo, J. H.; Saunders, K. J. (2014). The discrimination of printed words by prereading children. European Journal of Behavior Analysis, 15(2), 123-135.). Os dados mostraram que o ensino das unidades maiores (palavras) e das unidades menores (sílabas) favoreceu o desenvolvimento de habilidades de consciência fonológica, embora ainda incipiente para habilidades fonêmicas.

Os resultados indicam que a estrutura do programa de ensino de leitura e de escrita desenvolvido por de Rose e colaboradores (cf. de Souza & de Rose, 2006de Souza, D. G.; de Rose J. C. (2006). Desenvolvendo programas para o ensino individualizados para o ensino de leitura. Acta Comportamentalia, 14, 77-98.) favoreceu e facilitou os progressos observados nas habilidades de consciência fonológica dos participantes, além da aprendizagem de leitura e de escrita. Cardoso-Martins (1991Cardoso-Martins, C. (1991). A consciência fonológica e a aprendizagem de inicial de leitura e escrita. Cadernos de Pesquisa, 76, 41-49.) investigou a relação entre consciência fonológica e progresso inicial na aprendizagem da escrita do português. Os participantes foram crianças das classes populares sendo alfabetizadas por dois métodos diferentes: 32 pelo método fonético e 26 pelo método silábico. Os resultados confirmaram os de estudos anteriores, demonstrando, de modo geral, que variações na consciência fonológica correlacionam-se com variações na aprendizagem da leitura e da escrita. A autora destaca que os resultados sugerem que variações na consciência fonêmica, observadas no início da alfabetização, podem ser menos importantes para a aquisição da leitura e da escrita quando o método de alfabetização é o silábico.

Em relação ao desempenho dos participantes no Módulo 1 do programa de ensino de leitura e de escrita desenvolvido por de Rose e colaboradores, os resultados demonstraram que os participantes finalizaram o programa de ensino, necessitando de um número baixo de repetições de passo de ensino. Esse resultado replica e estende os dados da literatura que demonstram a eficácia do programa de leitura e escrita (cf. de Souza & de Rose, 2006de Souza, D. G.; de Rose J. C. (2006). Desenvolvendo programas para o ensino individualizados para o ensino de leitura. Acta Comportamentalia, 14, 77-98.; Reis et al., 2009Reis, T.; de Souza, D. G.; de Rose, J. C. (2009). Avaliação de um programa para o ensino de leitura e escrita.Estudos de Avaliação Educacional, 20, 425-449.). Destaca-se ainda ao longo das avaliações previstas aofinal de cada unidade de ensino, os participantes apresentaram melhora no desempenho de leitura de palavras não ensinadas diretamente (compostas por sílabas e letras recombinadas e pseudopalavras).

O participante Mario realizou o Módulo 1 do programa de leitura e de escrita pela segunda vez. Na primeira ocasião, o participante repetiu 28 vezes os passos de ensino das duas primeiras unidades. Conforme indicado por Bernardino Jr., Freitas, de Souza, Maranhe e Bandini (2006de Souza, D. G.; de Rose J. C. (2006). Desenvolvendo programas para o ensino individualizados para o ensino de leitura. Acta Comportamentalia, 14, 77-98.), as dificuldades na aprendizagem poderiam não estar relacionadas a problemas com o material, com o procedimento ou com o potencial do aluno, mas relacionadas com a ausência de habilidades de consciência fonológica. Em uma nova oportunidade (presente pesquisa), oparticipante retornou após um ano da primeira experiência. Nesse momento, o participante ainda apresentava dificuldades de aprendizagem em leitura e em escrita, e pôde se beneficiar do programa de ensino de leitura e de escrita.

O estudo de Bernardino Jr. et al. (2006)Bernardino Júnior, J. A.; Freitas, F. R.; de Souza, D. G.; Maranhe, E. A.; Bandini, H. H. M. (2006). Aquisição de leitura e escrita como resultado do ensino de habilidades de consciência fonológica. Revista Brasileira de Educação Especial, 12, 423-450. verificou se os alunos que vinham fracassando no programa de leitura desenvolvido por de Rose e colaboradores e que apresentaram baixos escores na Prova de Consciência Fonológica - PCF (Capovilla & Capovilla, 1998Capovilla, A. G. S.; Capovilla, F. (1998). Prova de Consciência Fonológica: desenvolvimento de dez habilidades da pré-escola à segunda série. Temas em Desenvolvimento, 7(40), 5-14.) seriam bem sucedidos em uma intervenção para ensino de habilidades de consciência fonológica e se o eventual sucesso da intervenção teria efeitos sobre a aprendizagem de leitura e de escrita. Os alunos foram expostos a um programa adaptado de Capovilla (1999)Capovilla, A. G. S. (1999).Leitura, escrita e consciência fonológica: desenvolvimento, intercorrelações e intervenções. (Tese de Doutorado). Universidade de São Paulo, São Paulo, SP.durante quatro semestres e concomitantemente continuavam a realizar o programa de ensino de leitura e de escrita. Os resultados demonstraram que o fortalecimento das habilidades de consciência fonológica, especificamente as fonêmicas, contribuiu para melhora tanto na leitura quanto na escrita dos participantes que vinham fracassando sistematicamente no programa de ensino de leitura e de escrita.

A partir dos resultados do presente estudo verifica-se a possibilidade de aprimorar e ampliar a eficácia dos procedimentos informatizados desenvolvidos para o ensino individualizado de leitura e de escrita (cf. de Souza & de Rose, 2006de Souza, D. G.; de Rose J. C. (2006). Desenvolvendo programas para o ensino individualizados para o ensino de leitura. Acta Comportamentalia, 14, 77-98.) incorporando atividades para garantir o pleno desenvolvimento de habilidades de consciência fonológica.

Considerando os resultados de estudos que ensinaram habilidades de consciência fonológica (Bandini, 2003Bandini, H. H. M. (2003). Um programa para promoção de Consciência Fonológica em pré-escolares aplicado em sala de aula (Dissertação de mestrado). Universidade Federal de São Carlos, São Carlos, SP.; Bernadino Jr. et al., 2006Bernardino Júnior, J. A.; Freitas, F. R.; de Souza, D. G.; Maranhe, E. A.; Bandini, H. H. M. (2006). Aquisição de leitura e escrita como resultado do ensino de habilidades de consciência fonológica. Revista Brasileira de Educação Especial, 12, 423-450.; Capovilla et al., 2004Capovilla, A. G. S.; Gutschow, C. R. D.; Capovilla, F. C. (2004). Habilidades que predizem competência de leitura e escrita. Psicologia: Teoria e Prática, 6, 13-26.; Freitas, 2008Freitas, F. R. (2008). Desenvolvimento de habilidades de Consciência Fonológica: independência e interdependência funcional no repertório de leitores iniciantes (Dissertação de mestrado). Universidade Federal de São Carlos, São Carlos, SP.) e de estudos conduzidos na Educação Infantil (Camilo & Mota, 2013Camilo, C. S. L.; Mota, M. M. P. E. (2013). Prática pedagógica e o desenvolvimento da consciência fonológica. Estudos e Pesquisas em Psicologia, 13(2), 447-459.; Moreschi & Barrera, 2017Moreschi, M. S. M.; Barrera, S. D. (2017). Programa Multissensorial/Fônico: Efeitos em pré-escolares em risco de apresentarem dificuldades de alfabetização. Psico, 48(1), 70-80.; Pestun, Omote, Barreto, & Matsuo, 2010Pestun, M. S. V.; Omote, L. C. F.; Barreto, D. C. M.; Matsuo, T. (2010). Estimulação da consciência fonológica na educação infantil: prevenção de dificuldades na escrita. Psicologia Escolar e Educacional, 14(1), 95-104.; Santos & Maluf, 2010Santos, M. J.; Maluf, M. R. (2010). Consciência fonológica e linguagem escrita: efeitos de um programa de intervenção. Educar em Revista, 38, 57-71.; Santos & Barrera, 2017Santos, M. J.; Barrera, S. D. (2017). Impacto do treino em habilidades de consciência fonológica na escrita de pré-escolares. Psicologia Escolar e Educacional, 21(1), 93-102.) que demontraram a importância da estimulação da consciência fonológica para o desenvolvimento da leitura e da escrita, sugere-se que estudos futuros desenvolvam programas para ensino de consciência fonológica, propiciando o desenvolvimento de estratégias educacionais que favoreçam e facilitem a aquisição de leitura e de escrita.

Referências

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  • O presente trabalho foi realizado com apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior - Brasil (CAPES/PROEX Processo #23028.005155/2017-67). A primeira autora teve bolsa de Mestrado da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES). A segunda autora tem financiamento Edital Universal 01/2016 (CNPq, Processo #427409/2016-0). Essa pesquisa é parte do programa científico do Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia sobre Comportamento, Cognição e Ensino (CNPq, Processo #465686/2014-1; FAPESPProceso #2014/50909-8; CAPES Processo #88887.136407/2017-00).

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    9 Dez 2019
  • Data do Fascículo
    2019

Histórico

  • Recebido
    09 Abr 2018
  • Aceito
    26 Dez 2018
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