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Editorial

EDITORIAL

Claudia Regina Furquim de Andrade

Professora Titular. Departamento de Fisioterapia, Fonoaudiologia e Terapia Ocupacional. Faculdade de Medicina. Universidade de São Paulo

Prezados leitores,

O ano de 2009 já iniciou de forma muito positiva para a Fonoaudiologia. Em janeiro foi realizado no Chile o "Congreso Internacional de Transtornos de La Comunicacíon". Esse evento foi organizado pelos Drs. Luís Martinez e Ricardo Rojas da Universidad de Talca, Facultad de Ciencias de la Salud, Escuela de Fonoaudiologia e pela Asociación Española de Logopedia, Foniatria y Audiologia. Foi uma oportunidade única terem conseguido juntar tantos profissionais de diferentes partes do mundo raciocinando sobre suas áreas com temas tão interessantes. A acolhida dos convidados foi impecável, amorosa e de alta competência executiva.

Embora a experiência tenha sido ótima, foi uma pena que estivéssemos em poucos brasileiros. Com o sucesso do evento houve um início de ações para a formação de uma, talvez, Sociedade Latino-Americana de Fonoaudiologia. Temos que formar algo que permita uma união entre os fonoaudiólogos da América do Sul e dos demais países falantes do Português e do Espanhol. Uma união em termos amplos. Uma união que se inicie pelos fundamentos curriculares na graduação e na pós-graduação estrito senso - circulação de alunos, troca de experiências clínicas e pesquisas, enfim, movimento da ciência e do conhecimento gerado pelos nossos povos.

Também nesse ano, além dos nossos congressos tradicionais da ABA e SBFa, teremos o Congresso Internacional de Fluência (IFA) no Rio de Janeiro e muitos outros eventos importantes que eu nem sei ou não lembro agora. Estaremos trazendo, só pelo meu Laboratório ou parcerias dele, três professores de grande destaque. Acho que finalmente podemos dizer que não estamos mais isoladas das propostas mundiais, hoje, qualquer grande pesquisador internacional aceita vir ao Brasil. Hoje, nós da editoria da Pró-Fono somos convidadas a participar de todos os grandes eventos e de todas as grandes discussões sobre políticas editoriais. Se a Fonoaudiologia brasileira ainda não chegou a ser uma referência internacional, estamos perto dessa meta. Já temos duas presidentes de associações internacionais.

Mais uma vez a Revista Pró-Fono foi contemplada com apoio editorial. É muito trabalho mas esse trabalho é recompensador. O número de artigos submetidos à revista cresce a cada dia. É um enorme prazer apresentar esse nosso primeiro número com treze artigos, sendo nove de pesquisa, três revisões de literatura e um relato de caso.

O objetivo da pesquisa apresentada por Coelho et al. (2009) foi relacionar as habilidades de percepção de fala com características vocais de crianças usuárias de implante coclear. Para isso, foram realizadas análises perceptivo-auditiva e acústica da vogal sustentada /a/ e da contagem de números de 25 crianças deficientes auditivas pré-linguais de grau severo a profundo implantadas, com idade de 5 a 10 anos. Os resultados da pesquisa apontam que, dentre as crianças com implante coclear, as que possuem melhor habilidade de percepção de sons da fala apresentam também menores desvios perceptivo-auditivos na qualidade vocal.

O estudo realizado por Murphy e Schochat (2009) aborda a temática do processamento auditivo no aprendizado da leitura, tendo como objetivo analisar a correlação entre leitura, consciência fonológica e processamento temporal auditivo em crianças brasileiras com dislexia. Foram avaliadas 60 crianças de 9 a 12 anos, sendo 33 pertencentes ao grupo com dislexia e 33 ao grupo controle. A conclusão do estudo refere que, apesar do grupo de crianças com dislexia ter apresentado pobre desempenho nos testes de processamento auditivo temporal, não foi possível afirmar que este esteja relacionado ao pobre desempenho em tarefas envolvendo leitura ou consciência fonológica.

Wertzner e Silva (2009) apresentaram uma pesquisa sobre a velocidade de fala no transtorno fonológico, com o objetivo de comparar o desempenho de crianças, com e sem transtorno fonológico, em diferentes tarefas de velocidade de fala. Participaram da pesquisa 20 crianças com diagnóstico de transtorno fonológico e 20 crianças com desenvolvimento típico de fala, de ambos os sexos, com idades entre 4.0 a 10.11 anos. Os resultados indicaram menores valores de velocidade de fala nas crianças com transtorno fonológico, em função de possíveis déficits lingüísticos ou motores. As autoras ressaltam ainda que este controle da velocidade de produção da fala apresentado pelas crianças com distúrbio fonológico pode ter sofrido a influencia da extensão da frase utilizada no teste.

Descrever as medidas antropométricas orofaciais de crianças paulistanas e compará-las aos padrões de normalidade publicados para a população de crianças norte-americanas foi o objetivo do estudo apresentado por Cattoni e Fernandes (2009). Participaram do estudo 254 crianças, leucodermas, em dentição mista, com idades entre 7.0 a 11.11 anos, sem histórico de distúrbios ou tratamento fonoaudiológicos. As medidas antropométricas orofaciais foram coletadas utilizando-se um paquímetro eletrônico digital. Os resultados das medidas das crianças paulistanas referentes à altura do lábio superior, altura do lábio inferior e altura do terço inferior da face foram menores do que aqueles publicados para as crianças norte-americanas, indicando que os dados de normalidade norte-americanos não foram válidos para as crianças participantes do presente estudo.

A pesquisa apresentada por Ciocchi e Andrade (2009) propôs a elaboração de um protocolo de cooperação fonoaudiológica para avaliação nasofibrolaringoscópica da mobilidade laríngea em doenças da tireóide (PAN). O objetivo deste protocolo foi a composição de um instrumento objetivo, preciso e consensual para avaliação. A primeira versão do protocolo foi elaborada a partir de fundamentação bibliográfica. Após esta etapa, o PAN foi julgado em duas instâncias pelo método de triangulação por seis juízes em três etapas, sendo então constituída uma versão piloto do protocolo. Este piloto foi aplicado em 11 pacientes, havendo então um novo julgamento de médicos e fonoaudiólogos. A partir da concordância dos juízes, foi construída a versão final do PAN. O PAN resultou na descrição de itens a serem solicitados durante a avaliação médica e fonoaudiológica no exame de nasofibrolaringoscopia da alteração da mobilidade laríngea em doenças da tireóide. Os resultados apontam que o PAN, em sua versão final, contribui para a sistematização dos procedimentos de avaliação fundamentados em evidências e concordâncias profissionais.

Um estudo sobre a relação entre idade, velocidade de fala e desempenho de fala em crianças foi apresentado por Folha e Felício (2009). Os participantes deste estudo foram 200 crianças agrupadas em três faixas etárias: 6:0 a 8:0 anos (Grupo I), 8:1 a 10:0 anos (Grupo II); 10:1 a 12:6 anos (Grupo III). Os resultados indicaram que o desempenho na fala, medido pela porcentagem de consoantes corretas (PCC), e a velocidade de fala aumentaram de acordo com a faixa etária, resultando em diferenças significantes entre os grupos. O aumento do PCC e da velocidade de fala foram diretamente proporcionais.

Comparar as taxas de elocução de indivíduos com diferentes gravidades de gagueira foi o objetivo da pesquisa proposta por Arcuri et al. (2009). Para tanto, foram selecionados seis adultos gagos, destes, dois apresentando gagueira leve, dois gagueira moderada e dois gagueira grave. As autoras apontam que o grupo com gagueira de grau leve e moderado apresentou taxas de elocução semelhantes e maiores, diferenciando-se estatisticamente do grupo com gagueira grave, indicando que quanto maior a gravidade, menor a taxa de elocução. A diferença parece estar relacionada às dificuldades na programação motora que afetam principalmente o ritmo e a temporalidade do discurso.

A pesquisa apresentada por Moura et al. (2009) verificou o possível ganho no desempenho em tarefas envolvendo habilidades de consciência fonêmica em crianças após o desenvolvimento de programa de estimulação em consciência fonêmica. Participaram do estudo alunos da segunda série do Ensino Fundamental, sendo 18 meninos e 18 meninas, com desenvolvimento típico de linguagem. As autoras concluíram que, na maioria das tarefas em consciência fonêmica, as meninas obtiveram melhor desempenho. Além disso, ressaltam que o programa de estimulação dessas tarefas foi eficaz.

O estudo proposto por Gonçalves et al. (2009) teve como objetivo verificar se a exposição ao ruído ocupacional é um risco importante para as alterações auditivas em adultos na faixa etária de 50 a 70 anos, além do desgaste auditivo decorrente da idade. Foram analisados os audiogramas de 71 homens, de 50 a 70 anos, divididos em dois grupos (Grupo 1 com histórico de exposição ocupacional ao ruído e Grupo 2 sem histórico de exposição ao ruído). Os resultados demonstraram que os limiares auditivos dos sujeitos com idade entre 50 e 70 anos estão piores no grupo exposto ao ruído, sendo portanto este um fator de risco maior do que a idade nas alterações auditivas neurossensoriais.

A revisão de literatura apresentada por Rodrigues e Béfi-Lopes (2009) descreveu e discutiu os achados encontrados sobre a avaliação da memória operacional fonológica em crianças em desenvolvimento normal desde a década de oitenta. Foram analisados estudos sobre a constituição dos testes e os resultados referentes aos efeitos de extensão e idade em relação à memória operacional fonológica para falantes do Inglês e do Português do Brasil. As autoras concluíram que esses estudos demonstraram existir uma relação entre o conhecimento fonológico e lexical e a memória operacional fonológica em crianças em desenvolvimento normal de linguagem.

Chun (2009) realizou uma revisão de literatura abortando a temática da expansão da comunicação suplementar e/ou alternativa (CSA) no Brasil. O objetivo desta revisão foi elencar as versões brasileiras em uso e discutir suas implicações, tomando como referência as publicações da International Society for Augmentative and Alternative Communication (Isaac). A autora conclui SER importante que uma versão, além da consagração pelo próprio uso, carregue os sentidos originais a que se propõe bem como esteja em consonância com recomendações/políticas da área, como as propostas pela Isaac.

O aparecimento da desordem práxica durante os primeiros anos do desenvolvimento infantil foi o tema da revisão de literatura apresentada por Souza et al. (2009). Após a revisão, as autoras constataram que nos textos atuais sobre apraxia de fala na infância existe uma tendência das pesquisas que poderá desencadear uma abordagem terapêutica mista. Esta abordagem mista contempla tanto os aspectos pertinentes ao processamento de linguagem, num nível representacional fonológico, quanto os aspectos pertencentes ao nível de programação motora e de seqüenciamento pré-articulatório da fala propriamente dita.

Para finalizar, o relato de caso apresentado por Machado et al. (2009) teve como objetivo investigar as possíveis relações entre problemas de alimentação e de linguagem oral, do ponto de vista bio-psíquico. A partir da descrição do caso, as autoras apontam existir uma relação entre os problemas de alimentação e de linguagem oral, sugerindo que os fonoaudiólogos que se ocupam dos problemas de linguagem em crianças, investiguem também as condutas alimentares.

É um excelente começo de ano!

Abraço, Claudia

  • Arcuri CF, Osborn E, Schiefer AM, Chiari BM. Taxa de elocução de fala segundo a gravidade da gagueira. Pró-Fono Revista de Atualização Científica. 2009 jan-mar;21(1):45-50.
  • Cattoni DM, Fernandes FDM. Medidas antropométricas orofaciais de crianças paulistanas e norte-americanas: estudo comparativo. Pró-Fono Revista de Atualização Científica. 2009 jan-mar;21(1):25-30.
  • Chun RYS. Comunicação suplementar e/ou alternativa: abrangência e peculiaridades dos termos e conceitos em uso no Brasil. Pró-Fono Revista de Atualização Científica. 2009 jan-mar;21(1):69-74.
  • Ciocchi PE, Andrade CRF. Protocolo de cooperação fonoaudiológica para avaliação nasofibrolaringoscópica da mobilidade laríngea em doenças da tireóide (PAN). Pró-Fono Revista de Atualização Científica. 2009 jan-mar;21(1):31-8.
  • Coelho ACC, Bevilacqua MC, Oliveira G, Behlau M. Relação entre voz e percepção de fala em crianças com implante coclear. Pró-Fono Revista de Atualização Científica. 2009 jan-mar;21(1):7-12.
  • Folha GA, Felício CM. Relações entre idade, porcentagem de consoantes corretas e velocidade de fala. Pró-Fono Revista de Atualização Científica. 2009 jan-mar;21(1):39-44.
  • Gonçalves CGO, Mota PHM, Marques JM. Ruído e idade: análise da influência na audição em indivíduos com 50 - 70 anos. Pró-Fono Revista de Atualização Científica. 2009 jan-mar;21(4):57-62
  • Machado FP, Cunha MC, Palladino RRR. Doença do refluxo gastroesofágico e retardo de linguagem: estudo de caso clínico. Pró-Fono Revista de Atualização Científica. 2009 jan-mar;21(1):81-3.
  • Moura SRS, Mezzomo CL, Cielo CA. Estimulação em consciência fonêmica e seus efeitos em relação à variável sexo. Pró-Fono Revista de Atualização Científica. 2009 jan-mar;21(1):51-6.
  • Murphy CFB, Schochat E. Correlações entre leitura, consciência fonológica e processamento temporal auditivo. Pró-Fono Revista de Atualização Científica. 2009 jan-mar;21(1):13-8.
  • Rodrigues A, Befi-Lopes DM. Memória operacional fonológica e suas relações com o desenvolvimento da linguagem infantil. Pró-Fono Revista de Atualização Científica. 2009 jan-mar;21(1):63-8.
  • Souza TNU, Payão LMC, Costa RCC. Apraxia da fala na infância em foco: perspectivas teóricas e tendências atuais. Pró-Fono Revista de Atualização Científica. 2009 jan-mar;21(1):75-80.
  • Wertzner HF, Silva LM. Velocidade de fala em crianças com e sem transtorno fonológico. Pró-Fono Revista de Atualização Científica. 2009 jan-mar;21(1):19-24.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    06 Abr 2009
  • Data do Fascículo
    Mar 2009
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