A emergência do Zika vírus no Brasil e a resposta federal dos Sistemas Nacionais de Vigilância em Saúde e de Vigilância Sanitária

O artigo analisa a resposta federal dos Sistemas Nacionais de Vigilância em Saúde e de Vigilância Sanitária frente à epidemia do Zika vírus no Brasil, de 2015 a 2018, com foco nos contextos político-institucionais e no conteúdo das medidas governamentais desenvolvidas no período. O estudo ancorou-se na abordagem institucionalista histórica, compreendendo análise documental e entrevistas com atores-chave. A resposta se caracterizou pela priorização inicial da emergência sanitária na agenda política do governo federal, reduzindo-se ao longo do período, influenciada pelas crises financeira e política. Verificou-se multiplicidade de atores e instâncias voltadas à contingência, com certa articulação entre os dois sistemas, a partir de experiências pré-emergência próprias. O controle vetorial teve centralidade, valorizando ações intersetoriais e comunitárias, induzidas sobretudo pela Secretaria de Vigilância em Saúde do Ministério da Saúde e complementarmente pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária. Observaram-se expressivas limitações alocativas de recursos financeiros novos e mudanças no aparato organizativo de resposta, com efeitos para a continuidade das políticas no pós-emergência, incluindo o desenvolvimento de medicamentos, vacinas e testes. A Emergência em Saúde Pública do Zika Vírus no Brasil foi marcada por limitada institucionalização de aprendizados e estratégias estruturantes, reduzindo oportunidades para a (re)organização das vigilâncias no Sistema Único de Saúde.

Palavras-Chave:
Sistema Nacional de Vigilância em Saúde; Sistema Nacional de Vigilância Sanitária; Zika Vírus; Emergências

Estratégia de Pesquisa	Materiais
Levantamento e análise documental	Lei Federal (1) Lei nº 13.301, de 27 de junho de 2016.
Procedimentos: - Busca, seleção e sistematização de documentos governamentais segundo ano de publicação, tipo, ementa e origem; - Categorização segundo dimensões analíticas (contexto e conteúdo).	Decretos presidenciais (2) Decreto nº 8.612, de 21 de dezembro de 2015; Decreto nº 8.662, de 1 de fevereiro de 2016.
Fontes: - Saúde Legis (saudelegis.saude.gov.br/ saudelegis/secure/norma/ listPublic.xhtml) - Ministério da Saúde (www.gov.br/saude/pt-br) - Anvisa (www.gov.br/anvisa/pt-br)	Portarias federais (23) Portaria GM/MS nº 2.757, de 11 de dezembro de 2014; Portaria GM/MS nº 1.167, de 07 de agosto de 2015; Portaria nº 1.813 de 11 de novembro de 2015; Portaria No 2.121, de 18 de dezembro de 2015; Portaria no 2.162, de 23 de dezembro de 2015; Portaria nº 204, de 17 de fevereiro de 2016, Portaria nº 779, de 20 de abril de 2016, Portaria GM/MS nº 1.046, de 20 de maio de 2016; Portaria nº 1834 de 11 de outubro de 2016; Portaria GM/MS nº 2484, de 18 de novembro de 2016; Portaria GM/MS nº 3129, de 28 de dezembro de 2016; Portaria nº 3, de 11 de janeiro de 2016; Portaria Interministerial nº 405, de 15 de março de 2016; Portaria Interministerial nº 1.115, de 3 de JUNHO de 2016; Portaria Interministerial nº 2.209, de 26 de outubro de 2016; Portaria nº 894, de 31 de março de 2017; Portaria nº 1.682, de 30 de julho de 2017; Portaria nº 3.502, de 19 de dezembro de 2017; Portaria nº 3958/2017; Portaria nº 1.313, de 3 de agosto de 2017; Portaria nº 4073/2018; Portaria nº 4426/2018; Portaria nº 3254/2018. Resolução (1) Resolução da Diretoria Colegiada – RDC n° 72, de 30 de março de 2016 Boletins epidemiológicos da SVS/MS ( 21) Bol Epidemiol. 2015;46(34):1-3; Bol Epidemiol. 2015;46(36):1-9; Bol Epidemiol. 2015;46(37):1-5; Bol Epidemiol. 2015;46(41):1-7; Bol Epidemiol. 2015;46(42):1-9; Bol Epidemiol. 2015;46(44):1-9; Bol Epidemiol. 2015;46(45):1-7; Bol Epidemiol. 2015;46(50):1-5; Bol Epidemiol. 2016;47(1):1-4; Bol Epidemiol. 2016;47(2):1-9; Bol Epidemiol. 2016;47(6):1-7; Bol Epidemiol. 2016;47(15):1-9; Bol Epidemiol. 2016;47(20):1-10; Bol Epidemiol. 2016;47(23):1-10; Bol Epidemiol. 2016;47(38):1-10; Bol Epidemiol. 2017;48(3):1-11; Bol Epidemiol. 2017;48(10):1-10; Bol Epidemiol. 2017;48(12):1-9; Bol Epidemiol. 2017;48(31):1-11; Bol Epidemiol. 2018;49(3):1-10; Bol Epidemiol. 2018;49(12):1-13.
	Planos, protocolos, diretrizes e notas técnicas (21) Plano de Resposta às Emergências em Saúde Pública (2014); Diretriz Geral SNCC/2015; Diretriz SNCC nº 2/2015 - Apoio das Forças Armadas; Nota Técnica Conjunta n.º 001 2015 GSH/GGPBS/GGMON; Protocolo para implantação de unidades sentinelas para Zika vírus; Protocolo de atenção à saúde e resposta à ocorrência de microcefalia relacionada à infecção pelo vírus zika; Protocolo de vigilância e resposta à ocorrência de microcefalia relacionada à infecção pelo vírus Zika; Diretriz SNCC nº 1.1/ 2016; Diretriz SNCC nº 1.2/ 2016; Diretriz SNCC nº 3/2016 – Saneamento Básico; Diretriz SNCC nº 4/2016 – Proteção e Defesa Civil; Instrução Operacional Conjunta nº 1 MS-MDS, de 25 de fevereiro de 2016; Instrução Operacional Conjunta nº 2 - MS-MDS, de 31 de março de 2016; Nota Técnica Conjunta n.º 001 2016 CGSH/GGMON; Nota Técnica Conjunta n.º 008 2016 CSTCO/GGMED/DIARE; Nota Técnica Conjunta CGSH-ANVISA/SAS/MS nº 002/2016; Protocolo de atenção à saúde e resposta à ocorrência de microcefalia; Protocolo de vigilância e resposta à ocorrência de microcefalia e/ou alterações do sistema nervoso central (SNC); Protocolo de investigação de óbitos por arbovírus urbanos no Brasil - Dengue, Chikungunya e Zika; Recomendações técnicas ao Sistema Nacional de Vigilância Sanitária para colaborar no combate ao Aedes aegypti e prevenção e controle da Dengue, Chikungunya e infecção pelo vírus Zika; Orientações Integradas de Vigilância e atenção à saúde no âmbito da Emergência de Saúde Pública de Importância Nacional. Ministério da Saúde.
	Relatórios e informes institucionais (15) Relatórios de Atividades Anvisa 2015 a 2018; Relatório de gestão Anvisa 2015 a 2018; Relatório de Gestão SVS 2015 a 2017; Zika: abordagem clínica na Atenção Básica (material educativo); Relatório estatístico sintético Ouvidoria/Anvisa 2016; Sala Nacional de Coordenação e Controle para o combater ao Aedes aegypti: um país mobilizado no combate ao mosquito (folder, 2017); Vírus Zika no Brasil – a resposta do SUS (livro; 2017); Relatório de Gestão Ministério da Saúde 2018.
Entrevistas	Roteiros semiestruturados de entrevista (7) Os roteiros foram estruturados nos seguintes blocos de perguntas:
Procedimentos: - Mapeamento, convite, agendamento e realização de entrevista com atores-chave, considerando inserção, cargo e função/papel nos sistemas estudados, em nível federal; - Aplicação de Termo de Consentimento Livre e Esclarecido e solicitação prévia de autorização para gravação das entrevistas; - Uso de roteiro semiestruturado de entrevista; - Transcrição textual do áudio da entrevista; - Análise da transcrição, segundo componentes das dimensões analíticas (contexto e conteúdo).	- Bloco A – Repercussões para a Vigilância Sanitária/Vigilância em Saúde - Bloco B - Estrutura e Organização do Sistema Nacional de Vigilância Sanitária/Vigilância em Saúde - Bloco C - Definição do(s) Plano(s) de Ação para Enfrentar a Epidemia de Zika - Bloco D - Articulação com outros Setores (intersetorialidade/ parcerias) - Bloco E – Financiamento das ações / do Plano de Ação - Bloco F - Resultados das Ações / do Plano de Ação (Aprendizados, fortalezas e desafios)

Momento	Contexto político-institucional	Conteúdo da política governamental
Pré-emergência (final de 2014-out/2015)	Monitoramento epidemiológico da Dengue e Chikungunya; preparação e resposta federal a eventual emergência. Identificação da circulação do Zika vírus (Bahia) e ocorrência simultânea com Chikungunya e Dengue; relação causal com Guillain Barré. Mudança no padrão de ocorrência da microcefalia (Pernambuco) e associação com Zika vírus.	Apoio a planos de contingência de Dengue e Chikungunya nos estados e municípios. Envio de recursos financeiros para ações emergenciais e distribuição de inseticidas e kits de diagnóstico. Microcefalia: acionamento da equipe de resposta rápida da Secretaria de Vigilância em Saúde do Ministério da Saúde (SVS/MS); comunicação do evento à Organização Mundial da Saúde.
Emergência (nov./2015-jul./2017)	Incertezas sobre a doença. Valorização das ações prévias para dengue; articulação Vigilância-Atenção; intersetorialidade. Zika priorizada na agenda presidencial; foco no controle vetorial, mobilização comunitária e diagnóstico laboratorial; estímulo à descentralização das decisões e execução de ações aos estados. Mudanças com o Impeachment presidencial: revisão da estratégia nacional de enfrentamento e prorrogações de iniciativas em curso. Diminuição do número de casos novos da infecção pelo ZIKV: encerramento da emergência.	Orientações aos Centros de Informações Estratégicas de Vigilância em Saúde (CIEVS) para notificação de casos; monitoramento de rumores; acionamento do Centro de Operações de Emergências em Saúde Pública (COES). Repasses financeiros para estados e municípios; Criação do sistema de Registro de Evento em Saúde Pública; e do Sistema de Registro de Atendimento às Crianças com Microcefalia; Capacitação dos Laboratórios Centrais de Saúde Pública em biologia molecular pelos laboratórios de referência. Elaboração e atualização de protocolos de vigilância e atenção à microcefalia e de unidades sentinela. Plano Nacional de Enfrentamento à Microcefalia; Sala Nacional de Comando e Controle; Rede Nacional de Especialistas em Zika e Doenças Correlatas (RENEZIKA); Estratégia de Ação Rápida. Autorização para ingresso forçado em imóveis e aplicação de sanções; uso de aeronaves para controle vetorial; Programa Nacional de Apoio ao Combate às Doenças Transmitidas pelo Aedes.
Pós-emergência (ago/2017 a dez/2018)	Permanência de elevado número de casos em investigação. Desativação do COES, redirecionamentos no Ministério da Saúde e avaliação da continuidade do PNEM.	Criação da Estratégia de Ações de Vigilância e Cuidado das Crianças Diagnosticadas ou com Suspeita de Síndrome Congênita associada à infecção pelo Zika vírus e com outras STORCH. Repasse financeiro condicionado à continuidade do monitoramento da infestação de Aedes aegypti nos municípios. Estratégias educacionais sobre manejo das arboviroses.

Momento	Contexto político-institucional	Conteúdo da política governamental
Pré-emergência (final de 2014-out/2015)	Integração à Rede Nacional de Alertas e Respostas às Emergências de Saúde Pública. Cooperação com o Centro de Monitoramento em Vigilância Epidemiológica do Ministério da Saúde. Aprendizado com a resposta à epidemia de Ebola (2014). Experiências com a organização de eventos de massa no Brasil (Copa do Mundo e Jogos Mundiais Indígenas).	Criação do Centro de Gerenciamento de Informações para Emergências em Vigilância Sanitária (eVisa).
Emergência (nov./2015-jul./2017)	eVisa: articulação das demandas do COES; participação no PNEM ‘Dia da Faxina’ e ‘Dia Nacional de Mobilização Zika Zero’. Demanda crescente por informações sobre repelentes. Ambiente de cooperação internacional. Desafios da regulação de novas tecnologias.	Recomendações para as vigilâncias sanitárias locais (controle de vetores nas inspeções sanitárias e fiscalização de repelentes e inseticidas no mercado). Elaboração de critérios técnicos para gerenciamento do risco no uso de hemocomponentes; e de funcionamento de bancos de células e tecidos germinativos. Ações para o registro e comprovação de eficácia da ação de repelentes e inseticidas; esclarecimentos sobre uso e cuidados. Priorização da análise de registro de testes de diagnóstico; aceleração de pesquisas de novos testes, vacinas e tratamentos. Priorização das análises de importação de insumos e materiais de pesquisas; esclarecimentos quanto à contaminação de produtos de exportação. Divulgação e comunicação voltada para os viajantes (Jogos Olímpicos).
Pós-emergência (ago/2017 a dez/2018)	Mudanças organizacionais e diretivas na Anvisa; eVisa reformulado em 2017: menor papel articulador e ausência na estrutura da Agência. Aprimoramento da preparação e resposta a futuras emergências de saúde pública. Intercâmbio com agências reguladoras de outros países.	Capacitação de profissionais da Anvisa no Programa de Treinamento em Epidemiologia Aplicada aos Serviços do Sistema Único de Saúde (EpiSUS). Discussões sobre riscos de contaminação em reprodução assistida e auto-hemoterapia.

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[1] Editora responsável: Jane Russo