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O bruxo e o Maestro: a colaboração musical entre Carlos Barbosa-Lima & Tom Jobim

The witch and the Maestro: the musical collaboration between Carlos Barbosa-Lima & Tom Jobim

RESUMO:

O objetivo do artigo é descrever os principais marcos da relação entre o violonista Carlos Barbosa-Lima e o compositor Antonio Carlos Jobim. Ao longo de mais de uma década os dois cultivaram uma profícua colaboração musical alimentada pela mútua admiração. A partir do trabalho conjunto em torno dos arranjos para violão solo das músicas de Jobim, estabeleceu-se uma amizade que teve reflexos positivos sobre a trajetória de ambos: pelas mãos de Barbosa-Lima, Jobim foi definitivamente incorporado ao repertório do violão de concerto; por meio de Jobim, Barbosa-Lima obteve maior projeção entre o público de jazz e música popular, inclusive no Brasil. Desta cooperação nasceu o projeto de compor um “Concerto para violão e orquestra” que, embora não concretizado, mostra quão estimulante foi a ligação entre o brujo do violão e o Maestro soberano.

PALAVRAS-CHAVE:
Violão solo; Arranjos para violão; Antonio Carlos Jobim; Carlos Barbosa-Lima; Música Popular Brasileira

ABSTRACT:

The aim of this article is to describe the milestones in the relationship between guitarist Carlos Barbosa-Lima and composer Antonio Carlos Jobim. Over more than a decade, the two cultivated a fruitful musical collaboration fueled by mutual admiration. Starting with their joint work on solo guitar arrangements of Jobim's songs, a friendship was established and it had positive impacts on both of their trajectories: through Barbosa-Lima's hands, Jobim was definitively incorporated into the classical guitar repertoire, and through Jobim, Barbosa-Lima gained greater visibility among jazz and popular music audiences, including in Brazil. From this collaboration emerged the project to compose a "Concerto for guitar and orchestra," which, although not realized, demonstrates how stimulating the connection between the guitar brujo and the Sovereign Maestro was.

KEYWORDS:
Solo guitar; Arrangements for guitar; Antonio Carlos Jobim; Carlos Barbosa-Lima; Brazilian Popular Music

Introdução

Nova York, primavera de 1982: duas grandes personalidades musicais brasileiras - o violonista Antonio Carlos Barbosa-Lima (1944 -fev.2022) e Antonio Carlos Jobim (1927-dez.1994) - encontram-se pela primeira vez. Meses mais tarde, em agosto, Barbosa-Lima grava em San Francisco o álbum Carlos Barbosa-Lima plays the Music of Antonio Carlos Jobim & George Gershwin (Concord Concerto, 1982Barbosa-Lima, Carlos. 1982. Carlos Barbosa-Lima plays the Music of Antonio Carlos Jobim & George Gershwin. Concord Concerto, CCD-42005, 1982/1990 (reedição ampliada).), primeiro e principal fruto da colaboração entre ambos. A partir de então, os “xarás”, como Jobim assinala amistosamente na contracapa, cultivariam uma rica afinidade pessoal e musical até o falecimento do Maestro.

No que se segue, contaremos a história dessa relação e dos possíveis significados para a carreira dos dois artistas. De imediato, convém assinalar que o trabalho não possui um viés analítico, de modo que não se debruça pormenorizadamente sobre as obras e os arranjos mencionados. A intenção é, antes, construir um relato detalhado desse intercâmbio musical a partir de dados disponíveis, mas até aqui esparsos e de difícil acesso (matérias em revistas norte-americanas da década de 1980 não digitalizadas, por exemplo). Narrativa de cunho histórico, o artigo pretende contribuir para os numerosos estudos sobre Jobim realizados no Brasil e no exterior, colocando, porém, a figura de Barbosa-Lima em primeiro plano, dada a escassez de pesquisas acadêmicas sobre ele. Decerto é em relação ao violonista que uma eventual contribuição deste texto será mais expressiva, na medida em que aborda importante capítulo de sua trajetória.

O artigo acompanha aproximadamente a cronologia dos eventos: o contexto do encontro; o processo de trabalho que resultou no disco de 1982; o episódio da série A música segundo Tom Jobim que traz Barbosa-Lima como convidado especial (TV Manchete, 1984Santos, Nélson Pereira, dir. 1984. A música segundo Tom Jobim. Série em 4 episódios. São Paulo, TV Manchete. Disponível em: Disponível em: https://www.jobim.org/jobim/handle/2010/8248 Acesso em: 20/04/23.
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); os novos arranjos para o duo de violões registrados com Sharon Isbin em Brazil, with love (Concord Picante, 1987Barbosa-Lima, Carlos, e Sharon Isbin. 1987. Carlos Barbosa-Lima & Sharon Isbin - Brazil with Love. Concord Picante, CCD-4320.); as referências ao plano de compor um concerto para violão. Os dados aqui utilizados são provenientes de fontes variadas, como encartes de LPs, entrevistas, críticas musicais, registros audiovisuais, álbum de partituras e correspondência pessoal.

1. Os personagens no contexto do encontro

Em 1981, Barbosa-Lima mudou-se para Nova York onde, a convite de Sharon Isbin, passaria a lecionar na Manhattan School of Music. Até então professor do Carnegie Mellon Institute (Pittsburgh), era na ocasião um concertista já bastante conhecido e com longo histórico de gravações - lançara seu primeiro disco, Dez dedos mágicos num violão de ouro (Chantecler, 1958), aos 14 anos.

Nesses primeiros registros, até 1961, o garoto-prodígio exibe um grande e eclético repertório de autores, que abrangia de Bach, Beethoven e Chopin a nomes centrais do cânone violonístico (Sor, Tárrega, Castelnuovo-Tedesco), incluindo compositores latino-americanos (Barrios, Antonio Lauro) e brasileiros (Camargo-Guarnieri e Villa-Lobos)1 1 Essas gravações juvenis foram reunidas e relançadas pela Zoho Music em 2015 e 2016 com o título The Chantecler Sessions vol. 1 (1958-1959) e vol. 2 (1960-1961). .

A década de 1960 testemunha o interesse de Barbosa-Lima pelo cancioneiro popular, como atesta o LP Imortal Catullo (Chantecler, 1964) dedicado a Catulo da Paixão Cearense, e o Álbum de modinhas (Chantecler, 1966). Tal versatilidade pode ser ao menos em parte creditada à formação feita com Isaias Savio (1900-1977). O mestre uruguaio era um produtivo didata que se dedicava à transcrição de compositores europeus - como Brahms e Mendelssohn - mas também a arranjos de Pixinguinha, por exemplo. Compositor prolífico, Savio escreveu muitas peças inspiradas em motivos populares, como “Pó de mico” e “Batucada”. Teve entre seus alunos expoentes do violão nacional, vários dos quais enveredaram por caminhos musicais híbridos, como Luiz Bonfá, Paulo Bellinati e Marco Pereira. Barbosa-Lima ressaltou mais de uma vez que a flexibilidade estética de Savio foi uma influência decisiva para que ele pudesse transitar livremente entre os universos da música erudita e popular (Barbosa-Lima 2009Barbosa-Lima, Carlos. 2009. “Carlos Barbosa-Lima”. Entrevista concedida a Eugênio Reis. Revista Digital BGM (Brazilian Guitar Magazine), n. 8, 20-28, maio 2009., 25).

Nos anos 1970, o violonista atrai a atenção da crítica internacional com suas transcrições de sonatas de Scarlatti (ABC Records, 1970). Outro destaque de sua discografia nesta fase é Barbosa-Lima interpreta os ‘12 estudos para violão’ de Francisco Mignone (Philips, 1978), escritos a partir de sugestão do próprio Barbosa-Lima. O “Concerto para violão e orquestra” (1977), de Mignone, foi dedicado ao violonista. Data da mesma época (1976) a célebre “Sonata for Guitar, op. 47”, do argentino Alberto Ginastera, composta com a ativa colaboração de Barbosa-Lima e a ele também dedicada2 2 Um extenso comentário sobre esta peça - sua história, intenções e influências - pode ser encontrado na terceira parte da entrevista concedida por Barbosa-Lima a Fabio Zanon (Barbosa-Lima 1999/2000). .

A temporada de estudos com Segovia em Madrid, em 1968, teria encorajado o pupilo brasileiro a investir em projetos mais pessoais, como este de abordar, valendo-se da técnica clássica, o mundo do jazz e do pop3 3 Cf. obituário assinado por Matt Schudel no The Washington Post (26/2/22) cuja principal fonte foi Larry del Casale - violonista com quem Barbosa-Lima trabalhou em duo entre 2003 e 2015. . O propósito era o de trazer para o violão solo aquilo que Barbosa-Lima chamava, nas entrevistas, de música popular “de alto nível”, “de qualidade” ou de “boa música popular”. O violonista sempre se dedicara a tais arranjos e transcrições, mas os reservava para uso próprio, inserindo-os, por vezes, em programas de concertos. Fato é que até os anos 1980 este era um veio secundário em suas atividades: o reconhecimento internacional fora obtido no âmbito do violão clássico - como transcritor e intérprete do repertório tradicional - e era com este interesse que as gravadoras o procuravam.

Cabe um comentário acerca da sempre tão discutível distinção, que por vezes beira o antagonismo, entre música clássica, erudita ou de concerto, de um lado, e música popular, de outro. Sem entrar mérito das extensas discussões a respeito, está claro que tais categorias se encontram presentes e bem demarcadas no pensamento de Barbosa-Lima. No material consultado, no entanto, não encontramos, da parte dele, definições precisas ou mesmo aproximada desses termos. Os critérios que embasam seus juízos de valor no terreno da música popular são ainda mais subjetivos; afinal, o que caracteriza uma produção “boa”, “de qualidade” ou “de alto nível” nesta seara? Em ambos os casos, só nos cabe cogitar quais seriam esses parâmetros implícitos no discurso do violonista a partir das únicas evidências de que dispomos: sua formação pessoal e o repertório que escolheu para arranjar/gravar. Grosso modo, o universo da “música erudita” parece abranger as composições escritas em partitura, muitas vezes destinadas a um instrumento solista ou a conjuntos orquestrais, em diálogo com aquilo que historicamente se estabeleceu como cânone da música ocidental e que requerem um mínimo de apuro técnico do(s) executante(s), inclusive no que diz respeito às nuances interpretativas. É um pouco do que se depreende, por exemplo, dos fatos até aqui mencionados - peças gravadas quando adolescente, anos de aprendizagem com Savio, transcrições de Scarlatti, intercâmbio com artistas como Mignone, Ginastera e Segovia. No que se refere à música popular de “alto nível”, a listagem das gravações e a entrevista concedida a Paul Magnussen em 1984 contêm algumas pistas. Primeiramente, são obras extraídas do cancioneiro lírico brasileiro, anterior e contemporâneo a Barbosa-Lima: às modinhas tradicionais e criações de Catulo da Paixão Cearense, viriam se somar as canções de Jobim e Bonfá (futuramente gravaria também Noel Rosa e Ary Barroso). Também no choro e na música instrumental brasileira Barbosa-Lima identifica qualidades - são vertentes ricas em ideias contrapontísticas e incorporam elementos de música afro. Ernesto Nazareth, Pixinguinha, Garoto, Baden Powell, Laurindo Almeida e até Egberto Gismonti são lembrados como nomes significativos4 4 Radamés Gnattali, João Pernambuco e Paulo Bellinati estão dentre os compositores da música instrumental brasileira gravados a partir de final dos anos 1980. . O trabalho com a tradição afro também caracteriza aqueles que Barbosa designa como “giants of American music”, Scott Joplin (a cujos ragtimes dedicou um álbum inteiro), Duke Ellington, George Gershwin, Cole Porter, Richard Rodgers e Stephen Sondheim. Dentre esses grandes nomes da canção americana, notam-se alguns de grande sucesso em musicais da Broadway e trilhas de cinema. Posteriormente, Barbosa-Lima aproximou-se dos ritmos latino-americanos (salsas, merengues) e gravou várias obras do violonista cubano Leo Brouwer (inclusive seus célebres arranjos de músicas dos Beatles). Em suma, o leque de referências daquilo que seria a “boa música popular” é demasiado amplo e variado para que se possa deduzir, afinal, quais os critérios que norteiam esta seleção. Um detalhe adicional: Barbosa-Lima afirma a Paul Magnussen que nesses arranjos ele se permite certa espontaneidade, algum grau de improviso (não comparável aos músicos de jazz, ele faz questão de frisar!), o que talvez aponte para um traço distintivo entre a música erudita e a popular. Fato é que, embora opere com tais categorias, Barbosa as considera muito relativas; como veremos adiante, ele afirma que não vê sentido nesse tipo de rotulação tão estrita (Barbosa-Lima 1993Barbosa-Lima, Carlos. 1993. Antonio Carlos Jobim 9 pieces arranged for solo guitar by Carlos Barbosa-Lima. San Francisco: GSP.).

A ambição de enriquecer o violão de concerto com peças populares encontrou condições favoráveis de desenvolvimento no começo da década de 1980, quando Barbosa-Lima mostrou alguns de seus arranjos para o amigo e guitarrista Charlie Byrd. Impressionado, Byrd apresentou-o a Carl Jefferson, dono da Concord Records, uma gravadora já consolidada no mercado de jazz (Barbosa-Lima 1984Barbosa-Lima, Carlos. 1984. “Carlos Barbosa-Lima interviewed”. Entrevista concedida a Paul Magnussen. Disponível em: Disponível em: http://www.paulmagnussen.com/carlos-barbosa-lima-interview.html . Acesso em: 12/03/2023.
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). Exatamente nesta época, a companhia estava lançando um novo selo - o Concord Concerto - voltado ao público de música clássica. A proposta e o perfil de Barbosa-Lima encaixaram-se à perfeição nos planos da gravadora: o disco Jobim-Gershwin inaugurou uma parceria entre o violonista e a Concord que renderia mais de quinze álbuns (solo, duo e outras formações) e duraria até quase os anos 2000.

Além de encontrar um selo disposto a endossar o projeto, Barbosa-Lima ponderou que enfim chegara o momento artístico de concretizá-lo, convencido de que seus arranjos haviam passado por um "amadurecimento", já estavam fluindo melhor (Barbosa-Lima 1983Barbosa-Lima, Carlos. 1983. “An interview with Carlos Barbosa-Lima”. Entrevista concedida a Brian Hodel. Classical Guitar, Gateshead, v.1, n.5, 48-49, may/june 1983., 48) e com a marca de seu próprio estilo:

De fato, eu estava esperando. Queria fazer isso [arranjos para música popular] desde o começo dos anos 70, mas de algum modo pensei que, com mais experiência, o momento certo chegaria. Sabe, tenho uma filosofia definida da harmonização, gosto das ideias contrapontísticas que são muito presentes na música brasileira, especialmente na prática instrumental. [...]. Porém, essa ideia ficou muito clara nos últimos três anos: eu queria incorporar essas peças ao meu repertório, mas com um toque próprio, pessoal (Barbosa-Lima, 1984Barbosa-Lima, Carlos. 1984. “Carlos Barbosa-Lima interviewed”. Entrevista concedida a Paul Magnussen. Disponível em: Disponível em: http://www.paulmagnussen.com/carlos-barbosa-lima-interview.html . Acesso em: 12/03/2023.
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).

Dada a projeção alcançada por Barbosa-Lima no âmbito dos arranjos5 5 Em suas manifestações, tanto Barbosa-Lima quanto Jobim empregam os termos “transcrição” e “arranjo” de modo genérico e intercambiável. , vale sintetizar algumas de suas posições sobre o assunto. Quando se iniciou na arte de transcrever, na época em que era aluno do maestro Theodoro Nogueira, aprofundou-se na análise das transcrições feitas por Segovia, Tárrega e Llobet, cotejando-as com os originais. Ao conceber um arranjo, procura escutar várias versões de uma mesma obra. Parte do básico - melodia, acordes e baixo - para então desenvolver o raciocínio polifônico (Barbosa-Lima 2009Barbosa-Lima, Carlos. 2009. “Carlos Barbosa-Lima”. Entrevista concedida a Eugênio Reis. Revista Digital BGM (Brazilian Guitar Magazine), n. 8, 20-28, maio 2009., 24). A abordagem é aparentemente simples: “Pela combinação entre a linha de contraponto horizontal com a harmonia vertical, dou ao arranjo aquilo que ele precisa para se tornar uma peça de concerto interessante” (Barbosa-Lima 1983Barbosa-Lima, Carlos. 1983. “An interview with Carlos Barbosa-Lima”. Entrevista concedida a Brian Hodel. Classical Guitar, Gateshead, v.1, n.5, 48-49, may/june 1983., 49).

Contudo, a criação de diferentes vozes simultâneas gera desafios técnicos, principalmente para a mão esquerda, cuja capacidade de abertura/extensão é considerada uma “chave para se aventurar numa polifonia mais complexa” (Barbosa-Lima 1983Barbosa-Lima, Carlos. 1983. “An interview with Carlos Barbosa-Lima”. Entrevista concedida a Brian Hodel. Classical Guitar, Gateshead, v.1, n.5, 48-49, may/june 1983., 49). Ele esclarece: “A dificuldade está em ir conduzindo as vozes, não na velocidade. Algumas posições podem parecer pouco ortodoxas, mas quero que as pessoas sejam pouco ortodoxas quando tocam” (idem).

O objetivo estético das transcrições e arranjos é inequívoco: a peça deve soar como se tivesse sido escrita para violão (Barbosa-Lima 2009Barbosa-Lima, Carlos. 2009. “Carlos Barbosa-Lima”. Entrevista concedida a Eugênio Reis. Revista Digital BGM (Brazilian Guitar Magazine), n. 8, 20-28, maio 2009., 14). Por vezes ele é ainda mais enfático, como se depreende desta sua fala, resgatada por Small: “Concordo com Segovia e outros quando dizem que o arranjo de violão deve soar ao menos tão bem quanto o original. Mas eu iria além dizendo que o arranjo deve ser criativo e novo, levando o ouvinte a sentir que ele soa melhor no violão” (Small 2018Small, Marc. 2018. “Artful Arrangement: Carlos Barbosa-Lima, Manuel Barrueco, Bill Kanengiser, and David Russel. On Translating Pieces to the Guitar”. Classical Guitar, Gateshead, spring 2018. Disponível em: Disponível em: https://classicalguitarmagazine.com/artful-arrangement-carlos-barbosa-lima-manuel-barrueco-bill-kanengiser-and-david-russell-on-translating-pieces-to-the-guitar/ Acesso em: 25/04/23.
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).

Há muito Barbosa-Lima tinha essa visão consolidada:

A arte da transcrição é trazer uma peça para um novo meio e uma nova vida, luz ou frescor. Trazer uma nova dimensão. Isso depende muito da inteligência e imaginação do arranjador. Você tem que realmente saber o que está fazendo em termos de estilo. O som, a sonoridade, é muito importante. Tenho visto algumas transcrições que são tecnicamente honestas, mas cujo resultado não é bom porque não soa bem. O violão é um instrumento difícil para transcrever. Você não pode só transcrever as notas - é preciso escutar o resultado (Barbosa-Lima 1983Barbosa-Lima, Carlos. 1983. “An interview with Carlos Barbosa-Lima”. Entrevista concedida a Brian Hodel. Classical Guitar, Gateshead, v.1, n.5, 48-49, may/june 1983., 49).

Uma síntese mais recente dessas ideias (Small 2018Small, Marc. 2018. “Artful Arrangement: Carlos Barbosa-Lima, Manuel Barrueco, Bill Kanengiser, and David Russel. On Translating Pieces to the Guitar”. Classical Guitar, Gateshead, spring 2018. Disponível em: Disponível em: https://classicalguitarmagazine.com/artful-arrangement-carlos-barbosa-lima-manuel-barrueco-bill-kanengiser-and-david-russell-on-translating-pieces-to-the-guitar/ Acesso em: 25/04/23.
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) ressalta a semelhança entre o arranjo e a tradução de uma língua para outra: no entender de Barbosa-Lima, as mudanças são necessárias e desejáveis - versões literais tendem a não funcionar. A meta seria recriar a composição original a partir do estilo pessoal do arranjador. Uma dessas marcas pessoais, nas palavras de Barbosa-Lima reproduzidas por Small (2018)Small, Marc. 2018. “Artful Arrangement: Carlos Barbosa-Lima, Manuel Barrueco, Bill Kanengiser, and David Russel. On Translating Pieces to the Guitar”. Classical Guitar, Gateshead, spring 2018. Disponível em: Disponível em: https://classicalguitarmagazine.com/artful-arrangement-carlos-barbosa-lima-manuel-barrueco-bill-kanengiser-and-david-russell-on-translating-pieces-to-the-guitar/ Acesso em: 25/04/23.
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: “Gosto de mover a melodia para o registro baixo ou médio, com a harmonia acima ou abaixo. É um conceito de orquestração”. Em suma, o violonista acredita que a concepção polifônica articulada com a exploração da riqueza timbrística do instrumento devem proporcionar a quem ouve a ilusão de escutar uma orquestra.

Um olhar atento para as mãos de Barbosa-Lima revela que ele soube tirar proveito de sua conformação anatômica para alcançar esse efeito orquestral: na mão esquerda, um dedo mínimo (dedo 4) grande e com uma abertura excepcional em relação ao dedo 3 (anular) favorecia suas tão peculiares digitações; na mão direita, o ângulo bastante aberto entre o polegar e os demais dedos (IMA) permitia ao polegar (utilizado com pouca unha) tocar numa região mais próxima ao braço, extraindo daí um timbre mais aveludado e distinto dos outros dedos, resultando numa sonoridade geral rica em nuances, propícia à polifonia. Na busca de maior densidade harmônica, o emprego do dedo mínimo da mão direita também era um recurso técnico usado pelo violonista.

Vale abrir um parêntese. A metáfora do violão como uma pequena orquestra é antiga: a grande extensão, a diversidade de timbres e a possibilidade de executar várias vozes simultâneas vêm há tempos embasando esta comparação (apesar do pouco volume e projeção do instrumento). O método para violão de Fernando Sor (1830) ressalta a possibilidade de imitação de outros instrumentos, enquanto o tratado de orquestração de Hector Berlioz (1844) sublinha a sutileza dos efeitos que dele podem ser extraídos por instrumentistas habilidosos6 6 Cf. capítulo 2 da dissertação de Daniel Motta (2012). . Em Segóvia, essa ideia se encontra explícita e comprovada - tal como se vê em trecho do filme Segovia at Los Olivos, dirigido por Christopher Nupen (1967)7 7 Cf. disponível em: https://youtu.be/V2zZl7Vifzw , no qual, em poucos minutos, ele demonstra como obter das cordas um impressionante colorido. Enquanto toca, vai explicando: “Por exemplo, [o violão] é como uma orquestra para o qual nós olhamos com o lado inverso de um binoculo. Quero dizer com isso que todas as coisas - todos os instrumentos da orquestra - estão dentro do violão, mas em um volume sonoro menor. Ele tem muitas cores diferentes, muitos timbres diferentes, e é necessário desenvolver estas qualidades do instrumento” (Motta 2012Motta, Daniel. 2012. “‘Quadros de uma exposição’ para violão solo por Kazuhiro Yamashita”. Dissertação de mestrado. Instituto de Artes da Universidade Estadual Paulista (Unesp)., 31).

Posteriormente, Marcelo Kayath (2009Kayath, Marcelo. 2009. “Violão: pequena orquestra ou grand piano?” Fórum do Violão (www.violao.org). Disponível em: Disponível em: https://violao.org/topic/6480-violao-pequena-orquestra-ou-grand-piano/ Acesso em: 26/04/2023.
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) retomou a metáfora para delinear o contraste entre duas concepções de violão, que resultam em estilos distintos de performance: a tradição Segovia/Julian Bream estaria na origem do “violão pequena-orquestra”, enquanto John Williams (e, a seguir, Manuel Barrueco e David Russel) desenvolveram o “violão grand-piano”, caracterizado pelo forte volume, velocidade, notas homogêneas e, sobretudo, pouca variedade timbrística.

Pois bem, não apenas Barbosa-Lima encampa essa visão do violão como pequena orquestra, como sem dúvida pode ser considerado um expoente dessa abordagem do instrumento, tendo conseguido divulgá-la para além dos círculos do violão erudito. E é exatamente assim que Tom abre a contracapa do disco de 1982: “Nas mãos de Carlos Barbosa-Lima o violão se torna uma orquestra” (Jobim 1982Jobim, Antonio Carlos. 1982. “Contracapa”. In Carlos Barbosa-Lima plays the Music of Antonio Carlos Jobim & George Gershwin. Concord Concerto, CCD-42005, 1982/1990 (reedição ampliada).). Fecha parêntese.

Nesta época, Jobim já era um nome mais do que consagrado internacionalmente. Lembre-se que antes mesmo de sua chegada aos EUA, em novembro de 1962, por ocasião do show da Bossa Nova no Carnegie Hall, o new brazilian beat já estourara por lá. O sucesso do álbum Jazz Samba, de Stan Getz e Charlie Byrd (Verve, 1962) abriu os caminhos para aqueles que permaneceram no país após o show, como Milton Banana, João Gilberto e o próprio Jobim.

O sucesso norte-americano de Tom durante os anos 1960 pode ser atestado por suas apresentações em shows de TV de grande audiência e pela gravação de dois LPs com Sinatra (1967; 1969/1971). Pode-se afirmar que tal prestígio é, em grande medida, tributário da estreita associação de seu nome com o movimento da Bossa Nova. Mesmo quando, a partir de 1970, o maestro segue gravando nos EUA projetos em que gradativamente se afastava da estética bossanovista, como Stone Flower (1970), Matita Perê (1973) e Urubu (1976), eram os antigos hits que continuavam a bater recordes de execução em diferentes regravações. Em outras palavras, Jobim passara a explorar novos caminhos estéticos, nos quais a veia orquestral, os motivos ecológicos/literários e os ritmos nordestinos ganham proeminência; porém, os vários prêmios Broadcast Music Inc. (BMI) “Great National Popularity” conquistados na década de 70 foram atribuídos a “Garota de Ipanema”, “Meditação”, “Desafinado” e “Wave”.

Junto à crítica especializada e aos músicos sua reputação continuava em alta: ao final da gravação da peça instrumental “Saudade do Brasil” Jobim foi aplaudido de pé pelos membros da Orquestra Sinfônica de Nova York que ele arregimentara para o disco Urubu. Em abril de 1980, o lançamento simultâneo no Brasil e nos EUA do LP duplo Terra Brasilis - uma espécie de revisitação da obra jobiniana, agora em nova roupagem modelada por Claus Ogerman8 8 O alemão Claus Ogerman (1930-2016) foi o maestro que mais trabalhou com Jobim, tendo sido o responsável pelos arranjos de sete discos entre 1963 e 1980. Compositor e pianista, Tom o descreve em carta ao filho Paulo (outubro de 1975): “Claus toca jazz no piano paca, tem bossa paca, (...). Claus é o Rei do Swing, só você vendo, não dá pra acreditar! É um Donato alemão”(Augusto 2002, 122). Para um estudo detalhado da relação Ogerman/Jobim, ver Luiz Duarte (2010). - mostra que Tom continuava a marcar presença no mercado fonográfico norte-americano. E assim seria até o final da vida, quando seu último álbum, Antonio Brasileiro (1994), foi contemplado com o Grammy.

Tudo isso indica que, no início dos anos 1980, nada mais natural do que a escolha do repertório de Jobim para lançar internacionalmente um violonista brasileiro no terreno de arranjos para música popular. A vinculação com o aclamado nome de Gershwin (que Tom considerava seu “irmão mais velho espiritual”) só poderia impulsionar o projeto. Se considerarmos o conjunto de elementos então reunidos - o selo híbrido, os anseios do intérprete, as características composicionais e trajetórias artísticas dos dois célebres songwriters - fica evidente que compartilham uma mesma atitude: a disposição para franquear as (sempre discutíveis) fronteiras que separam a canção da música instrumental, o clássico do popular, o regional do restante do mundo...9 9 A propósito das afinidades entre Jobim e Gershwin, cf. Castro 2017.

2. Aproximação e o processo de trabalho

Foram muitas as circunstâncias em que Barbosa-Lima relatou seu encontro com Jobim. Na entrevista a Brian Hodel10 10 Vale uma nota sobre este articulista que conheceu e se correspondeu com Jobim, e que tentamos (sem sucesso) localizar. Nascido em 1948, Brian Hodel tornou-se especialista em música brasileira e latino-americana para violão. Foi compositor, arranjador, violonista e professor (Univ. de Washington). Colaborador assíduo de revistas especializadas, Hodel publicou pelo menos 16 artigos sobre violão brasileiro na década de 1980 (Castagna e Schwarz 1993). Editou também dois álbuns de partituras com seus arranjos para violão solo: The Brazilian Masters: the Music of Jobim, Bonfá and Baden Powell arranged for Solo Guitar (1981) e The Brazilian Guitar (1983). , logo após o lançamento do disco, a descrição é sóbria:

Tive com ele um encontro estimulante. Sempre fui um grande admirador de sua música e penso que ele é um dos maiores compositores do mundo. Eu já tinha feito várias partituras e transcrições de gravações de suas peças para meu próprio uso. Quando Jobim estava em Nova York na primavera passada [1982] procurei-o e ele me convidou para ir ao seu hotel. Toquei meus arranjos e ele sugeriu uma colaboração (Barbosa-Lima 1983Barbosa-Lima, Carlos. 1983. “An interview with Carlos Barbosa-Lima”. Entrevista concedida a Brian Hodel. Classical Guitar, Gateshead, v.1, n.5, 48-49, may/june 1983., 48).

Cerca de quinze anos depois, o diálogo com Fábio Zanon é mais descontraído:

Na virada da década de 80, fui ao Brasil e consegui umas partituras do Jobim: estavam horríveis, com harmonias erradas, etc. Escutei os discos, com aquelas harmonias incríveis, Urubu, etc. Eu disse ‘isso aqui já não é bossa nova, é música de câmara’. Larguei as partituras e comecei a fazer os arranjos de ouvido, e depois tirei algumas coisas do livro do Eumir Deodato, lá por 81, 82. Então eu procurei o Tom Jobim. Foi uma sorte, me disseram que ele estava no Hotel Adams. Um dia criei coragem, liguei e ele mesmo atendeu, até assustei. Ele estava numa fase intermediária, não estava tocando muito em público, meio escondido. Ele disse que estava muito honrado, perguntou ‘você não quer vir aqui amanhã?’. Claro que eu fui. Ele falou pra eu nem levar as partituras, até brincou: ‘pode deixar que eu sei ler música’ (...) Eu mostrei as coisas, falei ‘aqui dá pra fazer um contraponto’, ele disse ‘vamos trabalhar nisso, eu estou o mês todo aqui’ (Barbosa-Lima 1999/2000Barbosa-Lima, Carlos. 1999/2000. “Entrevista com Carlos Barbosa-Lima”. Entrevista concedida a Fabio Zanon. Revista Violão Intercâmbio, n. 38, Ano VII, 18-21, nov/dez. 1999 (parte I); n. 39, Ano VIII, 23-27, jan/fev. 2000 (parte II); n. 40. Ano VII [sic], 21-26, mar/abr. 2000 (parte III)., 24-25).

Tom, por sua vez, resume na contracapa: “Trabalhamos juntos durante uma primavera em Nova York. Ao longo dos dias discutimos ritmo, harmonia, contraponto e intenção” (Jobim 1982Jobim, Antonio Carlos. 1982. “Contracapa”. In Carlos Barbosa-Lima plays the Music of Antonio Carlos Jobim & George Gershwin. Concord Concerto, CCD-42005, 1982/1990 (reedição ampliada).). Um relato sucinto que naturalmente nos desperta curiosidade: como teria sido o método de trabalho adotado nesses encontros? Na mesma entrevista a Brian Hodel, Barbosa-Lima revela: “Nossas sessões de arranjos foram uma experiência maravilhosa, iluminadora. Por vezes Jobim usava o violão, mas geralmente ele tocava piano. Frequentemente usamos dois violões para conseguir o efeito que queríamos, e depois eu arranjava isso para um violão só” (Barbosa-Lima 1983Barbosa-Lima, Carlos. 1983. “An interview with Carlos Barbosa-Lima”. Entrevista concedida a Brian Hodel. Classical Guitar, Gateshead, v.1, n.5, 48-49, may/june 1983., 49). Na conversa com Zanon surge mais um detalhe: “O Juan Orozco [luthier, ligado às cordas Aranjuez e dono de uma loja de violões em Nova York] arrumou um violão Di Giorgio que acabou ficando pra ele, muitas vezes ele tocava de violão para violão” (Barbosa-Lima 1999/2000Barbosa-Lima, Carlos. 1999/2000. “Entrevista com Carlos Barbosa-Lima”. Entrevista concedida a Fabio Zanon. Revista Violão Intercâmbio, n. 38, Ano VII, 18-21, nov/dez. 1999 (parte I); n. 39, Ano VIII, 23-27, jan/fev. 2000 (parte II); n. 40. Ano VII [sic], 21-26, mar/abr. 2000 (parte III)., 25).

O que nos chama a atenção nesse ponto é justamente o uso do violão por Jobim durante o processo. Se fosse apenas o caso de “dar as harmonias corretas” (Barbosa-Lima 2012Barbosa-Lima, Carlos. 2012. “O violão no Brasil. The Guitar in Brazil”. Entrevista concedida ao Movimento Violão. Gravada em 24/04/2012. Disponível em: Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=tYw7AJA-_yY . Acesso em: 19/03/2023.
https://www.youtube.com/watch?v=tYw7AJA-...
), o piano teria sido suficiente. Mas apesar de não se considerar violonista, Tom trabalhou efetivamente no instrumento de modo a intervir nos arranjos a partir de dentro, por assim dizer, do próprio universo sonoro de Barbosa-Lima. “De violão para violão”: trocas feitas na mesma linguagem em prol, tudo indica, da otimização dos recursos e idiomatismos do instrumento.

Vejamos o testemunho de Brian Hodel, que chegou a presenciar algumas dessas sessões de trabalho por ele consideradas “empolgantes”:

[...] Uma vez tive o prazer de assisti-lo [Jobim] arranjar algumas de suas obras para solo e duo de violão em colaboração com Carlos Barbosa-Lima. Jobim conduzia Barbosa-Lima para uma voz harmônica ou linha de contraponto que ele queria para o arranjo cantando-as ou tocando-as em outro violão. As ideias frequentemente complexas de Jobim vinham rápida e precisamente, sem que ficasse ‘caçando’ as notas (Hodel 1985Hodel, Brian. 1985. “Antonio Carlos Jobim - Guitar Player”. Manuscrito do artigo (datilografado, sem data). Disponível em: Disponível em: https://www.jobim.org/jobim/handle/2010/8226 Acesso em: 20/05/2023. Também publicado em Classical Guitar. Gateshead, v. 3, n.7, p.19-21, march 1985.
https://www.jobim.org/jobim/handle/2010/...
).

Logo adiante, o mesmo texto reproduz uma fala de Barbosa-Lima:

Arranjar a música de Jobim para violão não é apenas transcrever as mãos direita e esquerda do piano. Jobim tem um profundo entendimento do violão, e trabalhamos juntos desenvolvendo as ideias que vão para os arranjos. As melhores ideias surgem muito rapidamente, vêm direto nas nossas cabeças. Em alguns momentos, eu realmente me sentia transportado para outro lugar. (Hodel 1985Hodel, Brian. 1985. “Antonio Carlos Jobim - Guitar Player”. Manuscrito do artigo (datilografado, sem data). Disponível em: Disponível em: https://www.jobim.org/jobim/handle/2010/8226 Acesso em: 20/05/2023. Também publicado em Classical Guitar. Gateshead, v. 3, n.7, p.19-21, march 1985.
https://www.jobim.org/jobim/handle/2010/...
).

Assim, além da participação intensiva de Tom na concepção dos arranjos, tais relatos mostram que este foi um momento especial de seu envolvimento com o violão, seja como instrumentista, seja como apreciador do violão solo. Luiz Bonfá havia sido até então o virtuose com quem Tom tivera mais intimidade - compuseram juntos várias canções (e até um tema instrumental), além de ativa participação de Bonfá no teatro e nas gravações de Orfeu da Conceição (1956). Com Raphael Rabello (1962-1995) não se pode dizer que houve um intercâmbio propriamente violonístico. Eles se conheceram em 1979, apresentados por Radamés Gnattali - cerca de três anos antes do primeiro encontro com Barbosa-Lima. O primeiro disco do violonista carioca, Rafael Sete Cordas (Polygram, 1982Barbosa-Lima, Carlos. 1982. Carlos Barbosa-Lima plays the Music of Antonio Carlos Jobim & George Gershwin. Concord Concerto, CCD-42005, 1982/1990 (reedição ampliada).), traz um arranjo para violão solo da peça “Garoto”, que Tom gravara em Stone Flower (1970) com o título “Choro”. Tal arranjo foi feito com base em uma partitura cedida por Jobim e, devido às longas estadias deste no exterior, discutido com o filho Paulo Jobim. Dez anos depois, Raphael11 11 Registrado como Rafael, a partir de 1991 Rabello passa a assinar Raphael. Talvez para atender ao desejo original de sua mãe, talvez por ser uma grafia mais compatível com o mercado internacional, fato é que o “ph” tornou-se definitivo (Nobile 2018, 222). dedica um disco inteiro ao repertório de Jobim - Todos os Tons (BMG Ariola, 1992) - com participação de Tom e de Paulo na elaboração dos arranjos (e com o piano de Tom em uma das faixas).12 12 Os elogios mútuos são reproduzidos no livro de Sergio Cabral. Para Raphael, “a música de Tom é popular na forma, mas a técnica de composição e harmonização é erudita. Tom é um arquiteto musical”. Segundo Tom, “tudo que Rafael faz é sensacional. Ele é um gênio do violão, um cometa musical, desses que aparecem uma vez a cada século” (Cabral 1997, 421). Para detalhes da relação entre eles, ver Lucas Nobile (2018), especialmente capítulo 10. Baden Powell e Rosinha de Valença são outros solistas que Tom conheceu de perto. É possível que o apuro do “ouvido violonístico” de Jobim fosse também tributário de sua experiência como maestro e arranjador; mas é igualmente certo que pela primeira vez testemunhava e participava, com violão em punho, da gestação de arranjos para violão solo, descrevendo com precisão a sonoridade final:

(...) Como que por encanto, explodem ali [no violão de Carlos] todas as dimensões da música - o baixo, o registro médio dos acordes, a melodia, o ritmo, a harmonia e o contraponto. Tudo soa correto e claro. Tudo cai no lugar certo, com a medida certa de importância. Graça, delicadeza, leveza, força, ímpeto, vigor, independência, equilíbrio. Está tudo lá, como que por mágica, nos dedos desse verdadeiro brujo do violão. (...). Às vezes é possível ouvir até quatro linhas [diferentes], cada uma com seu toque distinto (Jobim 1982Jobim, Antonio Carlos. 1982. “Contracapa”. In Carlos Barbosa-Lima plays the Music of Antonio Carlos Jobim & George Gershwin. Concord Concerto, CCD-42005, 1982/1990 (reedição ampliada).).

Adiante retomaremos este ponto: como o contato com o bruxo Barbosa-Lima pode ter propiciado a Jobim uma nova experiência com o violão, instrumento que usava desde sua juventude para compor ou na função de (auto)acompanhamento.

3. O álbum CBL Plays ACJ & GG

A edição original do álbum de 1982 traz seis obras de Jobim dispostas na seguinte ordem: “Caminho de pedra”, “Desafinado”, “Estrada branca”, “Stone Flower” (“Quebra-pedra”), “Corcovado” e “Amparo”.

Note-se a inclusão de dois carros-chefes da Bossa Nova já amplamente conhecidos nos EUA como “Off key” (ou “Out of Tune”) e “Quiet nights of quiet stars”, assim como a toada “Estrada branca” (“This happy madness”), difundida na versão “abossanovada” de Frank Sinatra. Das demais composições, “Amparo” (“Olha Maria”) e “Stone Flower” (um misto de baião com maracatu) haviam sido gravadas por Jobim no disco homônimo de 1970. A faixa menos conhecida era “Caminho de pedra”, parceria com Vinícius datada de 1958, e que Tom só registrara ao acompanhar Elizeth Cardoso em Canção de amor demais.

Polifonia, contrapontos, variedade timbrística (com destaque para o abundante uso dos harmônicos): Barbosa-Lima não abriu mão desses pilares nem sob o risco de comprometer a fluência rítmica (como em “Desafinado”) ou mesmo alterar a levada de um clássico como “Corcovado”, aqui em versão distanciada da bossa-nova. “Caminho de pedra” e “Amparo” (onde Barbosa-Lima vê traços de Chopin e Debussy), assim com “Estrada branca”, permitiram a livre expressão de sua imaginação contrapontística; e, apesar de complexidade técnica, todas elas soam com naturalidade e extremo lirismo. O comentário de Jobim sobre as quatro vozes independentes, cada qual com sua peculiaridade, encontra nessas faixas uma perfeita ilustração.

Porém, o arranjo mais desafiador foi aquele que também mais teria agradado a Jobim: “Quebra-pedra”, onde o intérprete identifica influências como Stravinsky e Bartok (Barbosa-Lima 1993Barbosa-Lima, Carlos. 1993. Antonio Carlos Jobim 9 pieces arranged for solo guitar by Carlos Barbosa-Lima. San Francisco: GSP., 5). Nas palavras de Barbosa-Lima:

No caso de uma peça escrita para orquestra como a Stone Flower (Quebra-pedra) do Tom Jobim, eu busquei partir do próprio ambiente orquestral e o Tom Jobim me disse que nunca imaginou ouvir aquilo no violão, mas acabou sendo a sua peça favorita, que ele sempre me pedia pra tocar. É uma peça complexa, com muita polifonia, mas ficou tudo na mão, só é preciso a pessoa desenvolver uma técnica polifônica pra isso, onde as vozes são escutadas com clareza, mas o espírito da obra continua ali (Barbosa-Lima 2009Barbosa-Lima, Carlos. 2009. “Carlos Barbosa-Lima”. Entrevista concedida a Eugênio Reis. Revista Digital BGM (Brazilian Guitar Magazine), n. 8, 20-28, maio 2009., 24).

A admiração do Maestro por este arranjo transparece no especial da TV Manchete (1984)Santos, Nélson Pereira, dir. 1984. A música segundo Tom Jobim. Série em 4 episódios. São Paulo, TV Manchete. Disponível em: Disponível em: https://www.jobim.org/jobim/handle/2010/8248 Acesso em: 20/04/23.
https://www.jobim.org/jobim/handle/2010/...
, que comentaremos adiante. Nos diálogos gravados para o episódio, Tom diz que gosta muito dessa composição inspirada em motivos nordestinos e que Carlos conseguiu transpor para o violão a versão original, concebida com Eumir Deodato e orquestra. “O Carlos tem tudo isso no violão, num arranjo muito criativo, muito pessoal, uma coisa danada, vocês vão ouvir”. Barbosa-Lima executa a peça - ritmicamente a mais intrincada do disco - sob o olhar atento de Tom, que comenta: “É uma coisa incrível, esse arranjo seu é uma coisa maravilhosa com essa polifonia, com essas vozes, os harmônicos, tudo, todos os recursos, né?”. Barbosa-Lima acrescenta que essa peça especialmente foi considerada pela crítica americana como uma grande contribuição para o repertório violonístico: “Não há nada parecido. É uma síntese. O violão às vezes pode ser uma síntese da ideia orquestral (...)”. Neste caso, o arranjo sintetiza também alguns dos ingredientes característicos da obra, que seriam, ainda nas palavras de Carlos, o dramatismo da cultura nordestina, o lirismo, a polifonia e os ritmos simultâneos.

Ainda a propósito deste arranjo de “Quebra-pedra”, Jobim conclui a conversa no programa de TV incrementando um elogio já expresso anteriormente: “Realmente, o violão, como já disseram, é uma pequena orquestra. Que no seu caso [de Carlos] não é uma pequena orquestra, é uma grande orquestra, né?”

A boa repercussão do álbum levou, oito anos mais tarde, à sua reedição. Para esta nova versão de CBL Plays ACJ & GG (1990), foram acrescentados três arranjos inéditos: “Samba de uma nota só”, “Modinha” e “Canta Mais”. Vê-se novamente a estratégia de juntar um emblema da bossa nova com, desta feita, duas das composições mais “villalobianas” de Jobim. E, uma vez mais, nota-se que as canções de câmara acolhem melhor a exuberância polifônica de Barbosa-Lima. Estas faixas foram gravadas na Califórnia em julho de 1989; sabe-se por uma carta do violonista para Jobim (à qual nos referiremos adiante) que eles se encontraram em janeiro de 1989, de modo que é possível que tenham acertado os últimos retoques dos arranjos nesta ocasião.

O conjunto de nove peças foi enfim publicado, na forma de partituras e tablaturas, um ano antes da morte de Tom (Barbosa-Lima 1993Barbosa-Lima, Carlos. 1993. Antonio Carlos Jobim 9 pieces arranged for solo guitar by Carlos Barbosa-Lima. San Francisco: GSP.). O álbum Antonio Carlos Jobim - 9 pieces arranged for solo guitar by Carlos Barbosa-Lima, editado pela Guitar Solo Publications (GSP), inclui um pequeno texto introdutório, outro na contracapa e breves notas do intérprete sobre cada uma das músicas.

Alguns aspectos das partituras chamam nossa atenção. Primeiramente, a nítida preferência pelo recurso da scordatura - oito dos nove arranjos trazem a sexta corda afinada em Ré (apenas “Amparo” com afinação padrão). A profusão de harmônicos, em linhas melódicas e contrapontos, fica ainda mais evidente na representação visual. Destaque também para a grande quantidade de indicações de andamento e intenção (ex: “repeat three times - changing color each time, from dark towards bright”). Por fim, nota-se a meticulosidade na escrita das tablaturas, cujas convenções são esmiuçadas em um guia final.13 13 Vale a pena examinar o conjunto dessas partituras; o álbum integral, em formato PDF, encontra-se disponível em sites da internet.

Na contracapa, Barbosa-Lima louva a saudável atitude de integrar a tradição do violão clássico com os criativos e complexos estilos desenvolvidos em culturas impregnadas pela herança africana e nas quais o violão é proeminente, como América Latina, Caribe e Estados Unidos. Segundo ele, é preciso evitar o falso elitismo: “Quando se considera a música neste contexto mais amplo, ‘clássico’ e ‘popular’ são rótulos sem sentido” (Barbosa-Lima 1993Barbosa-Lima, Carlos. 1993. Antonio Carlos Jobim 9 pieces arranged for solo guitar by Carlos Barbosa-Lima. San Francisco: GSP.). Diversidade atestada pela coleção The Music of the America series, que reúne alguns dos álbuns arranjados e editados por ele na mesma GSP, trazendo repertório de nomes como Dave Brubeck, Francisco Mignone e Pixinguinha.

4. As cooperações posteriores

Em 1984, a TV Manchete veiculou a série A música segundo Tom Jobim, dirigida pelo cineasta Nelson Pereira dos Santos.14 14 O mesmo diretor reaproveitou esse título para batizar seu documentário, de 2012, sobre a obra de Jobim. Os quatro episódios trouxeram convidados recebidos com informalidade na casa de Jobim da rua Peri. Entre conversas e números musicais, acompanhamos algumas preferências do Maestro: Villa-Lobos (abordado em um episódio com a presença do violonista Turíbio Santos e da cantora Olivia Hime), Ary Barroso, Noel Rosa, Custódio Mesquita, Dorival Caymmi - que participou do programa juntamente com os filhos, aos quais se juntaram Chico Buarque e Gal Costa. Radamés Gnatalli compareceu tocando peças dele próprio e de Ernesto Nazareth. Enfim, a série retratou “a música segundo Tom Jobim” como uma descontraída confraternização musical15 15 Está disponível no site do IACJ uma edição com 2:47:47 de duração: https://www.jobim.org/jobim/handle/2010/8248. O episódio com Barbosa-Lima tem início em 2:05:43. .

Barbosa-Lima foi o foco de um dos episódios. A edição do material produzido na ocasião - ao menos a versão que está disponível atualmente - soma cerca de 20 minutos. Não se sabe ao certo quantas e quais peças foram gravadas, mas são apenas quatro as que restaram: o “Prelúdio nº 2” de Villa-Lobos; “Batucada” e “Caixinha de música”, de Isaias Savio, e “Quebra-pedra”, de Jobim.

O clima é bastante cordial - Tom se mostra orgulhoso da colaboração entre ambos e satisfeito por apresentar ao público o talento de Carlos, cuja timidez em nada prejudica as performances. Além das menções ao trabalho conjunto nos EUA e à boa acolhida pelo disco junto ao público e crítica, a conversa gira em torno de Villa-Lobos, da formação de Carlos com Isaias Savio (recomendado por Luiz Bonfá ao pai do então garoto-prodígio), de características das peças ali executadas e das peculiaridades do violão.

Dois momentos do encontro nos parecem particularmente relevantes. O primeiro, claro, é o número “Quebra-pedra” (2:23:23 - 2:24:46), já comentado acima. O segundo ocorre quando Tom pede a Barbosa-Lima que toque “Caixinha de música” (2:15:54 - 2:19:30). Essa “pequena joia”, inteiramente composta em harmônicos, suscita o olhar admirado de Tom e algumas observações de ambos sobre este recurso violonístico. Os harmônicos possibilitam aumentar o âmbito do instrumento (distância entre grave e agudo) e ainda gerar o efeito de um registro médio, produzido por aqueles obtidos no baixo. Jobim conclui: “Quer dizer, você escuta até o que não está sendo tocado, você escuta...”.

Isso nos mostra mais uma vez a sensibilidade do pianista para um idiomatismo do violão e seu apreço pelos atributos próprios ao instrumento. É uma cena especial na medida em que nos permite testemunhar algo já apontado: o contato com Barbosa-Lima teria permitido a Jobim uma imersão e uma intimidade inéditas com o universo violonístico, apesar de ter convivido com outros grandes nomes do instrumento.

O episódio também atesta um dos proveitos que a relação com Jobim teria rendido a Barbosa-Lima: a divulgação de seu trabalho em território nacional. Em entrevista muitos anos mais tarde, o violonista recorda:

Tom Jobim (...) uma vez me apresentou ao público brasileiro, já na década de 80, eu estava meio afastado, mas muita gente se lembra daquele programa, eu havia gravado o disco com obras do Tom e do Gershwin. Na plateia estavam o Radamés Gnattali, o Francisco Mignone e também o recém ganhador do concurso de Paris e de Toronto, o Marcelo Kayath, foi uma coincidência ver diferentes gerações, onde o Tom era o cicerone (Barbosa-Lima 2009Barbosa-Lima, Carlos. 2009. “Carlos Barbosa-Lima”. Entrevista concedida a Eugênio Reis. Revista Digital BGM (Brazilian Guitar Magazine), n. 8, 20-28, maio 2009., 23, grifos nossos).

O marco seguinte da colaboração musical entre Jobim e Barbosa-Lima materializa-se nas faixas no disco que Carlos lançou em parceria com a colega Sharon Isbin16 16 Sharon Isbin (1956 -), célebre violonista americana, transita com igual desenvoltura entre a música clássica e a popular. Aluna de Segovia, fundadora do Departamento de violão da Julliard School, ganhadora de vários Grammys, apresenta-se com as principais orquestras do mundo e lançou mais de trinta e cinco álbuns com todo tipo de repertório. Com Barbosa-Lima gravou ainda Rhapsody in Blue/West Side Story (Concord Concerto, 1988). . Intitulado Brazil, with love (Concord Picante, 1987Barbosa-Lima, Carlos, e Sharon Isbin. 1987. Carlos Barbosa-Lima & Sharon Isbin - Brazil with Love. Concord Picante, CCD-4320.)17 17 Este outro selo da Concord, criado em 1980, destinava-se a abrigar o melhor do Latin jazz - rótulo que agrupa os mais diversos ritmos afro-caribenhos e brasileiros. , o álbum foi gravado em novembro de 1986.

No repertório de quatorze músicas, Jobim encontra-se ladeado por Pixinguinha e Ernesto Nazareth, ali representados com quatro peças cada um. Tom comparece com seis obras, agora arranjadas para duo de violões: “Luiza”, “Felicidade”, “Chovendo na roseira”, “Garoto”, “Estrada do sol”, “Gabriella” (sic). Desta feita, os créditos do disco atribuem oficialmente ao Maestro a coautoria dos arranjos. Vale notar que uma partitura para violão solo de “’Gabriella’ Love theme”, “transcribed by Carlos Barbosa-Lima”18Barbosa-Lima, Carlos. 1983. “An interview with Carlos Barbosa-Lima”. Entrevista concedida a Brian Hodel. Classical Guitar, Gateshead, v.1, n.5, 48-49, may/june 1983., já havia sido publicada na Guitar Review em 1983, como apêndice de uma extensa matéria sobre Jobim feita pelo longevo editor da revista, Vladimir Bobri.19 19 Nessa época Barbosa-Lima integrava o conselho editorial da Guitar Review, para a qual contribuía assiduamente como crítico de violão, resenhando concertos e lançamentos fonográficos.

Embora todos os arranjos transmitam o perfeito entendimento entre os solistas, é forçoso reconhecer que causam menos impacto no ouvinte do que aqueles para violão solo gravados em 1982. De fato, agora é mais frequente o recurso à melodia acompanhada (Barbosa-Lima e Isbin se alternam na função de “acompanhamento”) e as complexas polifonias encontram-se desdobradas nos dois instrumentos. O resultado é primoroso, mas menos impressionante no que se refere ao virtuosismo exigido dos intérpretes. Lembremos que Barbosa-Lima retoma a gravação dos arranjos solo dois anos depois, em 1989, por ocasião da reedição de CBL Plays ACJ & GG: voltaria a enfrentar sozinho os intrincados desafios em que transformava os temas de Jobim.

Para o disco com Isbin, Tom redige outra contracapa elogiosa, datada de março de 1987, louvando as magic hands desses dois mestres do violão. Novamente refere-se, em espanhol, a Barbosa-Lima como brujo do instrumento, agora em pas de deux com a feiticeira (sorceress) Sharon Isbin (termos empregados por ele). A performance é descrita com fartos adjetivos: limpa, clara, melodiosa, harmoniosa, viva e rítmica. “É tão bonito que me dá arrepios”, confidencia, emendando a seguir:

Trabalhar com Carlos e Sharon nos arranjos para dois violões foi muito gratificante. O violão é um dos instrumentos mais completos. Imaginem dois, em perfeita harmonia. É como uma orquestra de câmara, onde nada se perde. Uma maravilhosa e rica combinação de diferentes timbres, que surpreendem e excitam o ouvido, uma grande alegria para o coração. Faz bem pra a alma (Jobim 1987Jobim, Antonio Carlos. 1987. “Contracapa”. In Carlos Barbosa-Lima & Sharon Isbin - Brazil with Love. Concord Picante, CCD-4320.).

Barbosa-Lima relata com orgulho que por duas vezes abriu os shows de Tom Jobim com a Banda Nova no Avery Fisher Hall, célebre sala de concertos situada no Lincoln Center (Nova York). A primeira delas foi justamente em duo com Sharon Isbin em 8/12/1985 (o que nos leva a crer que os arranjos gravados em novembro de 1986 já estivessem prontos um ano antes). Já na noite de 23/11/1987 é ele sozinho quem se encarrega da abertura do espetáculo, que conta também com a participação de Gal Costa e Oscar Castro-Neves (Cabral 1997Cabral, Sergio. 1997. Antônio Carlos Jobim - uma biografia. 2ª ed. Rio de Janeiro: Lumiar editora., 392 e 400). Entusiasmado, lembra em entrevista registrada em vídeo: “Foi uma maravilha - o violão acústico tocando para 3000 pessoas... foi um arrebatamento total” (Barbosa-Lima 2012Barbosa-Lima, Carlos. 2012. “O violão no Brasil. The Guitar in Brazil”. Entrevista concedida ao Movimento Violão. Gravada em 24/04/2012. Disponível em: Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=tYw7AJA-_yY . Acesso em: 19/03/2023.
https://www.youtube.com/watch?v=tYw7AJA-...
).

5. Um projeto não realizado

A colaboração musical prosseguiu até o final da década de 1980. Uma carta de Barbosa-Lima datada de 5/02/1989 menciona o encontro de ambos ocorrido em janeiro, quando aproveitaram para corrigir a harmonia de “Saudade do Brasil” - peça na qual Carlos estava trabalhando. “Estou enviando a você cópia do arranjo que eu preparei da sua obra ‘Saudade do Brasil’ em redução para violão e piano do que se transformará para violão e orquestra de câmara. Corrigi aquelas notas e acordes que você me mostrou quando nos encontramos há duas semanas”. No P.S. da carta, um pedido: “Procure pensar na instrumentação de ‘Saudade do Brasil’”.

No site do Instituto Antonio Carlos Jobim (IACJ) estão disponíveis dois manuscritos autógrafos de Barbosa-Lima para esta peça. O primeiro corresponde exatamente à descrição acima - uma redução para violão e piano, de um arranjo destinado para violão e orquestra de câmara, com 15 folhas. O segundo manuscrito, com 6 folhas e data de 1988, é apenas a parte de violão do que seria um arranjo para este instrumento e orquestra de cordas, contendo poucas e preliminares indicações para a futura instrumentação20 20 Respectivamente indexados como jobim.org/jobim/handle/2010/4458 e jobim.org/jobim/handle/2010/4459. . Como de praxe, indicam a 6ª corda afinada em Ré.

Outros dois documentos à disposição no site indicam que o arranjo acabou por ser discutido com Paulo Jobim, filho do Maestro: um bilhete de Barbosa-Lima dirigido a Paulo solicitando as modificações que este teria introduzido na partitura e um segundo, intitulado “Sugestões de mudanças no arranjo da música ‘Saudade do Brasil’”21 21 Respectivamente indexados como jobim.org/jobim/handle/2010/4414 e jobim.org/jobim/handle/2010/8000. . A indexação de ambos informa que “este arranjo de Saudade do Brasil foi feito em 1991 por Paulo Jobim e Carlos Barbosa-Lima”. Em suma, tudo leva a crer que nesse caso foi Paulo quem assumiu a interlocução com o violonista, levando a cabo a incumbência de trabalhar na instrumentação da peça.

Até onde foi possível averiguar na discografia de Barbosa-Lima, esse arranjo não chegou a ser gravado, apesar do violonista ter prosseguido na trilha da obra jobiniana até seus últimos álbuns Delicado (Zoho, 2019) e El Manisero (GLM Music, 2021).

Todavia, o mais ambicioso projeto cogitado pelos dois artistas - a ideia de compor um concerto para violão e orquestra - infelizmente não se concretizou. As notícias sobre tal projeto nos chegam de modo fragmentário, por meio de alusões em entrevistas e cartas.

A primeira delas aparece já em 1983 - uma rápida menção ao fato de que os dois estão planejando um concerto para violão (Bobri 1983Bobri, Vladimir. 1983. “Spotlight on Antonio Carlos Jobim”. Guitar Review, New York, n. 55, 1-4, fall 1983., 4). Mais ou menos na mesma época, o jornalista Paul Magnussen pergunta quais os planos de Barbosa-Lima para o futuro próximo: “Estarei colaborando com Jobim. Estamos no processo de encomenda de uma obra para violão e orquestra, temos um patrocinador nos Estados Unidos". (Barbosa-Lima 1984Barbosa-Lima, Carlos. 1984. “Carlos Barbosa-Lima interviewed”. Entrevista concedida a Paul Magnussen. Disponível em: Disponível em: http://www.paulmagnussen.com/carlos-barbosa-lima-interview.html . Acesso em: 12/03/2023.
http://www.paulmagnussen.com/carlos-barb...
). O artigo de Hodel tampouco avança detalhes:

É certo que o próximo projeto de Jobim para violão está destinado a despertar grande interesse entre os entusiastas do violão. Ele está considerando seriamente escrever um concerto para violão e orquestra. ‘Carlos sugeriu isto’, diz ele [Jobim]. ‘É uma ideia perigosa, é um desafio, muito tentador. Em termos de realização de minhas antigas aspirações na música clássica, é um dos meus desejos mais autênticos - do fundo da alma. Carlos seria o intérprete ideal’ (Hodel 1985Hodel, Brian. 1985. “Antonio Carlos Jobim - Guitar Player”. Manuscrito do artigo (datilografado, sem data). Disponível em: Disponível em: https://www.jobim.org/jobim/handle/2010/8226 Acesso em: 20/05/2023. Também publicado em Classical Guitar. Gateshead, v. 3, n.7, p.19-21, march 1985.
https://www.jobim.org/jobim/handle/2010/...
).

O artigo se encerra com os simpáticos votos que certamente seriam endossados pelos leitores da revista: “Vamos torcer para que o disco Carlos Barbosa-Lima toca ‘Primeiro Concerto para Violão e Orquestra’, de Jobim esteja em breve disponível nas lojas” (Hodel 1985Hodel, Brian. 1985. “Antonio Carlos Jobim - Guitar Player”. Manuscrito do artigo (datilografado, sem data). Disponível em: Disponível em: https://www.jobim.org/jobim/handle/2010/8226 Acesso em: 20/05/2023. Também publicado em Classical Guitar. Gateshead, v. 3, n.7, p.19-21, march 1985.
https://www.jobim.org/jobim/handle/2010/...
).

As duas cartas de Barbosa-Lima para Tom que constam do acervo do Instituto Antonio Carlos Jobim (IACJ) contêm referências ao concerto22 22 Agradeço ao Instituto Antonio Carlos Jobim e a Jobim Music a permissão para acessar este material; agradeço também o acolhimento gentil e prestativo por parte de todos aqueles que trabalham no IACJ. . Na primeira delas, datada de 17/09/1983, o violonista explicita: “Agora estou entusiasmado com o projeto para você compor o Concerto para Violão e Orquestra, que tenho a certeza será de grande impacto no mundo musical”. Comenta a seguir o encontro com um amigo de Nova Jersey que, também entusiasmado, “(...) estabeleceu o plano da ‘comission’”. Fica evidente aqui a expectativa de Carlos, que já tomava as primeiras providências rumo à realização do projeto.

Mais de cinco anos depois, em missiva de 05/02/1989, Barbosa-Lima insiste na tentativa de animar o parceiro. Diz que está saindo para uma viagem de duas semanas e que teria gostado de conversar por telefone antes disso, “(...) pois estarei me encontrando com o Maestro Lorin Maazel em Pittsburgh e com os diretores da Pittsburgh Symphony esta semana, que estão interessados no projeto de estrear a sua futura obra para violão e orquestra”. Como se vê, Carlos não apenas continuava motivado com a ideia, como também chegou a acionar membros do “primeiro time” da música sinfônica americana para participar da empreitada.

Não há indícios do que Jobim pensava a este respeito - nem das respostas que deu a Carlos, nem das razões que dava a si mesmo para protelar ou desistir do projeto. Conversamos com alguns dos maiores conhecedores da obra e do acervo de Tom, como Paulo Jobim, Mario Adnet e Aluísio Didier: nenhum deles conhece ou ouviu falar de algum esboço ou fragmento dessa peça.

Um possível motivo para o adiamento e/ou abandono da proposta: na mesma época em que conheceu Barbosa-Lima, Jobim envolveu-se profissional e afetivamente com a montagem da Banda Nova, formada por amigos e familiares. Tendo estreado oficialmente em 1984, em seus dez anos de existência a Banda cumpriu uma intensíssima agenda de gravações, shows e tournées internacionais - Tom jamais viajara com tal frequência e recebera tantas homenagens mundo afora. Uma fase produtiva e prazerosa em virtude do clima de descontração que predominava no grupo (como atestam os registros audiovisuais dos animados ensaios caseiros). Ora, a escrita de um concerto é tarefa árdua - exige um tempo e uma concentração que o Maestro pode ter preferido dedicar às composições, sempre ao piano, de canções e curtas peças instrumentais que alimentaram o repertório da banda.

6. Conclusão: os mútuos benefícios de uma colaboração

A amizade entre os dois artistas permaneceu intacta; sabe-se que Barbosa-Lima almoçou com Tom e família em setembro de 1994 (Bellinati 1996Bellinati, Paulo. 1996. “Spider Monkeys”. Entrevista concedida a Luiz Roberto Oliveira. Disponível em: Disponível em: https://web.archive.org/web/20011205094127/http:/jobim.com.br/entrevistas/bellinati.html Acesso em: 25/05/2023.
https://web.archive.org/web/200112050941...
), pouco antes da morte do Maestro, e manteve os laços afetivos com a família Jobim (Barbosa-Lima 2012Barbosa-Lima, Carlos. 2012. “O violão no Brasil. The Guitar in Brazil”. Entrevista concedida ao Movimento Violão. Gravada em 24/04/2012. Disponível em: Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=tYw7AJA-_yY . Acesso em: 19/03/2023.
https://www.youtube.com/watch?v=tYw7AJA-...
). É de se lamentar que muito material importante para documentar esta relação tenha se perdido e/ou se encontre indisponível - os bastidores da gravação e a íntegra do programa da TV Manchete, por exemplo, ou os arquivos de Barbosa-Lima, dos quais, por enquanto, pouco se sabe.23 23 Uma rara referência aparece quando perguntado sobre publicações: “Eu sempre deixo tudo prontinho, já escrito, precisando de um mínimo de revisão. Eu tenho um amigo chamado Geof Foote que quer criar uma biblioteca com todo o material que eu escrevi, digitalizado (...). Muito desse material está em Porto Rico [então sua residência] guardado em envelopes, mas nos últimos anos eu comecei a espalhar muita coisa com os amigos (...)” (Barbosa-Lima 2009, 26).

O que se pode depreender da trajetória aqui reconstituída é que a colaboração entre Barbosa-Lima e Jobim foi benéfica para ambos em várias dimensões - profissional, artística e pessoal.

O violonista erudito conquistou espaço entre o público de jazz e música popular. Desde seu lançamento, o álbum CBL plays ACJ & GG foi bem sucedido. “O disco chegou às rádios de jazz e eles começaram a tocar - foi uma loucura. Pegou os dois mundos” (Barbosa-Lima 1999/2000Barbosa-Lima, Carlos. 1999/2000. “Entrevista com Carlos Barbosa-Lima”. Entrevista concedida a Fabio Zanon. Revista Violão Intercâmbio, n. 38, Ano VII, 18-21, nov/dez. 1999 (parte I); n. 39, Ano VIII, 23-27, jan/fev. 2000 (parte II); n. 40. Ano VII [sic], 21-26, mar/abr. 2000 (parte III)., 26). Também chamou a atenção da crítica, sendo alvo de resenhas elogiosas (Bobri 1983Bobri, Vladimir. 1983. “Spotlight on Antonio Carlos Jobim”. Guitar Review, New York, n. 55, 1-4, fall 1983.) - no episódio da TV Manchete Jobim se refere à “pilha de recortes” que Carlos juntou com as muitas matérias publicadas na imprensa norte-americana. O LP sedimentou a atuação de Carlos no terreno desse repertório híbrido ao qual se dedicou com afinco a partir de então. As gravações imediatamente posteriores (com obras de Luiz Bonfá & Cole Porter e Scott Joplin), bem como as demais de sua exitosa carreira, misturam temas da Broadway, Beatles e música caribenha com Ginastera e impressionistas europeus. O álbum O Boto - Works for Solo Guitar and Guitar & Orchestra (Concord Concerto, 1997) é um ótimo exemplo da versatilidade do violonista; contém obras de Haendel, Emilio Pujol, Castelnuovo-Tedesco, do porto-riquenho Ernesto Cordero e, com destaque no título, de Jobim.

Ao lado de Tom, Barbosa-Lima também teve oportunidade de tocar para grandes plateias (shows da Banda Nova em Nova York) e de ter seu trabalho divulgado para a audiência brasileira (programa da TV Manchete). A convivência próxima com aquele que considerava um dos grandes compositores mundiais transformou-se numa amizade da qual se envaidecia. Sem hesitação, afirma sobre seu encontro com Jobim: “Foi uma das experiências que eu reputo das mais importantes da minha vida” (Barbosa-Lima 2012Barbosa-Lima, Carlos. 2012. “O violão no Brasil. The Guitar in Brazil”. Entrevista concedida ao Movimento Violão. Gravada em 24/04/2012. Disponível em: Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=tYw7AJA-_yY . Acesso em: 19/03/2023.
https://www.youtube.com/watch?v=tYw7AJA-...
).

Para Jobim, o álbum de 1982Jobim, Antonio Carlos. 1982. “Contracapa”. In Carlos Barbosa-Lima plays the Music of Antonio Carlos Jobim & George Gershwin. Concord Concerto, CCD-42005, 1982/1990 (reedição ampliada). reforçou sua circulação nas rádios e imprensa americanas, agora sob nova e sofisticada roupagem instrumental. Barbosa-Lima também ampliou a penetração do compositor junto ao público erudito, bem como deu forte impulso à incorporação de suas peças ao repertório do violão de concerto24 24 Paulo Bellinati é outro grande violonista a incorporar a obra de Jobim ao violão de concerto, tendo gravado e publicado numerosos arranjos. Em 2022, lançou, em parceria com Daniel Murray, uma versão de Sinfonia da Alvorada para duo de violões. .

Além disso, ao nosso ver, a relação com o brujo promoveu um ganho lateral: o convívio estreito e o trabalho minucioso com um virtuose proporcionaram a Jobim uma experiência inédita com o violão. Barbosa-Lima era dono de um estilo solidamente fundamentado na técnica clássica e na abordagem polifônica do violão solo, uma combinação incomum nos círculos violonísticos que Tom frequentara. O mergulho conjunto nos arranjos - com a exploração dos idiomatismos, das variedades timbrísticas, das possibilidades e limites quanto ao desenvolvimento polifônico, das particularidades em relação ao piano... - tudo isso talvez tenha descortinado, para o maestro, novas dimensões do violão instrumental.

Em outras palavras, o encontro com Barbosa-Lima teria levado Jobim a refletir sobre este mundo sonoro tão singular, do qual sempre esteve, paradoxalmente, próximo e distante: próximo, porque desde cedo usou o instrumento para compor e se acompanhar; distante, porque nunca se considerou um violonista e foi ao piano que se notabilizou. Imagens sugestivas surgiram nesse contexto:

Adoro os horizontes do violão, a beleza panorâmica de suas criações. Felizmente, porém, não preciso ser o virtuoso que deve executar aquelas passagens intrincadas que fazem a música do violão voar alto. Sou, vamos dizer, um ornitólogo amador no que diz respeito ao violão. Adoro contemplar as diferentes espécies de canto dentro do mundo deste pequeno instrumento. No entanto, prefiro observar a criação de longe, com binóculos, por assim dizer, quando ela está alçando vôo (Bobri 1983Bobri, Vladimir. 1983. “Spotlight on Antonio Carlos Jobim”. Guitar Review, New York, n. 55, 1-4, fall 1983., 4).

Se lembrarmos da paixão de Jobim pelas aves, a metáfora se torna ainda mais significativa. Os sons emitidos por um violão virtuoso são como pássaros subindo aos céus: poesia do Maestro, ofício do bruxo.

7. Referências

  • Augusto, Sergio. 2002. “Biografia”. In Cancioneiro Jobim Editado por Paulo Jobim. 2ª ed. revista. Rio de Janeiro: Jobim Music.
  • Barbosa-Lima, Carlos. 1982. Carlos Barbosa-Lima plays the Music of Antonio Carlos Jobim & George Gershwin Concord Concerto, CCD-42005, 1982/1990 (reedição ampliada).
  • Barbosa-Lima, Carlos. 1983. “An interview with Carlos Barbosa-Lima”. Entrevista concedida a Brian Hodel. Classical Guitar, Gateshead, v.1, n.5, 48-49, may/june 1983.
  • Barbosa-Lima, Carlos. 1984. “Carlos Barbosa-Lima interviewed”. Entrevista concedida a Paul Magnussen. Disponível em: Disponível em: http://www.paulmagnussen.com/carlos-barbosa-lima-interview.html Acesso em: 12/03/2023.
    » http://www.paulmagnussen.com/carlos-barbosa-lima-interview.html
  • Barbosa-Lima, Carlos, e Sharon Isbin. 1987. Carlos Barbosa-Lima & Sharon Isbin - Brazil with Love Concord Picante, CCD-4320.
  • Barbosa-Lima, Carlos. 1993. Antonio Carlos Jobim 9 pieces arranged for solo guitar by Carlos Barbosa-Lima San Francisco: GSP.
  • Barbosa-Lima, Carlos. 1999/2000. “Entrevista com Carlos Barbosa-Lima”. Entrevista concedida a Fabio Zanon. Revista Violão Intercâmbio, n. 38, Ano VII, 18-21, nov/dez. 1999 (parte I); n. 39, Ano VIII, 23-27, jan/fev. 2000 (parte II); n. 40. Ano VII [sic], 21-26, mar/abr. 2000 (parte III).
  • Barbosa-Lima, Carlos. 2009. “Carlos Barbosa-Lima”. Entrevista concedida a Eugênio Reis. Revista Digital BGM (Brazilian Guitar Magazine), n. 8, 20-28, maio 2009.
  • Barbosa-Lima, Carlos. 2012. “O violão no Brasil. The Guitar in Brazil”. Entrevista concedida ao Movimento Violão. Gravada em 24/04/2012. Disponível em: Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=tYw7AJA-_yY Acesso em: 19/03/2023.
    » https://www.youtube.com/watch?v=tYw7AJA-_yY
  • Bellinati, Paulo. 1996. “Spider Monkeys”. Entrevista concedida a Luiz Roberto Oliveira. Disponível em: Disponível em: https://web.archive.org/web/20011205094127/http:/jobim.com.br/entrevistas/bellinati.html Acesso em: 25/05/2023.
    » https://web.archive.org/web/20011205094127/http:/jobim.com.br/entrevistas/bellinati.html
  • Bobri, Vladimir. 1983. “Spotlight on Antonio Carlos Jobim”. Guitar Review, New York, n. 55, 1-4, fall 1983.
  • Cabral, Sergio. 1997. Antônio Carlos Jobim - uma biografia 2ª ed. Rio de Janeiro: Lumiar editora.
  • Castagna, Paulo, e Werner Schwarz. 1993. “Uma bibliografia do violão brasileiro 1916-1990”. Revista Música, São Paulo, vol.4, n.2, 190-218.
  • Castro, Ruy. 2017. “Dois gênios com tanto em comum - e em incomum”. In A onda que se ergueu no mar - novíssimos mergulhos na Bossa Nova 2ª ed. revista e ampliada. São Paulo: Companhia das Letras.
  • Duarte, Luiz. 2010. “Os arranjos de Claus Ogerman na obra de Tom Jobim: revelação e transfiguração da identidade da obra musical”. Dissertação de mestrado. Departamento de Música da Universidade de Brasília (UnB).
  • Hodel, Brian. 1985. “Antonio Carlos Jobim - Guitar Player”. Manuscrito do artigo (datilografado, sem data). Disponível em: Disponível em: https://www.jobim.org/jobim/handle/2010/8226 Acesso em: 20/05/2023. Também publicado em Classical Guitar. Gateshead, v. 3, n.7, p.19-21, march 1985.
    » https://www.jobim.org/jobim/handle/2010/8226
  • Jobim, Antonio Carlos. 1982. “Contracapa”. In Carlos Barbosa-Lima plays the Music of Antonio Carlos Jobim & George Gershwin Concord Concerto, CCD-42005, 1982/1990 (reedição ampliada).
  • Jobim, Antonio Carlos. 1987. “Contracapa”. In Carlos Barbosa-Lima & Sharon Isbin - Brazil with Love Concord Picante, CCD-4320.
  • Kayath, Marcelo. 2009. “Violão: pequena orquestra ou grand piano?” Fórum do Violão (www.violao.org). Disponível em: Disponível em: https://violao.org/topic/6480-violao-pequena-orquestra-ou-grand-piano/ Acesso em: 26/04/2023.
    » https://violao.org/topic/6480-violao-pequena-orquestra-ou-grand-piano/
  • Motta, Daniel. 2012. “‘Quadros de uma exposição’ para violão solo por Kazuhiro Yamashita”. Dissertação de mestrado. Instituto de Artes da Universidade Estadual Paulista (Unesp).
  • Nobile, Lucas. 2018. Raphael Rabello - o violão em erupção São Paulo: editora 34.
  • Santos, Nélson Pereira, dir. 1984. A música segundo Tom Jobim Série em 4 episódios. São Paulo, TV Manchete. Disponível em: Disponível em: https://www.jobim.org/jobim/handle/2010/8248 Acesso em: 20/04/23.
    » https://www.jobim.org/jobim/handle/2010/8248
  • Schudel, Matt. 2022. “Carlos Barbosa-Lima, virtuoso Brazilian guitarist, dies at 77”. The Washington Post (26/2/2022). Disponível em: Disponível em: https://www.washingtonpost.com/obituaries/2022/02/26/brazilian-guitarist-barbosa-lima-dies/ Acesso em: 24/04/23.
    » https://www.washingtonpost.com/obituaries/2022/02/26/brazilian-guitarist-barbosa-lima-dies/
  • Small, Marc. 2018. “Artful Arrangement: Carlos Barbosa-Lima, Manuel Barrueco, Bill Kanengiser, and David Russel. On Translating Pieces to the Guitar”. Classical Guitar, Gateshead, spring 2018. Disponível em: Disponível em: https://classicalguitarmagazine.com/artful-arrangement-carlos-barbosa-lima-manuel-barrueco-bill-kanengiser-and-david-russell-on-translating-pieces-to-the-guitar/ Acesso em: 25/04/23.
    » https://classicalguitarmagazine.com/artful-arrangement-carlos-barbosa-lima-manuel-barrueco-bill-kanengiser-and-david-russell-on-translating-pieces-to-the-guitar/
  • 1
    Essas gravações juvenis foram reunidas e relançadas pela Zoho Music em 2015 e 2016 com o título The Chantecler Sessions vol. 1 (1958-1959) e vol. 2 (1960-1961).
  • 2
    Um extenso comentário sobre esta peça - sua história, intenções e influências - pode ser encontrado na terceira parte da entrevista concedida por Barbosa-Lima a Fabio Zanon (Barbosa-Lima 1999/2000Barbosa-Lima, Carlos. 1999/2000. “Entrevista com Carlos Barbosa-Lima”. Entrevista concedida a Fabio Zanon. Revista Violão Intercâmbio, n. 38, Ano VII, 18-21, nov/dez. 1999 (parte I); n. 39, Ano VIII, 23-27, jan/fev. 2000 (parte II); n. 40. Ano VII [sic], 21-26, mar/abr. 2000 (parte III).).
  • 3
    Cf. obituário assinado por Matt SchudelSchudel, Matt. 2022. “Carlos Barbosa-Lima, virtuoso Brazilian guitarist, dies at 77”. The Washington Post (26/2/2022). Disponível em: Disponível em: https://www.washingtonpost.com/obituaries/2022/02/26/brazilian-guitarist-barbosa-lima-dies/ Acesso em: 24/04/23.
    https://www.washingtonpost.com/obituarie...
    no The Washington Post (26/2/22) cuja principal fonte foi Larry del Casale - violonista com quem Barbosa-Lima trabalhou em duo entre 2003 e 2015.
  • 4
    Radamés Gnattali, João Pernambuco e Paulo Bellinati estão dentre os compositores da música instrumental brasileira gravados a partir de final dos anos 1980.
  • 5
    Em suas manifestações, tanto Barbosa-Lima quanto Jobim empregam os termos “transcrição” e “arranjo” de modo genérico e intercambiável.
  • 6
    Cf. capítulo 2 da dissertação de Daniel Motta (2012Motta, Daniel. 2012. “‘Quadros de uma exposição’ para violão solo por Kazuhiro Yamashita”. Dissertação de mestrado. Instituto de Artes da Universidade Estadual Paulista (Unesp).).
  • 7
    Cf. disponível em: https://youtu.be/V2zZl7Vifzw
  • 8
    O alemão Claus Ogerman (1930-2016) foi o maestro que mais trabalhou com Jobim, tendo sido o responsável pelos arranjos de sete discos entre 1963 e 1980. Compositor e pianista, Tom o descreve em carta ao filho Paulo (outubro de 1975): “Claus toca jazz no piano paca, tem bossa paca, (...). Claus é o Rei do Swing, só você vendo, não dá pra acreditar! É um Donato alemão”(Augusto 2002Augusto, Sergio. 2002. “Biografia”. In Cancioneiro Jobim. Editado por Paulo Jobim. 2ª ed. revista. Rio de Janeiro: Jobim Music., 122). Para um estudo detalhado da relação Ogerman/Jobim, ver Luiz Duarte (2010Duarte, Luiz. 2010. “Os arranjos de Claus Ogerman na obra de Tom Jobim: revelação e transfiguração da identidade da obra musical”. Dissertação de mestrado. Departamento de Música da Universidade de Brasília (UnB).).
  • 9
    A propósito das afinidades entre Jobim e Gershwin, cf. Castro 2017Castro, Ruy. 2017. “Dois gênios com tanto em comum - e em incomum”. In A onda que se ergueu no mar - novíssimos mergulhos na Bossa Nova. 2ª ed. revista e ampliada. São Paulo: Companhia das Letras..
  • 10
    Vale uma nota sobre este articulista que conheceu e se correspondeu com Jobim, e que tentamos (sem sucesso) localizar. Nascido em 1948, Brian Hodel tornou-se especialista em música brasileira e latino-americana para violão. Foi compositor, arranjador, violonista e professor (Univ. de Washington). Colaborador assíduo de revistas especializadas, Hodel publicou pelo menos 16 artigos sobre violão brasileiro na década de 1980 (Castagna e Schwarz 1993Castagna, Paulo, e Werner Schwarz. 1993. “Uma bibliografia do violão brasileiro 1916-1990”. Revista Música, São Paulo, vol.4, n.2, 190-218.). Editou também dois álbuns de partituras com seus arranjos para violão solo: The Brazilian Masters: the Music of Jobim, Bonfá and Baden Powell arranged for Solo Guitar (1981) e The Brazilian Guitar (1983).
  • 11
    Registrado como Rafael, a partir de 1991 Rabello passa a assinar Raphael. Talvez para atender ao desejo original de sua mãe, talvez por ser uma grafia mais compatível com o mercado internacional, fato é que o “ph” tornou-se definitivo (Nobile 2018Nobile, Lucas. 2018. Raphael Rabello - o violão em erupção. São Paulo: editora 34., 222).
  • 12
    Os elogios mútuos são reproduzidos no livro de Sergio Cabral. Para Raphael, “a música de Tom é popular na forma, mas a técnica de composição e harmonização é erudita. Tom é um arquiteto musical”. Segundo Tom, “tudo que Rafael faz é sensacional. Ele é um gênio do violão, um cometa musical, desses que aparecem uma vez a cada século” (Cabral 1997Cabral, Sergio. 1997. Antônio Carlos Jobim - uma biografia. 2ª ed. Rio de Janeiro: Lumiar editora., 421). Para detalhes da relação entre eles, ver Lucas Nobile (2018)Nobile, Lucas. 2018. Raphael Rabello - o violão em erupção. São Paulo: editora 34., especialmente capítulo 10.
  • 13
    Vale a pena examinar o conjunto dessas partituras; o álbum integral, em formato PDF, encontra-se disponível em sites da internet.
  • 14
    O mesmo diretor reaproveitou esse título para batizar seu documentário, de 2012, sobre a obra de Jobim.
  • 15
    Está disponível no site do IACJ uma edição com 2:47:47 de duração: https://www.jobim.org/jobim/handle/2010/8248. O episódio com Barbosa-Lima tem início em 2:05:43.
  • 16
    Sharon Isbin (1956 -), célebre violonista americana, transita com igual desenvoltura entre a música clássica e a popular. Aluna de Segovia, fundadora do Departamento de violão da Julliard School, ganhadora de vários Grammys, apresenta-se com as principais orquestras do mundo e lançou mais de trinta e cinco álbuns com todo tipo de repertório. Com Barbosa-Lima gravou ainda Rhapsody in Blue/West Side Story (Concord Concerto, 1988).
  • 17
    Este outro selo da Concord, criado em 1980, destinava-se a abrigar o melhor do Latin jazz - rótulo que agrupa os mais diversos ritmos afro-caribenhos e brasileiros.
  • 19
    Nessa época Barbosa-Lima integrava o conselho editorial da Guitar Review, para a qual contribuía assiduamente como crítico de violão, resenhando concertos e lançamentos fonográficos.
  • 20
    Respectivamente indexados como jobim.org/jobim/handle/2010/4458 e jobim.org/jobim/handle/2010/4459.
  • 21
    Respectivamente indexados como jobim.org/jobim/handle/2010/4414 e jobim.org/jobim/handle/2010/8000.
  • 22
    Agradeço ao Instituto Antonio Carlos Jobim e a Jobim Music a permissão para acessar este material; agradeço também o acolhimento gentil e prestativo por parte de todos aqueles que trabalham no IACJ.
  • 23
    Uma rara referência aparece quando perguntado sobre publicações: “Eu sempre deixo tudo prontinho, já escrito, precisando de um mínimo de revisão. Eu tenho um amigo chamado Geof Foote que quer criar uma biblioteca com todo o material que eu escrevi, digitalizado (...). Muito desse material está em Porto Rico [então sua residência] guardado em envelopes, mas nos últimos anos eu comecei a espalhar muita coisa com os amigos (...)” (Barbosa-Lima 2009Barbosa-Lima, Carlos. 2009. “Carlos Barbosa-Lima”. Entrevista concedida a Eugênio Reis. Revista Digital BGM (Brazilian Guitar Magazine), n. 8, 20-28, maio 2009., 26).
  • 24
    Paulo Bellinati é outro grande violonista a incorporar a obra de Jobim ao violão de concerto, tendo gravado e publicado numerosos arranjos. Em 2022, lançou, em parceria com Daniel Murray, uma versão de Sinfonia da Alvorada para duo de violões.
  • 18
    Mais uma amostra da oscilação na nomenclatura transcrição/arranjo.

Editor de Seção Editor:

Fernando Chaib

Editor de Layout:

Fernando Chaib

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    07 Jun 2024
  • Data do Fascículo
    2024

Histórico

  • Recebido
    10 Jan 2024
  • Aceito
    07 Abr 2024
  • Publicado
    08 Maio 2024
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