Resumo
Este artigo apresenta uma pesquisa com docentes de redes públicas de ensino da Região Sudeste do Brasil, tendo a docência como objeto de análise. Dessa forma, objetivou-se pensar modos de fazer educação por meio do método biografemático, inspirado na formulação de Roland Barthes sobre biografemas. Foram realizadas entrevistas remotas e os relatos indicam a relevância de narrar histórias, colocando-as em diálogo para repensar práticas docentes. O ato de narrar favorece o ato de pensar e, ao exercitar o pensamento, força a experiência a se recriar, reposicionando os docentes em suas práticas e possibilitando, assim, a invenção de outros modos de ser ensinante.
Palavras-chave Política educacional; Trabalho docente; Biografemas
Resumen
Este artículo presenta una investigación con profesores de escuelas públicas de la región sureste de Brasil, basada en la enseñanza. Así, el objetivo fue pensar formas de hacer educación a partir del método biografemático, inspirado en la formulación de Roland Barthes sobre los biografemas. Se realizaron entrevistas en línea y los informes resultantes indican la pertinencia de narrar historias, poniéndolas en diálogo para repensar las prácticas docentes. El acto de narrar favorece el acto de pensar y, al ejercitar el pensamiento, obliga a recrear la experiencia, reposicionando a los docentes en sus prácticas y posibilitando así la invención de otras formas de ser docente.
Palabras clave Política educativa; Trabajo docente; Biografemas
Abstract
This article presents a research with teachers from public schools in the Southeastern region of Brazil, having teaching as object of analysis. Thus, it aimed to think about ways of doing education based on the biographematic method, inspired by Roland Barthes’ formulation on biographemes. The online interviews were conducted and the resulting reports indicate the relevance of narrating stories, putting them in dialogue to rethink teaching practices. The act of narrating favors the act of thinking and, by exercising thought, forces the experience of recreating oneself, repositioning teachers in their practices and thus enabling the invention of other ways of being a teacher.
Keywords Educational politics; Teaching work; Biographemes
Como começam as coisas?
As coisas não estão sempre já dadas, não se dão por anterioridade, mas por meio de um inusitado, de uma surpresa que se atualiza em uma porção do tempo. O presente, sempre que chega, nos surpreende, pois nos escapa e não está à nossa espera. Escorrega, foge, é intempestivo. A imprevisão é seu destino. Pesquisar o presente foi o desafio. Percursos foram tecidos, assumindo-se uma postura de pesquisa como um lembrar do que nunca soubemos (Rosa, 1993), à espreita dos acontecimentos. Traçar biografemas (Barthes, 1984, 2003, 2005; Costa, 2021) de vidas de professores(as) de redes públicas de ensino no Sudeste Brasileiro foi o objetivo. Buscamos dar visibilidade ao gesto pedagógico-filosófico (Ramírez, 2009) atualizado por ensinantes, o qual se expressa mais na forma de trabalhar e menos no resultado do trabalho; que privilegia menos a transmissão de conhecimento e mais a maneira de fazer, investigar, pensar os exercícios que se faz sobre si (Foucault, 2007). A atividade de ensino não teria sentido se não lhe atribuíssemos uma declaração visível e/ou audível, uma prestação de contas do que se está fazendo (Foucault, 2000). É esse o gesto que constitui uma educação pública, uma rede pública de ensino: publicizar o que se sabe e o que pesquisa um ensinante.
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Nosso propósito foi tecer em palavras experiências, gestos pedagógicos-filosóficos-públicos e entrelaçar linhas que foram se desenhando no percurso, acompanhando a processualidade incessante e ininterrupta de acontecimentalização da pesquisa. Um jogo foi jogado no caminho sempre inesperado, costurado no entre da conversa, acionando um saber que não se sabe, pois não é prévio ao próprio gesto de pesquisar. Uma pesquisa que transborda. Não é possível contê-la em moldes apriorísticos. Como ela começa? Ela tem começo?
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Aqui será exposta uma experiência pautada numa diligência modesta que é “deslocar-se, abjurar, se necessário” (Barthes, 2013, p. 28).
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O método? Vem a título de procedimento, sem visar produzir deciframentos ou apresentar resultados definitivos e inquestionáveis. Busca descartar discursos instituídos e é justo dizer que é também uma ficção. Nosso intuito é sustentar um discurso fugindo das armadilhas das estratégias fascistas que não proíbem, mas nos põem a falar (Barthes, 2013). Uma língua se define menos pelo que permite ou proíbe e muito mais pelo que obriga a dizer. Toda palavra é palavra de ordem (Deleuze & Guattari, 1996), mas é possível, talvez, enganar a língua e aliar o saber a certo sabor, forjando uma liberdade e um discurso fora do poder e de suas relações. Pesquisas como prática de escrever partem de um tipo de semiologia que vislumbra indicar formas usuais de se enunciar a realidade. A meta foi se aproximar de um bordado de correlações não impositivas que tecem a educação hoje. Um “jogo com os signos”, um deslocar-se, estar onde não se é esperado, abjurar, evitando-se a utilização da língua pelo poder, a qual transforma signos em senso comum (Barthes, 2013). O empreendimento metodológico assumiu, assim, que a produção de dados não se efetivou de forma neutra e desinteressada, como uma coleta de dados puros e sólidos, fixos, e sim como elementos que desvanecem. Um método que tenta fugir das besteiras (Deleuze, 1987) que dificultam conexões, derivas, criação de modos outros de vida. A opção foi por um método desviante (Gagnebin, 2006a), que não está vinculado a qualquer escola ou modelo prévio. É, antes, laborioso trabalho em um si que são outros e que não teme os desvios, não teme a errância. Projetos de pesquisa são esboços utópicos do percurso de uma problemática, de forma que o tempo não seja reduzido à sua dimensão chronos – tempo linear que induz a uma equivocada ideia de causalidade –, mas acolha também aiôn, criação de novidade e, “sobretudo, ‘kairós’, tempo oportuno, da ocasião que se pega ou se deixa, do não previsto e do decisivo” (Gagnebin, 2006a, p. 1). Quando algo acontece no percurso investigativo, isso pode ser subitamente uma efetiva questão, aí vale a pena demorar; parar; dar um tempo; descrever o impasse e perceber que algo está começando a ser gestado e não sabemos como o nomear. Um pesquisar que não teme perder tempo, tampouco ganha tempo (Gagnebin, 2006a, p. 1).
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Uma pesquisa em transformação, em franca dimensão impessoal, fabrica uma experiência mutante, com desvios; forja estratégias narrativas cujo objetivo não é sujeição, mas trapaças com a língua: “Essa trapaça salutar, essa esquiva, esse logro magnífico que permite ouvir a língua fora do poder, no esplendor de uma revolução permanente da linguagem” (Barthes, 2013, p. 27).
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Pesquisa-experiência, como viagem incerta, perigosa, não pretende condizer fielmente com o que se passou: “e que eu diga isso ou aquilo ou outra coisa, na verdade pouco importa. Dizer é inventar” (Beckett, 2014, p. 113). Uma experiência percorre, atravessa uma região durante uma viagem, é um modo de relação que se abre à dimensão do comum. E a narração é o modo como a transmissão dessa experiência se efetiva. O propósito foi evitar tomar a experiência dos docentes que participaram do processo como circunscrita à dimensão do privado, do particular, o que poderia acarretar um fechamento sobre esse particular (Gagnebin, 2006b). Nesse último caso, a narração passa a ser enunciada por meio de pronomes possessivos: “suas experiências inefáveis, seus sentimentos, suas mulheres, seus filhos, sua casa e seus objetos pessoais” (Benjamin, 1983, p. 51). Privilegiamos um tipo de narrar ‘‘como um catador de migalhas, um trapeiro, um catador de lixo que recolhe os cacos, não para transmitir qualquer totalidade, mas apenas os fragmentos recolhidos durante sua breve existência (Gagnebin, 2006b, p. 53).
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“Na verdade, experiência é matéria da tradição, tanto na vida privada quanto na coletiva. Forma-se menos com dados isolados e rigorosamente fixados na memória do que com dados acumulados, e com frequência inconscientes, que afluem à memória” (Benjamin, 2000, p. 103).
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Experiências são transformadoras (Foucault, 1987), são “modos pelos quais . . . seres humanos tornaram-se sujeitos” (Dreyfus & Rabinow, 1995, pp. 231-232) e têm por foco os modos de subjetivação, a ética, os modos de governamentalidade, além de expressarem uma trama de discursos e práticas por meio dos quais se dá forma àquilo que somos. Atentamos para condições concretas que favorecem a conformação de um singular modo de experiência histórica, de uma certa subjetividade. Uma pesquisa que partiu de situações concretas, de experiências ético-políticas de um devir-outro
. . . ao mesmo tempo próxima de nós, mas diferente de nossa atualidade, . . . a orla do tempo que cerca nosso presente, que o domina e que o indica em sua alteridade; é aquilo que fora de nós nos delimita, fazendo com que o outro e o externo se manifestem com evidência
(Foucault, 1987, pp. 150-151).
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“Cada vez que tentei fazer um trabalho teórico, foi a partir de elementos de minha própria experiência . . . que eu via se desenvolverem em torno de mim. . . . Foi porque acreditei reconhecer nas coisas que via, nas instituições com que me ocupava, em minhas relações com os outros, fissuras, abalos surdos, disfunções, que empreendi esse trabalho – algum fragmento de autobiografia” (Foucault, 1994, p. 82).
Os (in)começos de uma pesquisa: uma incerteza de verdade
O projeto de trabalho emergiu de um campo problemático que teve como cenário a pandemia do covid-19 em 2020 no Brasil. Com práticas de distanciamento físico, as aulas foram canceladas tanto nas universidades quanto nas escolas de ensino fundamental. Surgiram inúmeras reuniões online para continuarmos a tarefa de gestão do trabalho educacional. Iniciava-se um período de incertezas e indeterminações, estávamos vivendo a pandemia – palavra cuja etimologia grega remete àquilo “que se coloca sobre o povo” (Amador & Barros, 2020). Tal situação configurou-se apenas como um dos tantos cenários das problemáticas contemporâneas no que tange ao trabalho docente, uma vez que vivemos um desinvestimento na educação pública, em diferentes dimensões. Pensar os efeitos da pandemia nos mundos do trabalho na educação emergiu como um campo problemático importante.
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Como as coisas começam?
O trabalho de Roland Barthes (1977, 1984, 1998, 2003, 2005) sobre biografemas nos animou no propósito de provocar educadores(as) a narrarem suas experiências, na qualidade de estratégia de intervenção no presente distópico, pois escrever-narrar-ler produz formas outras de viver. Barthes forja a expressão biografema como pormenores, gostos, inflexões de um sujeito e volta-se para a mobilidade do viver fora de qualquer destino, o que poderá, então, contagiar algum corpo futuro. Nesse sentido, o biografema é um conceito que visa expressar espaços vazios, “uma vida esburacada . . . como um filme, à moda antiga, no qual não há palavras e cujo fluxo das imagens é entrecortado, como soluços, pelo escrito do intertítulo, a irrupção desenvolta de um outro significante” (Barthes, 2005, p. 17). Biografema toma algo da vida do biografado transformando-o em signo. Não tem a função de representar esse algo a partir de um quadro de possibilidades já dadas (Deleuze & Parnet, 2004), mas diz respeito a perceptos e afectos – fábrica criadora, expressa encontros que constituem uma vida. Uma pesquisa biografemática (Barthes, 1984) engendra uma perspetiva fragmentária do sujeito e procura encontrar elementos-chave-de-vida que ultrapassam a vida do sujeito. O objetivo desta pesquisa foi o de explorar traços biográficos das(os) profissionais da educação que pudessem nos encantar como uma bela fotografia. Tomados como fragmentos, biografemas iluminam detalhes e são uma escrita centrada não no eu, não no outro, e sim numa vida (Deleuze, 2002).
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O ato de narrar favorece o ato de pensar e, ao exercitar o pensamento, força a pensar o que vai se criando no curso da experiência. A biografia, às vezes, pretende ser expressão fiel da vida, o que consideramos um processo impossível e sobretudo indesejável. O material biográfico, processado no ato de narrar, torna-se outra coisa quando busca simplesmente expressar o vivido, num movimento de invenção de si que vai se fazendo como outramento. Lança os sujeitos a interferências múltiplas e eles se deslocam, se reposicionam, vão se constituindo como criadores, fabuladores de realidade. Biografemar foi estratégia para pensar vidas de professores(as) abertas à possibilidade de criação do dito e do vivido. Dizer é inventar. Inventar outros modos de ser ensinante.
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Professoras de uma rede pública de ensino fundamental e um professor universitário foram convidados(as) a participar do processo, que foi deslanchado com a leitura de artigos sobre a temática dos biografemas (Costa, 2021), seguida de um debate sobre a proposta metodológica.
Encontros agendados, a ideia era compor biografemas por meio de conversas online e de troca de cartas.
Aquele que escreve cartas assina e ausenta-se, num desaparecimento ativo que é, também, o desejo da partilha de um segredo, daquilo que lhe é mais próprio – o que há é um papel selado que, pelo enigma, lança-se às leituras e convida à resposta. Isso não significa necessariamente uma ode à intimidade, nem a obrigação da confissão, mas a afirmação da escrita como o inapropriável
(Fenati, 2012, p. 32).
O destino das cartas é partir e, ao endereçá-las, escapar aos limites de um eu, diferir em relação ao outro. Nesse jogo, temos uma dupla indeterminação decisiva: apagamento da origem e incerteza do destino.
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Muitos pontos das histórias se encontraram: experiência com racismos, machismos, solidão, tristeza, mas também alegria e força para enfrentamentos de um cotidiano perverso. Buscar respostas para cada vida não interessava, menos ainda procurar pacotes que prometem salvação. A ideia era “produzir vidas na vida que foi e que, ao ser olhada para além da mera visão sensorial, faz-se presente pelo que ela nos instiga a falar de nós próprios” (Fonseca & Costa, 2010, p. 14).
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Vamos falar de Dressa, NegraHelô e Carlos. Falar com elas(es). Infames (Foucault, 2003) de nossos tempos?
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Escrever com as vidas que não são nossas, não por obrigação ou encomenda, mas por um desejo, é a pista que o método biografemático nos oferece. É, sobretudo, uma pesquisa daquilo que incide na vida, a faz proliferar, e que investe no que acaba se deixando atrair. A escritura do resultante da pesquisa ocorreu na forma de fragmentos e, assim, o biografemático se fez, também, biofragmêntico. A ordenação escolhida não obedeceu a nenhuma exigência a priori. Poderia ser outra. Poderiam ser várias. O que nos inspirou foram as vidas que nos contaram.
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Fragmentos arrastam consigo o incômodo da incompletude e podem gerar desconforto (Preciosa, 2010). Pensamentos fragmentários não asseguram uma exposição evidente de um percurso metodológico específico. “Um texto fracionado, aos pedaços, insiste em ir ao encontro do que é episódico, descontínuo, dissipatório, efervescente, quase informe” (Preciosa, 2010, p. 23), o que pode frustrar alguns. “Entretanto, se acolhido, o fragmento pode nos surpreender. . . . Nele prevalece o entusiasmo pelos agregados de sentido que vão despontando pela urgência mesmo de existirem” (Preciosa, 2010, p. 23). Texto biofragmêntico, uma aposta.
Dressa
Superfície, Derivas, Fronteiras
Ouvir as histórias de vida despida(s) de (pré)conceitos, não buscar equilíbrio e racionalidade, tampouco coerência, livrar-nos do jaleco-branco-asséptico em nós, destituir-nos de vontades de verdade ou de completude nem sempre é uma tarefa fácil. Mas essa foi a aposta.
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Entre cinco irmãos, Dressa era a única que tinha “a cor da pele diferente”, pele escura, e sempre demostravam essa diferença nas brincadeiras: cabelo de bombril, pretinha que foi achada no lixo, neguinha pixaim. Dressa descreve um sentimento de desassossego em relação a esses comentários. Mas por que isso a perturbava? “Internalizei a imagem de que para ser ‘bonita’ e aceita pelos meus irmãos eu precisava alisar o meu, pois entendia que meu cabelo não era bonito como o que se vê nas revistas, nas prateleiras de lojas de cosméticos”. A família insistia: “Por que você não alisa seu cabelo? amarra esse cabelo que ele está muito volumoso, conheço produtos bons que podem melhorar isso aí. Me sentia ‘inferior’, tinha vergonha do meu cabelo, da minha pele. Chorava e me perguntava: por que eu nasci assim? O que eu fiz para merecer esse castigo?” (Relato de Dressa). “Castigo” experimentado em silêncio, na solidão da vergonha. Não tinha língua para nomear essa situação, só mais tarde começa a nomeá-la: RACISMO.
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Dressa, olhos brilhantes, postura altiva. Cabelos enrolados, presos no alto da cabeça. “Obrigada por esse convite! Faz toda diferença ter alguém que possa escutar minha história”, diz com voz firme.
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Mineira, 34 anos, filha de mãe solo, empregada doméstica, vida marcada pela pobreza. Fazia malabarismo para enfrentar os desafios cotidianos. “Vivemos numa sociedade marcada pela desigualdade... minha mãe sofreu as mazelas de ser mulher em uma sociedade machista, sexista, excludente e racista” (Relato de Dressa). Vida em bairro periférico, aluna de escola pública. “Encontrei, ao longo do caminho, todas as dificuldades de uma menina negra, inserida em um ambiente de extrema desigualdade social (Relato de Dressa)”. Mãe solo, como uma equilibrista, dançava na corda bamba e em cada passo dessa linha podia se machucar, mas a esperança é equilibrista, a esperança dança na corda bamba e sabe que o show deve continuar (Blanc & Bosco, 1979)4.
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Hoje, Dressa, diferentemente de sua mãe, equilibra-se não para enfrentar uma ditadura cívico- militar institucionalizada, mas um fascismo contemporâneo, que tem se expressado em diferentes formas de racismo e misoginia. Facetas, apenas algumas, de um fascismo que se multiplica em proporções geométricas no tecido social brasileiro: bancada do boi, da bíblia e da bala nas duas casas legislativas, índices fundamentais da retomada – ou da constância – do fascismo entre nós (Ferreira et al., 2022), para além da chefia de governo. Fascismo marcado, sim, por um Estado de pretensões totalitárias, mas, principalmente, como fluxo cotidiano e impessoal de modos de existência. Fascismo micropolítico, “inseparável de focos moleculares, que pululam e saltam de um ponto a outro, em interação” (Deleuze & Guattari, 1996, p. 92). Fascismo que se faz, portanto, também como microfascismo.
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Kilomba assinala: “Uma mulher negra diz que ela é uma mulher negra. Uma mulher branca diz que ela é uma mulher. Um homem branco diz que é uma pessoa.” (Mostra Internacional de Teatro de São Paulo, 2016).
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Aos 13 anos, trabalhou também como doméstica, cuidando da casa de uma senhora. [...] Chego a pensar que estive em um trabalho análogo à escravidão − a menina preta, a menina escrava, a menina explorada pelo racismo e capitalismo. Joana pula no seu colo no meio da conversa. Quem é essa, mamãe?
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A mãe a incentivou a estudar. “Você é linda, filha!!! Não alise seu cabelo”. Dressa vai tecendo uma trajetória. Universidade pública. . . . um novo desafio. Foram muitos os obstáculos. Mas . . . “ um orgulho para minha mãe: sua filha preta agora era universitária” (Relato de Dressa).
Na universidade, participou das políticas de ação afirmativa. Fazer parte desses grupos viabilizou um reposicionamento subjetivo: orgulho de ser negra. Trajetória na universidade marcada por estudos da cultura de maneira multidisciplinar. Racismo? Vergonha? Castigo? Começa a feitura de outros mundos: Comecei a me enxergar como NEGRA. Cabelos não mais alisados – gesto revolucionário, afirma. Como tornar-se Negra? Não se nasce mulher negra, torna-se – inflexão importante nas palavras de Beauvoir.
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Quando Joana adormece, tenta dar conta das leituras propostas na universidade. Logo adormece também. Corpo cansado. Sonha com professoras e professores. Sonha que seus sonhos caberiam num mundo que ela cria insistentemente. Os sonhos a impulsionam. Nos sonhos, podemos mudar constantemente de lugar e ângulo.
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Ergue a voz. Não se define um lugar para nós, mulheres negras, exclusivamente no âmbito do Direito. Dressa narra suas próprias histórias não como outridades do universal, mas como participante de uma humanidade multiversa. A sabedoria de sua mãe a encanta. Seus olhos brilham, sua voz se altera sempre que fala dela. A sabedoria da mãe emerge da conjunção de um ontem, de um hoje e do porvir. A narrativa de Dressa reúne (re)existência e um esperançar.
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Entre os encontros dialogados – saberes e fazeres populares e a academia –, vai afirmando e potencializando aspectos socioculturais das comunidades populares. Nasce uma função: formar-transformar existências jovens, principalmente a minha – afirma com um sorriso aberto no rosto. Imersão nos processos formativos-inventivos de professoras e professores, formação de jovens de comunidades periféricas e, principalmente, sua (form)ação, um tornar-se outra: tornar-se uma mulher, tornar-se negra. Traça caminhos; os obstáculos não são impedimento, mas fatores de propulsão. Equilibrista como sua mãe, sabe que o show deve continuar.
A voz da minha filha/recorre todas as nossas vozes/recolhe em si/as vozes mudas caladas/engasgadas nas gargantas. A voz de minha filha/recolhe em si/a fala e o ato. O ontem – o hoje – o agora. Na voz de minha filha/se fará ouvir a ressonância/o eco da vida-liberdade
(Evaristo, 2020b).
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A morte da mãe: Meu mundo caiu. Solidão. Desamparo. Mas os ensinamentos da minha mãe sempre ecoaram em mim. Era necessário voltar para o lugar que me transformou, que me trouxe inquietações, que me trouxe mais dúvidas do que respostas: a educação básica. O lugar que mudou a minha forma de encarar o mundo – um lugar de grandes transformações.
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Mestrado finalizado. Continuou a busca por debate e reflexão, sobretudo no que se refere aos processos de educação envolvendo sujeitos que vivenciam a pobreza ou a pobreza extrema. Entendi minha realidade – mulher preta periférica, que vivenciou o racismo e o machismo ao longo da vida. A atuação na educação básica foi um laboratório para esta professora preta – a escola é um ambiente que sempre me movimentou. Foi nesse ambiente que se viu com indagações sobre formação de professores e professoras, relação com os movimentos sociais e superação das desigualdades.
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O ambiente escolar está contaminado pelo machismo, sexismo velado, ou até mesmo escancarado, constituindo-se num código secreto e silencioso que molda e discrimina o papel de ser mulher/professora, afirma.
Hoje é professora de uma rede municipal de ensino, doutoranda no Programa de Pós-Graduação em Educação numa Universidade Pública. Gestos para tornar-se mulher, professora, negra, mãe e estudante. Como começam as coisas?
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Dressa agora lê bastante. Fica muito difícil ler, estudar e trabalhar, ser mãe e estudar e trabalhar, mas insiste. Hoje entende que não há motivos para se envergonhar dos cabelos ou da cor da pele. A sabedoria da mãe é uma inspiração importante. Dar conselhos está em extinção na nossa sociedade, como nos indicou Benjamin? Não temos mais disposição em ouvir e aconselhar o outro? “O conselho tecido na substância viva da existência tem um nome: sabedoria” (Benjamin, 1983, p. 45).
“O saber que vem de longe encontra hoje menos ouvintes que a informação sobre acontecimentos próximos. O saber, que vinha de longe – do longe espacial das terras estranhas, ou do longe temporal contido na tradição –, dispunha de uma autoridade que era válida mesmo que não fosse controlável pela experiência. . . . Se a arte da narrativa é hoje rara, a difusão da informação é decisivamente responsável por esse declínio”
(Benjamin, 1983, p. 56).
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Os olhos de Dressa vão ganhando outro brilho no curso da conversa. Os olhos tristonhos e acanhados dos primeiros instantes parecem ganhar colorido com a possibilidade de narrar sua história. Joana, sua filha, aparece na tela do computador mais uma vez. Pula no seu colo. “Quem é essa mulher, mamãe?” Dressa responde: “Uma professora”. Joana se surpreende: “Você ainda tem professora? Ela te dá aula de quê? Jogo de passar anel”. Professoras e alunas. Relação dessimétrica? Discurso de professora é mais autorizado, originário e último? Ameaça de opressão? Não, um convite ao jogo. Jogo de passar anel (Perrone-Moisés, 2013). Alunas devolvem o anel que um dia professoras colocaram em suas mãos. E, nesse jogo, o anel nunca é o mesmo, mas “uma outra volta da espiral” (Perrone-Moisés, 2013).
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Perguntamos a Dressa como tem feito o seu trabalho como docente na pandemia:
Durante a pandemia, a vida mudou, sobretudo no que se refere ao trabalho. Foi necessário nos adequar a uma nova realidade: ensino remoto, suas ferramentas
Foram os piores momentos da minha vida. . . . Medos permearam meus pensamentos: medo de morrer, de não ver minha filha crescer, de perder pessoas queridas, perder o emprego sempre me assombrava num momento de tantas incertezas no país. Momento de instabilidade financeira. Tentativa de permanecer forte.
Dentro de casa, fiquei muito assustada. Tínhamos que mostrar para os alunos que tudo estava bem! Não podia mostrar esse medo para os alunos!
Minha casa passou a ser meu novo espaço de trabalho. Foi preciso rearranjar os espaços. Minha filha passou a dormir no meu quarto e o dela passou a ser meu lugar de trabalho. Ela não entendia, batia insistentemente na porta. Época de amamentação e não podia dar a ela a atenção necessária. Minha casa não era mais minha casa, era meu trabalho (Relato de Dressa).
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Se pedissem a minha opinião, eu diria que o ópio do povo é o trabalho (Quintana, 2003).
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As reuniões se multiplicaram: manhã, tarde e noite. Não tínhamos mais horário específico de trabalho. Participando de mais de 25 grupos de WhatsApp! Cada toque do celular me arrepiava: mais uma tarefa! Mais uma exigência de pais! Mais uma exigência das coordenadoras da escola.
No primeiro momento da pandemia, trabalhava numa escola particular. Aulas gravadas, pais monitorando o que falávamos, um controle assustador de nossas posições políticas. Vigilância ideológica constante! As pessoas, pais e coordenadores, entravam nas aulas fazendo intervenções no que eu estava abordando. Ansiedade, terapia, medicação passaram a compor meu cotidiano. Sensação permanente de medo. Somos vigiadas em todas as nossas redes sociais. A misoginia se acirrava – eu era a única professora da cadeira de história. Falas machistas e desqualificadoras se multiplicaram. Perdi duas colegas para a covid.
E seguiu trabalhando, vigiada, tensa, assustada, filha bate na porta.
No segundo ano da pandemia, passei a compor o grupo de professores da rede municipal de ensino. Outros desafios, outras experiências, outras cobranças. Me deparo com adversidades da educação pública nesse país, com o intolerável. Miséria, inúmeras famílias em situação de vulnerabilidade, violência doméstica, uso de drogas, gravidez na adolescência. . .
Como tolerar o intolerável? E, principalmente, COMO DESOBEDECER?
NegraHelô
Ruídos, Flechas, Cama De Gato
Perguntamos a Helô como se deu o nascimento desse nome: NEGRAHELÔ.
É meu nome social, meu nome artístico. Fui eu quem criou.
[...] processo de reafirmação da minha identidade, da minha etnia, dos processos de resistência, dessas lutas conquistadas e aprendidas com minhas ancestrais negras
(Relato de NegraHelô).
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O jogo de cama de gato ou jogo de cordas é uma brincadeira que consiste em um participante fazer passar entre os dedos do outro o barbante ou cordão, alternando as figuras formadas em uma prática processual de tornar-se-com. Ao puxar fios, tenta-se seguir seus caminhos, rastreá-los, encontrar seus emaranhados e padrões para continuar com o problema em tempos e lugares particulares. Uma espécie de rastreamento, seguindo um fio, torna-se uma aventura. A figura dos fios não é rastreada, mas sim a coisa em questão, o padrão e a montagem que exige uma resposta; deve-se continuar, fazer figuras de cordas, passar e receber, fazer e desfazer, pegar cordas e deixá-las ir (Haraway, 1993). Vida de NegraHelô como cama de gato.
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A importância de SER, de existir sem qualquer restrição e tornar-se mulher, tornar-se professora à medida que narra a si mesma. Função política da língua, “cada palavra que usamos define o lugar de uma identidade” (Kilomba, 2020, p. 14). A língua cria, fixa e perpetua relações de poder.
A língua não é nem reacionária, nem progressista; ela é simplesmente: fascista; pois o fascismo não é impedir de dizer, é obrigar a dizer. Assim que ela é proferida, mesmo que na intimidade mais profunda do sujeito, a língua entra a serviço de um poder
(Barthes, 2013, p. 7).
Liberdade na linguagem seria impossível? Um meio de recorrer à liberdade é trapacear com a língua. “Essa trapaça salutar, essa esquiva, esse logro magnífico que permite ouvir a língua fora do poder, no esplendor de uma revolução permanente da linguagem... aflorar da língua e combatê-la em seu interior: eis o caminho para a trapaça” (Barthes, 2013, p. 17). Deslocar palavras, desfocalizar significantes e significados, desnivelar a enunciação, marginalizar o discurso institucional, submetendo as regras da língua aos breves e constantes sismos (Perrone-Moisés, 2013). Essa é uma estratégia de prestar um desserviço a um poder. No seio da linguagem servil, inventar uma heteronímia das coisas.
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NegraHelô fala de um colonialismo que é fundante de desigualdades e violências diversas praticadas contra a população negra. Como afirmado por Kilomba (2020), na narrativa da história oficial brasileira, a invisibilidade da população negra, em especial da mulher negra, é o que prevalece. Agora, como doutoranda, NegraHelô estuda epistemologias que recorrem a novas perspectivas teóricas e nos convida à desconstrução. Indaga o silêncio impositivo e o racismo violento vivido nos dias atuais. “O discurso acadêmico legitima uma sociedade capitalista e o modelo epistemológico branco, eurocêntrico. Da universidade precisa emanar afirmação de diferença, mas, ao contrário, transformou-se em palco de racismo violento” (Relato de NegraHelô).
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NegraHelô busca transformar a margem, a infâmia, em espaço de criação e (re)existência. Ao longo da conversa, vai explicitando uma busca romper com o racismo nas práticas em educação e com as opressões às mulheres negras cruzando categorias como gênero, raça e classe, por meio do feminismo interseccional e decolonial. A primeira opressão é de raça, afirma Helô; por isso, não se pode falar de gênero sem falar de raça quando se quer combater o racismo. As mulheres negras têm mais dificuldades para ter acesso aos direitos fundamentais e políticas afirmadoras de cidadania, conclui. “Pode a subalterna falar?” Pergunta quase retórica. “o subalterno não pode falar” (Spivak, 2010, p. 126). Mulher “pobre e negra” preenche todos os requisitos que lhe conferem a condição de subalternidade: a da pobreza, a do gênero, a da cor. Tal condição faz com que a mulher negra permaneça no lugar demarcado. Um lugar periférico. Como libertar-se da posição subalterna que a mulher ocupa? O silenciamento das mulheres negras no campo epistêmico e sua interface com o pensamento acadêmico eurocêntrico é o que movimenta Helô, hoje, como doutoranda de uma universidade pública.
A academia não é um espaço neutro nem tampouco simplesmente um espaço de conhecimento e sabedoria, de ciência e erudição, é também um espaço de violência
(Kilomba, 2020, p. 51).
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NegraHelô compreende o racismo a partir de uma visão crítica e decolonial, com vistas à criação de práticas que possam contribuir para a luta antirracista. Ela se diz militante. Mas não são todas as mulheres professoras militantes? − provocamos. Nem todas são, afirma. “Ser militante é se engajar em movimentos organizados de luta que resistem a esse cenário necropolítico. Vivo intensamente o feminismo negro. Sou ativista antirracista em cada gesto no cotidiano: na escola, na sede da Secretaria de Educação, no doutorado” (Relato de NegraHelô).
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A noite não adormecerá jamais nos olhos das fêmeas, pois do nosso sangue-mulher de nosso líquido lembradiço em cada gota jorra um fio invisível e tônico pacientemente cose a rede de nossa milenar resistência (Evaristo, 2020a).
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“Ninguém nasce mulher; torna-se mulher” (Beauvoir, 1980); ninguém nasce negra, ninguém nasce militante, ninguém nasce feminista, ninguém nasce professora. A afirmação de Beauvoir equivoca um modo de viver feminino, ressoa disruptiva. Rompe com essencialismos entre os sexos, desnaturaliza o modelo de feminino, não se dobra sob ditames dos modos burgueses e capitalistas de viver. Ninguém está dado(a) a priori, existem apenas feituras. NegraHelô, professora, inventadeira.
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NegraHelô cama de gato. NegraHelô não se emoldura totalmente por nenhuma tentativa de arranjo absoluto. Gira. Dribla. Se dobra. Embaralha os sentidos colocados. Entreabre posições políticas. “Sim, a vida é uma mulher” (Nietzsche, 1882/2012).
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Você busca garantia dos direitos políticos? – indagamos de forma provocativa. “Não!!!! Quero abrir vias, vida não enquadrada por naturalismos”. Seu rosto se abre num largo sorriso. Espalha-se na poltrona. “Minhas lutas, como as demais companheiras, buscam se configurar como maneiras provisórias do fazer em educação. E por serem marcadas por provisoriedades, são altamente perigosas e fecundas, pois ‘viver é perigoso’, já disse Guimarães Rosa” (Relato de NegraHelô).
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Helô diz que é desafiador lutar por uma existência não metrificada por padrões hegemônicos. As formas-duras engendradas também constituem a existência, também nos servem para o combate, mas, por vezes, insistem em sobreviver em nós para além dos usos na luta por uma vida defensável, digna de ser vivida por todas. Pensa o feminino fora das prerrogativas reprodutivistas. Inconformar o feminino, inconformar a formação de mulheres trabalhadoras-docentes aos modelos reinantes. Afinal, é a diferença que se repete, a única constância que existe é a mudança.(Deleuze & Parnet, 2004).
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Devir-mulher-trabalhadora-docente que não cessa de se inscrever. O homem, a mulher, a docente ou quaisquer outras essencialidades ou interioridades substancializadas não nos servem no projeto de afirmar a dimensão explosiva do viver; então, um exercitar, um tornar-se, refere-se à multiplicidade de afetos e circulação de desejos, fora dos sistemas de oposições binárias. Não se trata, portanto, de guerra entre gêneros (Rolnik, 1996). Não se trata de desprezar, tampouco, a importância do enfrentamento das discriminações e dos atos necropolíticos em curso no presente. Mas lutas não precisam implicar confinamento numa identidade, mantendo tais personagens num lugar que reforce modos identitários de subjetivação.
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O pensamento freudiano se viu desafiado na compreensão das mulheres. Ora, os modos de ser mulher portam forças de criação que não cabem em quadros conceituais, acadêmicos, científicos. No enfrentamento de um feminino sobrecodificado, temos forças que desestabilizam identidades! O devir só pode ser feminino (Deleuze & Guattari, 1996). Devir como linhas que escapam pelas fissuras de um socius orquestrado por um modo de ser homem. O devir-mulher escorrega, desvia das teias de dominação. A mulher racha modelos, resiste a uma infinidade de estratégias de captura, desfaz codificações e sobrecodificações.
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Pandemia. Mudam-se as estratégias. Bate forte a certeza de que o que move o trabalho docente é o contato, a troca, a interação. É estar juntas nas tentativas, nos erros e nos acertos. É um trabalho de disponibilidade para o outro, ainda mais nesses tempos em que nem sempre os estudantes conseguem estar presentes e com condições adequadas para situações de estudos. O desafio do exercício docente se amplia: como manter vínculo ou estabelecê-lo com quem não está presente fisicamente? – indaga NegraHelô.
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Há 15 anos trabalhando na Educação Básica, entende a docência como processo constante: cada faixa-etária, cada turma, cada escola provoca mudanças nas maneiras de planejar e de construir o conhecimento. Educação inventiva, invenção de si e de mundos (Dias, 2012). Essa imprevisibilidade exige criação e isso é o que mais me agrada na docência.
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O trabalho docente só existe pelo contato com o outro. Não fosse o outro, nós, docentes, não estaríamos aqui. Não fosse o contato, a troca, a possibilidade de aprender junto, não existiria o trabalho docente. Perder o contato diário do olho no olho pela força do vírus que se alastrou não foi fácil. Um corpo docente sentiu. Embora estivesse durante horas em frente a uma tela, o objetivo de manutenção de vínculos não deixou de ser perseguido. Aos poucos, o corpo docente que sobe e desce escadas, troca de salas, troca de ares, organiza os materiais, se esforça na criação de uma atmosfera de aprendizagem, vai se desfazendo e novo formato de educar emerge; entretanto, é preciso ser professora inteira e de corpo todo.
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NegraHelô-mulher. Aos 40 anos diz ter sofrido muito. Gestos de um racismo violento marcam seu corpo. História que foi se constituindo em meio a relações machistas. Passa parte do dia militando em muitos movimentos.
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Mora na capital de um estado do Sudeste brasileiro. O bairro onde mora é um bairro qualquer: árvores, asfalto, casas, grades, muros, porteiros, carros, ora rua vazia, ora rua movimentada.
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Pedaços de histórias. Pedaços de docente. Pedaços de mulher. Pedaços de crianças. Violência. Sexismo. Restos. Racismo. Como num caleidoscópio, pedaços se conectam, se entrelaçam, formando imagens imprevistas. Formas inéditas vão se delineando na narrativa. A cada movimento, combinações variadas vão surgindo. A produção de si caleidoscópica, apresentando combinações variadas e de interessantes efeitos visuais.
NegraHelô vai se forjando numa gambiarra[5] subjetiva-existencial. É um pouco de cada encontro feito: mãe, madrinha, pai, namorados. Gambiarra é improviso, é criada para enfrentar situações imprevistas. Provisoriedade, remendo. As gambiarras têm potência de mudança. Guardam os germens da novidade, do inusitado. NegraHelô – gambiarra subjetiva. Gambiarra que, por seu uso disfuncional, produz efeito estético. Composição de restos, de pedaços. Tornar-se negra, tornar-se professora, tornar-se mulher na composição de coisas estranhas, que se estranham.
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Os turbantes emolduram seu rosto, não aprisionam seus cabelos, dão espaço para um devir. Devir mulher. Helô é serenidade e agitação. Paradoxo vivo. Atenta a cada detalhe do que a cerca. E isso “exige uma aprendizagem de desaprender” (Pessoa, 1991, p. 153). Gambiarra-em-NegraHelô. Feita a muitas mãos. Helô-rede, emaranha linhas.
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Helô não gagueja enquanto fala. Suspiramos e respiramos fundo. Nos inquietamos nas cadeiras. A conversa flui. Cabelos multicor. Rosa. Acaju. Preto. Turbantes coloridos ou de cor viva. Boca com batom carmim. Muitos colares combinando com as cores do blusão. Ao fundo, um lindo quadro com um perfil de uma mulher, também de turbante. No antebraço direito uma tatuagem: é uma deusa africana no continente africano, diz.
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Passageira no bonde do viver, Helô vive intensamente as mudanças na paisagem existencial. O corpo, muitas vezes automatizado na inércia de caminhos asfaltados, responde aos movimentos bruscos da vida: subidas, solavancos, quedas. Muitas mulheres encostam suas mãos na dela ao longo dessa caminhada. Há contágio.
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Helô gosta de contar que já fez vários ensaios fotográficos. Ensaios de modos outros de existir-insistir. Gosta da sua imagem nas fotos. Não segue modas, formas “prêt-à-porter” (pronto a vestir) ou linhas predefinidas do corpo. Corpo de mulher é como ela quiser. Lugar de mulher é onde ela quer. Imagens e palavras.
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Muitas vozes nessas vozes. Algo se enuncia com força nessas narrativas: uma sociedade constituída pelo racismo patriarcal, raça e gênero. Opressões do racismo e do sexismo se interseccionam e produzem vulnerabilidades específicas contra mulheres negras (Kilomba, 2020).
Carlos Irreverência, Limiar, Ousadia
26 de janeiro de 2022. A conversa com Carlos foi antecedida por alguns ajustes nas nossas conexões de internet.
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Fale um pouco da sua história, disparamos. “Falar sobre tudinho??? Nunca vamos falar de tudo, não é mesmo? Uma vida não cabe numa conversa. Ela extrapola, escorre, derrapa, cria picadas” (Relato de Carlos).
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Voz firme e doce. Sorriso contagiante. “Fiquei pensando sobre o que poderiam me perguntar. . . . comecei a pensar o que dizer. Não consigo dizer tudo, mas tenho muito a dizer” (Relato de Carlos).
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Carlos começa destacando que o humor sempre o acompanhou. Corremos para o Google: humor é disposição de ânimo de uma pessoa em relação a alguma coisa ou em algum momento. Humor encanta a plateia. Essa definição nos atendia a princípio. Carlos usa o humor para encantar estudantes. “É a melhor estratégia para viver. Sempre fui um pouco desconfiado com essas pessoas que levam tudo muito a sério na educação!! Parece que não sorrir, não usar da ironia, é ser um bom profissional. Às vezes me sentia incomodado: será que estou sendo negligente, irresponsável?” (Relato de Carlos).
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Humor se constitui para ele como um dispositivo importante nas práticas em educação, pois “entorta” formas retas, abre trajetos, provoca novos modos de ver e dizer, põe em xeque as exclusões efetuadas pela razão. Pode ser um meio de nos fazer suportar a existência quando nenhuma explicação parece convincente. “O riso é uma das respostas do ser humano perante o dilema da existência” (Minois, 2003, p. 25). Por meio do riso, Carlos nos diz, “podemos traçar caminhos para transformar-compreender mundos que a razão séria não atinge”. O cômico faz brilhar o infinito da existência, banido pela razão como marginal e ridículo (Alberti, 1999). O riso frustra a expectativa pelo desvio da ordem e, ao ultrapassar os limites do pensamento sério, lança novos gestos pedagógicos, indica uma concordância entre o humano e o impensado.
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Em 1986, perguntou-se a Deleuze se ele e Foucault pertenciam ao “mesmo time”, ao que respondeu: “Penso que sim. . . . Ser do mesmo time é rir das mesmas coisas ou então calar-se, não precisar explicar-se” (Deleuze, 1992, p. 109).
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Carlos nasceu num município de um Estado do Sudeste brasileiro, por volta dos anos 1960 e, nos anos de 1970, já residia na capital do Estado em que nasceu, onde vive até hoje. Perguntamos como pensa o trabalho em educação. Educação precisa ser cruel!! (Fuganti, 1991), pautada numa certa irresponsabilidade, no bom sentido – afirma. É engendrar processos que cultivem força e viabilizem mestiçagens. O projeto pedagógico de Carlos privilegia os verbos mestiçar, misturar, a amorosidade e a intolerância a toda tentativa de perpetuação de padrões metrificados de subjetividade. Crueldade declara guerra contra os valores morais que aprisionam a luta, em favor da processualidade do viver (Fuganti, 1991). Não suporta práticas de tutela.
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Fala de seus amores com um sorriso atrevido. Quando sorri, é uma vida. Suas relações amorosas também têm a marca da irreverência. Deixo acontecer, afirma Carlos. Homofobia? Se houve, nunca percebi.
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Carlos tem dois irmãos. Não conheceu um pai super-herói, como muitos dos seus colegas falavam, aquele que dá conta de nossas dificuldades e que nos momentos mais difíceis está por perto, para socorrer de eventuais mazelas da vida. Muito diferente do que os seus amigos tinham como representação de pai, “herói não, aventureiro, nômade. Foi um coadjuvante”. Aventuras que desafiavam modos habituais de ser chefe de família. “Certa vez, chegou em casa nos comunicando que havia vendido um imóvel e iria ser dono de restaurante. Escolarização dos filhos? Esse aspecto não compôs seus interesses. Acho que morreu sem saber no que cada um se formou, mas isso nunca teve muita importância, pelo menos para mim. Era alcoólatra” (Relato de Carlos). Mãe, avó e madrinha foram presenças intensas na vida das crianças da família. “Sim, a vida é mulher” (Nietzsche, 2012 p. 4).
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Quando cursava a sexta série, precisou de um atlas escolar. Esse atlas não chegou. Essa não era uma prioridade para seu pai. “Fiquei sem o atlas, apesar de ter reiterado o pedido várias vezes. Dizia que havia esquecido. . . . eu ia apagando um pouco a importância dele na minha vida escolar (Relato de Carlos). Mãe e avó materna sempre atentas, cuidavam sem tutelar. Cuidam acompanhando, sempre ao lado.
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Trabalhou na rede pública de ensino da prefeitura da cidade, onde mora ainda hoje, no início da década de 1990. Em 1995, foi aprovado como professor numa universidade pública. Meu maior sonho!!!
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Afirma que sua aposta é nas redes afetivas de trabalho no campo da educação, tecidas nas relações cotidianas como um conjunto de disposições éticas e de predisposições no diálogo com o outro. Destaca a importância da afirmação da alteridade na educação: “Ninguém sabe o que é melhor para o outro” (Relato de Carlos). Educação em rede afetiva do trabalho. Uma rede menor (Gallo, 2021), como fios tecidos de modo singular e marginal, que se associam com outros fios, produzindo amplas redes colaborativas, rizomáticas, sem centro e sem hierarquia, com muitos e diferentes mundos. Redes que proliferam. Professores em rede, currículos em rede. Redes que aumentam a potência de agir, associadas à perturbação de variadas ordens de discurso, de forma a promover diferenciação também em rede. Ensinantes que jamais pautam sua atuação por um presumido lugar transcendente (Rodrigues et al., 2021).
Professor? “. . . . um sujeito que possuísse um saco onde colocasse tudo o que encontrasse. Porém, com a condição de ele próprio ser posto num saco” (Deleuze & Parnet, 2004 p. 19). Carlos segue forjando colapsos nos intoleráveis de determinadas formas de vida, dando passagem a sensibilidades outras, “principalmente naquelas em que humor e rigor nada têm de incompatíveis” (Rodrigues et al., 2021, p. 157).
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Como foi trabalhar na universidade na pandemia?
As estratégias mudaram, tivemos que inventar formas de trabalhar à distância e com ferramentas digitais, mas o investimento em uma micropolítica ativa continuou. Aposto na pluralidade do mundo como marca e não como impedimento para ação. Pluralidade que considera a legitimidade de diferentes sujeitos, de diferentes modos de ser e de compreender o mundo. Continuei ensejando formas de sair das tentativas de aprisionamento e perseguindo linhas minoritárias de re-existir
(Relato de Carlos).
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Persegue um projeto educacional que se efetiva por meio de uma educação como função-crítica que recusa microfascismos fundamentados na inviabilização da vida como obra. Práticas que buscam tornar os espíritos não centrados na obediência, mas no pensamento, sustentando indagações, sem pretensões de respostas gerais e universais, conjurando aquelas que passam palavras de ordem e trazem consigo sentença de morte, que superestimam conhecimentos academicistas, práticas de domínio e violência.
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Carlos, uma cara, um rosto, braços tatuados, mas isso não diz quem ele é. provisoriedade. Ora, um rosto existe para ser desfeito. Sorri de forma atrevida, irreverente, não se reconhece em nenhum padrão “prêt-à-porter” (pronto a vestir), afirma. Objetiva uma existência sempre no limite. Desarranjar-se com prudência para não espantar o acontecimento, o acaso. Gosta de experimentar um rosto que não é o seu, para, em seguida, o desfazer, deixando-o vazar. Pele com poros abertos, ávidos por novidades, abertos para o inusitado.
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Como se vivia na cidade onde nasceu nos anos 1960? Eram anos de chumbo no Brasil. A ameaça comunista oferecia salvo conduto e legitimava prender, torturar e matar aquele que se opusesse ao regime instaurado. Sua cidade natal não ficou livre desse clima. As ações repressivas aumentavam cada vez mais, com a justificativa de conter a ameaça comunista. Pessoas eram presas, outras desapareciam. Na cidade em que morava, no interior do Estado, não ocorreu nenhuma represália em relação ao posicionamento político, mas algo inusitado aconteceu na cidade: todos os dias pela manhã, os moradores encontravam em suas portas um exemplar do jornal do partido comunista. Como o periódico surgia era um mistério. As pessoas não sabiam como o tal jornal chegava a suas casas. Quem o distribuía? Muitos tinham medo de circular com ele em mãos e serem considerados comunistas. O autoritarismo imposto no Brasil produziu silenciamento pelas terras cachoeirenses também.
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Como foram seus dias de criança? Carlos não frequentou creche. “Naquela época, nem sei se existia” (Relato de Carlos). Fez ensino fundamental numa escola pública de referência no município onde morava. Poucos amigos, lembra-se de apenas dois. Poucas brincadeiras de rua. Segunda fase da infância – retorno, volto a viver com pais e irmãos na capital do Estado onde moro. Infância sempre marcada por poucos amigos. “Criei dois amigos invisíveis, com quem brincava muito” (Relato de Carlos). Invisíveis como o entregador do jornal... Ditaduras, resistências, falas e cálices. . . . cale-se.
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Força para não cair em processos de rostidade, mas evitava a desterritorialização absoluta. Persegue a criação de sentidos plurais para o que vive. Mas como esse exercício pode ser feito sem cair na armadilha dos processos identitários? Como não se empanturrar de identidade? Como não se cristalizar em uma configuração impermeável de si, mas tampouco correr o risco de desestabilização intensa? Errâncias de um viver. A palavra ressentimento não faz parte do seu dicionário: Esqueço tudo que faz mal, vou tocando a vida para onde ela vai me levando, mas eu sempre no comando.
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A conversa, continua e Carlos nos diz que pensa-exercita uma educação sem apego a modos identitários de ser e que crie estratégias para que o outro se emancipe na relação docente, que amplie autonomia frente ao discurso de professor, pondo fim a uma relação pedagógica de dependência. É indispensável “questionar nossa vontade de verdade; restituir ao discurso seu caráter de acontecimento; suspender, enfim, a soberania do significante” (Foucault, 2012, p. 48). “. . . e, nessa medida, considero-os (os estudantes) inteiramente livres para fazer, com o que eu digo, o que quiserem. São pistas de pesquisa, ideias, esquemas, pontilhados, instrumentos: façam com isso o que quiserem” (Foucault, 2000 p. 4).
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“Nunca sofri homofobia! E se alguma prática desse tipo tentou me atingir, nem percebi” (Relato de Carlos). Um desafio o acompanha: criar um corpo-profissional da educação que vibre e experimente as forças sutis que o percorrem, rasgam.
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Força do insignificante
As narrativas apresentadas, resultado do processo de pesquisa, foram tecidas e aportadas na leitura política do tempo histórico. Contar histórias pode constituir-se como instrumento para uma análise das práticas educacionais que se abrem a lutas menores, disruptivas. As palavras têm um caráter coletivo, pois as histórias e a palavra do outro permitem ao pesquisador um olhar para a atualidade. Os rastros desse encontro evidenciam “a dissolução da centralidade da enunciação na biografia de quem fala” (Ferreira, 2011, p. 130).
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Compor com os fragmentos, com o que nos parece inútil, e apostar na força do insignificante; compor com biografemas, fazer ficção, foi a proposta. “. . . os traços biografemáticos são detalhes insignificantes transformados em signos de escritura” (Feil, 2010, p. 28), “parte da fantasia” (Corazza, 2015, p. 12), transbordam e se constituem como “roteiros imaginários” (Corazza, 2015, p. 11). Ao se deparar com o real, a fantasia pode atingir o inédito, e operar com o método biografemático é assumir uma posição de atenção ao minúsculo imperceptível no cotidiano.
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Esta pesquisa buscou empreender uma vinculação entre narratividade, o contar histórias e gestos pedagógicos por meio da criação de biografemas de profissionais que pertencem aos infames (Foucault, 2003) de nossos tempos, cujos trabalhos são marcados por precarização, racismo e machismo. Vidas que subvertem a compreensão habitual de poder travado entre diferentes classes, gêneros ou raças. Vidas que vão se forjando em meio a políticas de assistência, de segurança, de educação, sociais, políticas constituídas por discursos que expressam segredos e disputas do cotidiano. Narrativas, paixões que jogam “com uma incerteza de verdade” (Barthes, 2013, p. 18) e buscam ser teimosas ao se manterem ao revés do poder fascista da língua, poder que serviliza (Barthes, 2013). Jogar com os signos em vez de destruí-los, colocar os signos numa maquinaria de linguagem cujos breques e travas de segurança arrebentaram, assim, instituir no próprio seio da linguagem servil uma heteronímia das coisas nos parece um caminho importante no reposicionamento das práticas em educação num presente distópico. Esta pesquisa afirmou a importância de “retomar o corpo naquilo que lhe é mais próprio, sua dor no encontro com a exterioridade, sua condição de corpo afetado pelas forças do mundo e capaz de ser afetado por elas: sua afectibilidade” (Pelbart, 2007, p. 4).
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Normalização, preparação e revisão textual: Piero Younan Kanaan revisao@tikinet.com.br
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Apoio: CNPq – Bolsa de Produtividade em Pesquisa
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O Bêbado e a Equilibrista é uma canção composta por João Bosco e Aldir Blanc, interpretada por Elis Regina no LP Essa Mulher, de 1979. Tornou-se um hino informal do período da anistia e do declínio da ditadura cívico-militar.
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Expressão usada por um colega em uma aula da disciplina Formação humana, no Programa de Pós-Graduação em Políticas Públicas e Formação Humana da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (PPFH-UERJ).
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Editor responsável: Antonio Carlos Rodrigues de Amorim. https://orcid.org/0000-0002-0323-9207
Datas de Publicação
-
Publicação nesta coleção
17 Nov 2023 -
Data do Fascículo
2023
Histórico
-
Recebido
23 Jun 2022 -
Revisado
05 Out 2022 -
Aceito
27 Out 2022