Resumo
As experiências adversas na infância (do inglês adverse childhood experiences – ACEs) implicam prejuízos no desenvolvimento psicossocial, afetando a aquisição de competências socioemocionais. Este estudo verificou a associação entre ACEs e competências socioemocionais (indicadas pelos níveis nas habilidades de empatia e autocontrole), considerando o gênero como variável moderadora. Foram coletados dados com 1.302 adolescentes, estudantes de escolas públicas em territórios socialmente vulneráveis. Verificou-se maior prevalência de ACEs para o gênero feminino. Os níveis de empatia e autocontrole oscilaram de formas distintas entre os gêneros, conforme o histórico de determinados tipos de ACEs. Os resultados indicam a necessidade de mais investigações acerca da influência dos estereótipos de gênero no desenvolvimento psicossocial de adolescentes.
Palavras-chave vitimização; empatia; autocontrole; autorregulação; gênero
Resumen
Las experiencias infantiles adversas (en el inglés adverse childhood experiences –ACE) implican daños en el desarrollo psicosocial, afectando a la adquisición de competencias socioemocionales. Este estudio analizó la asociación entre las ACE y las competencias socioemocionales (niveles de empatía y habilidades de autocontrol), considerando el género como variable moderadora. Se recogieron datos de 1.302 adolescentes que estudiaban en escuelas públicas de zonas socialmente vulnerables. Se encontró una mayor prevalencia de ACE en el género femenino. Los niveles de empatía y autocontrol oscilaron de forma diferente entre géneros, en función de los antecedentes de determinados tipos de ACE. Los resultados indican la necesidad de seguir investigando la influencia de los estereotipos de género en el desarrollo psicosocial de los adolescentes.
Palabras clave victimización; empatía; autocontrol; autorregulación; género
Abstract
Adverse childhood experiences (ACEs) configure highly prevalent problems, especially among socially vulnerable groups. ACEs are likely to damage psychosocial development, affecting the acquisition of socio-emotional skills, which are important for adaptive functioning. This study sought to verify the association between ACEs and socio-emotional competencies (indicated by levels in empathy and self-control skills), considering female and male genders as possible moderating variables. Data were collected from 1,302 adolescents who studied at public schools in socially vulnerable areas. Females showed a higher prevalence of ACEs. The levels of empathy and self-control differed between genders depending on the history of specific types of ACEs. Results indicate the need for further research into the influence of gender stereotypes on the psychosocial development of adolescents.
Keywords victimization; empathy; self-control; self-regulation; gender
Introdução
A exposição às experiências adversas na infância (do inglês adverse childhood experiences – ACEs) (Felliti et al., 1998) tem sido tema recorrente em produções científicas (Ceccarelli et al., 2022; Hawes & Allen, 2023). São experiências que remetem a situações potencialmente traumáticas, por estarem associadas a intenso estresse, como abuso (físico, psicológico, sexual), negligência, disfunções familiares – por exemplo, a convivência com adultos com questões de saúde mental e/ou que fazem abuso de substâncias psicoativas – e convívio com violências na comunidade (Organização Mundial da Saúde [OMS], 2020a). Seus efeitos, especialmente quando ocorrem de forma cumulativa, vão desde sofrimento psíquico persistente ao longo da vida adulta (Heidinger & Willson, 2019), até manifestação de doenças físicas e/ou problemáticas de caráter socioemocional (Bright & Thompson, 2018).
Ainda que crianças e adolescentes de diferentes estratos sociais estejam suscetíveis aos diferentes tipos de ACEs, alguns fatores incrementam a probabilidade de ocorrência de determinados tipos para certos segmentos, como os mais vulneráveis socialmente. Por exemplo, viver em regiões periféricas com menor acesso a recursos básicos aumenta as chances de vitimização por violência comunitária (Oliveira et al., 2020). Ser de determinado gênero também é um fator destacado (Jones, Pierce, & Shafer, 2022). Embora não haja consenso (Chang et al., 2019), a maior parte dos estudos verificam maiores índices de ACEs entre meninas e mulheres, denotando maior vulnerabilidade do gênero feminino (Comacchio et al., 2022; Haahr-Pedersen et al., 2020). Investigações mais específicas, contudo, observam certo desbalanço, a depender do tipo de ACE: o gênero feminino seria mais vulnerável às vitimizações no âmbito das relações mais próximas, incluindo experiências de abuso sexual (Haahr-Pedersen et al., 2020), e ao assédio sexual, no âmbito comunitário (Brown & Biefeld, 2023), ao passo que o gênero masculino seria mais vulnerável a experiências relacionadas a outras formas de violência na comunidade, direta e indiretamente (como testemunha) (Mitchell et al., 2019).
Diante disso, hipotetiza-se que certas situações inerentes ao conceito de ACEs, caracterizadas por fatalidades, como perdas de pessoas significativas, ou adversidades, como conviver com adulto que faz abuso de substâncias, independam da variável gênero. Situações relacionadas às diferentes formas de violência, contudo, dependem do gênero. O conceito gênero é aqui entendido como uma categoria socialmente construída, que dita normas, comportamentos e papéis aos indivíduos, fomentando também subjetividades atreladas aos papéis, conforme a categorização que lhes é atribuída (homem, mulher), e que variam entre diferentes grupos sociais e conforme a época (OMS, 2020b).
A partir dessa perspectiva conceitual, que não ébiofisiológica, algumas problemáticas são perpassadas pelas questões de gênero, considerando estereótipos que se convertem em fatores de vulnerabilidade para adversidades, na dinâmica das interações sociais. Estereótipos de gênero configuram as expectativas sobre os indivíduos que não necessariamente refletem suas características pessoais e, por categorizações binárias, reforçam diferenciações, endossando uma desigualdade/hierarquização entre os gêneros (Ellemers, 2018). São exemplos desses estereótipos ideias como “meninas são delicadas”, “meninos são agitados”, “mulheres devem ser submissas” e “homens devem demonstrar força física”, disseminadas no senso comum.
Os estereótipos de gênero também parecem influenciar as circunstâncias associadas às aquisições de competências socioemocionais importantes para o bem-estar e adaptação social dos indivíduos. Estas referem-se a um conjunto de habilidades que auxiliam na manutenção de bons relacionamentos, concernente a tomadas de decisões pautadas em escolhas mais conscientes e resolução de problemas (Collaborative for Academic, Social, and Emotional Learning, 2003). Os níveis de empatia, por exemplo, são quase sempre mais altos para o gênero feminino (O’Neill, 2020; Silke et al., 2018’), até mesmo porque, nas culturas ocidentais, os atos de preocupar-se com o outro, atentar-se a seus sentimentos e expressar reações emocionais são comportamentos considerados tipicamente femininos (Gutierrez et al., 2020). De igual modo, os níveis de autocontrole são quase sempre menores em indivíduos do gênero masculino (Jones, Pierce, & Chapple, 2022; Van Tetering et al., 2020). Há apontamentos de que a identificação de meninos e homens com a masculinidade tradicional torna mais provável, para eles, a adoção de normas que norteiam comportamentos agressivos, algo que se relaciona a baixos níveis de autorregulação (Malonda-Vidal et al., 2021). Sucintamente, vale dizer que empatia remete a habilidades cognitivas, relacionadas à compreensão dos sentimentos dos outros, e afetivas, associadas à ativação emocional suscitada por essa compreensão, em resposta aos sentimentos de outros (Stellar & Duong, 2023), ao passo que autocontrole, por vezes denominado auto regulação (Gross, 2021), refere-se à capacidade de regular os próprios comportamentos, emoções e pensamentos, visando os possíveis ganhos e prejuízos, a fim de atingir determinada meta (Berkman et al., 2017; Nigg, 2017).
Posto que a exposição às ACEs pode afetar negativamente o desenvolvimento das competências socioemocionais nos indivíduos (Hawes & Allen, 2023), mas que os índices de exposição às ACEs e de competências emocionais (especificamente empatia e autocontrole) apresentam variâncias que parecem contraditórias, quando analisadas em função do gênero, defende-se a importância de investigar mais a fundo as interações entre essas variáveis. Assim, este estudo teve como objetivos específicos: (i) estimar as prevalências de 37 tipos de ACEs, assim como os níveis médios de acúmulos dessas ACEs em uma amostra de adolescentes do gênero masculino e feminino, estudantes de escolas públicas, de territórios demarcados por indicadores de vulnerabilidade social; (ii) estimar os níveis de habilidades indicativas de competências socioemocionais (empatia e autocontrole/auto regulação); (iii) verificar a existência de diferenças de gênero em relação às ACEs e aos níveis de autocontrole e de empatia; e (iv) verificar associações entre ACEs e competências socioemocionais (autocontrole e empatia) e o papel desempenhado pelo gênero nessa relação, visando avaliar possível efeito moderador.
Método
Este estudo se insere em um projeto de pesquisa maior, denominado “Competências socioemocionais e comportamento antissocial em garotas-adolescentes expostas a experiências adversas: Análise comparativa entre Chile e Brasil”, realizado por meio da parceria entre o Programa de Pós-Graduação em Psicologia da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo (FFCLRP-USP) e o Programa de Pós-Graduação em Psicologia Jurídica e Forense da Universidad de La Frontera, de Temuco, Chile. Trata-se de um estudo transversal de natureza correlacional e comparativa.
Amostra
Os participantes foram adolescentes de 14 a 18 anos, estudantes de escolas públicas situadas em territórios demarcados por indicadores de vulnerabilidade social, de acordo com o índice paulista de vulnerabilidade social (IPVS), que classifica as unidades escolares de ensino público de acordo com o nível de vulnerabilidade social da zona em que está situada, com pontuação entre 1 e 7, considerando que quanto maior a pontuação, maior a vulnerabilidade do entorno da escola. Assim, foram coletados dados de 1.321 jovens, oriundos de escolas públicas de zonas com pontuação igual ou maior a 4, nas cidades de Ribeirão Preto e Franca, ambas situadas na mesma região do interior do estado de São Paulo.
A idade média dos participantes da amostra foi de 15,6 anos, com desvio padrão de 1,2. A distribuição mostrou-se semelhante no tocante aos gêneros: 48,8% se auto identificaram como do gênero masculino e 49,8% como do feminino. Uma pequena parcela (1,4%) autodeclarou-se como do gênero não-binário. Considerando a intenção de realizar as comparações entre grupos e a aferição da relação do gênero como variável moderadora, considerou-se que trabalhar com um grupo tão pequeno (n=19), em paralelo aos outros dois, formados pelo gênero masculino e feminino, geraria uma fragilidade metodológica. Portanto, decidiu-se pela exclusão dos dados dos jovens autodeclarados como não-binários nas análises deste estudo. As prevalências de ACEs identificadas no grupo não-binário serão incluídas separadamente em material complementar disponível na plataforma Open Science Framework (https://tinyurl.com/2z4rsvy8).
Assim, com relação a outras características sociodemográficas, considerando apenas a amostra dos gêneros masculino e feminino, composta por 1.302 adolescentes, verificou-se, quanto à raça, que a maior parte dos jovens se autodeclarou branca (40,6%), seguido de pardos (39,5%), pretos (15%), amarelos (2,6%) e indígenas (2,3%), categorização alinhada com a realizada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Quanto à renda familiar, a maior proporção informou que esta girava em torno de R$1.805,90 (42%). Tendo em vista o valor do salário mínimo paulista (R$ 1.550,00) (Casa Civil do Estado de São Paulo, 2023), é possível considerar essa renda baixa. Em seguida, os valores das rendas declarados na amostra foram: R$ 3.042,47 (24,4%); R$ 831,56 (19,2%); R$ 5.449,60 (10,3%); R$ 10.427,74 (2,5%); e R$ 22.716,99 (1,7%).
Instrumentos
Questionário Sociodemográfico. Elaborado no contexto do consórcio formado pelas equipes brasileira e chilena, relacionado ao projeto de cooperação bilateral, o questionário empregado inclui questões concernentes a dados sociodemográficos (idade, gênero, cor/raça, renda familiar) e algumas questões que sondam modalidades de experiências adversas (n=13), em complementação àquelas que são levantadas por meio de instrumento específico, que será apresentado a seguir. Nove itens referem-se à vitimização direta ou indireta (como testemunha) de violência comunitária (abordagem policial, violência policial, roubo ou dano à propriedade, agressões de terceiros, tráfico de drogas, presença de organizações criminosas, assédio sexual, violência dentro das famílias, violência entre vizinhos); dois itens referem-se à violência dentro da própria família (presenciar discussão e agressão entre os adultos da casa); um item indaga sobre abuso emocional (ter sido chamado, por adultos próximos, de nomes como ““estúpido/estúpida”“, ““preguiçoso/preguiçosa”“ ou ““feio/feia”“); um item indaga sobre negligência por parte dos cuidadores, devido ao uso abusivo de substâncias. Os níveis de resposta a esses itens são de natureza dicotômica, indicando a experiência ou não das situações descritas.
Escala para el tamizaje de experiencias adversas en adolescentes (EEA – Lucio & Durán, 2002). Essa escala contém 25 itens, projetados de acordo com o modelo de Felitti et al. (1998). Os itens visam informações sobre a vitimização por abusos, como o sexual (“Abusaram sexualmente de mim ou fui violada(a)”) ou o físico (“Fui golpeado fisicamente por algum membro da minha família”), bem como de vivências de situações potencialmente estressantes ou traumáticas, como perda de familiar próximo por falecimento (“Minha mãe faleceu”, “Meu pai faleceu”) e rupturas familiares (“Meu pai saiu de casa”), por exemplo. No instrumento, cada questão busca verificar se o respondente teria vivido ou não a experiência nomeada (sim=1 e não=0), e, em caso afirmativo, se a experiência teria ocorrido no último ano e sua importância, variando as possibilidades de resposta nesse quesito entre nenhuma=0 e muita=4. Neste instrumento, quanto maior a pontuação alcançada, maior o nível de ACEs para o respondente.
Em estudo piloto de adaptação dos instrumentos ao contexto sociocultural brasileiro, com dados de 202 estudantes de 14 a 18 anos incompletos, de escolas públicas, os adolescentes relataram uma média de 4,2 ACEs na vida (D=3,2) e 1,1 nos últimos 12 meses (DP=1,6). Na divisão por gênero, as médias para o feminino foram de 4,3 (DP=3) e 1,3 (DP=1,8), ao passo que para o masculino foram de 4,3 (DP=3,1) e 1,2 (DP=1,6). O alfa de Cronbach da escala foi de 0,72.
Os itens de vitimização do questionário sociodemográfico, mais os itens do EEA, foram agrupados em 15 categorias de ACEs, de acordo com a caracterização proposta pela OMS (Pereira & Viana, 2021), para fins de composição de medidas numéricas relacionadas às diferentes categorias de experiências adversas: abuso emocional (envolve 1 item); abuso físico (1 item); abuso sexual (1 item); aborto provocado (1 item); violência por pares (1 item); rejeição dos professores (1 item); envolvimento em acidente grave (1 item); violência na família (3 itens); abuso de substâncias pelos cuidadores (1 item); hospitalização dos cuidadores por problema grave de saúde (1 item); problemas de saúde mental na família (1 item); encarceramento de membro da família (3 itens); divórcio/separação ou recasamento dos pais (5 itens); perdas por falecimento (7 itens); e violência comunitária (9 itens).
Toronto Empathy Questionnaire (TEQ – Spreng et al., 2009). Composto por 16 itens, o questionário visa mensurar as seguintes dimensões da empatia: percepção do estado emocional dos outros (2 itens); compreensão da emoção nos outros (1 item); comportamentos que demonstram sensibilidade com relação ao estado emocional dos outros (5 itens); ativação/excitação fisiológica simpática (4 itens); comportamento empático de ordem superior (1 item); e altruísmo (3 itens). São exemplos de itens: “Me incomoda ver que estão faltando com o respeito com alguém”, “Eu desfruto quando faço outras pessoas se sentirem melhor” e “Quando alguém está se sentindo animado, eu fico animado também”. As respostas às questões deste instrumento possuem cinco categorias em uma escala da frequência em que se sente ou age de determinada maneira, sendo nunca=0 e sempre=4. Vale pontuar que, considerando todos os itens, há uma ênfase nos componentes emocionais da resposta empática – quanto maior a pontuação, maior o nível de empatia.
No estudo piloto, de adaptação do instrumento ao contexto sociocultural brasileiro, os adolescentes obtiveram uma média de 43,4 (DP=7,5), considerando um mínimo de 0 e um máximo de 64 pontos possíveis. Na divisão por gênero, a média do feminino foi de 45,1 (DP=7,4) e do masculino foi de 40,9 (DP=6,7). O alfa de Cronbach foi de 0,75. Na análise fatorial, identificou-se um modelo significativo de uma dimensão (X2(86)=118,23; CFI=0,98; TLI=0,97; AGFI=0,95; RMSEA=0,047; SRMR=0,07)1.
Escala de Autocontrole (EAC – Grasmick et al., 1993). Essa escala refere-se à versão do instrumento originalmente elaborado por Grasmick et al. (1993), adaptada ao contexto brasileiro por Gouveia e colaboradores (2013). A EAC é composta por 24 itens, sendo alguns exemplos: “Corro risco só para me divertir”, “Quando estou com muita raiva é melhor que as pessoas fiquem longe de mim” e “Tento conseguir as coisas que quero, mesmo quando sei que isso pode causar problemas para outras pessoas”. Esses itens pertencem a seis dimensões do constructo: orientação voltada para o aqui e o agora; interesse por experiências arriscadas e emocionantes; preferência por tarefas simples em vez das complexas; inabilidade para planificar o comportamento e planejar objetivos em longo prazo; egocentrismo e indiferença pelas necessidades e desejos dos outros; e, por fim, baixa tolerância à frustração e alta em relação à dor. A resposta a cada item é demandada numa escala Likert de 4 pontos, sendo discordo totalmente=1 e concordo totalmente=4. Com o somatório simples, obtém-se um escore geral e um escore em cada uma das dimensões. No caso deste instrumento, quanto maior a pontuação do indivíduo, menor são seus níveis de autocontrole; sendo assim, pode-se dizer que o constructo mensurado é mais propriamente o “baixo autocontrole”.
A despeito da adaptação do instrumento, realizada por Gouveia et al. (2013), decidiu-se também explorar as qualidades dos instrumentos, considerando a faixa etária e o tipo o contexto específico de recrutamento dos participantes (escolas públicas). Assim, no estudo prévio de adaptação dos instrumentos, o alfa das escalas atingiu uma pontuação aceitável, variando de 0,61 (baixa tolerância à frustração) a 0,81 (preferência por tarefas simples), à exceção da escala “interesse por experiências arriscadas”, que teve um alfa abaixo do aceitável (0,56). As médias do gênero feminino em cada escala foram: 8,4 (DP=2,6) em egocentrismo; 10,3 (2,4) em dificuldade de planejamento; 9,1 (2,8) em orientação voltada para o aqui e agora; 8,4 (3,0) em busca por atividades arriscadas; 9,6 (2,3) em preferência por tarefas simples; e 10,7 (2,6) em baixa tolerância à frustração. As médias do gênero masculino foram: 8,8 (DP=2,3) em egocentrismo; 11,1 (2,6) em dificuldade de planejamento; 8,9 (2,4) em orientação voltada para o aqui e agora; 9,2 (2,3) em busca por atividades arriscadas; 9,2 (2,3) em preferência por tarefas simples; e 9,0 (3,0) em baixa tolerância à frustração. O modelo fatorial confirmatório para seis dimensões obteve: CFI=0,85; TLI=0,84; AGFI=0,83; RMSEA=0,17; SRMR=0,15 (X2(237)=1294), denotando ajustamento não aceitável da estrutura de seis fatores, favorecendo, portanto, a interpretação como um constructo unidimensional de (baixo) autocontrole.
Procedimentos de coleta
Os adolescentes foram recrutados nas escolas, sendo convidados presencialmente pelos pesquisadores dias antes das datas das coletas, a fim de que estes informassem seus responsáveis e retornassem com os termos de consentimento e assentimento assinados. O recrutamento foi realizado pelo método de amostragem por conveniência, intencional, de acordo com o método de Sheaffer, Mendenhall e Hott (1987). A coleta de dados aconteceu de forma coletiva, em grupos de 20 adolescentes, em salas e espaços alternativos cedidos pelas escolas, durante o período regular de aulas. Os instrumentos foram apresentados em formato digital, reunidos em um aplicativo (sem acesso à rede aberta), pelo qual os participantes eram solicitados a responder autonomamente e individualmente aos itens, com o uso de tablets. O aplicativo contou com recurso de áudio, com transcrição dos itens escritos em áudio, de uso opcional, no intuito de auxiliar os participantes que poderiam apresentar dificuldades de compreensão de leitura. Assim, aos adolescentes que demandaram, foi fornecido também um fone de ouvido.
Procedimentos de análise de dados
Os dados relativos às ACEs foram tratados de modo que, para cada tipo investigado, foi calculada a frequência e a proporção de adolescentes que relataram a experiência, assim como a estratificação por gênero feminino e masculino. As diferenças entre os gêneros foram verificadas por meio do teste de associação de qui-quadrado. Em seguida, os gêneros foram comparados por meio do teste U de Mann-Whitney em relação às medidas numéricas em cada domínio de ACEs e para o total de ACEs (considerando o conjunto de 37 experiências investigadas), a fim de verificar diferenças no acúmulo dessas experiências. Os gêneros também foram comparados em termos de níveis de autocontrole e de empatia. Foram calculados os riscos relativos e os valores d de Cohen como medidas de magnitude do efeito para as variáveis categóricas e numéricas, respectivamente. Por último, três modelos de regressão foram ajustados para verificar a associação entre ACEs e autocontrole e outros três para verificar a associação entre ACEs e empatia, bem como para verificar o papel moderador da variável gênero em ambos os casos.
No primeiro modelo, utilizou-se como variável dependente o escore em autocontrole e como variáveis preditoras o somatório das ACEs e sua interação com a variável gênero, controlando o efeito da variável cor/raça. No segundo modelo, as variáveis preditoras foram as ACEs subdivididas nas 15 categorias : abuso emocional (binária), abuso físico (binária), abuso sexual (binária), aborto provocado (binária), violência por pares (binária), rejeição pelos professores (binária), envolvimento em acidente grave (binária), violência na família (numérica: 0-3), abuso de substâncias pelos cuidadores (binária), hospitalização dos cuidadores por problemas grave de saúde (binária), problema de saúde mental na família (binária), encarceramento de membros da família (numérica: 0-3), divórcio, separação ou recasamento dos pais (numérica: 0-5), violência comunitária (numérica: 0-9), perdas por morte ou suicídio (numérica: 0-7), com controle pela variável cor/raça e gênero. O terceiro modelo adicionou uma interação entre gênero e cada uma das 15 categorias de ACEs que fizeram parte do segundo modelo. O mesmo procedimento desses três modelos foi reproduzido tendo como variável dependente os escores em empatia.
Resultados
A Tabela 1 mostra a frequência e a proporção de adolescentes que relataram ter experienciado, ao menos uma vez, cada uma das 37 ACEs investigadas.
Considerando as ACEs vivenciadas item a item, na amostra geral, as experiências mais frequentes no âmbito da família foram a de ser chamado, pelas pessoas da família, de termos ofensivos como “estúpido/a”, “preguiçoso/a” ou “feio/a” (65,1%), falecimento de avô(ó) (64,3%) e discussões exaltadas entre os adultos da casa (58,9%), enquanto as menos frequentes foram encarceramento da mãe (2,1%), aborto provocado (2,3%) e falecimento da mãe (2,7%). No âmbito comunitário, as maiores porcentagens na amostra foram abordagem policial (73,7%), tráfico de drogas (66,5%) e agressões e violência por parte de outros (61,0%). Destaca-se que seis das nove experiências categorizadas como violência comunitária foram testemunhadas por pelo menos metade dos adolescentes, sendo a menos frequente delas – presença de quadrilhas (organizações criminosas) no bairro – reportada por cerca de um terço da amostra (29,9%).
Em relação às diferenças de gênero, o teste de qui-quadrado identificou que o feminino, quando comparado ao masculino, relatou mais situações de abuso sexual (23,1% versus 4,8%), de violência física entre os adultos da família (16,0% versus 8,2%), assim como de abuso emocional, como ser chamada de “estúpida, preguiçosa ou feia” (70,8% versus 59,4%), de abuso físico, como ser agredida fisicamente por um familiar (30,1% vs. 22%) e, no âmbito comunitário, mais assédio sexual na rua (55,9% versus 19,2%). Por outro lado, o gênero masculino reportou ter mais experiência de acidentes graves (17,2% versus 8,8%), (viver ou testemunhar) abordagem policial (78,9% versus 68,6%), (viver ou testemunhar) violência policial (37,5% versus 31,4%) e vitimização por agressão violenta por pares (5,7% versus 3,2%). Em relação às perdas por morte ou suicídio, mais indivíduos do gênero feminino reportaram que perderam um amigo próximo (39,9% versus 34,3%), que um membro da família se suicidou (14,6% versus 9,8%) e que um amigo da família se suicidou (19,8% versus 11,2%), enquanto mais indivíduos do gênero masculino reportaram o falecimento do pai (9,1% versus 6,2%).
Em relação ao acúmulo de ACEs, sublinha-se uma média de 10 categorias, sobre as 15 investigadas, para ambos os gêneros e para a amostra total. Quanto às diferenças de gênero, a Tabela 2 mostra as diferenças em termos de proporção para aquelas representadas por um único item e em termos de média para aquelas que compreendem dois ou mais itens. Confirmando as diferenças identificadas na Tabela 1, mais indivíduos do gênero feminino reportaram vitimização por abuso emocional, abuso físico, abuso sexual e conviver com problemas de saúde mental da mãe, enquanto mais indivíduos do gênero masculino reportam sofrer mais vitimização por violência por pares e acidentes graves.
Em relação às categorias de ACEs nas quais se verificaram diferenças entre os gêneros, observou-se que o feminino obteve maior pontuação na categoria de violência no âmbito da família e nas perdas por morte ou suicídio, enquanto o masculino obteve maior pontuação no âmbito das violências comunitárias. No somatório total de ACEs, os indivíduos do gênero feminino pontuaram significativamente acima dos do gênero masculino.
A Tabela 3 mostra a relação entre ACEs e empatia, testada por três modelos, sendo dois deles aninhados (1b e 1c). O Modelo 1a mostra que a associação entre o somatório de todas as ACEs não possui relação significativa com o escore na escala de empatia. Já o segundo modelo (1b) mostra que a vivência de um aborto provocado possui associação negativa com a escala de empatia, de modo que os estudantes que relataram ter experimentado um aborto provocado (ou na parceira) apresentaram, em média, 3,94 pontos a menos na escala de empatia. A pontuação total nas violências comunitárias se associou de forma positiva aos níveis de empatia. O modelo 1c, no qual foram consideradas as relações de moderação entre ACEs e gênero, verificou uma interação significativa entre violências comunitárias e o gênero masculino, de modo que os indivíduos do gênero masculino que indicaram mais experiências nessa categoria tenderam a apresentar maiores pontuações em empatia quando comparados aos indivíduos do gênero feminino. Em todos os modelos, o gênero masculino foi um preditor de menores pontuações em empatia, indicando que o gênero feminino pontuou, em média, mais alto nessa escala. Em termos de capacidade explanatória dos modelos, o melhor deles (1c) explica cerca de 5% a variação na medida de empatia.
Na Tabela 4, estão os resultados das regressões multivariadas referentes ao autocontrole. Vale relembrar que quanto maior a pontuação na EAC, mais baixo o nível de aquisição dessa competência socioemocional.
O modelo 2a mostrou uma relação positiva significativa entre o somatório das ACEs e piores escores em autocontrole, porém sem qualquer relação significativa com a variável gênero. No modelo 2b, os domínios abuso emocional, abuso físico, rejeição por parte dos professores, vivência de acidente grave, divórcio/separação ou recasamento dos pais e perdas por falecimento apresentaram associação positiva e significativa com a dificuldade em autocontrole. No terceiro modelo (2c), o abuso emocional, a vivência de acidente grave, o divórcio/separação dos pais e as perdas por falecimento mantiveram suas relações positivas e significativas. As relações de interação indicaram que o gênero desempenha um papel moderador na relação entre ACEs e autocontrole, no sentido de que as ACEs como aborto provocado e violências comunitárias afetam os gêneros de forma distinta, de modo que o feminino apresenta piores níveis de autocontrole que o masculino quando submetido a esses tipos de ACEs. Quanto à capacidade explanatória dos modelos, o melhor deles (2c) explica cerca de 13% a variação na medida de autocontrole.
Discussão
As experiências adversas na infância se mostram significativamente associadas a desfechos negativos, segundo a literatura científica (Villanueva et al., 2023; Zhu et al., 2023). Acredita-se que a variável gênero influencie a probabilidade de sofrer determinados tipos de ACEs, assim como seu impacto no desenvolvimento psicossocial, notadamente no que diz respeito às aquisições de competências socioemocionais. Neste estudo, com dados de uma amostra de adolescentes brasileiros vivendo em condições de vulnerabilidade social, buscou-se verificar a relação entre os diferentes tipos de ACEs, as competências socioemocionais – autocontrole e empatia – e o gênero, visando verificar o efeito moderador deste nessa relação.
No tocante às taxas de ACEs, inicialmente ressalta-se que, na amostra geral e nas subamostras relativas aos gêneros masculino e feminino, observou-se uma média de 10 categorias de ACEs vividas, sobre 15 investigadas (sem diferenças significativas entre os gêneros), o que indica um acúmulo significativo das situações investigadas. Focalizando as categorias, os dados denotaram maior prevalência de experiências de abuso emocional praticado pelos familiares, perda de familiar próximo e violência dentro da própria família. Um estudo de coorte inglês (Lacey et al., 2022) encontrou maior prevalência da categoria problemas de saúde mental materno (52,1%), seguida de separação ou divórcio parental (34,7%). Um estudo estadunidense, com amostra representativa da população, encontrou maior prevalência de dificuldades econômicas (22,5%) e divórcio ou separação dos responsáveis (21,9%) (Crouch et al., 2019). Outro estudo estadunidense encontrou maiores frequências nos domínios de abuso emocional (33,5%), separação ou divórcio dos pais (28,2%), abuso de substâncias na família (26,8%), violência por parceiro íntimo (17,8%), abuso físico (17,8%), problema de saúde mental de familiar (16,2%), abuso sexual (11,3%) e encarceramento de algum familiar (8,1%) (Giano et al., 2020).
É interessante pontuar que, apesar de haver diferenças nas categorias específicas das ACEs investigadas neste estudo e nos estudos supracitados, os dados sempre sugerem uma maior prevalência de ACEs no âmbito familiar. As diferenças nas categorias específicas podem dever-se a questões metodológicas. Neste estudo, investigou-se uma amostra de jovens em situação de vulnerabilidade social, enquanto nos demais lidou-se com dados de amostra da população geral. Esse ponto merece destaque, uma vez que a condição socioeconômica da amostra estudada – uma das dimensões da vulnerabilidade social – pode influenciar significativamente sua exposição a certas formas de ACEs (Lacey et al., 2022; Walsh et al., 2019).
No tocante às prevalências de ACEs de acordo com o gênero, os resultados denotaram uma taxa de exposição maior em meio ao gênero feminino, corroborando a maior parte da literatura (Comacchio et al., 2022; Haahr-Pedersen et al., 2020). As prevalências dos tipos específicos de ACEs, por sua vez, corroboram estudos como os de Leban e Gibson (2020) e de Mersky et al. (2021), os quais sublinham que as vitimizações nas esferas familiar e privada são mais frequentes em meio a adolescentes do gênero feminino, ao passo que as violências comunitárias são mais frequentes em meio aos do gênero masculino. Segundo Leban e Gibson (2020), esse resultado pode ser interpretado à luz dos estereótipos de gênero e suas consequências. No contexto sociocultural brasileiro, especificamente, tradições sexistas norteiam as expectativas com relação aos comportamentos, bem como a atribuição de tarefas para cada gênero, desde a infância (Carvalho & Melo, 2019). Nessa esteira, as adolescentes provavelmente se tornam mais suscetíveis – no âmbito doméstico – a sofrerem com a violência de gênero, que inclui abusos nos domínios sexual, físico, mental e econômico (Division of International Protection, 2021). Os adolescentes do gênero masculino seriam mais suscetíveis às violências comunitárias, também em função de estereótipos de gênero. Um estudo brasileiro realizado com adolescentes de diferentes regiões do país encontrou maior prevalência de indivíduos do gênero masculino como vítimas de violência física e psicológica na comunidade quando comparados aos do gênero feminino, argumentando em torno de uma possível banalização do sofrimento masculino, no meio social, para explicar tal fenômeno (Moreira & Paludo, 2022).
Em relação às competências socioemocionais investigadas, os resultados obtidos apresentam convergências e divergências com a literatura. No tocante à empatia, é importante observar que as variações nos níveis dessa competência apresentaram, de modo geral, poucas associações significativas com os domínios de ACEs e nenhuma associação com o somatório das ACEs. No entanto, nas relações entre empatia e gênero, verificou-se que os escores foram mais elevados para as adolescentes, corroborando a literatura (O’Neill, 2020; Silke et al., 2018’). As disparidades de gênero em empatia, conforme apontamento da literatura, podem decorrer das práticas de socialização diferenciadas às quais são submetidos meninas e meninos, mas também podem decorrer, em parte, da utilização do método do autorrelato. Tal método pode mensurar, na realidade, uma autopercepção das próprias habilidades, o que também pode estar sob a influências das expectativas de gênero, que normatizam que as meninas sejam mais sensíveis aos estados emocionais e às demandas do outro. Nos estudos em que essa competência é medida pelo desempenho na realização de tarefas ou por observação externa de comportamentos indicativos de empatia, essa disparidade entre os gêneros nem sempre se mantém (Löffler & Greitemeyer, 2021).
Ainda em relação à empatia, no modelo em que se considerou as relações com as ACEs e a moderação do gênero, observou-se uma relação positiva entre a exposição à violência comunitária e aumento do nível de empatia para o gênero masculino. A expectativa era de que ACEs sempre impactariam negativamente aquisições como a empatia. Contudo, para o gênero masculino, a experiência das violências na comunidade parece fomentar maior sensibilidade ao outro. Em comparação, uma pesquisa (Berzenski & Yates, 2022) com crianças de seis a oito anos, ao verificar o desenvolvimento da empatia perante históricos de maus tratos, observou aumento e diminuição dos níveis dessa habilidade socioemocional a depender de tipos específicos de ACEs, sendo que a vitimização por abuso emocional e negligência foi associada à diminuição da empatia, enquanto abuso físico e exposição à violência doméstica previram o aumento desta (sendo que a representação negativa da mãe teve efeito moderador nessas correlações). Portanto, os diferentes tipos de ACEs, a depender da fase em que ocorrem, parecem interferir de maneiras distintas no desenvolvimento da empatia, na medida em que outras variáveis (no caso do presente artigo, o gênero) exercem efeito moderador.
Com relação ao autocontrole/auto regulação, alinhando-se mais às expectativas, os resultados mostraram menores níveis dessa competência, sendo que na amostra geral isto correlacionou-se a níveis mais altos de ACEs (acúmulo) (Chapple et al., 2021; Jones, Pierce, & Chapple, 2022). No que se refere ao papel moderador do gênero na relação entre ACEs e autocontrole, verificou-se uma relação negativa entre ACEs – especificamente o aborto provocado e as violências comunitárias – e os níveis dessa competência, para o gênero feminino. Esse dado parece divergir dos resultados das pesquisas na área (Jones, Pierce & Chapple, 2022; Van Tetering et al., 2020). No entanto, considerando que o exame dos níveis dessa competência, neste estudo, se deu de forma associada às ACEs, esse dado pode indicar, na verdade, uma maior suscetibilidade do gênero feminino aos prejuízos dessas vivências. Contrariamente, tem-se o dado de que os adolescentes do gênero masculino que indicaram ter tido a experiência de parceira que provocou aborto pontuaram significativamente menos na escala de autocontrole, ou seja, apresentaram maior autocontrole, em comparação às adolescentes do gênero feminino que reportaram essa experiência adversa. Essa adversidade, em específico, por questões que vão desde o aspecto fisiológico até as expectativas de gênero relacionadas à maternidade, impacta diretamente as mulheres, as afetando de maneira mais intensa física e psicologicamente (Faria et al., 2021). Por isso, uma hipótese mais adequada seria a de que essa capacidade de auto regulação mais prejudicada nelas seja indicativa de prejuízos decorrentes dessa experiência traumática, uma vez que o mais baixo autocontrole pode estar associado a piores indicadores de ajustamento psicológico (Oliva et al., 2019). Assim, esse dado traz à luz uma temática delicada e importante de ser estudada no contexto brasileiro, o da prática do aborto (não legalizada), como uma experiência que prejudica o desenvolvimento das adolescentes, representando risco não só a sua integridade física, mas também à psíquica (Menezes et al., 2020).
Por fim, cumpre frisar que investigar as vivências adversas e os efeitos sobre o desenvolvimento psicossocial de adolescentes, pela perspectiva do gênero, norteia-se pelo potencial das normas intrínsecas aos estereótipos referentes ao feminino ou ao masculino (ou outro gênero), de moldar as atitudes e os comportamentos dos indivíduos, por meio das relações sociais (Cislaghi & Heise, 2020). Logo, como esses adolescentes se percebem em seus entornos sociais, e como vivenciam hierarquizações e violências, é mediado pelas questões de gênero. Posto isso, tem-se como uma limitação do estudo a redução da análise de gênero a duas categorias amplas: masculino e feminino. Assim, é certo que outras identificações de gênero foram excluídas, atém mesmo na coleta dos dados do estudo maior, pelo fato de não haver mais opções de escolha no questionário aplicado (restrito às categorias feminino, masculino e não-binário). Ademais, é preciso considerar a possibilidade de pessoas transgênero terem integrado o estudo, se atribuído uma identidade de gênero dentro daquilo que era possível (estando, assim, relativamente invisibilizados/as). Sabe-se que pessoas desse segmento são altamente vulneráveis a certas formas de vitimização, tanto familiar, quanto comunitária (talvez até mais que os identificados como não-binários). Teria sido possível identificar, ainda que grosseiramente, participantes trans, ao verificar marcações distintas nos itens “gênero” (identidade) e “sexo” (biológico, atribuído no nascimento) de cada participante. No entanto, dada a complexidade de se abordar o tema no contexto do recorte aqui apresentado – englobando adolescência, desenvolvimento, experiências adversas e vulnerabilidade social –, essa análise deverá ser realizada futuramente, assim como aquela que envolve os indivíduos que se autodeclararam não-binários.
Conclusões
Este estudo visou contribuir para a construção de conhecimentos mais refinados sobre as nuances das experiências adversas que afetam o desenvolvimento psicossocial de crianças e adolescentes, considerando as diferenças de gênero. Pôde-se observar a alta magnitude das taxas de determinadas ACEs e o fato de o acúmulo de ACEs impactar negativamente adolescentes, evidenciando também os diferentes desdobramentos das experiências em relação ao gênero. De acordo com os resultados, o gênero feminino padece mais com as ACEs. Logo, produzir essas evidências pode ajudar a aumentar a sensibilidade à importância de se identificar e prevenir as ACEs, também por meio de um debate em torno das questões de gênero (King et al., 2021). Sublinha-se a importância de conduzir estudos sobre fatores protetivos às ACEs e seus desdobramentos (Hays-Grudo & Morris, 2020), incluindo igualmente uma perspectiva de gênero, de forma a subsidiar intervenções eficazes no campo da prevenção.
Limitações e estudos futuros
Apesar das contribuições aportadas por este estudo, é importante destacar suas limitações. Elas se relacionam a seu recorte transversal, ao uso de instrumentos de autorrelato e ao fato de enfocar gênero somente pela perspectiva binária. Sugere-se, então, a adoção de um recorte longitudinal, o emprego de instrumentos de coleta de dados que diminuam a possibilidade de respostas norteadas pela desejabilidade social, bem como a ampliação das categorias de gênero, de forma a abarcar outras expressões identitárias. Além disso, propõe-se também que estudos futuros busquem elucidar a relação entre ACEs e indicadores de saúde mental, para que se possa compreender melhor os resultados deste estudo, com relação às competências socioemocionais.
-
Revisão textual:
Normalização bibliográfica (APA 7ª Ed.), preparação e revisão textual em português: Luiza Corrêa (Tikinet) <revisao@tikinet.com.br>Versão e revisão em língua inglesa: Marília Dominicci (Tikinet)traducao@tikinet.com.br>
-
Apoio e financiamento:
Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP), no. 2020/07599-9 e Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES), no. 88887.658123/2021-00
Referências
-
Berkman, E. T., Hutcherson, C. A., Livingston, J. L., Kahn, L. E., & Inzlicht, M. (2017) Self-control as value-based choice. Current Directions in Psychological Science, 26(5), 422-428. https://doi.org/10.1177/0963721417704394
» https://doi.org/10.1177/0963721417704394 -
Berzenski, S. R., & Yates, T. M. (2022) The development of empathy in child maltreatment contexts. Child Abuse & Neglect, 133, 1-13. https://doi.org/10.1016/j.chiabu.2022.105827
» https://doi.org/10.1016/j.chiabu.2022.105827 -
Bright, M. A., & Thompson, L. A. (2018) Association of adverse childhood experiences with co-occurring health conditions in early childhood. Journal of Developmental and Behavioral Pediatrics, 39(1), 37-45. https://doi.org/10.1097/DBP.0000000000000514
» https://doi.org/10.1097/DBP.0000000000000514 -
Brown, C. S., & Biefeld, S. (2023). The development of perpetration and tolerance of sexual harassment. Current Directions in Psychological Science, 32(1), 10-17. https://doi.org/10.1177/09637214221141855
» https://doi.org/10.1177/09637214221141855 -
Carvalho, J. B., & Melo, M. C. (2019). A família e os papéis de gênero na adolescência. Psicologia & Sociedade, 31, 1-15. https://doi.org/10.1590/1807-0310/2019v31168505
» https://doi.org/10.1590/1807-0310/2019v31168505 -
Casa Civil do Estado de São Paulo. (2023, 8 de setembro). Alesp aprova novo salário mínimo paulista de R$ 1.550, proposto pelo governo de SP https://tinyurl.com/2mdcm79z
» https://tinyurl.com/2mdcm79z -
Ceccarelli, C., Prina, E., Muneghina, O., Jordans, M., Barker, E., Miller, K., Singh, R., Acarturk, C., Sorsdhal, K., Cuijpers, P., Lund, C., Barbui, C. & Purgato, M. (2022) Adverse childhood experiences and global mental health: Avenues to reduce the burden of child and adolescent mental disorders. Epidemiology and Psychiatric Sciences, 31, 1-7. https://doi.org/10.1017/S2045796022000580
» https://doi.org/10.1017/S2045796022000580 -
Chang, X., Jiang, X., Mkandarwire, T., & Shen, M. (2019). Associations between adverse childhood experiences and health outcomes in adults aged 18–59 years. PLoS ONE, 14(2), 1-11. https://doi.org/10.1371/journal.pone.0211850
» https://doi.org/10.1371/journal.pone.0211850 -
Chapple, C. L., Pierce, H., & Jones, M. S. (2021). Gender, adverse childhood experiences, and the development of self-control. Journal of Criminal Justice, 74, 101811. https://doi.org/10.1016/j.jcrimjus.2021.101811
» https://doi.org/10.1016/j.jcrimjus.2021.101811 -
Cislaghi, B., & Heise, L. (2020) Gender norms and social norms: Differences, similarities and why they matter in prevention science. Sociology of Health & Illness, 42(2), 407-422. https://doi.org/10.1111/1467-9566.13008
» https://doi.org/10.1111/1467-9566.13008 - Collaborative for Academic, Social, and Emotional Learning. (2003). Safe and sound: An educational leader’s guide to evidence-based social and emotional learning (SEL) programs
-
Comacchio, C., Antolini, G., Ruggeri, M., & Colizzi, M. (2022) Gender-oriented mental health prevention: A reappraisal. International Journal of Environmental Research and Public Health, 19(3), 1-21. https://doi.org/10.3390/ijerph19031493
» https://doi.org/10.3390/ijerph19031493 -
Crouch, E., Probst, J. C., Radcliff, E., Bennett, K. J., & McKinney, S. H. (2019). Prevalence of adverse childhood experiences (ACEs) among US children. Child Abuse & Neglect, 92, 209-218. https://doi.org/10.1016/j.chiabu.2019.04.010
» https://doi.org/10.1016/j.chiabu.2019.04.010 -
Division of International Protection. (2021). UNHCR policy on the prevention of, risk mitigation, and response to gender-based violence (GBV). International Journal of Refugee Law, 33(3), 506-527. https://doi.org/10.1093/ijrl/eeac006
» https://doi.org/10.1093/ijrl/eeac006 -
Ellemers, N. (2018) Gender stereotypes. Annual Review of Psychology, 69, 275-298. https://doi.org/10.1146/annurev-psych-122216-011719
» https://doi.org/10.1146/annurev-psych-122216-011719 -
Faria, D. S. C., Silva, L. S. O., Leahy, L. L. G., Viana, M. P. C. F., Tourinho, L. O. S., & Azevedo, F. L. A. (2021). As perspectivas dos direitos humanos sobre aborto e saúde pública no Brasil: Uma revisão narrativa. Revista Eletrônica Acervo Saúde, 13(12), 1-7. https://doi.org/10.25248/reas.e9297.2021
» https://doi.org/10.25248/reas.e9297.2021 -
Felitti, V. J., Anda, R. F., Nordenberg, D., Williamson, D. F., Spitz, A. M., Edwards, V., Koss, M. P., & Marks, J. S. (1998). Relationship of childhood abuse and household dysfunction to many of the leading causes of death in adults: The adverse childhood experiences (ACE) study. American Journal of Preventive Medicine, 14(4), 245-258. https://doi.org/10.1016/s0749-3797(98)00017-8
» https://doi.org/10.1016/s0749-3797(98)00017-8 -
Giano, Z., Wheeler, D. L., & Hubach, R. D. (2020). The frequencies and disparities of adverse childhood experiences in the U.S. BMC Public Health, 20, 1-12. https://doi.org/10.1186/s12889-020-09411-z
» https://doi.org/10.1186/s12889-020-09411-z - Gouveia, V. V., Santos, W. S., Guerra, V. M., Fonseca, P. N., & Gouveia, R. S. V. (2013). Escala de autocontrole: Adaptação brasileira e evidências de validade de construto. Avaliação Psicológica, 12(3), 379-386.
- Grasmick, H. G., Tittle, C. R., Bursik, R. J., & Arneklev, B. J. (1993). Testing the core empirical implications of Gottfredson and Hirschi’s general theory of crime. Journal of Research in Crime and Delinquency, 30, 5-29.
-
Gross, D. (2021) In the self-control and self-regulation maze: Integration and importance. Personality and Individual Differences, 175, 110728. https://doi.org/10.1016/j.paid.2021.110728
» https://doi.org/10.1016/j.paid.2021.110728 -
Gutierrez, B. C., Halim, M. L. D., Martinez, M. A., & Arredondo M. (2020). The heroes and the helpless: The development of benevolent sexism in children. Sex Roles: A Journal of Research, 82(9-10), 558-569. https://doi.org/10.1007/s11199-019-01074-4
» https://doi.org/10.1007/s11199-019-01074-4 -
Haahr-Pedersen, I., Perera, C., Hyland, P., Vallières, F., Murphy, D., Hansen, M., Spitz, P., Hansen, P., & Cloitre, M. (2020) Females have more complex patterns of childhood adversity: Implications for mental, social, and emotional outcomes in adulthood. European Journal of Psychotraumatology, 11(1), 1-12. https://doi.org/10.1080/20008198.2019.1708618
» https://doi.org/10.1080/20008198.2019.1708618 -
Hawes, D. J., & Allen, J. L. (2023) A developmental psychopathology perspective on adverse childhood experiences (ACEs): Introduction to the special issue. Research on Child and Adolescent Psychopathology, 51, 1715-1723. https://doi.org/10.1007/s10802-023-01100-w
» https://doi.org/10.1007/s10802-023-01100-w - Hays-Grudo, J., & Morris, A. S. (2020). Adverse and protective childhood experiences: A developmental perspective American Psychological Association.
-
Heidinger, L. S., & Willson, A. E. (2019) The childhood roots of adult psychological distress: Interdisciplinary perspectives toward a better understanding of exposure to cumulative childhood adversity. Child Abuse & Neglect, 97, 104-136. https://doi.org/10.1016/j.chiabu.2019.104136
» https://doi.org/10.1016/j.chiabu.2019.104136 -
Jones, M. S., Pierce, H., & Chapple, C. L. (2022). Early adverse childhood experiences and self-control development among youth in fragile families. Youth & Society, 54(5), 806-832. https://doi.org/10.1177/0044118X21996378
» https://doi.org/10.1177/0044118X21996378 -
Jones, M. S., Pierce, H., & Shafer, K. (2022) Gender differences in early adverse childhood experiences and youth psychological distress. Journal of Criminal Justice, 83, 101-195. https://doi.org/10.1016/j.jcrimjus.2022.101925
» https://doi.org/10.1016/j.jcrimjus.2022.101925 -
King, T. L., Scovelle, A. J., Meehl, A., Milner, A. J., & Priest, N. (2021). Gender stereotypes and biases in early childhood: A systematic review. AustralasianJournal of Early Childhood, 46(2), 112-125. https://doi.org/10.1177/1836939121999849
» https://doi.org/10.1177/1836939121999849 -
Lacey, R. E., Howe, L. D., Kelly-Irving, M., Bartley, M., & Kelly, Y. (2022). The clustering of adverse childhood experiences in the Avon longitudinal study of parents and children: Are gender and poverty important? Journal of Interpersonal Violence, 37(5-6), 2218-2241. https://doi.org/10.1177/0886260520935096
» https://doi.org/10.1177/0886260520935096 -
Leban, L., & Gibson, C. L. (2020). The role of gender in the relationship between adverse childhood experiences and delinquency and substance use in adolescence. Journal of Criminal Justice, 66, 101637. https://doi.org/10.1016/j.jcrimjus.2019.101637
» https://doi.org/10.1016/j.jcrimjus.2019.101637 -
Löffler, C.S., & Greitemeyer, T. (2021). Are women the more empathetic gender? The effects of gender role expectations. Current Psychology, 42, 220-231. https://doi.org/10.1007/s12144-020-01260-8
» https://doi.org/10.1007/s12144-020-01260-8 - Lucio, E., & Durán, C. (2000). Sucesos de vida, versión para adolescentes Manual Moderno.
-
Malonda-Vidal, E., Samper-García, P., Llorca-Mestre, A., Muñoz-Navarro, R., & Mestre-Escrivá, V. (2021). Traditional masculinity and aggression in adolescence: Its relationship with emotional processes. International Journal of Environmental Research and Public Health, 18, 1-12. https://doi.org/10.3390/ijerph18189802
» https://doi.org/10.3390/ijerph18189802 -
Menezes, G. M. S., Aquino, E. M. L., Fonseca, S. C., & Domingues, R. M. S. M. (2020). Aborto e saúde no Brasil: Desafios para a pesquisa sobre o tema em um contexto de ilegalidade. Cadernos de Saúde Pública, 36(Suppl1), 1-15. https://doi.org/10.1590/0102-311x00197918
» https://doi.org/10.1590/0102-311x00197918 -
Mersky, J. P., Choi, C., Plummer Lee, C., & Janczewski, C. E. (2021) Disparities in adverse childhood experiences by race/ethnicity, gender, and economic status: Intersectional analysis of a nationally representative sample. Child Abuse & Neglect, 117, 105066. https://doi.org/10.1016/j.chiabu.2021.105066
» https://doi.org/10.1016/j.chiabu.2021.105066 -
Mitchell, K. J., Jones, L. M., Turner, H. A., Beseler, C. L., Hamby, S., & Wade, R. (2019). Understanding the impact of seeing gun violence and hearing gunshots in public places: Findings from the Youth Firearm Risk and Safety Study. Journal of Interpersonal Violence, 36(17-18), 8835-8851. https://doi.org/10.1177/0886260519853393
» https://doi.org/10.1177/0886260519853393 -
Moreira, L. R., & Paludo, S. S. (2022). A violência mora ao lado? Violência familiar e comunitária entre adolescentes. Psicologia: Teoria e Pesquisa, 38, 1-10. https://doi.org/10.1590/0102.3772e38314.pt
» https://doi.org/10.1590/0102.3772e38314.pt -
Nigg, J. T. (2017) Annual research review: On the relations among self-regulation, self-control, executive functioning, effortful control, cognitive control, impulsivity, risk-taking, and inhibition for developmental psychopathology. Journal of Child Psychology and Psychiatry, 58(4), 361-383. https://doi.org/10.1111/jcpp.12675
» https://doi.org/10.1111/jcpp.12675 -
Oliva, A., Antolín-Suárez, L., & Rodríguez-Meirinhos, A. (2019) Uncovering the link between self-control, age, and psychological maladjustment among Spanish adolescents and young adults. Psychosocial Intervention, 28(1), 49 – 55. https://doi.org/10.5093/pi2019a1
» https://doi.org/10.5093/pi2019a1 -
Oliveira, P. C., Reis, M. L., Vandenberghe, L., Souza, M. M., & Medeiros, M. (2020). “Sobrevivendo”: Vulnerabilidade social vivenciada por adolescentes em uma periferia urbana. Interface: Comunicação, Saúde, Educação, 24, 1-18. https://doi.org/10.1590/Interface.190813
» https://doi.org/10.1590/Interface.190813 -
O’Neill, K. K. (2020). Adolescence, empathy, and the gender gap in delinquency. Feminist Criminology, 15(4), 410-437. https://doi.org/10.1177/1557085120908332
» https://doi.org/10.1177/1557085120908332 -
Organização Mundial da Saúde. (2020a, 28 de janeiro). Adverse childhood experiences international questionnaire (ACE-IQ) https://tinyurl.com/4ehx7csa
» https://tinyurl.com/4ehx7csa -
Organização Mundial da Saúde. (2020b, 15 de setembro). Gender and health https://tinyurl.com/mrydf5ar
» https://tinyurl.com/mrydf5ar -
Pereira, F. G., & Viana, M. C. (2021). Adaptação transcultural do Adverse Childhood Experiences International Questionnaire. Revista de Saúde Pública, 55, 1-21. https://doi.org/10.11606/s1518-8787.2021055003140
» https://doi.org/10.11606/s1518-8787.2021055003140 -
Sheaffer, L. D., Mendenhall, W., & Hott, D. A. (1987). Elementary survey sampling. Technometrics, 29(2), 248. https://doi.org/10.2307/1269791
» https://doi.org/10.2307/1269791 -
Silke, C., Brady, B., Boylan, C., & Dolan, P. (2018) Factors influencing the development of empathy and pro-social behaviour among adolescents: A systematic review. Children andYouth Services Review, 94, 421-436. https://doi.org/10.1016/j.childyouth.2018.07.027
» https://doi.org/10.1016/j.childyouth.2018.07.027 -
Spreng, R. N., McKinnon, M. C., Mar, R. A., & Levine, B. (2009). The Toronto empathy questionnaire: Scale development and initial validation of a factor-analytic solution to multiple empathy measures. Journal of Personality Assessment, 91, 62-71. http://dx.doi.org/10.1080/00223890802484381
» https://doi.org/10.1080/00223890802484381 -
Stellar, J. E., & Duong, F. (2023). The little black box: Contextualizing empathy. Current Directions in Psychological Science, 32(2), 111-117. https://doi.org/10.1177/09637214221131275
» https://doi.org/10.1177/09637214221131275 -
Van Tetering, M. A. J., Ven der Laan, A. M., de Kogel, C. H., de Groot, R. H. M., & Jolles, J.(2020). Sex differences in self-regulation in early, middle and late adolescence: A large-scale cross-sectional study. PLoS ONE, 15(1), 1-17. https://doi.org/10.1371/journal.pone.0227607
» https://doi.org/10.1371/journal.pone.0227607 -
Villanueva, L., Adrián, J. E., & Gomis-Pomares, A. (2023). The effect of childhood adversity on mental health in young adults: A longitudinal study. Current Psychology, 43, 6418-6429 https://doi.org/10.1007/s12144-023-04831-7
» https://doi.org/10.1007/s12144-023-04831-7 -
Walsh, D., McCartney, G., Smith, M., & Armour, G. (2019). Relationship between childhood socioeconomic position and adverse childhood experiences (ACEs): A systematic review. Journal of Epidemiology and Community Health, 73(12), 1087-1093. https://doi.org/10.1136/jech-2019-212738
» https://doi.org/10.1136/jech-2019-212738 -
Zhu, J., Racine, N., Devereux, C., Hodgins, D. C., & Madigan, S. (2023). Associations between adverse childhood experiences and substance use: A meta-analysis. Child Abuse & Neglect Publicação online avançada. https://doi.org/10.1016/j.chiabu.2023.106431
» https://doi.org/10.1016/j.chiabu.2023.106431
Editado por
-
Editores responsáveis:
Editor Associado: Alice Sophie Sarcinell <https://orcid.org/0000-0002-1074-2417>Editor Chefe: Chantal Victória Medaets <https://orcid.org/0000-0002-7834-3834>
Datas de Publicação
-
Publicação nesta coleção
28 Out 2024 -
Data do Fascículo
2024
Histórico
-
Recebido
20 Out 2023 -
Revisado
23 Fev 2024 -
Aceito
16 Mar 2024