Resumo
O objetivo deste texto é, por meio de um caso, inspecionar a diversidade contextual de gênero, de formas, práticas e motivações de um agente nas interações com redes de comercialização de drogas ilegais. A reflexão busca mapear os trânsitos, as negociações de sentido que foram levadas a cabo, as incoerências, as mobilidades e moralidades negociadas. Este caso faz parte de uma pesquisa de campo, realizada em 2015, sobre a participação de mulheres em redes de comercialização de drogas ilegais em Belo Horizonte e Região Metropolitana, no estado de Minas Gerais.
Palavras chave:
Gênero; Tráfico ilegal de drogas; Deslocamentos
Resumen
El objetivo de este texto es, a través de un caso, inspeccionar la diversidad contextual de género, de formas, prácticas y motivaciones de un agente en las interacciones con redes de comercialización de drogas ilegales. La reflexión busca mapear los tránsitos, las negociaciones de sentido que se llevaron a cabo, las incoherencias, las movilidades y las moralidades negociadas. Este caso es parte de una investigación de campo, realizada en 2015, sobre la participación de mujeres en redes de comercialización de drogas ilegales en Belo Horizonte y Región Metropolitana en el estado de Minas Gerais.
Palabras clave:
Género; Tráfico ilegal de drogas; Desplazamientos
Abstract
The purpose of this paper is, through a case, to inspect the context of gender diversity, forms, practices and motivations established in the interactions with illegal drug marketing networks. The reflection seeks to map the transits, the negotiations of meaning that were undertaken, inconsistencies, negotiated mobility and moralities. This case is part of the field research, conducted in 2015, on women's participation in illegal drug marketing networks in Belo Horizonte and the metropolitan area.
Keywords:
Gender; Illegal drug trafficking; Displacements
Introdução
A proposta deste artigo centra-se nos deslocamentos e sentidos de gênero dentro das redes de comercialização de drogas ilegais, a partir da análise da trajetória de Tatá1 1 Nome fictício , mulher jovem que participou de uma rede de comercialização no varejo de drogas ilegais na RMBH (rede de empreendedores de bocas). Nossa principal questão aqui é entender como os indivíduos conseguem mobilizar seus recursos (incluindo o gênero com o qual se apresentam socialmente) diante de limites estruturais, aparentemente intransponíveis, dando-lhes outros sentidos e valores.
Em nossa abordagem, a perspectiva de gênero justifica-se ao nos permitir expor alguns desses limites como produzidos pelas assimetrias e hierarquias dentro das relações entre homens e mulheres (Scott, 1996Scott, J. (1996). Gênero: uma categoria útil para análise histórica. Recife: S. O. S. Corpo.). A assimetria de poder é marca constitutiva das relações de gênero e, portanto, inerente às interações entre homens e mulheres no seu cotidiano e na sua cultura (Welzer-Lang, 2001Welzer-Lang, D. (2001). A construção do masculino: dominação das mulheres e homofobia. Rev. Estud. Femininos, 9(2), 460-482.). No entanto, é importante ressaltar que relações assimétricas de poder existem não apenas na relação entre homens e mulheres, mas também entre as próprias mulheres já que, em muitas circunstâncias, há entre elas mais diferenças e disputas do que identificações devido às especificidades de classe, raça e poder (Kofes, 2001Kofes, S. (2001). Mulher, mulheres: identidade, diferença e desigualdade na relação entre patroas e empregadas. Campinas, SP: Editora da Unicamp.). Não podemos, assim, deixar de atentar para o fato de que, como afirma Moore (1994), mesmo que as distinções sejam percebidas categoricamente, homem e mulher, sua vivência é relacional e as relações de gênero sempre atravessam outras relações sociais. Esta compreensão evita que pensemos o gênero como uma categoria isolada, reconhecendo que existem intersecções e interfaces com outras categorias de diferenciação social como classe, raça, etnicidade e sexualidade, e que atuam conjunta ou paralelamente ao gênero, como limites estruturais da ação (Barbieri, 1993Barbieri, T. (1993). Sobre a Categoria Gênero: uma introdução Teórica metodológica. (1993). Debates em Sociologia, 18, 2-19. Recuperado de http://estudios.sernam.cl/img/upoloads/barbieri_sobre_categoria_genero.pdf.
http://estudios.sernam.cl/img/upoloads/b...
; Nicholson, 2000Nicholson, L. (2000). Interpretando o Gênero. Revista Estudos Feministas, 8(2), 9-41.).
Ainda em relação à nossa compreensão do conceito, ao assumirmos que gênero se refere às múltiplas conotações sociais atribuídas ao dimorfismo sexual (Corrêa, 1996Corrêa, M. (1996). Sobre a invenção da mulata. Cadernos Pagu (6-7), 35-50.), possuindo historicidade e variabilidade de acordo com contextos culturais distintos, não quer dizer que pensamos o sexo como algo natural ou biologicamente dado, um elemento pré-discursivo que se constitui numa fundação estável sobre a qual se construiriam as diferenças sociais atribuídas ao feminino e ao masculino2 2 Para uma crítica ao “fundacionalismo biológico” ver Nicholson, 2000. . Ao contrário, seguimos aqui os vários autores que desconstroem a relação dicotômica entre biologia e cultura, sendo o sexo definido pela primeira e gênero pela segunda (Butler. 2003Butler, J. P. (2003). Problemas de gênero: feminismo e subversão da identidade. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira.; Laqueur, 2001Laquer, T. (2001). Inventando o Sexo - Corpo e gênero dos gregos a Freud. Rio de Janeiro, Relume Dumará.; Moore, 1994Moore, H. L. (1994). Understanding Sex and Gender. In T. Ingold (Ed.), Companion Encyclopedia of Anthropology: Humanity, culture and social life (pp. 813-830). London: Rutledge. ). Uma vez que se entende o sexo e o gênero como atributos independentes, ambos se revelam fluidos e não fixos ou determinados por fatores biológicos. Gênero não se refere a homens e mulheres como opostos fixos, mas, antes diz respeito à categorização de diferenças, dominação e subalternidades. A partir daí, as relações de assimetria e poder entre masculino e feminino se mantêm, mas não por si somente: existem, por exemplo, graus de “masculinidade” - revelados nas relações sociais - quando os indivíduos podem ser menos ou mais “masculinos” e, portanto, terem menos ou mais poder (Strathern, 2006Strathern, M. (2006). O gênero da dádiva: problemas com as mulheres e problemas com a sociedade na Melanésia. Campinas, SP: Editora da Unicamp.; Vale Almeida, 1995Vale Almeida, M. (1995). Senhores de Si. Uma Interpretação Antropológica da Masculinidade. Lisboa: Fim de Século ., 1996Vale Almeida, M. (1996). Masculinidade e. Poder. Revendo um caso do Sul de Portugal. Anuário Antropológico, 95, 161-190.).
Mais ainda, quando partimos das reflexões de Judith Butler (2003Butler, J. P. (2003). Problemas de gênero: feminismo e subversão da identidade. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira.) a respeito da instabilidade das construções de gênero que desconstrói essa suposta relação mimética entre sexo e gênero, apontamos para a possibilidade de que construções de masculinidade não se apliquem somente a homens, assim como construções de feminilidade não se apliquem somente a mulheres. E tal reflexão fornece uma base para a compreensão de que são várias as possibilidades e que essas não se limitam a duas conexões possíveis, entre homens/masculinidade e poder e entre mulheres/feminilidade e subordinação, para os sujeitos, permitindo sim, outros deslocamentos e ressignificações dos sentidos de gênero como os que serão analisados a partir da trajetória de Tatá.
Limites, deslocamentos e trajetórias de vida
Antes mesmo do início, procuramos argumentar sobre a seguinte questão: Ainda que entrelaçado nas tramas estruturais, é possível a um agente negociar com as determinações? Voltando à nossa questão central, como esse agente mobiliza seus recursos, mesmo que escassos, diante dos limites, a princípio intransponíveis, dando-lhes outros sentidos e valores?
A ideia dos limites como uma dimensão estrutural que define as trajetórias de vida é pontuada pelos trabalhos de Adalberto Cardoso (2010Cardoso, A. (2010). A construção da sociedade do trabalho no Brasil: uma investigação sobre a persistência secular das desigualdades. Rio de Janeiro: FGV. , 2013Cardoso, A. (2013). Juventude, trabalho e desenvolvimento: elementos para uma agenda de investigação. Caderno CRH, 26(68), 293-314. ) a partir da premissa de que, em um recorte socioespaço-temporal, um agente é o resultado de probabilidades configuradas por escolhas das quais não participou - determinações herdadas dos seus pais e/ou responsáveis - e também das escolhas por ele realizadas dentro do leque de possibilidades do seu estar no mundo, cujos contornos são dados pelos limites dos recursos, desigualmente distribuídos, que definem o quanto este leque está aberto para alguns e fechado para outros. Em uma ordem estruturalmente desigual, como a sociedade brasileira, essas probabilidades, segundo Cardoso (2010Sapori, L. F., Sena, L. L., & Silva, B. (2010). A relação entre o comércio do crack e a violência urbana na Região Metropolitana de Belo Horizonte. In L. F. Sapori & R. Medeiros (Orgs.), Crack: um desafio social (pp. 38-80). Belo Horizonte: Editora PUC Minas.), assumem a forma de uma perpetuação “ex-ante e “ex-post” das desiguais oportunidades de acesso aos recursos materiais e simbólicos, garantidos pelos direitos sociais, políticos e econômicos.
Neste artigo, colocamos em questão a totalidade pressuposta na perspectiva das definições estruturais das trajetórias e da distância, ou isolamento, de uma mainstream social (Kaztman, 1999Kaztman, R. (1999). Marco conceptual sobre activos, vulnerabilidad y estructura de oportunidades. Comisión Económica para América Latina y el Caribe. Montevideo: CEPAL.) dos “condenados da sorte”, cujos resultados já estão definidos em uma escala de probabilidades e as adições negativas são determinantes anteriores a qualquer tipo de ação mobilizadora de um agente.
Nas práticas encontradas na pesquisa de campo em algumas redes de comercialização de drogas ilegais em Belo Horizonte e RMBH (Sena, 2018Sena, L. L. (2018). I love my white: mulheres no registro do tráfico de drogas. Belo Horizonte: Editora PucMinas.), nos deparamos com situações em que os agentes se pautam não somente pelos sentidos de “acesso, poder e prestígio” constituídos nos restritos limites “além-muros”, aos quais não têm acesso. Eles giram mundos e não somente certo mundo social; movem-se os agentes envolvidos em situações pautadas por significações e reconhecimento constituídos nas redes de relações com as quais se conectam. A ideia de um horizonte normativo, cuja direção única de valor (percebida enquanto tal) é almejada por muitos e conquistada por poucos, segundo uma lógica excludente de recursos escassos, restringe as possibilidades de entender a atividade sobre o mundo como sendo, também, constituído pelas suas margens.
Os regimes de mobilidade são configurados por estratégias, percursos e destinos que se abrem como trânsitos que, se não podem ser totalmente controlados, não prescindem das escolhas - por mais destituídos e estruturalmente expostos que pareçam ser os agentes. A atividade sobre o mundo é, também, uma lógica particularizada, por mais estruturalmente “marcada” que uma experiência possa se mostrar. O todo não é capaz de determinar teologicamente as direções, os sentidos e resultados de todas as práticas pois ele é, também, constituído pela relativa diversidade das partes.
O que pretendemos demonstrar com o caso de Tatá é a investigação da diversidade contextual dos sentidos de gênero, de seus deslocamentos através das formas de participação, em práticas específicas, em motivações que foram configuradas nas interações estabelecidas com as redes de comercialização com as quais a jovem se conectou. A reflexão segue através do mapeamento dos trânsitos, das negociações de sentido que foram levadas a cabo, as incoerências, as mobilidades e moralidades postas em questão.
Com este caso buscamos evidenciar como os agentes, na forma como se percebem e se localizam na “corrente da sua história”, supostamente feita a despeito do seu controle, conectam-se por meio de seus recursos e destituições; fazem-se pelas suas necessidades vitais de sobrevivência física, social e simbólica; revelam poderes; se deslocam. As dimensões estruturais acionam experiências e não somente determinações. O deslocamento é a razão da permanência, o deslocamento é a condição de viver e de sobreviver nas margens. “Durar é mudar!”3 3 “Durar é mudar” - Gabriel Tarde, citado por Eduardo Viana Vargas (2004). Multiplicando os agentes do mundo: Gabriel Tarde e a sociologia infinitesimal.Revista Brasileira de Ciências Sociais,19(55), 172-176.
Tatá nas conexões de uma rede de empreendedores de bocas
Tatá é uma mulher jovem, parda, nascida em 1992. Nós nos conhecemos no ano de 2013, quando ela tinha 22 anos e vivia uma fase de transição em termos da saída da sua atividade no tráfico e a busca por novas formas de sobrevivência financeira. Sua conexão com uma rede de comercialização de drogas ilegais teve início quando ela tinha 16 anos, no bairro em que nasceu e morava, na periferia de uma cidade da Região Metropolitana de Belo Horizonte. Estudou até o primeiro ano do ensino médio (“tá difícil estudar não tenho mais paciência pra escola”)4 4 As frases entre aspas e itálico são de autoria de Tatá e foram colhidas durante as várias situações de campo em que estivemos juntas . Conheceu seu pai recentemente, depois que entrou para a Igreja de orientação neopentecostal e o perdoou pelo abandono. Esse abandono, segundo seu relato, foi mais intensamente sentido há sete anos, quando sua mãe morreu devido a complicações decorrentes da Aids (“a minha mãe trabalhava na granja também, mas depois parou, era muito desvairada, saía, nos deixava, num ligava muito pras coisas não!”). A separação dos irmãos ocorreu depois do falecimento da mãe, quando foi morar com a tia, que não pode mais trabalhar por problemas na coluna.
Assim, os rendimentos advindos do trabalho dessa tia em granjas na zona rural da cidade, também desapareceram. Não conseguindo obter afastamento pelo INSS, a tia, que havia assumido o cuidado dos sobrinhos - já abandonados pelo pai e órfãos da mãe -, viu-se impossibilitada de continuar trabalhando. Esse fato foi determinante para a redução das condições de sobrevivência do núcleo familiar e levou à decisão pela separação entre os irmãos. Somente Tatá permaneceu morando com a tia mas, aos 16 anos, saiu de casa, tendo moradia instável, desde então.
Esta narrativa recolhida no trabalho de campo parece não indicar qualquer possibilidade de mudança frente a um quadro em que as desigualdades se apresentam como abismos que se abrem a cada etapa da caminhada de vida dessa jovem. À primeira vista, o que se apresenta é uma mobilidade descendente definida pela destituição pessoal e social que envolve a todos.
A partir desse sombrio panorama apresentado, a dinâmica vai se mostrando mais complexa, não pelo peso das determinações impostas, mas pela forma como Tatá, o agente em questão, movimenta as peças em um jogo que já parece perdido, ex-ante, como definido nos termos de Cardoso (2010Cardoso, A. (2010). A construção da sociedade do trabalho no Brasil: uma investigação sobre a persistência secular das desigualdades. Rio de Janeiro: FGV. ). Os elementos de destaque que retiramos da narrativa dizem respeito à forma como Tatá se move, inicialmente, em termos do distanciamento dos sentidos femininos - referidos como identificadores de perdas, fragilidade e susceptibilidade - uma vez que circula por vários espaços de trabalho e, por um período, conecta-se às redes de comercialização de drogas ilegais, de predominância masculina e que parecem acenar para ela com virtuais significados de potência, característica tradicionalmente associada à masculinidade. Afinal, se o poder não precisa estar, necessariamente, com homens, “ele está no masculino”, como observa Strathern (citada por Henrietta Moore, 1994Telles, V. (2011). Ilegalismos populares e relações de poder nas tramas da cidade. In R. Cabanes, I. Georges, C. Rizek, & V. Telles (Orgs.), Saídas de emergência: ganhar/perder a vida na periferia de São Paulo (pp. 155-169). São Paulo: Boitempo. ).
As entradas e saídas intermitentes no trabalho formal, informal e no tráfico são manipuladas por ela, de acordo com as urgências do momento, apresentando-se, todos esses espaços, como estruturas de oportunidades. Se em uma breve passagem pelo trabalho formal (como Caixa em um supermercado) e na realização de faxinas e outros tipos de trabalhos domésticos, funções tipicamente ocupadas por mulheres pobres e negras, ela conquistou alguma renda, foi no tráfico que Tatá experimentou sentidos distintos de potência de gênero. Inicialmente, esse mercado ilegal se abre como uma possibilidade de experimentar práticas cujas representações parecem ser para ela relativas a um “ethos masculino” potente. Mas a sua atuação vai assumindo características que ora ratificam essa representação, ora se configuram como algo relativo às mulheres. Ela mobiliza cada uma dessas potências e posições de gênero em seu favor de acordo com as demandas dos trânsitos na rede de comercialização da qual participou. É esse deslocamento estratégico que configura as redes como espaços de atualização das experiências de gênero.
A ideia de movimento entre as fronteiras dos sentidos de gênero, poder e crime está presente nos destaques que Tatá pontua sobre a facilidade e o desejo de estabelecer relações de amizade com “os meninos”. Suas razões se referem àquilo que vê como características representativas dos homens e do que fazem e, ao inverso, para o que as mulheres são e fazem. Os movimentos pontuados nessa direção aparecem nas justificativas acionadas para o gradativo afastamento do núcleo familiar, onde uma experiência de gênero, como ser um determinado “tipo de mulher”, por exemplo, caracterizava-se como desvio moral. A experiência é narrada tendo em vista as várias classificações de natureza estigmatizantes que relacionavam seu comportamento à figura da mãe:
Como minha mãe morreu de Aids, as pessoas ficavam jogando na minha cara que eu era igual a ela, que eu era uma prostituta. Aí teve um momento em que me desliguei da minha família.
Um sistema de classificação é imobilizador, constituição política que essencializa um agente (Butler, 2012Butler, J. P. (2012). Problemas de gênero: feminismo e subversão da identidade. 4.ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira .; Goffman, 1975Goffman, E. (1975). Estigma - notas sobre a manipulação da identidade deteriorada (3ª ed.). Rio de Janeiro: Zahar.; Foucault, 1980), sobretudo pelo enquadramento negativo, sendo as provas corporais (como uma doença fatal sexualmente transmitida e a prostituição) os elementos insofismáveis dessa moldura. No entanto, a pressuposta universalidade do sentido da classificação “ser uma prostituta” não se adequava aos significados que Tatá atribuía à sua forma de vivenciar seu corpo, sua sexualidade e sociabilidade naquele momento da sua vida, a adolescência (“Eu era danada, saía, usava roupa curta, fazia e acontecia, não tava nem aí pra nada.”.
Os agentes também atuam sobre os sentidos: as designações não produzem automaticamente uma sujeição desviante, exceto quando elas deslizam para a subjetividade do suposto transgressor (Misse, 1999Misse, M. (1999). Malandros, Marginais e Vagabundos e a Acumulação Social da Violência no Rio de Janeiro. Tese de Doutorado, Programa de Pós-graduação em Sociologia, Instituto Universitário de Pesquisas do Rio de Janeiro, IUPERJ.). Mas esse deslizamento não pode ser tomado como uma certeza de ação do poder de configuração política dos agentes. Há enfrentamentos! Parecer uma prostituta, ser uma herança ou reprodução de um sentido negativo de mulher, representado pelo que foi a mãe, cujo comportamento a própria Tatá referencia como sendo de uma “desvairada”, é uma estabilidade da existência de um mundo que a nomeava com um pertencimento negativo. Assim, ela busca desfazer-se desse sistema de classificação dos “laços fortes” (no sentido utilizado por Granovetter, 1973Granovetter, M. S. (1973). The Strength of Weak Ties. The American Journal of Sociology, 78(6), 1360-1380.), impregnado de subordinação moral, que não coincide com a maneira como ela, na sua narrativa, construía a percepção de si - “ser danada, não estar nem aí para nada”. O movimento por ela narrado é o de afastar-se do contexto familiar/privado que a estabilizava em uma “sujeição moral” feminina para afirmar-se como livre, em termos da sua sexualidade (“eu era danada”) e em torno do controle sobre os rumos da sua vida (“eu passei a tomar as minhas próprias decisões”).
Depois que eu perdi a minha mãe, por causa das coisas que eles ficavam jogando tanto na minha cara, eu fui me desligando da minha família. Eles ficavam falando [tanto] que eu era igual à minha mãe, que era vagabunda, que eu era isso e aquilo, que passei a tomar as minhas decisões. Eu tava com 14 pra 15 anos e passei a ir pra escola à noite, fazia tudo o que eu queria, saía da escola na hora que eu queria, chegava em casa na hora que eu queria.
Tal tentativa de controle sobre a própria trajetória agregou-se aos fatores que ela descreve como concomitantes à sua adesão a uma rede de comercialização de drogas ilegais. Tendo como referência um núcleo familiar em que todas as mulheres trabalhavam - a mãe (na granja inicialmente e depois como prostituta), a tia (na granja) e ela, Tatá, no trabalho em casa (“trabalho desde novinha porque eu era pequena e eu é que olhava meus irmãos”) - busca uma atividade fora desse núcleo de referência feminino no qual o trabalho tem forte característica doméstica e de precariedade. Seu deslocamento inicial é em direção ao mercado formal. Sua primeira e breve experiência, assim que saiu de casa, aos 16 anos, é em supermercado local, na qual permaneceu por somente 45 dias. Nesse emprego, mais do que uma “carteira de trabalho”, as chances que, aparentemente, se abriram foram as redes de relacionamento que ela conseguiu estabelecer e que lhe serão úteis posteriormente. No mercado formal, o seu comportamento como mulher (pela forma como se vestia) e perfil de funcionária (usava drogas nos intervalos de trabalho) não se mostraram adequados ao esperado (inclusive por ela).
Fichada, mesmo, eu trabalhei 45 dias em um supermercado, só que eu nem fiquei. Num era que o trabalho era pesado, só que as pessoas… foi muito difícil. Porque na verdade o problema era comigo, porque quando eu entrei lá, como eu era muito doida, eu entrava lá achando que eu podia fazer o que eu queria e aí num ia dar certo. Porque eu só gostava de usar roupa curta, entrava doidona nesse supermercado, eu num tava nem aí, e devido a um tempo em que tinha uns amigos meus que trabalhavam lá, na hora dos intervalos a gente começou a fumar maconha, usar droga antes de entrar e aí eu fui mandada embora. E depois disso, fichada mesmo, eu num trabalhei mais não. Eu só trabalho fazendo bico, uma faxina, mas fichada até hoje... Em nome de Jesus, tá difícil demais trabalhar.
As manifestações contra a autoridade patronal são resistências aparentemente simplórias, mas cujos sentidos mobilizam uma vivência de liberdade, incorporada na forma de vestir e de portar-se, naquele momento específico, em que ela se apresenta como uma mulher que tem controle sobre “as próprias decisões”. Mas as classificações advindas fora do espaço doméstico e também de outras mulheres (“as pessoas é que eram difíceis”) e a exigência de submeter-se à uma autoridade eram inerentes a esse caminho desejado.
Essa breve experiência vai ser direcionada para outros rumos que significarão tanto o seu afastamento do trabalho formal - que ela afirma nunca mais ter tido - quanto uma busca de relações que lhe garantiriam subsistência. Finalmente, a busca de um suporte para uma posição que naquele período ela pretendia afirmar: ser, ao mesmo tempo, uma mulher que “toma as próprias decisões”, de ser “muito doida” e de “não estar nem aí pra nada”. E é por meio do novo grupo de relacionamentos conquistado no supermercado, que também pertenciam ao bairro onde Tatá vivia, que ela consegue aproximar-se e atuar em uma rede de comercialização - uma rede de empreendedores de bocas5 5 Tipologia de uma rede de comercialização em que o núcleo central (uma boca) apresenta agentes cujas conexões estabelecem vínculos de subordinação relativos às posições hierárquicas das ocupações desempenhadas. . Essa rede é destacada, por ela, como sendo constituída por amigos e não por amigas, devido à sua afirmação de ter uma incompatibilidade com as mulheres:
Na verdade eu nunca gostei muito de andar com amigas não, eu andava com a minha prima, que era quase como irmã, mas ela não gostava muito de trabalhar. Eu, na verdade, não sei explicar porque eu tinha amizade com todo mundo, com os homens, mas com as mulheres eu num batia bem da cabeça, em nada.
Entender essa incompatibilidade de Tatá é buscar o sentido que ela vincula ao gênero com as referência ao trabalho. São as mulheres que ela tem como referência de trabalho, mas ao mesmo tempo frágeis nas suas precárias situações profissionais (como já apresentado acima, a mãe e a tia no seu núcleo familiar) ou as que estão próximas a ela, mas são percebidas como distantes do empenho pelo trabalho: a prima (“tipo a minha prima, que era quase como irmã, ela num é muito chegada em trabalhar não”). Outro perfil de mulher são as que Tatá referencia como pertencente à rede do tráfico da qual participa (“as meninas de lá são umas cachorras mesmo, as meninas que num tá nem ai pra nada, fica ali e pronto!”). Nesse trânsito entre as moralidades de trabalho e gênero ela se declara como longe “dessas meninas” que ocupam uma posição no tráfico, mas que lhe parecem ser inativas e destituídas de valor, e se identifica com os meninos (“a galera”) que são aqueles com quem diz ter facilidade para se aproximar e estabelecer amizade. Tatá classifica esses homens como aqueles que trabalham (“eu gostava de andar com homens, com os meninos, eles trabalham, né? Diz eles que é trabalho, tráfico, né? Profissão!”). Ela não está propriamente no lugar dos meninos, a quem coloca a atividade em suspeição ao afirmar que trabalham, ou quase isso (“diz eles que é trabalho”). Mas, ao mesmo tempo, se aproxima deles pela relação que estabelece entre gênero e a posição em termos de atividade que os possibilita obter aquilo que ela valoriza - independência financeira.
Quando comecei eu tava com 16 anos, com uma galera. As menina lá são só umas cachorras mesmo, as meninas que num tá nem aí pra nada, fica ali e pronto! Mas eu sempre trabalhava porque eu sempre gostava de ter o meu dinheiro. Então, eu sempre corri atrás pra comprar minhas roupas, eu sempre gostei de ir no baile funk, então eu sempre gostei de ter dinheiro pra comprar minhas coisas.
Na sua busca do sentido de gênero performatizado pelos meninos, seu movimento é de ir ao encontro deles - “mexer com coisa errada”. Classifica esse deslocamento como decorrente do seu desalento na busca daquilo que é, aparentemente, legitimado como trabalho e assume para si uma atividade que, a despeito de classificar como “coisa errada”, passa a referenciar como lhe sendo própria [e a dos meninos] “Eu sempre gostei de trabalhar mas, depois de um tempo, fui desanimando [...], e aí eu comecei a me envolver com coisa errada”.
Mas nem todas as mulheres são destituídas de potência. A referência da força feminina com a qual Tatá estabeleceu proximidade a partir dessa rede de comercialização é exemplificada em uma pessoa que ela afirma ser uma transexual e que mostrou fidelidade em um momento extremamente difícil por ela vivido e, também, de uma MC, Cris. A esta última ela se refere como sendo um tipo de mulher com a qual se assemelhava “eu só gostava de andar com um tipo de gente assim!”. São essas mulheres que representam, para Tatá, as pessoas que “tinham conceito”: “todo mundo assim gosta, por exemplo, respeita, porque é gente de algum modo considerada”. Pessoas que, ao mesmo tempo, “é humilde”, mas “fortalecida no mundo” [ainda que seja um mundo moralmente dúbio para Tatá], pois “no caso, também, ela mexia com essas coisas de errado”. Uma pessoa que portava indumentárias representativas do seu sucesso, (“ela só andava com cordão de prata, de ouro, só assim”) e que tem ao seu lado alguém que garante o seu conceito, um homem, (“o namorado dela também é doidão, então todo mundo considerava ela)”.
A narrativa de Tatá, à primeira vista, poderia ser lida no âmbito da incorporação do under world institutionalized sexism (Stessfemeier & Terry, 1986Steffensmeier, D. & Terry, R. M. (1986). Institutional Sexism in the Underworld: A View from the Inside. Sociological Inquiry, 56(3), 304-323.), perspectiva baseada nas crenças sobre as essências masculinas ou femininas que atuam como uma perpetuação das marcações de gênero, no campo da criminalidade. Atuando como verdades sobre o mundo, essas crenças se materializam, tanto na dimensão das inclusões, quanto nas exclusões dos agentes de uma determinada prática, pelas habilidades de gênero, das quais, supostamente, são portadores e que se configuram como uma autoridade de gênero sobre as práticas criminais. Nessa perspectiva, as determinações hierárquicas das posições derivadas das desigualdades socialmente constituídas entre homens e mulheres têm seus princípios adaptados aos mercados ilegais. São desigualdades que condicionariam não só as formas, como também os lugares subordinados de participação das mulheres nas atividades criminosas (Maher et al., 1996Maher, L., Dunlap, E., Johnson, B., & Hamid, A. (1996). Gender, Power, and Alternative Living Arrangements in the Inner-City Crack Culture.Journal of Research in Crime And Delinquency,33(2), 181-205.).
Talvez seja necessário problematizar essa suposta universalidade dos parâmetros que são mimetizados e tomados como medida de valor de autonomia feminina na criminalidade, entendida pelo seu nível de controle ao acesso e formas de participação e às posições hierárquicas ocupadas. Argumento que a diversidade dos contextos em que o tráfico de drogas se realiza, de estruturas de negócios e respectivos agentes é o que constitui a medida desses parâmetros. Da mesma forma, a diversidade de intencionalidades dos projetos femininos, pressupostos pela trajetória em que o tráfico foi ou é presente, assim como as escolhas ou condicionamentos da associação à figura masculina, são também valores relativos a “essas mulheres” e aos lugares que ocuparam. Não dizem respeito às essências ou a uma universalidade não contextual de sentidos.
No caso ilustrado pela figura de Tatá, as posições não parecem não estar muito marcadas como substâncias de gênero. Ela mobiliza e desloca as suas significações de homem, mulher e respectivas posições segundo critérios estratégicos, baseados na funcionalidade moral das redes. Essa ideia estabelece os sentidos e práticas de gênero nas redes de comercialização de drogas ilegais pesquisadas. Ao contrário de uma forma essencialista e estrutural de constituição da posição como, por exemplo, a classe na perspectiva de Bourdieu (2007Bourdieu, P. (2007). O poder simbólico. Rio de Janeiro: Bertrand.), os lugares de distinção nas redes do tráfico pesquisadas são erigidas sobre moralidades individualizadas e transitórias.
A funcionalidade moral é o reconhecimento de um agente não por supostas essencialidades que lhe são correlatas. São acionamentos de valor estratégicos de uma determinada dinâmica criminosa. É uma especificidade cujas significações (reiteradas ou ressignificadas) são constituídas nas particulares mobilizações que o agente faz de alguns princípios. É com base nessa lógica que certas práticas são estabelecidas na sua adequação da diferença devido a uma característica do valor de gênero com o qual um agente se apresenta como lhe sendo próprio, mas que é transitório, e que deve ser comprovado (ou descartado) a cada nova situação em que esse valor é acionado (Sena, 2018Sena, L. L. (2018). I love my white: mulheres no registro do tráfico de drogas. Belo Horizonte: Editora PucMinas..
Tal funcionalidade serve para Tatá como guia para as suas próprias práticas e pelas quais ela se legitima em uma atividade exercida por quem valoriza o resultado do trabalho, os homens. Mas, ao mesmo tempo, diz respeito a ela no sentido de que por essa atividade pode auferir renda e exibir material e, simbolicamente, o resultado da posição de valor relativa ao reconhecimento (de pessoa que gosta de ter as suas “próprias coisas”) que ela busca adquirir. Isso a despeito de que, para tanto, ela tenha que negociar com a moralidade em relação ao mercado de drogas ilegais e com os sentidos de gênero em movimentos de proximidades e afastamentos (afastar/aproximar da atividade dos homens; afastar/aproximar de um tipo de mulher; afastar/aproximar de uma prática ilegal).
Na medida dos interesses e/ou situações com as quais Tatá vai se deparando e que exigem um posicionamento, ela vai se colocando entre uma e outra dessas essências de gênero, desloca-se, volta ao ponto anterior. Quando a situação assim exigia (“até que se pega respeito né?), afastava-se da posição feminina caracterizando-a como submissa (“mulher tem que se submeter a muitas coisas, né?”) e se transformava em um dos meninos, fazia o que eles faziam, “comia o que eles comiam”. Esses deslocamentos lhe permitiam acionar ou preservar os recursos que ela referencia como sendo próprios dos homens, como a confiança e o valor de troca que considera como lhe sendo próprio também.
Mulher se expõe demais. Tipo assim: o homem pode fazer tudo pra eles tanto faz, mulher tem que se submeter a muitas coisas, né? Muita mulher acaba que tem que se prostituir, porque ficar com um e outro é a mesma coisa que prostituir. Em muitos casos, até que se pega respeito tem que fazer o que todo mundo quer. Eu nunca cheguei nesse ponto porque eu sempre andei com todo mundo na amizade, onde eles comia, eu comia o que eles bebia, eu bebia, tipo assim. Por causa disso eu sempre tava lá, se eles precisasse de mim eles sabia que eu tava lá, eles sabia que podiam contar comigo, eu era amiga de todo mundo. Nesse sentido, eles sabiam que podiam contar comigo em tudo. Se precisasse levar droga pra outro lugar, eu levava. O que eles precisassem, eu fazia, toda hora que eles precisassem, porque eu sabia que toda hora que eu precisasse deles eles ia tá lá!
Por outro lado, quando tudo estava “fora de controle”, Tatá acionou a sua sexualidade (anteriormente criticada por ela como uma condição feminina), como um recurso que somente ela podia controlar, manipulando-o a seu favor. Este movimento pode ser exemplificado por uma situação narrada por ela mesma, quando, durante atuação nas redes, a sua atividade passou a estar comprometida pelo vício. Nessa situação, o seu corpo de mulher (recurso sob controle dela) é estrategicamente utilizado para aquisição de drogas:
Lá, quando eu ia, tinha que ficar com os meninos pra usar droga, porque eu já tava de um jeito [que] eu tava precisando da droga. Eu tava sem dinheiro. E o que eu ia fazer se eu tava sem dinheiro? Eu vesti uma roupa curta e fui pra lá. E os meninos ficava igual bobo, dando droga! Era só a gente por roupa curta que os meninos dava droga. E eu ficava só pegando droga com eles, fiquei uma semana lá.
Outra situação desse deslocamento está presente em uma das razões que Tatá apresenta para a sua participação na rede do tráfico - a excitação - e que já se tornou senso comum em termos da proclamada adrenalina, garantida para aqueles que atuam nessas redes: “Na verdade, é uma adrenalina que a gente tem”. Estas palavras de Tatá, também foram encontradas nos depoimentos de outra mulher participante do estudo, “é muita adrenalina, véio! Parece que tá na sua veia!”6 6 Entrevista concedida por Baby, mulher presidiária, 19 anos, rede de empreendedores de bocas .
Na narrativa de Tatá sobre essa experimentação, o trabalho e o ser “muito doida” não são situações contraditórias. Tatá as apresenta como um lado masculino potente, ao referenciar o risco experimentado como o de ser “o cara!”. É ela própria quem está sendo referenciada na narrativa (“você é o cara!”), como um agente que ganha visibilidade (conceito) ao suscitar respeito e temor porque experimentou o medo e a violência institucional, mas venceu (“essa coisa de polícia, porque quanto mais a polícia tá em cima, mais cê acha que tá no auge, você é o cara! Ainda mais se vai preso, cê sabe que é por pouco tempo, então quando cê sai, cê é mais o cara, vira o cara!”).
No reverso da ordem normativa, a Vida Loka7 7 Título da tese de Paulo Artur Malvasi (2012): Interfaces da vida loka, um estudo sobre jovens, tráfico de drogas e violência em São Paulo. Malvasi, Tese de Doutorado. Programa de pós-graduação em Saúde Pública, Universidade de São Paulo, São Paulo. se mostra como fator de distinção dupla, ou seja, social e de gênero. O enfrentamento com a autoridade (apesar de ambígua uma vez que “dura pouco”) não sujeita criminalmente os agentes, na perspectiva utilizada por Misse (1999Misse, M. (1999). Malandros, Marginais e Vagabundos e a Acumulação Social da Violência no Rio de Janeiro. Tese de Doutorado, Programa de Pós-graduação em Sociologia, Instituto Universitário de Pesquisas do Rio de Janeiro, IUPERJ.). Antes, é uma atribuição de sentido positivo, uma distinção. E essa distinção é vivida por Tatá como incorporação de uma qualidade de agente masculino: “Vira o cara!”.
Nos enfrentamentos que caracterizam o risco do processo descrito por Tatá, “a pessoa que passa a ser idolatrada pelas pessoas” é alguém que ganha uma espécie de visibilidade agonística (Arendt, 1972Arendt, H. (1972). Crises of the Republic: Lying in Politics - Civil Disobedience - On Violence - Thoughts on Politics and Revolution. New York: Mariner Books.). Essa visibilidade fica garantida pelo enfrentamento público, em nome de uma “causa comum”, em um contexto que interliga uma prática criminalizada a um espaço social e à respectiva sujeição dos agentes a ele pertencentes, mesmo que esse agente capitalize para si a batalha e/ou a vitória, sem que o parâmetro de um projeto político mais amplo esteja no horizonte da sua prática, tal qual o sentido utilizado por Arendt (1972). O enfrentamento de uma ordem normativa e legal pela experimentação do risco é de natureza política8 8 Gabriel Feltran (2010, 2011) reitera muito essa relação entre crime, violência e as dimensões políticas no âmbito das redes paulistas que pesquisou. , apesar da violência endêmica presente nas redes do tráfico no Brasil ter reforçado, principalmente, a representação de prevalência do individualismo instrumental, “em que o abandono de referências coletivas moderadoras da busca dos interesses individuais acaba por eliminar o autocontrole, mas não o raciocínio instrumental que garante a forma social de ‘fins’ ou ‘interesses’ a puros ‘desejos’ irrestritos ou ‘pulsões’” (Silva, 2004Silva, L. A. M. (2004). Sociabilidade violenta: por uma interpretação da criminalidade contemporânea no Brasil urbano.Sociedade e Estado,19(1), 53-84. , p. 74).
Tatá, os afetos e contextos de conexão
Outro deslocamento apresentado na narrativa de Tatá é quando ela declara que “começou pra valer” devido a um garoto por quem passou a ter grande interesse. Busco com essa passagem, partir das estruturas de rede de comercialização do varejo de drogas ilegais tomando-as como uma diversidade socioespacial e de perfis dos agentes envolvidos, que implica, também, discutir as especificidades dos sentidos de autonomia de gênero.
O caso de Tatá é uma referência para a construção do contra-argumento da universalidade da relação das desigualdades e opressões, ilustrado pelo enlace masculino como indutor do protagonismo ou direcionador das práticas e hierarquias das posições assumidas pelas mulheres no tráfico.
Na narrativa dessa jovem, os rumos tomados para o incremento da sua participação na rede, ao mesmo tempo em que insinuam uma forma de atuação passiva feminina e baseada na coação (“no caso, eles pedem, cê tem que fazer o que eles mandam”) é retificado, por ela própria, na sequência seguinte, através da afirmação (“porque cê tá ali também né? Aí faz!”) que revela uma decisão ativa de acionar o recurso sexual como uma prática derivada de uma escolha e não de uma destituição de controle sobre esse recurso.
Nas redes pesquisadas, os trânsitos entre os espaços em que as mulheres se inserem tanto podem revelar um lugar de preservação das desiguais relações de poder de gênero, quanto podem ser lidos como práticas reveladoras de um agenciamento, entendido aqui em termos da autonomia de mobilização de recursos disponíveis frente aos constrangimentos estruturais e de gênero nesse mercado. A própria observação de Tatá, anteriormente descrita, sobre as cachorras sugere que a suposta imobilidade que ela condena “de se ficar ali e pronto!” revela menos uma passividade de gênero do que um uso estratégico dos constrangimentos e limitações sociais e de gênero, que passam a ser acionados como recurso por algumas mulheres no mercado do tráfico. Ao contrário da percepção de Tatá de que elas “ficam ali e pronto”, podemos ponderar que elas se movem a partir dos recursos que possuem.
Essa apreciação negativa sobre a posição das “cachorras” aparece, também, na fala de outra participante do estudo, Malu, que foi quem nos apresentou à Tatá. Quando a conhecemos, em 2011, ela era namorada de um jovem que gerenciava uma rede de comercialização. A depreciação dela sobre “essas mulheres” reforça o contra-argumento aqui defendido. Ao mesmo tempo em que Malu afirma que “essas mulheres [as cachorras] não são importantes, mas acham que são” e que a atividade delas se caracteriza como as dos cães que aguardam pelas “sobras” (drogas, algum dinheiro, participar de uma festa etc), o leque de atividades arroladas por ela parece indicar que, ao contrário da apreciação moral feita, elas ocupam posições cujo valor e reconhecimento são configurados no contexto da dinâmica dessa rede: por exemplo, aliciam outras mulheres; avisam sobre a chegada da polícia; atuam na complexa trama das disputas comerciais e de poder por meio das fofocas (prática que Tatá denomina “judiaria”). Por esse tipo de atuação, a funcionalidade moral que elas portam - por serem mulheres e “cachorras” - lhes garante acionar recursos de sobrevivência e de conexão em uma rede. Para essas mulheres as estruturas de oportunidades não são espaços existentes de maneira prévia à sua ativação.
No caso de Tatá, o encontro e associação com um homem implicou em uma situação em que houve trocas, subordinações e afirmações de poder, de ambos os lados. No primeiro momento, essa associação mostrou-se como uma forma de estar ao lado de um agente masculino, “de conceito”, qualidade que lhe proporcionava a conquista de respeito, de “ser considerada” nas redes pelas quais circulava. Mas esse poder não foi dado somente por ele, no sentido de uma espécie de busca de colagem do capital simbólico masculino que ele possuía. Para estar com ele, Tatá acionou o recurso da coragem (“ele tinha muito problema”) como uma característica que lhe era própria e já exibida na rede em que atuava. Para além de ser uma mulher “muito doida”, a parceria estabeleceu-se, também, pelo recurso da confiança, valor de troca não necessariamente existente em um mercado ilegal. Nas situações em que era necessário acionar esse atributo ela foi capaz de demonstrá-lo negociando-o a seu favor:
Ele já tinha passado por muitas coisas, ele morava no Rio de Janeiro e com aquelas confusões do Complexo do Alemão, aquela guerra, ele tinha muito problema e teve que fugir pra cá. Ele era MC lá, eu achava o máximo! Ah, eu vou ficar com esse menino! Mas, no caso, ele sempre evitava de eu ficar muito perto dele, ele sabia dos riscos, eu também sabia, só que eu num ligava. Já tinha acontecido várias coisas, por exemplo, de ele se envolver em briga e eu ia atrás pra não deixar as coisa acontecerem; me ameaçavam, porque viam que eu tava com ele. Ele via e se preocupava. Então a gente começou a ficar junto. Tipo isso, o cara protege, quando o cara gosta da pessoa, porque se não gostar, num tá nem aí.
Foi com esse jovem que Tatá, na posição de “mulher dele”, conheceu outras redes fora do espaço da cidade em que moravam, especificamente na capital, Belo Horizonte. Vivenciou com esse deslocamento espacial as emoções de um local com forte sentido simbólico para ela: uma favela (“... eu pensei: cheguei no meu lugar!! Eu fiquei louca, eu disse pra ele eu quero ficar é aqui, eu era doida pra morar numa favela. Eu era doida com favela, eu via uma favela na televisão, meu olho até brilhava!”). Essa emoção foi reiterada pela vivência dos perigos de redes mais belicosas, comparativamente às redes nas quais circulava. Nesta favela, em um determinado momento, experimentou “a guerra”, quando esteve frente a frente em um enfrentamento armado junto com o seu grupo, em uma situação de conflito em que se digladiavam os homens, entre eles e sobre “os inimigos”.
Desligamentos e novas conexões
Como último ponto a ser tratado, os fluxos das conexões que ligam agentes também podem significar situações que acionam desligamentos desejados, impostos ou necessários. Aqui, trago um contraponto com a pesquisa de Lisa Maher (1996Maher, L., Dunlap, E., Johnson, B., & Hamid, A. (1996). Gender, Power, and Alternative Living Arrangements in the Inner-City Crack Culture.Journal of Research in Crime And Delinquency,33(2), 181-205.), no que diz respeito aos arranjos femininos na busca de alternativas para os usos e a comercialização segura do crack em uma região de Nova York. A autora aponta a moradia como uma das situações mais prementes, que induziram, dentre outras buscas, à associação das mulheres usuárias, e eventualmente comerciantes, com homens que pudessem oferecer-lhes esse tipo de guarida. A prestação de serviços domésticos e sexuais ou a simples companhia para homens mais velhos eram recorrentes, em troca da obtenção de um espaço seguro e para recomposição das forças. Mas aquilo que é interpretado por Maher et a., (1996) como uma posição subordinada, entendida por vivências que não rompem com uma clássica reprodução das hierarquias de gênero, talvez possa ser lido como micropolíticas de sobrevivência, em que o gênero funciona como recurso estratégico e não como referendo da destinação de um papel social estruturalmente definido.
Essa mobilização estratégica tem na trajetória de Tatá um caso exemplar. As trocas dos atributos femininos clássicos tais como sexo e serviços domésticos, para ela que não tinha uma moradia fixa, significou, no primeiro momento da sua aproximação com o parceiro anteriormente mencionado, a possibilidade de ter um lugar mais estável para permanecer. No entanto, a partir dessa troca, uma situação de subordinação, que até então ela não vivenciara, mostrou-se como uma ameaça à sua autonomia. Junto a esse homem, ela passou a, eventualmente, ter que cuidar dos filhos dele, fato que restringiu seus rendimentos regulares na comercialização de drogas e trouxe restrições em relação à sua rede de amigos. Pela primeira vez ela se viu impedida de estar com os “meninos”, de executar determinadas tarefas, seja deslocando-se nas atividades femininas ou masculinas que até então desempenhava, seja nas formas de se vestir. Enfim, foi aos poucos sofrendo perdas de uma série de dimensões de sua autonomia, até então conquistadas e negociadas como recursos, na sua rede de atuação.
No entanto, as permanências em relação às posses ou subordinações não são uma realidade das redes de comercialização no tráfico de drogas ilegais, nem em termos comerciais, nem nas relações que são estabelecidas. Uma rede é, por princípio, o movimento das conexões. O poder desse homem sobre Tatá vai aos poucos perdendo a força pelo fato de, ele também, ter perdido grande parte do seu domínio na rede sob seu comando pelas disputas em que se envolveu, sobretudo devido ao vício. Mas, para além desse embate de forças, restritas ao casal, o fato de ela ainda ter conexão com pessoas ligadas à sua rede de comercialização, na condição de ser “um deles”, foi um recurso que acionou para terminar esse relacionamento, de forma relativamente segura. Em suas palavras, “mandou um recado”, para ele, apoiada no reconhecimento que conquistou na rede de conexões a que pertencia.
A gente ficou morando junto pouco tempo porque tanta coisa aconteceu, meu Deus! Ele falava que se eu separasse dele ele me matava. Ele tinha três filhos e eu cuidava deles porque a mãe num ligava, era muito drogada e eles ficavam muito carentes. Eu ficava em casa, fazia as coisas, parei de sair, ele não deixava eu usar droga, num deixava eu fazer nada. Eu fiquei tipo presa, num podia falar com ninguém, fiquei sem telefone. Passou um tempo, eu tava doida pra terminar porque eu gostava de fazer as minhas coisas e ele num deixava. Um dia, ele falou que a mãe dos meninos ia aparecer e eu pensei, agora é que eu vou dar no pé! Eu fui pra casa de uma amiga e mandei um recado que se ele quisesse, pra ele ir lá. Ele num foi e eu dei por terminado. Ele ficou me perseguindo muito tempo, eu só tive paz depois que ele morreu.
A partir desse rompimento, os trânsitos das conexões que Tatá estabeleceu ganharam novas direções. Ela volta a atuar nas redes em que era conhecida, mas aprofunda uma experiência onde a conjugação entre a sua autonomia, em termos do uso do corpo e capacidade de comercialização, são recursos que busca acionar de maneira bem intensa. Mas essa intensidade é vivida na ativação de novas experiências de comercialização em que a sociabilidade passou a ser um ingrediente importante, implicando em uma intensidade do uso de drogas. Sua narrativa nesse momento é direcionada para as experiências das práticas de comercialização vividas, principalmente, nos bailes funk e nas festas que ela passou a frequentar com bastante assiduidade. A partir desse momento, Tatá se aprofunda no vício e seus rendimentos passam a estar comprometidos com essa “ostentação”, para usar uma expressão já incorporada no vocabulário juvenil. A situação que ela narra como tendo ocorrido uma semana depois do término do seu relacionamento ilustra um pouco isso:
Passou uma semana eu já tava saindo de novo, voltei a sair com meus amigos. Um outro dia, um amigo me liga e disse: “Tatá, tá rolando um baile funk”. Esse amigo falou que sabia que eu tava meio sem dinheiro e que ia pagar pra mim. Eu arrumei roupa, arrumei sapato, arrumei tudo. Rachei pro baile. Cheguei lá, bebi todas, cheirei, fiquei ruim, fiquei ruim mesmo, fiquei com um tanto de menino, tirei a barriga da miséria!
Essa vivência a aproxima dos “meninos” que, como ela anteriormente afirmou (“não têm cabeça, eles acha que ter dinheiro só pra bancar droga e ter muié, cabô!”). Por outro lado, ao contrário do entendimento de um ethos hedonista em contraponto ao ethos do trabalho9 9 Manuela Cunha (2002) retoma, para contestar, essa contraposição discutida por Patrícia e Peter Adler (1993) na etnografia que realiza com as mulheres encarceradas, na prisão de Tires, Portugal, pelo delito de tráfico ilegal de drogas. , um desfrute compulsivo em um mercado de mercadorias compulsivas, é parte de uma mesma engrenagem. Os momentos da sociabilidade, do baile, dos encontros, das festas, são situações de dinamização da comercialização nas quais um agente se apresenta como uma conexão ativa.
E assim, Tatá segue no seu movimento de conexões e sua narrativa é aqui concluída com uma nova rede à qual ela se liga, uma Igreja Pentecostal. Sua conexão com essa rede religiosa foi estabelecida, de maneira mais decisiva, no momento em que ela vivencia uma extrema precarização da sua condição financeira (“eu tive que voltar pra casa da minha tia, porque eu tinha perdido tudo, eu tava sem nada mesmo!”). Desloca-se, novamente, à condição anterior de mulher “vulnerável” em um núcleo familiar predominantemente feminino. Além disso, sua saúde estava comprometida pelo vício (“eu quase morri porque fiquei cinco meses com uma gravidez nas trompas e eu nem cuidava, eu só tava querendo usar droga, num tava nem aí!”) e, exatamente devido ao seu aprofundamento no vício há a perda da possibilidade de atuar de maneira mais intensa na sua rede de comercialização. Ela passa a ser mais um dos vários agentes que, em um estágio de alto grau de vício, sofre uma perda gradativa da confiança no valor da sua conexão. O gênero, nesses casos, passa a ser um ativo indiferente .
Juntamente com esse quadro pessoal, as redes nas quais atuava com mais frequência passaram por um processo de reconfiguração devido a uma forte incidência de encarceramento e violência intestina (“Depois que eu parei de sair, vai fazer um ano que eu tô na Igreja, os meninos morreu, outros foi preso, os meninos quase tudo morreu. Os meninos mais doido de antes acabou tudo!”). No contexto destas redes já não há meninos ou meninas para os quais um deslocamento estratégico de gênero seja possível. Novos deslocamentos serão necessários. O deslocamento é a razão da permanência, a mudança é a condição de viver e de sobreviver, dos agentes. “Durar é mudar!”
Considerações finais
As mudanças, que encerram o caso de Tatá, retomam o argumento inicial da ideia das conexões como um processo de interação e não de determinação. É uma absorção e renovação dos fluxos e práticas que dinamizam o movimento das redes. A entrada em uma nova rede depende da forma como as conexões se movem e seus resultados contingentes.
Não necessariamente os deslocamentos são movimentos ascendentes, ou abrem possibilidades de novos fluxos cujas conexões significam melhoria dos padrões de renda, menos precariedade e exposição ao risco. No entanto, são acionamentos circunstanciais na busca pela permanência, mesmo que marcados por novas dimensões de conflitos, de disputas e perdas. Mas isso está posto na vida social para todos, e não somente para os que vivenciam (ou vivenciaram) uma dinâmica criminal. Os deslocamentos e suas significações são contingenciais e se realizam em contextos específicos. Nas redes dos empreendedores do mercado ilegal de drogas, usufruem ou perdem, controlam ou são controlados, ganham e morrem os homens e as mulheres, “os patrões” e “os guerreiros”.
A perspectiva dos deslocamentos remete, também, à ideia da funcionalidade moral de gênero como uma dimensão constituidora da permanência. Os domínios femininos e masculinos nas redes não são definidos por uma dada relação de poder e identidade de gênero exterior às redes. Assim como as posições não são destinos ou derivações das supostas essências ou precariedades de gênero, os sentidos, relações e reconhecimento são potencialidades contextuais.
Um agente apresenta o seu “valor de gênero”, sua distinção, na modalidade de uma prática concreta e contextualizada na diversidade dos deslocamentos realizados nas redes de comercialização do mercado ilegal de drogas. Mas esse valor não é essencial, não tem sentido de permanência. O sentido é uma situação posicional nas e das margens. Os trânsitos de Tatá parecem sugerir isso.
Na dinâmica específica de cada rede de relações renovam-se os fluxos das conexões, mobilizam-se as essências como um sentido prático. Ocultar-se no “véu dos sentidos”, supostamente próprios do espaço doméstico, ou expor-se na visibilidade necessária de um mercado social, coloca os agentes e os sentidos das posições em relação e não em determinação de posições ou supostos lugares dos homens e das mulheres nas redes.
Não há uma diferença a priori, definida por uma suposta unidade social determinante das práticas e seus respectivos valores [de gênero]. Manipular estrategicamente a crença de uma constituição substantiva de um ser é buscar a permanência em uma rede. As redes não são somente comerciais, são deslocamentos de posições, sentidos e reconhecidos entre os pares. Relações de poder e de negociações. Imposição e submissão. Ocultamento e visibilidade. Conexões e desligamentos. Isso não se traduz por uma relação de subordinação de gênero já dada. As posições e seus sentidos estão em disputa. Mudança e permanência são, também, dinâmicas relativas à diferença entre as redes, reveladas por uma infinidade de dimensões e sentidos de gênero que lhe são constitutivas.
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1
Nome fictício
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2
Para uma crítica ao “fundacionalismo biológico” ver Nicholson, 2000.
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3
“Durar é mudar” - Gabriel Tarde, citado por Eduardo Viana Vargas (2004). Multiplicando os agentes do mundo: Gabriel Tarde e a sociologia infinitesimal.Revista Brasileira de Ciências Sociais,19(55), 172-176.
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4
As frases entre aspas e itálico são de autoria de Tatá e foram colhidas durante as várias situações de campo em que estivemos juntas
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5
Tipologia de uma rede de comercialização em que o núcleo central (uma boca) apresenta agentes cujas conexões estabelecem vínculos de subordinação relativos às posições hierárquicas das ocupações desempenhadas.
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6
Entrevista concedida por Baby, mulher presidiária, 19 anos, rede de empreendedores de bocas
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7
Título da tese de Paulo Artur Malvasi (2012): Interfaces da vida loka, um estudo sobre jovens, tráfico de drogas e violência em São Paulo. Malvasi, Tese de Doutorado. Programa de pós-graduação em Saúde Pública, Universidade de São Paulo, São Paulo.
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8
Gabriel Feltran (2010Feltran, G. (2010). Crime Castigo na Cidade: os repertórios da justiça e a questão do homicídio nas periferias de São Paulo. CADERNO CRH, 23(58), 59-73. , 2011Feltran, G. (2011). Fronteiras de tensão: política e violência nas periferias de São Paulo. São Paulo: UNESP; CEM.) reitera muito essa relação entre crime, violência e as dimensões políticas no âmbito das redes paulistas que pesquisou.
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9
Manuela Cunha (2002Cunha, M. P. (2002). Entre o bairro e a prisão: tráfico tracjetos. Lisboa: Fim de Século. ) retoma, para contestar, essa contraposição discutida por Patrícia e Peter Adler (1993) na etnografia que realiza com as mulheres encarceradas, na prisão de Tires, Portugal, pelo delito de tráfico ilegal de drogas.
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Financiamento: CAPES n º BEX 12878/13-8 (Bolsa sanduíche, na Universidade do Minho); PUCMINAS (Reitoria de Pós-graduação- PROPPG).
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Consentimento de uso de imagem: Foi obtido o consentimento escrito dos participantes e/ou do detentor dos direitos autorais sobre a imagem.
Datas de Publicação
-
Publicação nesta coleção
05 Dez 2019 -
Data do Fascículo
2019
Histórico
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Recebido
06 Dez 2018 -
Revisado
14 Maio 2019 -
Aceito
13 Jun 2019