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DESENCONTROS CONTEXTUAIS. A (NÃO-)RECEPÇÃO DA TEOLOGIA DA LIBERTAÇÃO NA TCHECOSLOVÁQUIA COMUNISTA

Contextual Mismatches. The (Non-)Reception of the Theology of Liberation in Communist Czechoslovakia

RESUMO

Este artigo busca as razões pela rejeição da teologia da libertação por parte dos cristãos na Tchecoslováquia comunista que rejeitaram diálogo com o regime. Presente tanto o positivo como o negativo das reuniões entre cristãos e marxistas no país, para mostrar porque, embora houvesse teoricamente possibilidade de encontro, havia mais desencontro e desentendimento. Através do exemplo da visita do frade dominicano brasileiro Frei Betto ao país o artigo mostra porque a teologia da libertação como foi apresentada parecia como apoio pelo regime. No final, o artigo reflete sobre a maneira na qual é possível superar estes desencontros para descobrir o que une em vez daquilo que separa.

PALAVRAS-CHAVE
Diálogo cristão-marxista; Teologia da libertação; Frei Betto; Tchecoslováquia

ABSTRACT

This article examines the reasons for the rejection of liberation theology by Christians in Communist Czechoslovakia who rejected any dialogue with the regime. It presents both the positive and negative sides of the meetings between Christians and Marxists in the country to show that, although theoretically there was the possibility of encounter, there was more non-encounter and misunderstanding. Using the example of the visit of the Brazilian Dominican Frei Betto to the country, the article shows why the theology of liberation, as it was presented, appeared to support the regime. Finally, the article reflects on how it is possible to overcome these non-meetings in order to discover what unites instead of what separates.

KEYWORDS
Christian-Marxist Dialogue; Liberation Theology; Frei Betto; Czechoslovakia

Introdução1 1 Este artigo faz parte do projeto de pesquisa da Universidade Carolina em Praga, “Theological Anthropology in Intercultural Perspective”, Charles University Research Centre program No. UNCE/24/SSH/019. Também faz parte do projeto “Latin American Liberation Theology: Prospects and Challenges”, “A Teologia da Libertação Latino-Americana: Perspectivas e Desafios” (GAČR 18-01543S), fundado pela Fundação Científica Tcheca.

O conhecido filósofo da hermenêutica Hans-Georg Gadamer (1900–2002) foi quem introduziu o conceito da fusão dos horizontes (Horizontverschmelzung). O horizonte é a perspectiva a partir de qual se vê o mundo:

Todo presente finito tem seus limites. Nós determinamos o conceito da situação justamente pelo fato de que representa uma posição que limita as possibilidades de ver. Ao conceito da situação pertence essencialmente, então, o conceito do horizonte. Horizonte é o âmbito de visão que abarca e encerra tudo o que é visível a partir de um determinado ponto.

(Gadamer, 199912 GADAMER, H. G. Verdade e Método. Traços fundamentais de uma hermenêutica filosófica. Tradução de Flávio Paulo Meurer. 3ª Edição. Petrópolis: Vozes, 1999, 452., p. 452).

Para Gadamer, a fusão dos horizontes tem a ver em primeiro lugar com o encontro entre o “leitor” atual e o passado. Como é que podemos encontrar e entender o passado? Mais adiante o filósofo alemão diz que “a fusão dos horizontes que se deu na compreensão é o genuíno desempenho da linguagem”. (GADAMER, 199912 GADAMER, H. G. Verdade e Método. Traços fundamentais de uma hermenêutica filosófica. Tradução de Flávio Paulo Meurer. 3ª Edição. Petrópolis: Vozes, 1999, 452., p. 555, cursivo no original). Mas o que acontece quando não há esta fusão, quando em vez de descobrir o campo de fusão, de compreensão mútua entre duas realidades diferentes, se faz presente um não-ouvir, um não-entender? Neste artigo pretendemos abordar este problema da “fissão dos horizontes”, usando como exemplo a (não-)recepção da Teologia da Libertação na Tchecoslováquia comunista. Mais precisamente, vamos considerar as visitas de Carlos Alberto Libânio Christo, o Frei Betto, ao país em 1988 e depois em 1989, alguns meses antes da queda do governo comunista em novembro 1989. Começamos com um panorama geral das relações entre cristãos e marxistas no país, antes de examinar um dos escritos do Frei Betto traduzido pelo tcheco. Fazendo isso, veremos que o contexto latino-americano e brasileiro daquela época era tão diferente daquele da Tchecoslováquia que não existia a possibilidade para cristãos críticos do regime totalitário tchecoslovaco ouvir e aceitar a posição do frade dominicano. Porém, e ainda que ele mesmo não tenha entendido o contexto tcheco,2 2 No ano 1993 o país da Tchecoslováquia, já um país democrático, se dividiu em dois, a República Tcheca e a Eslováquia. Já que os dois países são diferentes, também em relação à religião, vamos nos concentrar aqui na situação tcheca. tentaremos mostrar onde houve a possibilidade de encontro. No final, refletiremos sobre a situação colocando um pé em cada dos dois campos, para experimentar uma posição hermenêutica onde a fissão pode se tornar uma fusão.

1 Marxistas e cristãos na Tchecoslováquia comunista

A Tchecoslováquia começou como país independente nos últimos dias da Primeira Guerra Mundial, no dia 28 de outubro de 1918 (HEIMANN, 200915 HEIMANN, M. Czechoslovakia: The State That Failed. New Haven, CT: Yale University Press, 2009., p. 20-47; GOLDFEDER, 198113 GOLDFEDER, S. A primavera de Praga. São Paulo: Ed. Brasiliense, 1981., p. 9-14). Depois de somente vinte anos, os grandes poderes europeus (sobretudo a Grã-Bretanha) permitiram que Hitler entrasse nas regiões da fronteira do país, chamado Sudetas (Sudetenland), onde a maioria da população falava alemão. Os nazis entraram definitivamente em março de 1939 e ficaram no país até o fim da Segunda Guerra Mundial em 1945. Na primeira eleição geral depois da guerra, que aconteceu em 1946, os comunistas venceram e em fevereiro de 1948 houve um golpe e os comunistas, sob a liderança de Klement Gottwald (1896-1953), tomaram o poder, e o mantiveram até o final de 1989. Já em agosto de 1948 foi preparado um plano para lidar com as igrejas, sobretudo a igreja católica, da qual pertencia a maioria da população.3 3 No censo que foi feito em 1950, de uma população de 8,896,133, 6,792,046 pessoas se reconheciam como católicos romanos (e ainda 32,862 como católicos gregos), isto é, aproximadamente 76%. A segunda maior igreja foi a Igreja Tchecoslovaca (hoje em dia a Igreja Tchecoslovaca Hussita), uma igreja que saiu do movimento do Modernismo Católico no ano 1920, que naquela época tinha 946,813 aderentes. Depois foram as igrejas protestantes tradicionais, da qual a maior foi (e ainda é) a Igreja Evangélica dos Irmãos Tchecos, que contou com 401,729 membros. Este plano buscava utilizar divisões já presentes entre o episcopado e o clero, fazer com que a igreja ficasse dependente também economicamente no Estado, e desligar a igreja no país do Vaticano (Balík; Hanuš, 20071 BALÍK, S.; HANUŠ, J. Katolická církev v Československu 1945-1989. Brno: CDK, 2007., p. 16-17). Um ano depois se passou um conjunto de leis que regulavam a relação entre as igrejas e o Estado, ou melhor, colocou a igreja quase completamente sob o controle do Estado. Dentro das medidas mais significativas, o Estado foi quem passou a empregar o clero, pagando o salário e permitindo ou não que celebrassem os ritos religiosos. Na prática isso significou que, se um padre fizesse algo do qual o poder político comunista não gostasse, perderia a permissão e não poderia servir como pároco (Balík; Hanuš, 20071 BALÍK, S.; HANUŠ, J. Katolická církev v Československu 1945-1989. Brno: CDK, 2007., p. 26-29; KAPLAN, 198619 KAPLAN, K. Church and State in Czechoslovakia from 1948 to 1956. Part II. Religion in Communist Lands, v. 14, n.2, p. 180-193, 1986., p. 181).

Nestes primeiros anos do regime outro momento significativo foi em abril de 1950, quando o serviço de segurança do Estado (em tcheco, Státní bezpečnost, abreviado como StB) fechou os mosteiros e casas de religiosos do país, e a grande maioria dos religiosos foi detida. (Balík; Hanuš, 20071 BALÍK, S.; HANUŠ, J. Katolická církev v Československu 1945-1989. Brno: CDK, 2007., p. 158-177; KAPLAN, 198619 KAPLAN, K. Church and State in Czechoslovakia from 1948 to 1956. Part II. Religion in Communist Lands, v. 14, n.2, p. 180-193, 1986., p. 186-187). Outros foram presos e outros ainda tinham que fazer trabalho duro e muitas vezes perigoso. A partir deste momento, as ordens religiosas foram proibidas e passaram a funcionar somente às escondidas. Poucas semanas depois as ordens femininas foram igualmente fechadas e muitas religiosas internadas ou presas. Ao mesmo tempo, o governo tentou criar organizações de padres leais ao regime. Embora neste momento não tivesse grande apoio, foi o primeiro passo na tentativa de desligar a igreja católica tchecoslovaca de Roma.

Não podemos entrar aqui em todos os pormenores desta relação entre o regime comunista e a Igreja Católica.4 4 Já que as demais igrejas eram menores e não tinham ligações tão estreitas com o exterior, no início não sofreram tanto como instituições. Mas as tentativas de divisão, para criar uma igreja fiel em primeiro lugar ao Estado, aconteceram nestas igrejas também. A primeira década do regime foi de sofrimento e até martírio com uma forte perseguição da igreja, sobretudo do clero. Havia duas possibilidades, ou buscar um modo de convivência com o regime, ou resisti-lo. A resistência teve peso moral, mas terminou com o fechamento de igrejas e a proibição do clero. A partir de 1960 houve uma mudança pequena, com a anistia para o clero preso nos anos cinquenta. Mas foi só em 1968 sob o presidente Alexander Dubček (1921-1992) (Goldfeder, 198113 GOLDFEDER, S. A primavera de Praga. São Paulo: Ed. Brasiliense, 1981., p. 30-47) que houve um momento de reencontro mais positivo entre o regime e a igreja. Embora este tempo de abertura durasse menos de um ano, o resultado foi duplo. Por um lado, como veremos, abriu-se um caminho para o diálogo entre cristãos e marxistas, porém por outro lado ficou claro que esta abertura iria sofrer oposição da União Soviética e outros países marxistas da Europa Central e do Leste. Mas naquele breve momento de esperança, era possível perceber que a “Primavera de Praga fora pensada, portanto, também num sentido liberatório.” (Goldfeder, 198113 GOLDFEDER, S. A primavera de Praga. São Paulo: Ed. Brasiliense, 1981., p. 47). Será que esta busca pela libertação poderia ser um lugar de encontro entre cristãos e marxistas? Vamos investigar este diálogo.

1.1 O início do diálogo cristão-marxista

Nos anos 1950 qualquer diálogo entre a igreja e os marxistas configurava-se muito difícil, sobretudo para os católicos. A história deste diálogo tem suas raízes já no século XIX (LANDA; MERVART, 201723 LANDA, I.; MERVART, J. Proměny marxisticko-křesťanského dialogu. (Mudanca do diálogo marxista-cristão). Landa, I.; Mervart, J. (Ed.), Proměny marxisticko-křesťanského dialogu v Československu. (Mudanças no diálogo marxista-cristão na Tchecoslováquia). Praga: Filosofia, 2017, p. 11-30., p. 13-14) e há trechos das primeiras encíclicas sociais (sobretudo Rerum novarum), em que se encontra um juízo sobre a situação dos trabalhadores que não estava longe das ideias de Marx e Engels. (NOBLE, 2021a29 NOBLE, T. A Critical Re-evaluation of the Theological Reception of Karl Marx. Communio Viatorum, v. 63, n. 2, p. 91-106, 2021a., p. 97). Mas os encontros foram marcados por desconfiança em ambos os lados, já que os marxistas não poderiam confiar na religião, vendo nela um apoio da estrutura da sociedade (a religião como o conhecido, ainda que mal-entendido, “ópio do povo.”) Por sua parte, os cristãos ou pelo menos a liderança das igrejas cristãs, e sobretudo a igreja católica, viram desde o início nesta nova crença uma ameaça à igreja. O estabelecimento da União Soviética a partir de 1917 e a perseguição das igrejas serviu para reforçar esta desconfiança e mesmo que houvesse momentos de encontro (na França e Itália, por exemplo), a história foi de conflito mais do que de diálogo. Como entendeu Jan Milíč Lochman (1922–2004), um dos mais conhecidos teólogos tchecos dos anos 60 e 70, poder-se-ia pensar, pelo menos do ponto de vista teorético, que o diálogo fosse impossível, pois tratava-se de duas crenças universais e conflitivas e, mais, naquela época no Leste da Europa os marxistas desfrutavam do poder e os cristãos representavam uma minoria, enquanto que na Europa do ocidente, a situação era oposta. (LOCHMAN, 197024 LOCHMAN, J. M. Christian-Marxist Dialogue. LOCHMAN, J. M. Church in a Marxist Society. A Czechoslovak View. New York: Harper and Row, 1970, p. 170-198., p. 170-171). Lochman, porém, pensava que o diálogo era realmente possível, sobretudo no nível prático, já que de fato aconteceu.

Apesar disso, o diálogo aconteceu. Começou no final dos anos 1950, sobretudo com a rejeição das medidas mais duras e cruéis do stalinismo a partir de 1956. É de certo modo verdade que o diálogo ficou no nível mais acadêmico e os personagens mais importantes vieram desse campo. Mas sem dúvida havia encontros na vida cotidiana entre pessoas cristãs e não-cristãs e até marxistas. Estes acontecimentos do dia a dia são a base sobre a qual os encontros mais técnicos e acadêmicos se construíram. Mesmo nestes encontros foi muitas vezes a amizade entre cristãos e marxistas que possibilitaram um entendimento mútuo.

A primeira abertura aconteceu com seminários que aconteceram no prédio da faculdade protestante em Praga,5 5 Durante o período do comunismo, a faculdade podia funcionar, mas só fez parte da Universidade Carolina, a universidade mais antiga da Europa Central, fundada em 1348 pelo rei e imperador do Santo Império Romano, Carlos IV, a partir de 1990. A Faculdade Católica, uma das faculdades fundadoras da universidade, foi expulsa e os seminaristas estudaram no seminário diocesano na cidade de Litoměřice, uns 70 quilômetros a norte de Praga. A terceira faculdade, também em Praga, era a da Igreja Tchecoslovaca Hussita. Como me contou minha esposa, estudante na faculdade hussita nos últimos anos do regime comunista, os estudantes nem mesmo podiam ir ao mesmo dentista de outros estudantes, para não os infectar com a doença da religião! que naquela época se encontrava numa rua chamada V Jirchářích,6 6 Rua dos Curtidores. no centro da cidade. Muito importante neste campo foi o teólogo protestante Josef Lukl Hromádka (1889–1969). Já antes da Segunda Guerra Mundial teve uma ligação estreita com o primeiro presidente da República Tchecoslovaca, Tomáš Garrigue Masaryk (1850-1937), sobre quem escreveu seu doutorado. Junto com Masaryk, buscou uma maneira de renovar a fé cristã, fazendo dela algo relevante para o ser humano do seu tempo (Berglund, 20182 BERGLUND, B. Castle and Cathedral in Modern Prague. Longing for the Sacred in a Sceptical Age. Budapest: Central European University Press, 2018., p. 289-293).7 7 Segundo Berglund, Hromádka também participou de algo que poder-se-ia chamar de proto-círculo bíblico, com a filha de Masaryk, Alice, ondes eles pretendiam “aplicar os ensinamentos da Escritura aos problemas sociais conterrâneos” (BERGLUND, 2018, p. 213). Durante a guerra, Hromádka fugiu para os Estados Unidos, onde ensinou em Princeton. Voltou à Tchecoslováquia, e depois da tomada do poder pelos comunistas foi um dos cristãos que tentou encontrar uma maneira de lidar com o regime.

Num artigo do ano 1950, refletiu sobre a possibilidade de ser igreja neste contexto novo. (HROMÁDKA, 195016 HROMÁDKA, J. The Church of the Reformation Faces Today’s Challenges. Theology Today, v. 6, n. 4, 446-464, 1950., p. 446-464). Se a igreja “não é, e nem pode estar em casa na República de Klement Gottwald” (HROMÁDKA, 195016 HROMÁDKA, J. The Church of the Reformation Faces Today’s Challenges. Theology Today, v. 6, n. 4, 446-464, 1950., p. 450), tampouco pode estar em casa no Império Austríaco ou na República de Masaryk. A tarefa da igreja é ser peregrina, de estar no mundo, mas sem lugar permanente para deitar. A pergunta que se deve fazer é a seguinte: “Quando a Igreja tem a obrigação de aceitar as mudanças revolucionárias com compreensão, ainda que, ao fazer assim, ela tenha de abandonar mais de um privilégio antigo? Quando deve levantar a sua voz em protesto porque sua mensagem espiritual fundamental se vê ameaçada?” (HROMÁDKA, 195016 HROMÁDKA, J. The Church of the Reformation Faces Today’s Challenges. Theology Today, v. 6, n. 4, 446-464, 1950., p. 454). Eis a pergunta com a qual Hromádka e mais ainda a Igreja cristã naquele contexto teve que trabalhar. A mudança pode ser indesejada, mas de fato necessária, ou pode ser algo que representa uma ameaça existencial para a igreja. Como discernir a forma de agir nesta situação?

Para muitas pessoas de então (e de nossos dias) as tentativas de Hromádka foram demasiadamente simpáticas para com o regime comunista. Ele desejava manter aberta uma via de comunicação, uma possibilidade de intervir com o governo, com as autoridades. Viu nas questões sociais um ponto de ligação entre o melhor da visão marxista e da visão cristã.8 8 Hromádka morreu um ano depois da invasão da Tchecoslováquia pelas forças do Pacto de Varsóvia em agosto de 1968. Mas parece que ele nunca deixou de acreditar que havia a possibilidade de um encontro entre cristianismo e marxismo (MORÉE, 2012, p. 335-349). Agradeço ao Dr. Moree, um dos grandes conhecedores de Hromádka e da história do período comunista em relação às igrejas, pela ajuda na preparação deste artigo. Ambos buscaram justiça, igualdade e uma melhoria na vida do trabalhador mais pobre. Mas isso foi interpretado, por seus oponentes, como cegueira em relação aos delitos do regime, à perseguição dos crentes, à inumanidade dos atores do Estado. Seja qual for o último julgamento sobre a posição de Hromádka, ele foi personagem central dos encontros na faculdade, da qual ele foi durante muitos anos o decano.

Os seminários tiveram mais regularidade e uma posição mais importante a partir dos anos sessenta (FLOSS, 201711 FLOSS, K. Josef Lukl Hromádka a křesťansko-marxistický dialog. (Josek Lukl Hromádka e o diálogo cristão-marxista). In: LANDA, I.; MERVART, J. (Ed.), Proměny marxisticko-křesťanského dialogu v Československu. (Mudanças no diálogo marxista-cristão na Tchecoslováquia). Praga: Filosofia, 2017, p. 33-59., p. 50 e Matějka, 201825 MATĚJKA, O. Social Engineering and Alienation between East and West: Czech Christian-Marxist Dialogue in the 1960s from the National Level to the Global Arena. In: CHRISTIAN, M.; KOTT, S.; MATĚJKA, O. (Ed.), Planning in Cold War Europe. Competition, Cooperation, Circulations (1950s–1970s). Berlin: de Gruyter, 2018, p. 165-186., p. 177–178).9 9 Floss foi um católico engajado neste diálogo. Aconteciam na faculdade às 19:30 a cada segunda quarta-feira durante o ano letivo, com temas diversos.10 10 Para uma lista (em tcheco), veja http://www.i-triada.net/index.php?id=26&menu=aktuality⊂=aktuality&str=aktualita.php. A ecumenicidade dos seminários é clara. Como exemplo, os temas do primeiro semestre do ano 1965/66 foram, entre outros, “A filosofia e o movimento ecumênico,” “A história do ecumenismo católico,” “Constituição sobre a Igreja (Vaticano II),” “A discussão sobre a justificação entre Barth e Küng,” “Diálogo e a imutabilidade da doutrina,”, “A ciência e a fé,” “O corpo de Cristo segundo a Carta aos Efésios,” e “Teologia como ciência.” Os participantes eram também de confissões diferentes (protestantes e católicos). Ao mesmo tempo aconteceram outros seminários, desta vez na Faculdade de Filosofia da Universidade Carolina. Estes encontros foram organizados por um marxista chamado Milan Machovec (1925–2003),11 11 Machovec nasceu numa família católica, e depois de 1970, quando ele ficou proibido de ensinar, viveu como organista nas igrejas católicas de Praga. Neste período antes da queda de comunismo continuou com as atividades intelectuais nos chamados “seminários no apartamento.” As pessoas se reuniram num apartamento para palestras e discussões. Depois de 1990, Machovec pôde retornar à universidade. e começaram no ano de 1962. Machovec começou sua vida acadêmica como professor de marxismo dialético e marxismo-leninismo. Mas já nos anos 50 começou a trabalhar no instituto de religião e o seu interesse na dimensão transcendente da vida humana cresceu. Os “Diálogos marxistas com cristãos” tiveram participação internacional (Erich Fromm, Hannah Arendt, Jean-Paul Sartre, Jürgen Habermas e Theodor Adorno, entre outros) e local, e novamente os temas eram diversos, ecumênicos e até inter-religiosos.

1.2 O encontro em Marienbad 1967

O ponto mais alto deste diálogo, que de certo modo contribuiu aos acontecimentos da “Primavera de Praga”, foi uma conferência que se realizou em abril de 1967 na cidadezinha de Marienbad (Mariánské Lázně), no oeste do país, a alguns quilômetros da fronteira com a Alemanha (MERVART, 201726 MERVART, J. Historické perspektivy křesťansko-marxistického dialogu a konference v Mariánských Lázních 1967. (Perspectivas históricas do diálogo cristão-marxista e da conferência em Mariánské Lázně). In: LANDA, I.; MERVART, J. (Ed.), Proměny marxisticko-křesťanského dialogu v Československu, Praga: Filosofia, 2017, p. 61-86.). Foi a terceira conferência organizada pela Paulus-Gesellschaft, uma entidade alemã fundada pelo sacerdote e teólogo Erich Kellner para apoiar um diálogo entre a igreja e o mundo. Durante a primeira metade dos anos 60 Kellner veio a entender a necessidade de criar um lugar para os encontros cristãos-marxistas. Já em 1965 e 1966 aconteceram encontros em Salzburg, Áustria, e em Herrenchiemsee (Bavária, Alemanha), aos quais foram convidados participantes da Europa comunista (Matějka, 201825 MATĚJKA, O. Social Engineering and Alienation between East and West: Czech Christian-Marxist Dialogue in the 1960s from the National Level to the Global Arena. In: CHRISTIAN, M.; KOTT, S.; MATĚJKA, O. (Ed.), Planning in Cold War Europe. Competition, Cooperation, Circulations (1950s–1970s). Berlin: de Gruyter, 2018, p. 165-186., p. 180-181; KADLECOVÁ, 196718 KADLECOVÁ, E. Sympozium na téma v Mariánských Lázních v dubnu 1967. (Simpósio no tema „Schöpfertum und Freiheit in einer humanen Gesellschaft“ em Mariánské Lázně em abril de 1967). Sociologický Časopis, v. 3, n. 5, 627–630, 1967., p. 628).12 12 Estas conferências tiveram como temas “Christentum und Marxismus heute” (Cristianismo e Marxismo Hoje) e “Christliche Humanität und marxistischer Humanismus” (Humanidade cristão e humanismo marxista). Na segunda conferência na Alemanha, Erika Kadlecová (1924-2014),13 13 Kadlecová nasceu na parte leste do que hoje em dia é a República Tcheca numa família protestante, mas deixou a igreja durante a guerra e ingressou no Partido Comunista. Foi uma das primeiras e mais importantes sociólogas da religião no país. Sua maior pesquisa foi sobre a religiosidade de uma parte do país (o norte da Morávia), que foi feita em 1963 e mostrou a continuação da fé religiosa e a presença de algo que hoje em dia é até típico para a República Tcheca, uma fé em “algo,” mas uma rejeição do cristianismo, sobretudo na sua forma institucionalizada. Sobre Kadlecová, veja Nešpor, 2017, p. 87-103. fundadora e diretora do departamento para o ateísmo científico na Academia das Ciências, e a partir de 1965, diretora do Instituto de Sociologia da mesma Academia, convidou os participantes para um reencontro no ano 1967 em Mariánské Lázně. A possibilidade de encontro em um país comunista agradou e como tema escolheram “Criatividade e liberdade numa sociedade humana.”14 14 Os textos da conferência encontram-se em Kellner, 1968.

Para Kadlecová, como organizadora principal da conferência, ao menos da parte comunista, a meta era clara. Mesmo reconhecendo que um encontro acadêmico não poderia resolver todos os problemas práticos do mundo em dois ou três dias, o objetivo era “esclarecer alguns pressupostos teóricos, a verificação ou não-verificação dos quais poderiam modificar as relações entre os dois lados no futuro.” Continua: “O melhoramento das relações não se pode conseguir, se um partido pressiona o outro, mas com base na própria correção interna, que surge da certeza do valor positivo (ainda que parcial) do outro.” Mas no fundo desta abordagem fica o entendimento que “certamente não se pode levar a sério alguém que fala e depois volta para viver tranquilamente, sem ficar perturbado pelo que acontece em torno de si.” (KADLECOVÁ, 196718 KADLECOVÁ, E. Sympozium na téma v Mariánských Lázních v dubnu 1967. (Simpósio no tema „Schöpfertum und Freiheit in einer humanen Gesellschaft“ em Mariánské Lázně em abril de 1967). Sociologický Časopis, v. 3, n. 5, 627–630, 1967., p. 628). Este esforço de entender o outro não foi limitado ao diálogo entre cristãos e marxistas, mas tocou simultaneamente as relações entre os marxistas da Europa do Leste e do Oeste.15 15 Entre estes foram, por exemplo, o francês Roger Garaudy (1913–2012), o espanhol Manuel Azcárate (1916–1998), e os italianos Cesare Luporini (1909–1993) e Luciano Gruppi (1920–2003) (Mervart, 2017, 80). Os representantes comunistas se encontravam a cada dia para avaliar a jornada e preparar suaposição para o dia seguinte.

Do lado cristão a maioria dos participantes16 16 Houve 169 cristãos (entre estes, porém, foram também incluídos cientistas e políticos social-democratas alemães) e 48 marxistas. A Paulus Gesellschaft convidou mais ou menos 150 pessoas, enquanto o instituto tcheco convidou 11 marxistas ocidentais, 22 da Europa comunista, e ainda 27 cristãos dos países comunistas europeus (MERVART, 2017, 62). era da Alemanha (os mais conhecidos eram Johannes Baptist Metz e Jürgen Moltmann), de Roma (Giulio Girardi), e o dominicano francês Yves Congar. Cada dia do simpósio teve seu próprio tema. O primeiro dia foi dedicado ao tema “Sociedade e a história e seu significado para o ser humano,” com os principais palestrantes Johannes Baptist Metz e Yves Congar pelo lado cristão e o tcheco Milan Prucha e o filósofo marxista húngaro Jósef Lúkacs pelo lado marxista. Já no segundo dia os participantes discutiram o tema “Sociabilidade, progresso e o potencial criativo pessoal do ser humano,” com a participação de um biólogo alemão, e na parte da tarde de Jürgen Moltmann (naquela época conhecido como o autor do livro Teologia da esperança). O tema do terceiro dia foi liberdade individual e responsabilidade social, concluindo com a contribuição de Giulio Girardi (1926–2012), (SAUVAGE, 201734 SAUVAGE, P. “Girardi, Giulio. In : CHEZA, M.; MARTÍNEZ, L.; SAUVAGE, P (Ed.). Dictionnaire historique de la théologie de la libération. Namur: Lessius, 2017, p. 229-31., p. 229-231)17 17 Naquela época Girardi era padre salesiano, ensinando na Universidade Salesiana em Roma. Foi um grande apoiador da teologia da libertação, sendo expulso da ordem dos salesianos e do sacerdócio por causa de seu compromisso político. marcada pela professora Kadlecová como um dos pontos mais altos do encontro (KADLECOVÁ, 196718 KADLECOVÁ, E. Sympozium na téma v Mariánských Lázních v dubnu 1967. (Simpósio no tema „Schöpfertum und Freiheit in einer humanen Gesellschaft“ em Mariánské Lázně em abril de 1967). Sociologický Časopis, v. 3, n. 5, 627–630, 1967., p. 630). Muito importante aqui foi a encíclica de Paulo VI, Populorum progressio, lançada no dia 26 de março, só um mês antes, e que marcou um passo relevante no caminho do magistério da Igreja Católica em relação ao mundo majoritariamente pobre. Numa reportagem sobre a conferência o filósofo e cientista político suíço Arnold Künzli escreveu que a

tendência fundamental do congresso foi a de superar, ou pelo menos desarmar a oposição ateísmo – teísmo, e no mais tirar o elemento dogmático de todas as questões ideológicas. Os cristãos mostraram uma disponibilidade sincera de participar na mudança material do mundo – de certo ponto até poderiam apoiar a revolução. Os marxistas mostraram também uma disponibilidade sincera de se comprometerem com os problemas até agora negligenciados do indivíduo e de assegurar a liberdade aqui e agora e não só num milênio distante.

(Künzli, 196722 KÜNZLI, A. Ost und West in Marienbad. Gewerkschaftliche Monatshefte v. 7, 438-441, 1967., 441).

Antes de passarmos a outras expressões mais problemáticas do encontro cristão–comunista na Tchecoslováquia comunista, podemos dar uma breve avaliação destes seminários e encontros. Como acabamos de ver no resumo do simpósio de Marienbad, houve uma aproximação entre os dois lados, na qual os cristãos se mostraram mais abertos aos problemas reais do mundo (fome, opressão, exclusão) e a necessidade de entrar nesses conflitos como cristãos, enquanto os marxistas aprenderam que a construção de um mundo novo (como eles o entendiam) necessitava de uma visão de ser humano mais adequada e completa. O ser humano não poderia ser reduzido ao problema econômico.

2. Mudanças depois de 1968

Neste sentido é claro que pelo menos teoricamente poderia ter havido um encontro entre os cristãos e marxistas tchecos e os teólogos da libertação. A terra já havia sido preparada e os interesses eram próximos. Mas isso não aconteceu. No dia 21 de agosto de 1968 as forças do Pacto de Varsóvia invadiram a Tchecoslováquia e puseram fim à primavera de Praga.18 18 Só para lembrar que foi menos de uma semana antes do início da Conferência de Medellín, que começou no dia 24 de agosto. Os bispos viram na televisão as reportagens da invasão e foi um elemento que serviu para o pano de fundo do concílio (SARANYANA, 2005, 179). Com isso, acabava a tentativa de criar “um comunismo com rosto humano” e a Tchecoslováquia entrou numa fase que foi chamada de normalização, o que significou o retorno a um comunismo já sem aceitação ou expectativa, mas com o qual as pessoas devem se acostumar – na frase conhecida do futuro presidente da República Tcheca Václav Havel significou “viver na mentira” (HAVEL, 197814 HAVEL, V. Moc bezmocných Disponível em: https://ct24.ceskatelevize.cz/sites/default/files/1817870-vaclavhavel_moc_bezmocnych_1978.pdf. Acesso em: 20 jan. 2022. Tradução portuguesa: O Poder dos sem-poder. Disponível em: http://dagobah.com.br/vaclav-havel-o-poder-dos-sem-poder/. Acesso em: 20 jan. 2022.
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), fingindo que tudo estava em ordem, enquanto todo o mundo sabia que nada estava em ordem. Para muitos cristãos, a própria ideia de dialogar com os marxistas era compreendida como viver na mentira, e esperar que algo pudesse acontecer por meio deste diálogo era visto como desejo de estabelecer relações com os representantes de um regime perdido.

Esta posição não existiu apenas pelo lado dos cristãos. A maioria dos marxistas mais abertos, como Milan Machovec ou Erika Kadlecová, foi expulsa das universidades. Ao mesmo tempo, porém, por motivos variados, até positivos, os parceiros ocidentais do diálogo quiseram manter o contato.19 19 Alguns participaram nos seminários nos apartamentos, e isso foi muito apreciado. Aqui tratamos dos que vieram a convite de organizações aprovadas pelo Estado e, portanto, como colaboradoras. Mas não puderam evitar uma certa manipulação por parte do regime, que sabia utilizá-los como prova para o mundo exterior de que tudo estava bem no mundo comunista, e que os cristãos tinham total liberdade. Uma maneira de fazer isso foi através de um movimento chamado de Conferência Cristã pela Paz (CCP).

2.1 Conferência Cristã pela Paz e Pacem in Terris

Esta organização foi fundada pelo já mencionado Josef Hromádka no ano 1958. Teve como fim a promoção da paz entre as nações europeias e do mundo inteiro sob a ameaça de um conflito com armas nucleares. Ainda que este objetivo fosse admirável, a CCP foi desde o seu início vista pelas autoridades comunistas como um meio de propaganda (Piškula, 201032 PIŠKULA, J. The Conception of the Christian Peace Conference and the Totalitarian Regime in Czechoslovakia. Communio Viatorum, v. 52, n. 3, p. 254-269, 2010.). A linguagem de paz soou muito bem, mas como explicou uma reportagem do Departamento de Estado dos EE. UU, “a Conferência Cristã pela Paz, com sede em Praga, é uma organização que serve como uma organização internacional de fachada para apoio da União Soviética.” (UNITED STATES DEPARTMENT OF STATE, 198536 UNITED STATES DEPARTMENT OF STATE. .Soviet Active Measures: Christian Peace Conference. Foreign Affairs Note. Washington, D.C.. May 1985., p. 1).20 20 É verdade que o Departamento de Estado dos EE. UU em maio de 1985 (sob a presidência de Ronald Reagan) não é a fonte mas confiável nestes assuntos, mas neste caso seria difícil negar a conclusão. Depois da invasão de Praga, isso se tornou mais claro ainda. Hromádka, já um homem velho, renunciou ao cargo de presidente (MORÉE, 201227 MORÉE, P. A Broken Man? Josef L. Hromádka in 1968 and 1969. Communio Viatorum, v. 49, n. 3, 335-349, 2012., p. 62-66) e a nova liderança estava claramente sob a influência dos bolchevistas, como dizia a dissidência tcheca da União Soviética. E foi exatamente esta organização, a CCP, que organizou a primeira tradução da obra de Frei Betto na Tchecoslováquia (BETTO, 19864 Frei BETTO, Fidel and Religion. Conversations with Frei Betto. Praga: Christian Peace Conference, 1986.).

Antes de investigarmos esta tradução e outra em tcheco, necessitamos considerar uma última parte do encontro entre comunismo e cristianismo. Em geral, pelo menos no que concerne à Tchecoslováquia, a Igreja Católica ficou mais distante do diálogo. Havia católicos que fizeram parte deste diálogo, mas quase todos eram leigos.21 21 Dos teólogos exilados, o Padre Karel Skalický foi uma das maiores exceções. Ensinou na Pontifícia Universidade Lateranense e foi editor de uma revista publicada em tcheco pelos teólogos exilados, chamado de Studie (Estudos). Skalický ensinou também na América Latina, e foi um dos primeiros teólogos tchecos que tinha um conhecimento de perto da Teologia da Libertação (VOKOUN, 2017). Mas isso não significa que a Igreja Católica ficara fora do movimento para melhorar as relações com o Estado neste período. A instância mais conhecida e mais problemática desta tentativa de aproximação foi a fundação de uma organização para padres católicos que recebeu o nome de Pacem in Terris.22 22 A referência à encíclica do Papa João XXIII foi intencional. Teve suas origens já bem antes, com o Movimento de Paz do Clero Católico, que começou em 1951, com o objetivo por parte do regime comunista de “criar uma igreja cismática nacional, igual àquela da China.” (TOMSKY, 198235 TOMSKY, A. ‘Pacem in Terris’ between church and state in Czechoslovakia. Religion in Communist Lands, v. 10, n. 3, p. 275-282, 1982., p. 275). Mas aquele movimento tornou-se muito enfraquecido, nunca tendo apreciado o apoio, nem da hierarquia nem da maioria do clero. Depois dos eventos de 1968 e como parte da normalização, criou-se em 1971 uma nova organização, em certa medida como continuidade dos movimentos anteriores, com o nome de “Associação de Clero Católico Pacem in Terris.” (Balík; Hanuš, 20071 BALÍK, S.; HANUŠ, J. Katolická církev v Československu 1945-1989. Brno: CDK, 2007., p. 129-145). Esta associação objetivava “participar na vida de paz e felicidade da nossa sociedade,” como “testemunhos da força dinâmica de que os trabalhadores despendem para alcançar os objetivos humanísticos desafiadores resultantes da conclusão do XIV Congresso do Partido Comunista Tchecoslovaco e do programa do plano quinquenal.” (Balík; Hanuš, 20071 BALÍK, S.; HANUŠ, J. Katolická církev v Československu 1945-1989. Brno: CDK, 2007., p. 133).

Este movimento era sempre minoritário, mas até 1983 contava com mais ou menos uma terça parte do clero católico. A oposição do Papa João Paulo II fez com que sobretudo o Arcebispo de Praga, Cardeal František Tomášek (já nesta época com mais de 80 anos de idade) tivesse a coragem de implementar o decreto da Sagrada Congregação para o Clero, Quidam episcopi, de 8 de março de 1982. O sucesso do decreto não foi total e até o fim do período comunista Pacem in Terris teve quase 30% do clero como membros. (Balík; Hanuš, 20071 BALÍK, S.; HANUŠ, J. Katolická církev v Československu 1945-1989. Brno: CDK, 2007., p. 142). Mas isso significou que alguém como Frei Betto, que havia dialogado com comunistas, e que havia tido contato com pessoas ligadas à Pacem in Terris, fosse suspeito para a maioria dos católicos.

2.2 Frei Betto na República Tcheca.

Graças ao seu livro, Fidel e a Religião, (BETTO, 19853 Frei BETTO. Fidel e a religião: conversas com Frei Betto. São Paulo: Brasiliense, 1985. Edição cubana: Frei BETTO. Fidel y la religión: conversaciones con Frei Betto. Havana: Oficina de Publicaciones del Consejo de Estado, 1985.)23 23 Trabalhamos com a edição cubana em castelhano. abriu-se um caminho para Frei Betto visitar vários países comunistas, às vezes sozinho, às vezes com outros teólogos e jornalistas. (BOFF, 19897 BOFF, C. Cartas Teológicos sobre o Socialismo. Coleção Fé e Militância 1. Petrópolis: Vozes, 1989.).24 24 O livro de Clodovis Boff trata de viagens feitas à Cuba, à União Soviética e à China. Talvez diferentemente do colega dominicano, o Frei Clodovis conseguiu entender o ponto fraco da sua visão bastante positiva a respeito dos estados comunistas. Ele foi duas vezes à Tchecoslováquia, em junho de 1988 e depois mais uma vez em maio de 1989. Embora fosse pouco antes da queda do comunismo e já depois da abertura comunista na União Soviética sob o presidente Gorbachev, o regime comunista parecia sólido no país. Já não havia a perseguição brutal das igrejas e do clero, mas o período da normalização significou uma perseguição mais sutil, a perda da possibilidade de estudar, de conseguir ascensão profissional, de pensar livremente, e, para os padres e pastores, de celebrar a liturgia e trabalhar numa paróquia ou comunidade.25 25 Uma representação muito bonita desta fase se vê no filme Zapomenuté světlo (A Luz Esquecida) do diretor Vladimir Michálek do ano 1996, que conta a história de um padre que perde as suas igrejas e seu trabalho pelas maquinações dos comunistas.

Em outubro de 1987, um ano antes de visitar a Tchecoslováquia, o Frei Betto havia ido à Polônia a convite de um grupo pro-comunista, a Associação Social Cristã (Chrześcijańskie Stowarzyszenie Społeczne) (Orzełek, 201931 ORZEŁEK, A. U genezy Chrześciańskiego Stowarzyszenia Społecznego. Powstanie i rozpad pierwszego zespołu redakcyjnego tygodnika ‘Za i Przeciw’. (Sobre a gênese da Associação Social Cristã. Estabelecimento e dissolução da primeira equipe editorial da revista semanal ‘Pro e Contra’”). Kwartalnik Historyczny, v. 124, n. 4, p. 721-763, 2019.; Kosicki, 201821 KOSICKI, P. H. The Catholic 1968: Poland, Social Justice, and the Global Cold War. Slavic Review, v. 77, n. 3, 638-660, 2018.). Por ser esta organização muito suspeita para os cristãos que não concordavam com os comunistas, os dominicanos poloneses não queriam hospedá-lo. (BETTO, 19936 Frei BETTO, O Paraíso Perdido: Nos Bastidores do Socialismo. São Paulo: Geração, 1993, 255., p. 255). Entre outras coisas, o Frei Betto teve a possibilidade de se encontrar com o líder do movimento Solidariedade, Lech Wałesa. Segundo o relato do Frei Betto, não foi um encontro muito fácil nem feliz. Para o líder do Solidariedade, o escritor brasileiro fez “um serviço de urso, porque usaram você para fazer propaganda deles.” (BETTO, 19936 Frei BETTO, O Paraíso Perdido: Nos Bastidores do Socialismo. São Paulo: Geração, 1993, 255., p. 262). Provavelmente por isso não somente Frei Betto, mas toda a Teologia da Libertação foi rechaçada nos países comunistas, mesmo depois da queda paulatina dos regimes locais na década de 1990. A resposta de Frei Betto foi “falo o que penso, em nenhum momento afirmei que este é o melhor regime do mundo.” (BETTO, 19936 Frei BETTO, O Paraíso Perdido: Nos Bastidores do Socialismo. São Paulo: Geração, 1993, 255., p. 262). De fato Betto não havia afirmado aquilo, mas não foi o suficiente para seus interlocutores, que esperavam uma condenação dos regimes comunistas, de seus males e uma denuncia mais incisiva por parte do frei dominicano. Wałesa, por outro lado, rejeitou os argumentos de Frei Betto e refutou a Teologia da Libertação, claramente movido por seus preconceitos, pois não conhecia a teologia da libertação.

Esse desencontro, essa falha de fusão dos horizontes, marcou a recepção na Tchecoslováquia. Neste país Frei Betto não se encontrou com a oposição, só em geral com as pessoas aprovadas pelo Estado. Porém, o governo tcheco não quis sua presença. Como membro de uma ordem religiosa, recusaram conceder-lhe um visto, e isso só aconteceu depois de o embaixador cubano no Brasil ter intercedido junto ao embaixador tcheco.26 26 No seu livro, Betto recorda que os “tchecos deixaram de traduzir um livro infantil cubano porque queriam que se excluísse uma foto da Igreja de Santa Maria do Rosário, uma das mais belas de Cuba.” (BETTO, 1993, p. 188). Betto ofereceu uma descrição poética e bela de Praga, sobretudo aquela Praga de Franz Kafka. Depois teve um encontro com o Cardeal Tomášek, que explicou-lhe a situação da Igreja e os conflitos que ainda aconteciam com o Estado comunista. O secretário do cardeal também lhe avisou que os “protestantes da Conferência Cristã pela Paz e os padres do movimento Pacem in Terris eram agentes de propaganda do Estado.” (BETTO, 19936 Frei BETTO, O Paraíso Perdido: Nos Bastidores do Socialismo. São Paulo: Geração, 1993, 255., p. 292).27 27 Nesta página deve se notar que o entendimento da história não é exato. Frei Betto disse que foi visitar o lugar “onde Jan Hus e mais 27 companheiros foram queimados em 6 de junho de 1415.” Fala da Praça da Cidade Velha (não Torre Velha). Mas Hus fora queimado pelo Concílio de Constanza, localidade cerca de 600 quilômetros distante de Praga. Os 27 (quase todos protestantes) foram executados no dia 21 de junho de 1621, depois da derrota das forças protestantes na batalha de Monte Blanca (novembro 1620). Mas este aviso parece não ter encontrado um entendimento. Frei Betto encontrou-se com o secretário-geral da Conferência Cristã pela Paz, Lubomír Miřejovský (1925–2002), que narrou que os comunistas não permitiram a publicação de uma tradução tcheca do livro de conversas com o Fidel, porque era “‘muito cubano,’ e haveria o risco de quererem aplicar aqui.” (BETTO, 19936 Frei BETTO, O Paraíso Perdido: Nos Bastidores do Socialismo. São Paulo: Geração, 1993, 255., p. 292).

Naquela primeira visita, Frei Betto havia sido convidado para dar uma palestra numa consulta do Conselho Mundial de Igrejas sobre a questão da teologia contextual, que aconteceu entre os dias 21 e 25 de junho de 1988. No ano seguinte saiu a versão tcheca da tradução feita pela CCP, (BETTO, 19895 Frei BETTO, Na straně chudých. (No lado dos pobres). Praga: Výbor církevních a náboženských činitelů v Československu, 1989.)28 28 O grupo que publicou este livro – Comissão de agentes eclesiais e religiosos na Tchecoslováquia – não é muito conhecido e parece que existiu só nestes últimos anos do regime. As pessoas eram basicamente as mesmas da CCP. e esta palestra foi o último texto desta coleção. Antes de concluir com uma leitura mais pormenorizada dele, vale a pena dizer algo sobre o livro, já que foi um dos únicos textos em tcheco que conteve algo da experiência religiosa ou teológica latino-americana.29 29 De fato isso permanece como problema. O único livro de um teólogo da libertação traduzido para o tcheco até agora é BOFF, 2000. Mais sobre a teologia da libertação na República Tcheca pode ver-se em NOBLE, 2021b, 39-40. Os dois livros (o em inglês e a versão tcheca) contêm mais ou menos os mesmos textos, com a diferença, já notada, que o livro em tcheco tem a palestra dada em Praga. No livro em inglês, antes dos trechos retirados das conversas com Fidel existem dois capítulos, um dos quais fala da “espiritualidade de Jesus,” (BETTO, 19864 Frei BETTO, Fidel and Religion. Conversations with Frei Betto. Praga: Christian Peace Conference, 1986., 3-9) enquanto o segundo se chama “A Vida em Jesus.” (BETTO, 19864 Frei BETTO, Fidel and Religion. Conversations with Frei Betto. Praga: Christian Peace Conference, 1986., 9-12). O primeiro tem como conclusão que “Deus quer ser servido e amado no nosso companheiro, e mais ainda naquele que não tem vida e precisa de justiça. São estas as pessoas com quem Jesus se identificou. Por isso, não há contradição entre a luta pela justiça e a realização da vontade de Deus.” (BETTO, 19864 Frei BETTO, Fidel and Religion. Conversations with Frei Betto. Praga: Christian Peace Conference, 1986., 8).

Na segunda contribuição, lemos da necessidade, tão comum para a Teologia da Libertação, de lutar pela vida contra a morte. “Essa praxe reúne cristãos e ateístas que se comprometem com a construção de uma sociedade de fraternidade, na qual a bondade da vida será compartilhada igualmente.” (BETTO, 19864 Frei BETTO, Fidel and Religion. Conversations with Frei Betto. Praga: Christian Peace Conference, 1986., 12). No livro em inglês seguem seis passagens do livro de Frei Betto, com os subtítulos, “De uma educação cristã a uma convicção revolucionária (na edição cubana, 153-161); “Não posso concordar com qualquer tipo de discriminação” (245-250); “A pastoral social da igreja” (260-268); “A Teologia da Libertação – A volta do Cristianismo às suas raízes,” (270-303); “Karl Marx poderia ter assinado o Sermão na Montanha” (321-45);30 30 No livro tcheco esta secção tem o título “Os marxistas não descobriram a luta de classes.” “Os martírios da Revolução” (371-79). Embora esta escolha seja representativa do livro, é claro que a mensagem subjacente é que os cristãos são mais cristãos quanto mais estão perto do marxismo, ou pelo menos que no fundo os objetivos da vida cristã e da vida marxista, em termos sociais, são iguais. Quando se lê esta mensagem do ponto de vista da pobreza latino-americana, ela pode fazer sentido. Porém, da perspectiva tcheca ou de alguém que morava num país comunista, não se torna tão simples, porque de fato, no chamado socialismo real, os fins eram bem diferentes. Naquela época o Estado teve como finalidade a manutenção da estrutura dele mesmo com seus instrumentos de opressão e a libertação que ocorreu foi exatamente daquele mundo.

Agora podemos voltar ao texto sobre a fé, a política e a ideologia. (BETTO, 19895 Frei BETTO, Na straně chudých. (No lado dos pobres). Praga: Výbor církevních a náboženských činitelů v Československu, 1989., p. 88-99).31 31 Não encontramos este texto em forma publicada em português. A única referência que achamos é ao texto em formato de xerox, “Fé, Política e Ideología”. Para o(a) leitor(a) da América Latina o texto não traz grande novidade, pelo menos hoje em dia. Começa na tradição metodológica da Teologia da Libertação com uma apresentação da situação socioeconômica no Brasil e na América Latina. Mas, dado o pano de fundo de cooperação ou colaboração entre alguns cristãos e o regime comunista na Tchecoslováquia, a linguagem escolhida para fazer esta apresentação (pelo menos na tradução tcheca) se aproxima muito àquela dos poderes políticos. O texto afirma que a região da América do Sul é ligada com o capitalismo sob a hegemonia dos Estados Unidos, (BETTO, 19895 Frei BETTO, Na straně chudých. (No lado dos pobres). Praga: Výbor církevních a náboženských činitelů v Československu, 1989., p. 88), elogia Cuba, que “há 30 anos quebrou o domínio capitalista e hoje em dia mostra o maior desenvolvimento social de todo o continente, erradicou a miséria e o analfabetismo, introduziu educação gratuita em todos os níveis, e criou tal sistema de saúde que supera o de muitos países do primeiro mundo.” (BETTO, 19895 Frei BETTO, Na straně chudých. (No lado dos pobres). Praga: Výbor církevních a náboženských činitelů v Československu, 1989., p. 89). Embora seja verdade, este louvor dos sistemas com ligações fortes com a União Soviética (o poder imperial e hegemônico que dominava a Tchecoslováquia e outros países da Europa Central e do Leste) é quase uma garantia de ofender os oponentes do regime.

A primeira parte da palestra fala da fé como um dom encarnado. Começa com a afirmação que “na América Latina não é possível desligar a fé, a política e a ideologia.” (BETTO, 19895 Frei BETTO, Na straně chudých. (No lado dos pobres). Praga: Výbor církevních a náboženských činitelů v Československu, 1989., p. 89). Mostra a relação estreita entre os poderes políticos e os poderes religiosos, tanto no tempo de Jesus como na história da Igreja. “A fé,” diz Frei Betto, “é um dom politicamente velado, que tem sua razão de ser neste conflito histórico, conflito histórico este em qual somos chamados pela graça a reconhecer o plano de salvação de Deus.” (BETTO, 19895 Frei BETTO, Na straně chudých. (No lado dos pobres). Praga: Výbor církevních a náboženských činitelů v Československu, 1989., p. 90). Entrar no caminho de uma vida de fé significa reconhecer que tudo tem implicações tanto para a fé como para a política – mesmo os milagres de Jesus, que restauram as pessoas na comunidade têm, por este próprio fato, uma dimensão política inevitável, porque necessariamente mudam a estrutura da sociedade.

Por isso, o texto continua com uma reflexão sobre como “Viver a fé a partir da causa dos pobres.” Isso não é porque “os pobres são mais santos ou melhores que os ricos, mas simplesmente porque os pobres são pobres e a existência massiva dos pobres não fez parte do plano original de Deus, plano este no qual todos deveriam ter compartilhado os valores da criação e ter vivido como irmãos e irmãs.” (BETTO, 19895 Frei BETTO, Na straně chudých. (No lado dos pobres). Praga: Výbor církevních a náboženských činitelů v Československu, 1989., p. 91). Por mais que seja verdade no Brasil, esta afirmação não era tão clara no contexto tchecoslovaco comunista. Em termos um pouco simples do coeficiente de Gini, a República Tcheca ainda hoje tem um dos valores mais baixos no mundo,32 32 O coeficiente para a República Tcheca é de 0.24, menos da metade do número brasileiro. É o segundo menor na Europa, veja https://appsso.eurostat.ec.europa.eu/nui/show.do?dataset=ilc_di 12⟨=en. O problema, porém, é que esta estatística esconde formas de desigualdade – o exemplo mais claro, mesmo que absurdo, seria uma sociedade onde ninguém tem nada, onde o coeficiente de Gini seria de zero, mas a miséria seria total. enquanto, como se sabe, o Brasil tem um dos valores mais altos. (Ferreira de Souza et al., 2019, 23-28).33 33 No ano 2001 o coeficiente de Gini para o Brasil era de 0.595. No ano 2015 baixou para 0.514 (FERREIRA DE SOUZA, 2019, p. 23). Os números do Banco Mundial são um pouco diferentes, de 0.584 em 2001 a 0.519 em 2015. Também afirmam que estaria novamente crescendo tendo atingido 0.539 em 2019: veja https://data.worldbank.org/indicator/SI.POV.GINI?locations=BR. Sob o comunismo houve diferenças entre os mais ricos e os mais pobres (os líderes políticos e até os membros do partido comunista tiveram maiores possibilidades), mas não houve em geral a miséria material da América Latina ou sua desigualdade. Por outro lado, as pessoas, mesmo tendo as necessidades de vida, se sentiam pobres, porque não tinham a possibilidade de viajar, de escolher o que queriam, de falar com alguém sem medo, etc. Se de fora o mundo comunista parecia oferecer renovação e perspectivas melhores, de dentro foi exatamente o contrário, o mundo capitalista é que parecia oferecer possibilidades com as quais não se podia sonhar.

Vamos voltar a este desencontro contextual no fim, mas ele continua, quando Frei Betto fala da “Ligação com a ideologia revolucionária da perspectiva cristã.” Ele admite que tem contatos com “forças políticas e revolucionárias, que aparentemente estão em oposição ao mundo da fé.” (BETTO, 19895 Frei BETTO, Na straně chudých. (No lado dos pobres). Praga: Výbor církevních a náboženských činitelů v Československu, 1989., p. 93). Mas isso “tem a ver com uma abordagem prática comum com gente contra o imperialismo dos EE. UU, contra a exploração capitalista, em prol dos direitos dos pobres e em prol de um futuro socialista.” (BETTO, 19895 Frei BETTO, Na straně chudých. (No lado dos pobres). Praga: Výbor církevních a náboženských činitelů v Československu, 1989., p. 93). Os elogios que fez aos movimentos cristãos de paz, como terra de compromisso entre comunistas e cristãos, parecem mostrar que não atendeu ao aviso do secretário do Cardeal Tomášek, que citamos acima. Os problemas, como enumera o frade mineiro, são todos pelo lado da Igreja Católica. Não há crítica da violência e perseguição sofrida pela igreja nos países comunistas (onde houve também martírio). É verdade que “o Deus em que cremos, não é o Deus que o marxismo nega, porque não cremos no deus do capitalismo, de exploração capitalista, da tortura, da ditadura, no deus da ideologia moderna.” (BETTO, 19895 Frei BETTO, Na straně chudých. (No lado dos pobres). Praga: Výbor církevních a náboženských činitelů v Československu, 1989., p. 95-96). Mas o deus que o marxismo nega foi tampouco o Deus das vítimas do regime comunista, o Deus da exploração comunista, de tortura, física e psíquica, do Estado, o Deus da ideologia da modernidade. É muito provável que o Frei Betto pudesse concordar com isso, mas para os leitores tchecos o silêncio, a ausência de uma crítica equilibrada, falou mais alto.

A palestra cita uma declaração da Terceira Reunião do Partido Comunista de Cuba em 1986, que entre outras coisas, avalia a Teologia da Libertação

não só como uma experiência sincera e comprometida com os pobres do lado deles, que nesta maneira exprimem seu cristianismo autêntico, mas também avaliamos o seu significado político, como uma manifestação do desejo de muitos cristãos de construir, na base das suas próprias convicções cristãs um mundo no qual dominará fraternidade, igualdade e justiça entre as pessoas.

(BETTO, 19895 Frei BETTO, Na straně chudých. (No lado dos pobres). Praga: Výbor církevních a náboženských činitelů v Československu, 1989., p. 97-98).

Do ponto de vista de muitos cristãos e teólogos latino-americanos esta citação pode gerar concordância. Mas para o ouvinte ou leitor sob o regime comunista o simples fato de aprovar uma afirmação de um partido comunista a desautoriza. Não há como aceitá-la.

Considerações finais

Neste artigo quisemos demonstrar porque no final do período comunista e no início da Tchecoslováquia (e a partir de 1993 a República Tcheca) democrata, houve uma rejeição quase visceral da Teologia da Libertação. Os primeiros apoiadores ou comentadores desta teologia no país34 34 Eis alguns artigos que apareceram em duas revistas publicadas na Tchecoslováquia. Ambas revistas, Communio Viatorum, que publicou em inglês, alemão e francês, e Křesťanská revue (Revista Cristã) foram fundadas por Josef Hromádka e foram publicadas pela faculdade protestante. Da revista Communio Viatorum podemos citar os seguintes artigos: Shaull, R., Liberation Theology Through Transformation. v. 14, n. 2, p. 85-105, 1971; Brož, L., Subversive Education of Paulo Freire. v. 14, n. 3, p. 285–289, 1971, uma recensão do livro Pedagogia dos Oprimidos; Brož, L., Alves’s Programme of Radical Utopianism. v. 15, n. 4, p. 201-209, 1972; HAM, A., Introducing the Theology of Liberation. v. 16, n. 3, p. 113-120, 1973; FREIRE, P., Conscientization and Liberation. v. 17, n. 3, p. 110-122, 1974, entrevista publicada em IDAC 1 (1973); Tóth, K. The Theology of Liberation and its Relation to Anti-Racism. v. 18, n. 1-2, 51-56, 1975. Tóth, um presbítero reformado húngaro, foi um dos seguidores de Hromádka como secretário-geral da Conferência Cristã pela Paz; Smolík, J., Recensão de Gutiérrez, Theologie der Befreiung. v. 18:1–2 (1975), 99-103. Esta recensão foi publicada também em tradução tcheca como “Teologie osvobození” na revista Křesťanská revue v. 42, n. 6, 119-121, 1975; KERN, U., Die lateinamerikanische Theologie der Befreiung in ihrem theologischem Selbstverständnis, v. 29, n. 1, 41–66, 1986; Smolík, J., Recensão de Leonardo Boff, Kirche, Charisma und Macht, v. 30, n. 3, 273-276, 1987. Os artigos seguintes figuraram na revista Křesťanská revue; Drapál, D. Alvesova teologie lidské naději. (A Teologia de Esperança de Alves), v. 37, n. 5-6, 140-141, 1970; CONE, J., Černá teologie. (Teologia negra), v. 42, n. 3-4, 58-62, 1978; Opočenský, M. Recensão de Alain Gheerbrant, The Rebel Church in Latin America. v. 43, n. 7, 165-166, 1976; Mar Gregorios, P. Poznámky k teologii osvobození. (Observações sobre a Teologia da Libertação), v. 46, n. 7-8, 164-168, 1979; Opočenský, M. Teologie osvobození. (Teologia da Libertação), v. 53, n. 3, 162-168, 1986 e v. 53, n. 4, 88-93, 1986. mantiveram uma relação de proximidade com o regime comunista que muitos taxaram como colaboração, no pior sentido desta palavra. Na melhor das hipóteses estes discursos sobre a Teologia da Libertação foram usados pelo regime como instrumentos para mostrar que houve liberdade religiosa no país e que o marxismo e a fé cristã poderiam conviver. Mas neste contexto a convivência foi de um lado só, porque os cristãos tinham que se submeter à vontade do Estado.

A posição de João Paulo II estava em certo desacordo com a Teologia da Libertação. O então papa sempre negou a necessidade de haver um vínculo entre fé e transformação política. Para o papa polonês, o clero não deve estar presente na política, como observou-se nos países latino-americanos como a Nicarágua. Mas naquele contexto havia uma exceção, porque nos países comunistas europeus o clero católico e sobretudo a hierarquia eclesiástica ganhou um impulso profundo para enfrentar as autoridades. O Cardeal Tomášek foi um exemplo muito claro disso. Já velho (nasceu em 1899), ele foi durante mais de uma década administrador apostólico da Arquidiocese de Praga, tendo assumido o ofício de arcebispo só em 1977. O Cardeal não colaborou anteriormente com o governo, mas foi muito discreto e não foi reconhecido como oponente do regime comunista. A partir da eleição de João Paulo II, porém, ele se tornou uma voz da oposição, acolhendo e apoiando católicos e outros cristãos e oponentes do governo. Mas isso, é claro, é uma forma de política e os que não quiseram ouvir sobre a Teologia da Libertação, pois a viram como uma mistura de fé e política (e, portanto, posição ideológica), nunca tiveram problemas com este esforço do Cardeal e outros membros do clero católico ou dos pastores protestantes.35 35 Entre os que assinaram a Carta 77 foram pastores protestantes e padres e leigos católicos. Esta carta aberta, publicada pela primeira vez em 6 de janeiro de 1977, reivindicou os direitos humanos garantidos pelo Acordo de Helsinque de 1975, e marcou um momento importante no caminho da derrota do regime comunista. Seu porta-voz foi o futuro presidente Václav Havel.

Com isso, se pode ver tanto as possibilidades de encontro que existiram como as razões de não-encontro. Frei Betto e Lech Walesa tiveram muito em comum, viram e entenderam a necessidade de lutar para a libertação no nível político e espiritual de um mundo onde dominava a opressão, a mentira e o ódio. Ambos foram presos por sua oposição a estas estruturas. Mas a realidade contra a qual eles lutaram foi diferente, ou pelo menos foi nomeada de maneira completamente diferente. Enquanto o dominicano brasileiro entrou em conflito com um regime militar de chamada “segurança nacional” (COMBLIN, 19789 COMBLIN, J. A ideologia da Segurança Nacional. O poder militar na América Latina. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1978.), o sindicalista polonês enfrentou o poder comunista.

Estes contextos influenciaram o que se pode ouvir e entender. No contexto brasileiro, qualquer aliança com o capitalismo norte-americano, que tanto apoiou a ditadura, era impensável. A linguagem de oposição veio em primeiro lugar, pelos teólogos da libertação, do evangelho, da fé cristã, mas esta fé encontrou sua expressão mais adequada numa linguagem, até numa prática, que teve fortes raízes marxistas. Contudo o contexto tcheco (ou polonês) foi outro. O marxismo ou a prática dos comunistas foi contra os cristãos e quis eliminar a religião. Embora houvesse pessoas (como Machovec), que quiseram um diálogo aberto e sincero com cristãos, houve outros que quiseram abusar da bondade de cristãos para fazê-los servos de um regime inimigo, como foi o caso da Conferência Cristã pela Paz. Quem se tornou aliado a este grupo se tornou suspeito por ter sido compreendido como apoiador do regime.

Para concluir, oferecemos uma reflexão pessoal e depois uma sugestão sobre o que podemos fazer para evitar estes desencontros. Visitei a República Tcheca pela primeira vez em 1996 para dar uma palestra sobre a Teologia da Libertação. Fiquei surpreso com a resistência a esta teologia, ouvi que é marxista, de jeito nenhum cristã. Este preconceito foi bastante comum e não entendia bem de onde veio. Agora, depois de morar mais de vinte anos neste contexto, entendo bem melhor. Poder-se-ia dizer que o mundo era simples – ou alguém fica no lado do regime, ou é contrário a ele.36 36 Tenho a impressão que a realidade nunca foi tão simples assim. Nas palavras de Havel, rejeitando a mentira é possível, mas para funcionar, para sobreviver, alguma coisa foi preciso aceitar. Por exemplo, comprar comida ou bebida foi comprar do Estado, porque tudo foi do Estado, mas tem que comer e beber, tem que morar num apartamento, tem que trabalhar. E os que entraram em diálogo ou mesmo falaram nos encontros dos movimentos como a Conferência Cristã pela Paz deram apoio ao regime. Por outro lado, nestes últimos 25 anos, muitas pessoas passaram a entender a força da Teologia da Libertação. Os países pós-comunistas estão de certo modo às margens da Europa, mesmo um país como a República Tcheca que se encontra geograficamente no coração da Europa e sempre serviu como uma ponte entre o mundo eslavo e o mundo ocidental. Comparado com países vizinhos como Alemanha ou Áustria o país se compreende como pobre e pequeno.37 37 Em dados encontrados na página https://www.worldometers.info/world-population/population-by-country/ (18 de janeiro 2022). Segundo esta página, de 235 países, territórios e dependências no mundo, a República Tcheca ocupa o lugar 86 quanto à população e fica bem no meio (117) quanto ao tamanho. O Brasil é sexto na população e quinto no tamanho. Porém, quanto a densidade da população, a República Tcheca fica na posição 86, enquanto o Brasil está na posição 187. Já o capitalismo não é visto como o grande libertador e a linguagem de justiça social não soa como marxista, mas também como cristã.

No fim, como é que podemos evitar este desencontro contextual, quando não podemos ouvir e entender o outro por causa do barulho que circunscreve os relatos que fazemos. É um problema teológico, pois trata de como podemos falar de Deus onde aquele que é contra Deus fala tão alto. Neste caso nem basta dizer que devemos tentar falar de experiência à experiência. Frei Betto fez isso, mas nem ele nem os seus ouvintes conseguiram ouvir, pois a articulação da experiência impossibilitou um encontro mais profundo. Talvez o melhor seja fazer como indicou Santo Inácio no princípio de caridade nos Exercícios Espirituais:

Para que tanto o que dá os Exercícios Espirituais, como o que os recebe, mais se ajudem e aproveitem, se há de pressupor que todo o bom cristão deve estar mais pronto a salvar a proposição do próximo que a condená-la; se a não pode salvar, inquira como a entende, e, se a entende mal, corrija-o com amor; e se não basta, busque todos os meios convenientes, para que, entendendo-a bem, se salve.

(S. INÁCIO, 199917 INÁCIO de Loiola, Santo. Exercícios Espirituais. Tradução do autógrafo espanhol por Vital Cordeiro Dias Pereira, S.J. Organização e Notas por F. de Sales Baptista, S.J. Braga: Livraria Apostolado, 1999., 9 – Exercícios Espirituais 22).

Para isso necessita-se de humildade, de reconhecer que o meu mundo é um mundo, mas não o único. O melhor mundo possível se manifesta como maior do que qualquer mundo limitado. Não é negar ou menosprezar o próprio mundo, pois é uma parte importante deste mundo maior. Mas é aceitar que não se pode insistir que a nossa seria a única possibilidade. O contexto é de grande importância, mas para libertar, não para prender. É a segurança e a certeza de onde podemos sair, não as paredes que nos limitam. Afinal de contas, como cristãos somos peregrinos, os sem-casa (1 Pd 2:12, por exemplo), que temos a casa, o contexto mais fundamental, em Cristo. Permanecendo nele é que podemos nos encontrar, como Elias buscando a voz de Deus na montanha no silêncio. Os horizontes diferentes, as perspectivas diversas, os contextos variados, se encontram e realizam uma fusão, e aí então podemos encontrar-nos diante da presença sagrada do Senhor, abrindo o coração para Ele, buscando a transformação do mundo para que manifeste a justiça, o amor e a misericórdia de Deus.

  • 1
    Este artigo faz parte do projeto de pesquisa da Universidade Carolina em Praga, “Theological Anthropology in Intercultural Perspective”, Charles University Research Centre program No. UNCE/24/SSH/019. Também faz parte do projeto “Latin American Liberation Theology: Prospects and Challenges”, “A Teologia da Libertação Latino-Americana: Perspectivas e Desafios” (GAČR 18-01543S), fundado pela Fundação Científica Tcheca.
  • 2
    No ano 1993 o país da Tchecoslováquia, já um país democrático, se dividiu em dois, a República Tcheca e a Eslováquia. Já que os dois países são diferentes, também em relação à religião, vamos nos concentrar aqui na situação tcheca.
  • 3
    No censo que foi feito em 1950, de uma população de 8,896,133, 6,792,046 pessoas se reconheciam como católicos romanos (e ainda 32,862 como católicos gregos), isto é, aproximadamente 76%. A segunda maior igreja foi a Igreja Tchecoslovaca (hoje em dia a Igreja Tchecoslovaca Hussita), uma igreja que saiu do movimento do Modernismo Católico no ano 1920, que naquela época tinha 946,813 aderentes. Depois foram as igrejas protestantes tradicionais, da qual a maior foi (e ainda é) a Igreja Evangélica dos Irmãos Tchecos, que contou com 401,729 membros.
  • 4
    Já que as demais igrejas eram menores e não tinham ligações tão estreitas com o exterior, no início não sofreram tanto como instituições. Mas as tentativas de divisão, para criar uma igreja fiel em primeiro lugar ao Estado, aconteceram nestas igrejas também.
  • 5
    Durante o período do comunismo, a faculdade podia funcionar, mas só fez parte da Universidade Carolina, a universidade mais antiga da Europa Central, fundada em 1348 pelo rei e imperador do Santo Império Romano, Carlos IV, a partir de 1990. A Faculdade Católica, uma das faculdades fundadoras da universidade, foi expulsa e os seminaristas estudaram no seminário diocesano na cidade de Litoměřice, uns 70 quilômetros a norte de Praga. A terceira faculdade, também em Praga, era a da Igreja Tchecoslovaca Hussita. Como me contou minha esposa, estudante na faculdade hussita nos últimos anos do regime comunista, os estudantes nem mesmo podiam ir ao mesmo dentista de outros estudantes, para não os infectar com a doença da religião!
  • 6
    Rua dos Curtidores.
  • 7
    Segundo Berglund, Hromádka também participou de algo que poder-se-ia chamar de proto-círculo bíblico, com a filha de Masaryk, Alice, ondes eles pretendiam “aplicar os ensinamentos da Escritura aos problemas sociais conterrâneos” (BERGLUND, 20182 BERGLUND, B. Castle and Cathedral in Modern Prague. Longing for the Sacred in a Sceptical Age. Budapest: Central European University Press, 2018., p. 213).
  • 8
    Hromádka morreu um ano depois da invasão da Tchecoslováquia pelas forças do Pacto de Varsóvia em agosto de 1968. Mas parece que ele nunca deixou de acreditar que havia a possibilidade de um encontro entre cristianismo e marxismo (MORÉE, 201227 MORÉE, P. A Broken Man? Josef L. Hromádka in 1968 and 1969. Communio Viatorum, v. 49, n. 3, 335-349, 2012., p. 335-349). Agradeço ao Dr. Moree, um dos grandes conhecedores de Hromádka e da história do período comunista em relação às igrejas, pela ajuda na preparação deste artigo.
  • 9
    Floss foi um católico engajado neste diálogo.
  • 10
    Para uma lista (em tcheco), veja http://www.i-triada.net/index.php?id=26&menu=aktuality⊂=aktuality&str=aktualita.php. A ecumenicidade dos seminários é clara. Como exemplo, os temas do primeiro semestre do ano 1965/66 foram, entre outros, “A filosofia e o movimento ecumênico,” “A história do ecumenismo católico,” “Constituição sobre a Igreja (Vaticano II),” “A discussão sobre a justificação entre Barth e Küng,” “Diálogo e a imutabilidade da doutrina,”, “A ciência e a fé,” “O corpo de Cristo segundo a Carta aos Efésios,” e “Teologia como ciência.”
  • 11
    Machovec nasceu numa família católica, e depois de 1970, quando ele ficou proibido de ensinar, viveu como organista nas igrejas católicas de Praga. Neste período antes da queda de comunismo continuou com as atividades intelectuais nos chamados “seminários no apartamento.” As pessoas se reuniram num apartamento para palestras e discussões. Depois de 1990, Machovec pôde retornar à universidade.
  • 12
    Estas conferências tiveram como temas “Christentum und Marxismus heute” (Cristianismo e Marxismo Hoje) e “Christliche Humanität und marxistischer Humanismus” (Humanidade cristão e humanismo marxista).
  • 13
    Kadlecová nasceu na parte leste do que hoje em dia é a República Tcheca numa família protestante, mas deixou a igreja durante a guerra e ingressou no Partido Comunista. Foi uma das primeiras e mais importantes sociólogas da religião no país. Sua maior pesquisa foi sobre a religiosidade de uma parte do país (o norte da Morávia), que foi feita em 1963 e mostrou a continuação da fé religiosa e a presença de algo que hoje em dia é até típico para a República Tcheca, uma fé em “algo,” mas uma rejeição do cristianismo, sobretudo na sua forma institucionalizada. Sobre Kadlecová, veja Nešpor, 201728 NEŠPOR, Z. Význam Eriky Kadlecové a sociologie náboženství v marxisticko-křesťanském dialogu šedesátých let. (O Significado da Erika Kadlecová e da sociologia da religião no diálogo marxista-cristão dos anos 1960). In: LANDA, I.; MERVART, J. (Eds.), Proměny marxisticko-křesťanského dialogu v Československu, Praga: Filosofia, 2017, p. 87-103., p. 87-103.
  • 14
    Os textos da conferência encontram-se em Kellner, 196820 KELLNER, E. (Ed.) Schöpfertum und Freiheit. Munique: Paulus-Gesellschaft, 1968..
  • 15
    Entre estes foram, por exemplo, o francês Roger Garaudy (1913–2012), o espanhol Manuel Azcárate (1916–1998), e os italianos Cesare Luporini (1909–1993) e Luciano Gruppi (1920–2003) (Mervart, 201726 MERVART, J. Historické perspektivy křesťansko-marxistického dialogu a konference v Mariánských Lázních 1967. (Perspectivas históricas do diálogo cristão-marxista e da conferência em Mariánské Lázně). In: LANDA, I.; MERVART, J. (Ed.), Proměny marxisticko-křesťanského dialogu v Československu, Praga: Filosofia, 2017, p. 61-86., 80). Os representantes comunistas se encontravam a cada dia para avaliar a jornada e preparar suaposição para o dia seguinte.
  • 16
    Houve 169 cristãos (entre estes, porém, foram também incluídos cientistas e políticos social-democratas alemães) e 48 marxistas. A Paulus Gesellschaft convidou mais ou menos 150 pessoas, enquanto o instituto tcheco convidou 11 marxistas ocidentais, 22 da Europa comunista, e ainda 27 cristãos dos países comunistas europeus (MERVART, 201726 MERVART, J. Historické perspektivy křesťansko-marxistického dialogu a konference v Mariánských Lázních 1967. (Perspectivas históricas do diálogo cristão-marxista e da conferência em Mariánské Lázně). In: LANDA, I.; MERVART, J. (Ed.), Proměny marxisticko-křesťanského dialogu v Československu, Praga: Filosofia, 2017, p. 61-86., 62).
  • 17
    Naquela época Girardi era padre salesiano, ensinando na Universidade Salesiana em Roma. Foi um grande apoiador da teologia da libertação, sendo expulso da ordem dos salesianos e do sacerdócio por causa de seu compromisso político.
  • 18
    Só para lembrar que foi menos de uma semana antes do início da Conferência de Medellín, que começou no dia 24 de agosto. Os bispos viram na televisão as reportagens da invasão e foi um elemento que serviu para o pano de fundo do concílio (SARANYANA, 200533 SARANYANA, J.-I. La recepción de “Medellín” en la historiografía colombiana. Anuario de la Historia de la Iglesia, v. 14, p. 177-199, 2005., 179).
  • 19
    Alguns participaram nos seminários nos apartamentos, e isso foi muito apreciado. Aqui tratamos dos que vieram a convite de organizações aprovadas pelo Estado e, portanto, como colaboradoras.
  • 20
    É verdade que o Departamento de Estado dos EE. UU em maio de 1985 (sob a presidência de Ronald Reagan) não é a fonte mas confiável nestes assuntos, mas neste caso seria difícil negar a conclusão.
  • 21
    Dos teólogos exilados, o Padre Karel Skalický foi uma das maiores exceções. Ensinou na Pontifícia Universidade Lateranense e foi editor de uma revista publicada em tcheco pelos teólogos exilados, chamado de Studie (Estudos). Skalický ensinou também na América Latina, e foi um dos primeiros teólogos tchecos que tinha um conhecimento de perto da Teologia da Libertação (VOKOUN, 201737 VOKOUN, J. “‘Skalický je filomarxista.’ Křesťansko-marxistický dialog v Řimských Studiích,” (‘Skalický é filomarxista’. O diálogo cristão-marxista na revista romana Studie). In: LANDA, I.; MERVART, J. (Ed.), Proměny marxisticko-křesťanského dialogu v Československu, Praga: Filosofia, 2017, p. 141-72.).
  • 22
    A referência à encíclica do Papa João XXIII foi intencional.
  • 23
    Trabalhamos com a edição cubana em castelhano.
  • 24
    O livro de Clodovis Boff trata de viagens feitas à Cuba, à União Soviética e à China. Talvez diferentemente do colega dominicano, o Frei Clodovis conseguiu entender o ponto fraco da sua visão bastante positiva a respeito dos estados comunistas.
  • 25
    Uma representação muito bonita desta fase se vê no filme Zapomenuté světlo (A Luz Esquecida) do diretor Vladimir Michálek do ano 1996, que conta a história de um padre que perde as suas igrejas e seu trabalho pelas maquinações dos comunistas.
  • 26
    No seu livro, Betto recorda que os “tchecos deixaram de traduzir um livro infantil cubano porque queriam que se excluísse uma foto da Igreja de Santa Maria do Rosário, uma das mais belas de Cuba.” (BETTO, 19936 Frei BETTO, O Paraíso Perdido: Nos Bastidores do Socialismo. São Paulo: Geração, 1993, 255., p. 188).
  • 27
    Nesta página deve se notar que o entendimento da história não é exato. Frei Betto disse que foi visitar o lugar “onde Jan Hus e mais 27 companheiros foram queimados em 6 de junho de 1415.” Fala da Praça da Cidade Velha (não Torre Velha). Mas Hus fora queimado pelo Concílio de Constanza, localidade cerca de 600 quilômetros distante de Praga. Os 27 (quase todos protestantes) foram executados no dia 21 de junho de 1621, depois da derrota das forças protestantes na batalha de Monte Blanca (novembro 1620).
  • 28
    O grupo que publicou este livro – Comissão de agentes eclesiais e religiosos na Tchecoslováquia – não é muito conhecido e parece que existiu só nestes últimos anos do regime. As pessoas eram basicamente as mesmas da CCP.
  • 29
    De fato isso permanece como problema. O único livro de um teólogo da libertação traduzido para o tcheco até agora é BOFF, 20008 BOFF, L. Orel a kuře: o integraci a dynamické rovnováze protikladů v nás. Praga: Portál, 2000. Tradução tcheca de: BOFF, L. A águia e a galinha: metáfora da condição humana. Petrópolis: Vozes, 1997.. Mais sobre a teologia da libertação na República Tcheca pode ver-se em NOBLE, 2021b30 NOBLE, T. Teologie osvobození v době politických a církevních proměn. (A teologia da libertação na época de mudanças políticas e eclesiais). Studia Theologica, v. 23, n. 3, 39–60, 2021b., 39-40.
  • 30
    No livro tcheco esta secção tem o título “Os marxistas não descobriram a luta de classes.”
  • 31
    Não encontramos este texto em forma publicada em português. A única referência que achamos é ao texto em formato de xerox, “Fé, Política e Ideología”.
  • 32
    O coeficiente para a República Tcheca é de 0.24, menos da metade do número brasileiro. É o segundo menor na Europa, veja https://appsso.eurostat.ec.europa.eu/nui/show.do?dataset=ilc_di 12⟨=en. O problema, porém, é que esta estatística esconde formas de desigualdade – o exemplo mais claro, mesmo que absurdo, seria uma sociedade onde ninguém tem nada, onde o coeficiente de Gini seria de zero, mas a miséria seria total.
  • 33
    No ano 2001 o coeficiente de Gini para o Brasil era de 0.595. No ano 2015 baixou para 0.514 (FERREIRA DE SOUZA, 201910 FERREIRA DE SOUZA, P. H. G. et al. Os Efeitos do Programa Bolsa Família sobre a Pobreza e a Desigualdade: Um Balanço dos Primeiros Quinze Anos. Texto para Discussão 2499. Rio de Janeiro: IPEA, 2019., p. 23). Os números do Banco Mundial são um pouco diferentes, de 0.584 em 2001 a 0.519 em 2015. Também afirmam que estaria novamente crescendo tendo atingido 0.539 em 2019: veja https://data.worldbank.org/indicator/SI.POV.GINI?locations=BR.
  • 34
    Eis alguns artigos que apareceram em duas revistas publicadas na Tchecoslováquia. Ambas revistas, Communio Viatorum, que publicou em inglês, alemão e francês, e Křesťanská revue (Revista Cristã) foram fundadas por Josef Hromádka e foram publicadas pela faculdade protestante. Da revista Communio Viatorum podemos citar os seguintes artigos: Shaull, R., Liberation Theology Through Transformation. v. 14, n. 2, p. 85-105, 1971; Brož, L., Subversive Education of Paulo Freire. v. 14, n. 3, p. 285–289, 1971, uma recensão do livro Pedagogia dos Oprimidos; Brož, L., Alves’s Programme of Radical Utopianism. v. 15, n. 4, p. 201-209, 1972; HAM, A., Introducing the Theology of Liberation. v. 16, n. 3, p. 113-120, 1973; FREIRE, P., Conscientization and Liberation. v. 17, n. 3, p. 110-122, 1974, entrevista publicada em IDAC 1 (1973); Tóth, K. The Theology of Liberation and its Relation to Anti-Racism. v. 18, n. 1-2, 51-56, 1975. Tóth, um presbítero reformado húngaro, foi um dos seguidores de Hromádka como secretário-geral da Conferência Cristã pela Paz; Smolík, J., Recensão de Gutiérrez, Theologie der Befreiung. v. 18:1–2 (1975), 99-103. Esta recensão foi publicada também em tradução tcheca como “Teologie osvobození” na revista Křesťanská revue v. 42, n. 6, 119-121, 1975; KERN, U., Die lateinamerikanische Theologie der Befreiung in ihrem theologischem Selbstverständnis, v. 29, n. 1, 41–66, 1986; Smolík, J., Recensão de Leonardo Boff, Kirche, Charisma und Macht, v. 30, n. 3, 273-276, 1987.
    Os artigos seguintes figuraram na revista Křesťanská revue; Drapál, D. Alvesova teologie lidské naději. (A Teologia de Esperança de Alves), v. 37, n. 5-6, 140-141, 1970; CONE, J., Černá teologie. (Teologia negra), v. 42, n. 3-4, 58-62, 1978; Opočenský, M. Recensão de Alain Gheerbrant, The Rebel Church in Latin America. v. 43, n. 7, 165-166, 1976; Mar Gregorios, P. Poznámky k teologii osvobození. (Observações sobre a Teologia da Libertação), v. 46, n. 7-8, 164-168, 1979; Opočenský, M. Teologie osvobození. (Teologia da Libertação), v. 53, n. 3, 162-168, 1986 e v. 53, n. 4, 88-93, 1986.
  • 35
    Entre os que assinaram a Carta 77 foram pastores protestantes e padres e leigos católicos. Esta carta aberta, publicada pela primeira vez em 6 de janeiro de 1977, reivindicou os direitos humanos garantidos pelo Acordo de Helsinque de 1975, e marcou um momento importante no caminho da derrota do regime comunista. Seu porta-voz foi o futuro presidente Václav Havel.
  • 36
    Tenho a impressão que a realidade nunca foi tão simples assim. Nas palavras de Havel, rejeitando a mentira é possível, mas para funcionar, para sobreviver, alguma coisa foi preciso aceitar. Por exemplo, comprar comida ou bebida foi comprar do Estado, porque tudo foi do Estado, mas tem que comer e beber, tem que morar num apartamento, tem que trabalhar.
  • 37
    Em dados encontrados na página https://www.worldometers.info/world-population/population-by-country/ (18 de janeiro 2022). Segundo esta página, de 235 países, territórios e dependências no mundo, a República Tcheca ocupa o lugar 86 quanto à população e fica bem no meio (117) quanto ao tamanho. O Brasil é sexto na população e quinto no tamanho. Porém, quanto a densidade da população, a República Tcheca fica na posição 86, enquanto o Brasil está na posição 187.

Referências

  • 1
    BALÍK, S.; HANUŠ, J. Katolická církev v Československu 1945-1989 Brno: CDK, 2007.
  • 2
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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    24 Maio 2024
  • Data do Fascículo
    Jan-Apr 2024

Histórico

  • Recebido
    30 Jan 2022
  • Aceito
    19 Abr 2024
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