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Tempo e resistência: Ecléa e o método em psicologia social

Time and resistance: Ecléa and the social psychology approach

Temps et résistance : Ecléa et la méthode en psychologie sociale

Tiempo y resistencia: Ecléa y el método en psicología social

Resumo

Este ensaio tem como base os trabalhos de Ecléa Bosi, com foco especial em suas contribuições metodológicas para a concepção e condução de pesquisas envolvendo entrevistas de memória social. Trata-se de leitura com objetivo de melhor compreender suas contribuições. Percorro seus textos e procuro fazer alguns apontamentos, tentando compartilhar com o leitor aquilo que aprendi sob sua orientação. Procurei sistematizar modestamente essas lições, entendendo que são contribuições atuais e preciosas não só para a Psicologia, mas para as demais ciências humanas e sociais. Por fim, procuro ressaltar a dimensão política e a atualidade de suas contribuições, estabelecendo interlocução entre seu ponto de vista, debates contemporâneos sobre a experiência do tempo, e formas de resistências sociais ancoradas na memória e nas tradições dos oprimidos.

Palavras-chave:
memória social; Ecléa Bosi; entrevista; psicologia social

Abstract

Based on Ecléa Bosi’s oeuvre, this essay focuses on her methodological contributions for designing and carrying out research involving social memory interviews. By examining and commenting on her texts, the paper shares with the reader the lessons learned under her guidance. This systematization effort stems from the understanding that such lessons are current and significant contributions not only to Psychology, but also to other human and social sciences. Finally, the article highlights the political dimension and the timeliness of Ecléa’s contributions, establishing dialogues between her point of view, contemporary debates on the experience of time, and forms of social resistance anchored in the memory and traditions of the oppressed.

Keywords:
social memory; Ecléa Bosi; interview; social psychology

Résumé

A partir de l’oeuvre d’Ecléa Bosi, cet essai se concentre sur ses apports méthodologiques pour la conception et la réalisations de recherches impliquant des entretiens de mémoire sociale. En examinant et commentant ses textes, l’article partage avec le lecteur les leçons apprises sous sa direction. Cet effort de systématisation découle de la compréhension du fait que ces leçons constituent des contributions actuelles et significatives non seulement à la psychologie, mais aussi à d’autres sciences humaines et sociales. Enfin, l’article souligne la dimension politique et l’actualité ses contributions, établissant des dialogues entre son point de vue, les débats contemporains sur l’expérience du temps et les formes de résistance sociale ancrées dans la mémoire et les traditions des opprimés.

Mots-clés :
mémoire sociale; Ecléa Bosi; entretien; psychologie sociale

Resumen

Este ensayo se basa en el trabajo de Ecléa Bosi, con un enfoque especial en sus contribuciones metodológicas al diseño y realización de estudios que utilizan entrevistas de memoria social. Se trata de leer con el objetivo de mejor comprender sus aportes. Reviso sus textos y trato de tomar algunas notas para compartir con el lector lo que aprendí bajo su orientación. Traté de sistematizar estas lecciones, entendiendo que son contribuciones actuales e importantes no solo a la Psicología, sino a las demás Ciencias Humanas y Sociales. Finalmente, trato de enfatizar la dimensión política y la actualidad de sus aportes, estableciendo un diálogo entre su punto de vista, debates contemporáneos sobre la vivencia del tiempo y formas de resistencia social ancladas en la memoria y tradiciones de los oprimidos.

Palabras clave:
memoria social; Ecléa Bosi, entrevista, psicología social

O trabalho da memória

A utilização de entrevistas de memória em psicologia social vem de longa data. Está em voga, ativa e frequente nos dias atuais. Seus focos e públicos são diversos, mas destacam-se as pesquisas com grupos excluídos ou marginalizados. Merecem destaque na América Latina (Piper-Shafir, Droguet, & Íñiguez-Rueda, 2013Piper-Shafir, I., Droguett, R. F., & Íñiguez-Rueda, L. (2013). Psicología social de la memoria: espacios y políticas del recuerdo. Psykhe, 22(2), 1-13. doi: 10.7764/psykhe.2013.22.13
https://doi.org/10.7764/psykhe.2013.22.1...
) e no Brasil (Arns, 1985Arns, P. E. D. (Org.). (1985). Brasil: nunca mais. São Paulo, SP: Vozes.; Costa, 1980Costa, A. O. (1980). Memórias das mulheres do exílio. Rio de Janeiro, RJ: Paz e Terra.; Dória, 1978Dória, P. (1978). A guerrilha do Araguaia. São Paulo, SP: Alfa-Ômega.; Tavares, 2005Tavares, F. (2005). Memórias do esquecimento: os segredos dos porões da ditadura. Rio de Janeiro, RJ: Record.) os trabalhos que se dedicaram às memórias dos militantes, dos mortos e desaparecidos durante as ditaduras civil-militares no continente. No continente europeu, merecem menção os trabalhos de Vázquez (2001Vázquez, F. (2001). La memoria como acción social. Barcelona: Paidós, 2001.), entre outros.

No Brasil, o trabalho de Ecléa é pioneiro, tanto em seu objeto de estudo quanto em relação ao método (Bosi, 1994Bosi, E. (1994). Memória e sociedade: lembranças de velhos (3a ed.). São Paulo, SP: Companhia das Letras., 2003Bosi, E. (2003). O tempo vivo da memória: ensaios de Psicologia Social. São Paulo, SP: Ateliê Editorial.). Coloca na berlinda a memória social como foco de pesquisa e desenvolve perspectiva singular para sua compreensão.

Comecemos marcando sua compreensão sobre memória. Ecléa traz Bergson (1939/2006Bergson, H. (2006). Matéria e memória: ensaio sobre a relação do corpo com o espírito (3a ed.). São Paulo, SP: Martins Fontes. (Trabalho original publicado em 1939)). Para o autor, percepção e lembrança são dois atos que se penetram sempre, trocam algo de suas substâncias. A percepção precisa do passado, que de algum modo se conservou no sujeito.

O passado não atua sobre nós de maneira homogênea. Construímos esquemas de comportamento, que são a memória-hábito, necessária para a vida, mas via pela qual o sujeito se aprisiona em esquemas e convenções sociais. É responsável pelo nosso adestramento cultural, adquirida pelo esforço da repetição.

Mas existem outras lembranças, independentes, que frequentemente entram em conflito com a memória-hábito. Segundo Bergson, a lembrança pura traz um momento único da vida. Tem caráter evocativo, não repetitivo, assim como a matéria que tantas vezes origina o sonho e a poesia. “Pela memória, o passado não só vem à tona das águas presentes, misturado com as percepções imediatas, como também empurra, ‘descola’ estas últimas, ocupando o espaço todo da consciência” (Bosi, 2003Bosi, E. (2003). O tempo vivo da memória: ensaios de Psicologia Social. São Paulo, SP: Ateliê Editorial., p. 36).

Para Bergson, a memória pura está no reino privilegiado do espírito livre. Mas a memória relacionada ao hábito é um redutor do espírito e da vida subjetiva: vita activa versus vita contemplativa; memória-hábito versus memória pura.

Esquemas e categorizações, atitudes, estereótipos são conceitos clássicos de inspiração cognitivista, fartamente encontrados nos diversos manuais de psicologia social (Aronson, Wilson, & Akert, 2018Aronson, E., Wilson, T., & Akert, R. (2018). Psicologia Social (8a ed.). Rio de Janeiro, RJ: LTC.; Garrido, 2007Garrido, A. J. L. (2007). Psicología social (2a ed.). Madrid: McGraw Hill.; Rodrigues, Assmar, & Jablonski, 1999Rodrigues, A., Assmar, E. M. L., & Jablonski, B. (1999). Psicologia social (23a ed.). Petrópolis, RJ: Vozes .). Há um pano de fundo comum aqui, tendo em vista a presença da Psicologia da Gestalt nos trabalhos de Ecléa. A autora se orienta por fontes clássicas, autores como Sollomon Asch (1952/1977Asch, S. E. (1977). Psicologia social (4a ed.). São Paulo, SP: Editora Nacional. (Trabalho original publicado em 1952)), Kurt Koffka (1935/1975Koffka, K. (1975). Princípios de psicologia da Gestalt. São Paulo, SP: Edusp. (Trabalho original publicado em 1935)), Kurt Lewin (1945/1999Lewin, K. (1999). Problemas de dinâmica de grupo. São Paulo, SP: Cultrix. (Trabalho original publicado em 1945)), entre outros, mas segue rumos diferentes. Ecléa era gestaltista. Sua pesquisa tem caráter empírico, mas não é baseada em experimentos. A autora concebe a memória para além de um depositário de informações a ser trabalhado por esquemas de processamento.

Com Bergson, estabelecemos então uma compreensão dialética entre memória e percepção. Ambas não existem em estado puro, cabendo ao sujeito trabalhar na tensão entre as pressões e determinações do presente e suas lembranças.

A partir de Halbwachs (1968/2006Halbwachs, M. (2006). A memória coletiva. São Paulo, SP: Centauro. (Trabalho original publicado em 1968)), psicólogo social a quem Ecléa dedica sua tese, temos um contraponto. O autor sinaliza a relação entre a evocação da memória e o contexto social: como este seleciona, restringe, fortalece ou enfraquece a memória dos indivíduos.

Diferente de Bergson, para Halbwachs, a memória individual tem sua existência na medida em que é sustentada pelo grupo. Halbwachs relativiza o princípio bergsoniano de que o passado se conserva no espírito de maneira autônoma: “Se lembramos, é porque os outros, a situação presente nos faz lembrar” (citado por Bosi, 1994Bosi, E. (1994). Memória e sociedade: lembranças de velhos (3a ed.). São Paulo, SP: Companhia das Letras., p. 54).

Memória, narrativa, experiência

Walter Benjamin é referência central nos trabalhos de Ecléa. O ensaio “O narrador: considerações sobre a obra de Nikolai Leskov” (1936/1994) dispara ideias germinais para quem estuda memória e narrativa. Benjamin inicia seu texto revelando um distanciamento temporal ao leitor e certo exercício de resgate de uma faculdade que perdemos. No centro desse declínio está o ocaso geral da experiência humana, matéria-prima da narrativa.

Por mais familiar que seja seu nome, o narrador não está de fato presente entre nós, em sua atualidade viva. Ele é algo distante, e que se distancia ainda mais… Uma experiência quase cotidiana nos impõe a exigência dessa distância. É a experiência de que a arte de narrar está em vias de extinção. São cada vez mais raras as pessoas que sabem narrar devidamente. Quando se pede num grupo que alguém narre alguma coisa, o embaraço se generaliza. É como se estivéssemos privados de uma faculdade que nos parecia segura e inalienável: a faculdade de intercambiar experiências. (Benjamin, 1936/1994Benjamin, W. (1994). O narrador: considerações sobre a obra de Nikolai Leskov. In Obras Escolhidas: magia e técnica, arte e política (Vol. 1, 7a ed., pp. 197-221). São Paulo, SP: Brasiliense. (Trabalho original publicado em 1936), pp. 197-198)

Benjamin justapõe três formas discursivas: a narrativa, o romance e a informação. Tais formas relacionam-se com o avanço da burguesia e com mudanças nos modos de produção, trazendo implicações para a consciência, para nossas formas de perceber o tempo, de metabolizar as relações com o mundo físico e social.

No romance, o autor se isola dos demais, assim como seu personagem e seu leitor. Distancia-se do mundo comum para comunicar-se com algo singular, que o diferencia e opõe-se à sociedade que o cerca.

Mas o contraponto central para Benjamin (1936/1994Benjamin, W. (1994). O narrador: considerações sobre a obra de Nikolai Leskov. In Obras Escolhidas: magia e técnica, arte e política (Vol. 1, 7a ed., pp. 197-221). São Paulo, SP: Brasiliense. (Trabalho original publicado em 1936)) é entre narrativa e informação:

Com a consolidação da burguesia, destacou-se uma forma de comunicação que, por mais antigas que fossem suas origens, nunca havia influenciado definitivamente a forma épica. Agora ela exerce essa influência. Ela é tão estranha à narrativa como o romance, mas é mais ameaçadora e, de resto, provoca uma crise no próprio romance. Essa nova forma de comunicação é a informação. A informação aspira uma verificação imediata. Antes de mais nada, ela precisa ser compreensível “em si e para si”. Cada manhã recebemos notícias do todo o mundo. E, no entanto, somos pobres em história surpreendentes. A razão é que os fatos já nos chegam acompanhados de explicações. Em outras palavras: quase nada do que acontece está a serviço da narrativa, e quase tudo está a serviço da informação. Metade da arte narrativa está em evitar explicações… O extraordinário e miraculoso são narrados com a maior exatidão, mas o contexto psicológico da ação não é imposto ao leitor. Ele é livre para interpretar a história como quiser, e com isso o episódio narrado atinge uma amplitude que não existe na informação. (pp. 202-203)

A informação deve ser clara, explícita; tem valor de acordo com sua atualidade e se esgota assim que lida e atualizada por outra informação. Sua lógica e temporalidade são as da mercadoria. A narrativa é fortemente ancorada em uma experiência coletiva, tanto pregressa como presente. O narrador trabalha as lembranças e as transmite para um ouvinte interessado em preservar tal experiência, pois se reconhece nela.

Entre ouvinte e narrador, há o reconhecimento de pertença a uma comunidade, de seus tesouros partilhados no tempo. O narrador navega por esse tempo, o constrói, transitando entre diferentes períodos e volta para o presente. O ouvinte não quer que a narrativa se perca: é sua herança.

Ouvi de uma depoente que entrevistei dizer que eu era a criança que pergunta e que, sem ela, o velho não fala.

A narrativa é uma forma artesanal de relação entre o indivíduo, seu passado e seu fazer.

A narrativa, que durante tanto tempo floresceu num meio artesão, é ela própria, num certo sentido, uma forma artesanal de comunicação. Ela não está interessada em transmitir o “puro em si” da coisa narrada como uma informação ou um relatório. Ela mergulha a coisa na vida do narrador para em seguida retirá-la dele. Assim se imprime na narrativa a marca do narrador, com a mão do oleiro na argila do vaso. (Benjamin, 1936/1994Benjamin, W. (1994). O narrador: considerações sobre a obra de Nikolai Leskov. In Obras Escolhidas: magia e técnica, arte e política (Vol. 1, 7a ed., pp. 197-221). São Paulo, SP: Brasiliense. (Trabalho original publicado em 1936), p. 205)

A narrativa está fortemente enraizada na experiência popular, no trabalho e no fazer, sendo ela mesma um ofício. Como outras formas artesanais, outros trabalhos ou ofícios, tende a desaparecer no esteio da revolução industrial.

A alma, o olho e a mão estão assim inscritos no mesmo campo. Interagindo, eles definem uma prática. Essa prática deixou de nos ser familiar. O papel da mão no trabalho produtivo tornou-se mais modesto, e o lugar que ela ocupava durante a narração está agora vazio. (Pois a narração, em seu aspecto sensível, não é de modo algum o produto exclusivo da voz. Na verdadeira narração, a mão intervém decisivamente, com seus gestos, aprendidos na experiência do trabalho, que sustentam de cem maneiras o fluxo do que é dito.) A antiga coordenação da alma, do olhar e da mão, que transparece nas palavras de Valéry, é típica do artesão, e é ela que encontramos sempre, onde quer que a arte de narrar seja praticada. Podemos ir mais longe e perguntar se a relação entre o narrador e sua matéria - a vida humana - não seria ela própria uma relação artesanal. Não seria sua tarefa trabalhar a matéria-prima da experiência - a sua e a dos outros - transformando-a num produto sólido, útil e único? (Benjamin, 1936/1994Benjamin, W. (1994). O narrador: considerações sobre a obra de Nikolai Leskov. In Obras Escolhidas: magia e técnica, arte e política (Vol. 1, 7a ed., pp. 197-221). São Paulo, SP: Brasiliense. (Trabalho original publicado em 1936), p. 221)

A cadência da sociedade industrial fragmenta a memória, nos aprisiona no presente. O capitalismo potencializa essa propriedade fabril, na medida em que encurta os tempos, intensifica as informações e torna nossa relação com elas, com o mundo e com as pessoas superficiais. Corrói diretamente o que sedimentaria a memória. A arte de narrar é avessa, portanto, à fragmentação inerente ao trabalho alienado. Propiciá-la, em si, já consiste em uma forma de resistência. Tomemos de Benjamin três orientações metodológicas para a pesquisa em memória social, seguidas por Ecléa.

Primeiro, não é fácil narrar, tampouco ouvir. Muito menos hoje. Ambos, narrar e ouvir, são trabalhos. O primeiro, artesanal. O segundo, de entrega, uma espécie de contemplação respeitosa semelhante à necessária para admirar uma obra de arte. Esse trabalho supõe certa afinidade e disposição para o outro; supõe confiança pelo menos, algo que supere um encontro mecânico ou apressado entre pesquisador e participante da pesquisa.

Segundo, a narrativa estabelece um sentido para quem narra e para quem escuta. Há aqui efeitos no depoente, no pesquisador e nos leitores ou ouvintes que irão ler ou ouvir a entrevista. O ato de realizá-la e registrá-la já consiste, portanto, em intervenção psicossocial.

Terceiro, a entrevista tem uma estrutura própria e singular. É uma totalidade, mas não é homogênea. Suas lacunas, fissuras, contradições compõem sua totalidade, são elementos próprios e indispensáveis da narrativa que não devem ser tidos como falhas. São pontos importantes para as interpretações e sinalizam tensões sociais.

Memória, ideologia, resistência

O enraizamento é talvez a necessidade mais importante e mais desconhecida da alma humana e uma das mais difíceis de definir. O ser humano tem uma raiz por sua participação real, ativa e natural na existência de uma coletividade que conserva vivos certos tesouros do passado e certos pressentimentos do futuro. (Weil, 1996Weil, S. (1996). A condição operária e outros estudos sobre a opressão (2a ed.). Rio de Janeiro, RJ: Paz e Terra ., p. 411)

A narrativa traz o acontecimento vivido, a experiência. Não é mero substituto de fontes que não temos. Pode servir a esse propósito, mas não se reduz a ele. Frequentemente, uma entrevista traz ou revela informações que não estão em outros registros ou documentos. Mesmo nesses casos, a informação habitada diferencia-se de outras fontes, na medida em que expressa esse metabolismo do indivíduo em relação à história e às experiências coletivas.

Não é apenas o registro daquilo que os participantes falam que importa. Sem dúvida, dando voz aos excluídos, registramos, criamos fontes e obtemos informações que frequentemente são desprezadas ou ignoradas pela memória e historiografia oficiais. Isso já consiste em contribuição relevante. Mas o trabalho da narrativa supõe outros produtos e efeitos. Enquanto resultado, tece os fatos em uma perspectiva que envolve um sujeito em seu estilo. Traz a pertença social, a profissão, envolve o indivíduo em sua integralidade com a história e a cultura que habita.

Uma dificuldade que temos em pesquisa com entrevistas é a “falta de tempo”, expressão comum da dominação capitalista. Difícil parar para falar ou escutar, romper a cadência do presente. A pesquisa de memória instaura um intervalo, força uma parada para ouvinte e narrador. Nesse contexto, a entrevista em si é uma intervenção, espaço de elaboração e resistência.

Não raro o entrevistado agradece o pesquisador pela entrevista. Agradece a possibilidade de se recompor, encontrar a si mesmo em seu trabalho evocativo, em um ofício quase clínico no encontro entre ambos. “O sujeito se sente crescer… Psiquicamente e até somaticamente se sente rejuvenescido. ‘Lembrar faz bem ao meu coração’, disse-me um velho cardíaco’. O corpo memorativo recebe um tônico e uma força inesperada” (Bosi, 2003Bosi, E. (2003). O tempo vivo da memória: ensaios de Psicologia Social. São Paulo, SP: Ateliê Editorial., p. 44)

É comum, durante as entrevistas, que o depoente se desautorize, que desmereça sua perspectiva daquilo que viveu. Ele frequentemente busca uma “correção” de seu ponto de vista na versão aceita pelo grupo. Durante as entrevistas, por vezes, vai confirmar em um livro aquilo que procura lembrar. Em Entre a opinião e o estereótipo, Ecléa aborda tema clássico da psicologia social, articulando-o com as pressões da ideologia dominante sobre a consciência proletária: “No processo de estereotipia, os padrões correntes interceptam as informações no trajeto rumo à consciência” (Bosi, 2003Bosi, E. (2003). O tempo vivo da memória: ensaios de Psicologia Social. São Paulo, SP: Ateliê Editorial., p. 116). É frequente percebermos como o discurso dominante por vezes se sobrepõe, constrói um clichê conveniente no lugar daquilo que seria uma narrativa orientada pela experiência do sujeito.

E nada garante que a memória ou a história Oral sejam utilizadas sempre em favor dos oprimidos. Nada garante que não possam ser utilizadas para enaltecer ainda mais a perspectiva do opressor. São conhecidos os trabalhos biográficos em torno de grandes personalidades políticas, alguns deles de grande importância, mas que certamente não trazem um ponto de vista marginalizado ou excluído (Fundação Getulio Vargas, 2020Fundação Getulio Vargas. (2020). Centro de Pesquisa e Documentação de História Contemporânea da Fundação Getulio Vargas. Recuperado de https://bit.ly/3HQVMUf
https://bit.ly/3HQVMUf...
).

A memória localiza, orienta o indivíduo e seu grupo social. Ela sinaliza possibilidades para o futuro que foram suprimidas. A memória vitaliza o passado, expõe suas heranças e faz que nos posicionemos no presente a partir elas.

A memória deixa de ter um caráter de restauração e passa a ser memória geradora do futuro. É bom lembrar com Merleau-Ponty que o tempo da lembrança não é o passado, mas o futuro do passado. A nostalgia revela sua outra face: a crítica da sociedade atual e o desejo de que o presente e o futuro nos devolvam alguma coisa preciosa que foi perdida. (Bosi, 2003Bosi, E. (2003). O tempo vivo da memória: ensaios de Psicologia Social. São Paulo, SP: Ateliê Editorial., pp. 66-67)

A memória pode resistir à ideologia e ao estereótipo, compondo ou pelo menos sinalizando outros caminhos possíveis, indicando promessas do passado não realizadas e que não confirmam a versão dos vencedores. Ela repõe possibilidades não cumpridas, impedidas por relações de dominação. Afirma Gonçalves Filho (2008Gonçalves Filho, J. M. (2008). A letra viva de Ecléa Bosi. Psicologia USP, 19(1), 43-50. doi: 10.1590/S0103-65642008000100007
https://doi.org/10.1590/S0103-6564200800...
) sobre essa possibilidade de resistência em Ecléa:

Os episódios malogrados, que dão a razão dos vencidos, são os fundamentos de uma Psicologia Social do Oprimido, como certa vez o Prof. João Alexandre Barbosa caracterizou a obra de Ecléa Bosi. Compreendamos, daí, uma lição desta psicóloga dedicada à memória, uma lição em grande acordo com Walter Benjamin: a memória precisa devolver não simplesmente o passado, mas o que o passado prometia. A memória, quando devolve o que o passado vislumbrou e o presente esqueceu, vinga os vencidos! (p. 44)

Um estilo

Ecléa tem textos com enfoque metodológico (Bosi, 2003Bosi, E. (2003). O tempo vivo da memória: ensaios de Psicologia Social. São Paulo, SP: Ateliê Editorial.), mas nada parecidos com um manual. Há muitos deles (Alberti, 2004Alberti, V. (2004). Manual de história oral (3a ed.). Rio de Janeiro, RJ: FGV.; Bom-Meihy, 2004Bom-Meihy, J. C. S. (2004). Manual de história oral (4a ed.) São Paulo, SP: Loyola.; Queiroz, 1991Queiroz, M. I. P. (1991). Variações sobre a técnica de gravador no registro da informação viva. São Paulo, SP: T. A. Queiroz.; Thiolent, 1981Thiolent, M. (1981). Crítica metodológica, investigação social e enquete operária (2a ed.). São Paulo, SP: Polis.). Seus escritos mais diretamente relacionados ao método passam longe desse formato, mais sugerindo do que direcionando.

Nunca conversei com Ecléa sobre isso, mas creio haver algo proposital aqui. Seus textos deixam, à semelhança das narrativas, aberturas para o pensamento autônomo. Eles não entulham de ideias o leitor; oferecem espaços ao pensamento mais do que conduzem por trilhas inequívoca e supostamente seguras. Escrever assim não é fácil: dá trabalho deixar o espaço certo no lugar certo. São ausências pensadas. Gonçalves Filho (2008Gonçalves Filho, J. M. (2008). A letra viva de Ecléa Bosi. Psicologia USP, 19(1), 43-50. doi: 10.1590/S0103-65642008000100007
https://doi.org/10.1590/S0103-6564200800...
) sintetiza esse estilo:

Quem tenha sido aluno de Ecléa ou tenha lido o que escreveu haverá de me entender: as aulas e os textos não distribuem fatos e ideias, mas movem fatos e ideias. Os fatos assumem a figura de fatos vivos: acontecimentos. As ideias assumem a figura de ideias vivas: pensamentos. Uma autora: colhe fatos e ideias como quem os vai semeando outra vez. Vem, então, a inauguração. Cada ensaio destampa um pequeno tesouro. Há passagens em que nada ou ninguém parece interpor-se entre o fenômeno examinado e a ensaísta: vibra em modo puríssimo o estilo inconfundível da escritora: as frases curtas, condensando ou abrindo um caminho. São como estações a meio caminho. O leitor vai parar, vai naturalmente demorar, matutando o caminho feito ou o caminho sugerido. Frases pequenas, como pedaços de pão: o leitor vai ler como quem se alimenta. (pp. 43-44)

A estratégia (se podemos chamar assim) é sugerida em “Culto e enraizamento” (Bosi, 2003Bosi, E. (2003). O tempo vivo da memória: ensaios de Psicologia Social. São Paulo, SP: Ateliê Editorial.), ensaio em que Ecléa reflete criticamente sobre traduções e outras formas de divulgação de passagens da Bíblia que procuram simplificar, comentar ou esmiuçar suas mensagens, restringindo as interpretações possíveis a uma leitura unívoca. Segundo a autora, as interpretações e simplificações da Bíblia veiculadas para as classes populares limitam o caráter sintético e musical de suas passagens. Constituem também um dano estético, uma vez que fecham uma obra aberta, fonte de significações e interpretações infinitas, limitando-a a um sentido que convém à ocasião.

Grave também é o abuso da função conativa, comum e preponderante na imprensa e na propaganda. Sua intenção é direcionar o comportamento.

Na publicidade comercial, a variedade aparente esconde uma ordem: - Compre! Toda propaganda é movida por alguma imposição oculta ou aparente. Verificamos um estreitamento, uma redução em funil da missão comunicante, que pode ser cognitiva, emotiva, fática… No entanto, quantas vezes, numa mensagem destinada ao povo, encontramos apenas a função conativa, uma tutela moral! (Bosi, 2003Bosi, E. (2003). O tempo vivo da memória: ensaios de Psicologia Social. São Paulo, SP: Ateliê Editorial., p. 202)

Temos aqui pistas importantes e que tanto se aplicam à compreensão dos textos de Ecléa como estabelecem perspectiva metodológica transversal para edição, apresentação e interpretação das entrevistas. Tomemos, nesse sentido, mais do que regras e prescrições, certos cuidados, disposição e abertura que devem acompanhar o pesquisador em todas as etapas da investigação.

Roteiro e condução das entrevistas

Em seus trabalhos metodológicos, Ecléa faz recomendações. O pesquisador deve ter calma de ir a campo. Sugestão difícil diante do prazos das agências de fomento.

A confecção do roteiro dá trabalho, é instrumento que deve ser pensado. Não basta elencar temas, mas pensar também nas palavras, por mais que não leiamos o roteiro para o depoente. Ele deve ser construído com base em estudos sobre o tempo e o mundo do narrador.

Ecléa (2003) recomendava não apenas o estudo da história dos acontecimentos vividos, mas a leitura de revistas, recurso a filmes, livros da época, elementos capazes de colocar o pesquisador mais próximo do que o depoente viveu.

O roteiro não é uma camisa de forças, não supõe gabarito. Ele se ajusta, adapta-se às vicissitudes da entrevista; modifica-se. Serve mais para o pesquisador não se perder e dar motes ao entrevistado. Iscas para a memória. Podemos pegar aquilo que queremos, mas frequentemente pegamos outras coisas.

É difícil separar a parte inicial de confecção das perguntas da totalidade da pesquisa. As perguntas trazem nossas intenções e, frequentemente, enunciam interpretações finais. É no trânsito entre essas certezas iniciais e nosso desejo de abrir um efetivo espaço de construção autônoma para o sujeito que devemos confeccionar o roteiro.

Aqui se revela a mestria do pesquisador: uma pergunta traz em seu bojo a gênese da interpretação final; é uma verdade que não se pode negar. E, no entanto, a liberdade do depoimento deve ser respeitada a qualquer preço. É um problema sério de ética da pesquisa. (Bosi, 2003Bosi, E. (2003). O tempo vivo da memória: ensaios de Psicologia Social. São Paulo, SP: Ateliê Editorial., pp. 55-56)

Gonçalves Filho me ensinou a evitar perguntas opinativas ou perguntas que travem, inibam o trabalho narrativo: “o que você acha”, “como foi” são expressões que induzem opiniões; “você lembra”, “você pode me contar” sugerem que queremos ouvir uma estória. Perguntas que supõe opinião sobre temas da pesquisa devem ficar preferencialmente para o final do roteiro.

É interessante também o recurso a pessoas, espaços e acontecimentos: “Você lembra alguém em especial nesse período? Pode falar sobre ele?”; “Você pode me contar um episódio que vocês viveram?”; “Você lembra seu lugar de trabalho? Você pode me falar como era?”; “Você lembra algum episódio que te marcou nesse período? Pode me contar?”.

Feito o roteiro, seguem os primeiros contatos. Essa etapa varia, depende da escolha dos participantes, da proximidade entre eles e o pesquisador, de tempos, disponibilidades etc. Desses primeiros contatos surgem novos temas e perguntas. Adapta-se o roteiro novamente.

O primeiro encontro da entrevista tem especial importância. Complementa os contatos preliminares, dá o tom, sugere o formato, dá elementos para nova adaptação do roteiro. Não são só temas novos, mas tempos e estilos que se apresentam aqui. Ecléa recomenda nunca interromper o depoente. Supostos desvios do tema, momentos demorados em que longas falas têm curso, em geral, têm seu lugar e contexto na entrevista.

A realização das entrevistas não exige que concordemos com o interlocutor, mas supõe certa empatia, necessária para que se abandone o próprio ponto de vista. Sem percebermos, transmitimos nossa indisposição. Nossos pré-julgamentos são muitas vezes manifestos em desatenção, pressa, cansaço prematuro, uma série de pequenos sinais que o pesquisador dá sobre si e que o depoente muitas vezes percebe, ainda que de maneira intuitiva.

Entrevistei militantes sobre sua participação política, tema controverso que supõe tensas divergências. Não é necessário insistir nelas. tampouco dissimular e fingir concordância. O pesquisador deve se esforçar para ouvir, simplesmente ouvir, suspendendo ao máximo seus pré-julgamentos e opiniões. Não é tarefa fácil. O pesquisador também é, ele mesmo, vítima de estereótipos, convencionalizações, ideologia, limitações de formação.

Ao silêncio do depoente, muitas vezes, deve corresponder o silêncio e a paciência do pesquisador. Paciência necessária para o trabalho da pesquisa, difícil de exercer dada nossa ansiedade e pré-julgamentos. Difícil abandonar a si mesmo para acolher a perspectiva do outro. “O silêncio na pesquisa não é uma técnica, é como que o sacrifício do eu na entrevista que pode trazer como recompensa uma iluminação para as ciências humanas como um todo” (Bosi, 2003Bosi, E. (2003). O tempo vivo da memória: ensaios de Psicologia Social. São Paulo, SP: Ateliê Editorial., p. 65).

Ecléa pontua em diferentes ensaios a simpatia que o pesquisador precisa ter em relação ao depoente. Aproxima o vínculo de ambos à amizade, sem a qual a pesquisa seria uma espécie de impostura, de apropriação indevida do trabalho do outro para fins de titulação e publicação.

É recorrente a expressão comunidade de destino nos trabalhos da autora, de inspiração na prática radical de religiosos militantes.

Segundo Jacques Loew, é preciso que se forme uma comunidade de destino, para que se alcance a compreensão plena de uma dada condição humana. Este conceito que nós retrabalhamos para trazê-lo à Psicologia Social, já exclui, pela sua própria enunciação, as visitas ocasionais ou estágios temporários no locus da pesquisa. Significa sofrer, de maneira irreversível, sem possibilidade de retorno à antiga condição, o destino dos sujeitos observados. (Bosi, 2003Bosi, E. (2003). O tempo vivo da memória: ensaios de Psicologia Social. São Paulo, SP: Ateliê Editorial., p. 152)

Seria pedir demais tal sacrifício e disposição aos pesquisadores hoje. Em meu doutorado, utilizei a expressão e fui prontamente corrigido por Ecléa, que me sugeriu outra bem mais branda: comunidade de sentidos. Quem estuda, a partir da academia, o movimento operário, campesino, quilombola ou qualquer outro, por mais que seja engajado e comprometido com seus militantes e causas, por mais que se reconheça e identifique-se com eles, geralmente não partilha seus destinos. O que nos fica é o desafio de um reconhecimento e uma empatia autênticos, na medida em que nossas limitações e pertenças de classe nos permitam. Não subestimá-las já é um bom começo.

Transcrição, edição e apresentação das entrevistas

Diante dos prazos acadêmicos, a transcrição tem sido terceirizada: realizada por estagiários, orientandos, empresas especializadas. Fica para o pesquisador a tarefa de arrumar o texto transcrito, ajustá-lo àquilo que pretende fazer, recortar e analisar. Difícil fugir dessa tendência, mas o ideal seria que entrevistador e transcritor fossem a mesma pessoa. Mesmo com apoio tecnológico, a transcrição dá trabalho, mas propicia impregnação com o material, que é essencial para a interpretação.

A transcrição já inicia o processo de edição e mesmo de interpretação. É seu primeiro momento. E os posteriores variam de acordo com características do trabalho e do foco da pesquisa. A atenção às pausas, expressões, palavras, tempos, idas e vindas da fala varia muito nesse campo. Nos extremos estão as distorções bruscas na fala, edições quase jornalísticas das entrevistas que mantêm delas quase apenas o conteúdo; e as transcrições à risca, que procuram manter o oral quase intacto, mensurando intervalos, mantendo todas as palavras pronunciadas.

Há diversas padronizações que podem organizar o processo de transcrição das entrevistas (Manzini, 2016Manzini, E. J. (2016). Considerações sobre a transcrição de entrevistas. Recuperado de https://bit.ly/3KtdrmT
https://bit.ly/3KtdrmT...
; Marcuschi, 1986Marcushi, L. A. (1986). Análise da conversação. São Paulo, SP: Ática.). Há também autores que fazem distinção de diferentes etapas, desde o processo de transcrição à edição (Bom-Meihy, 2004Bom-Meihy, J. C. S. (2004). Manual de história oral (4a ed.) São Paulo, SP: Loyola.; Lima, 2015Lima, R. B. (2015). Estudos culturais: do planejamento à transcrição, textualização e transcriação da literatura oral. In Anais do II Congresso Internacional de História da UEPG - Unicentro: produção e circulação do Conhecimento Histórico no Século XXI. Ponta Grossa, RS: UEPG.).

Nos trabalhos de Ecléa, houve edição das entrevistas. A autora compara a narrativa à música. E há uma espécie de tom central nas entrevistas de memória, uma totalidade composta por um estilo e por uma linguagem recorrente. Isso deve ser preservado a todo custo. As correções devem atentar para não agredirem essa totalidade.

Por outro lado, por vezes o depoente repete gírias exaustivamente, interrompe expressões para melhor formulá-las ou corrigi-las. Tais idas e vindas devem ser objeto de análise, e sua exposição deve ser pensada para que não trunquem a leitura da entrevista. Temos esse cuidado, por exemplo, quando transcrevemos falas de colegas docentes em congressos e seminários acadêmicos para futuras publicações. Não há porque não tê-lo com os depoentes.

É obrigatório submeter as entrevistas depois de editadas ao crivo do depoente, conversar com ele sobre a edição. Trata-se de aspecto ético na condução da pesquisa.

O formato final das entrevistas varia de acordo com o enfoque, com os temas e características da publicação. O depoimento completo, sem segmentações, tal como Ecléa apresenta em Memória e sociedade: lembranças de velhos (1994), tem a vantagem de preservar a totalidade, trazendo a perspectiva integrada daquele depoente. Nesse formato, os temas são indissociados desse ponto de vista, e o leitor deve estabelecer nexos, vínculos com os outros depoimentos a partir dos capítulos finais.

No outro extremo, existem as tradicionais citações no corpo do texto. Organiza-se o trabalho em temas, as entrevistas são recortadas e trechos são apresentados durante os capítulos do trabalho. Há, aqui, um formato que privilegia os temas de análise e precisa estabelecer recortes a partir deles. O risco é quebrar a totalidade do depoimento. Sua compreensão fica fragmentada, subordinada aos temas abordados de investigação. Mas trata-se de um formato mais adequado a um artigo acadêmico, em que seria impossível trabalhar com depoimentos completos ou mesmo trechos muito longos. Nesses casos, Ecléa opta por citações curtas, raras ou simples menções às entrevistas.

Interpretação das entrevistas

Durante o mestrado ou doutorado, somos espremidos pelos prazos e demandas da pós-graduação. Frequentemente, as teses e dissertações começam por longos capítulos teóricos e introdutórios, sem dúvida necessários, mas que repetem aquilo que já sabemos. Preocupamo-nos também com o aspecto metodológico. Faremos análise de discurso ou conteúdo? Que teoria nos orientará?

Vamos finalmente para nosso campo, no caso, aqui, as entrevistas. Estas sim, partes originais da nossa pesquisa, objetos de nosso artesanato. Temos pouco tempo para ouvir, pensar, ruminar. E o fazemos ostensivamente acompanhados por teorias e categorias que assumimos frequentemente de forma rígida, estereotipada. Nosso olhar vem pesado, pouco disposto à alteridade, à suspensão de si necessária à escuta e à interpretação.

Sintoma dessa indisposição são os capítulos finais das teses e dissertações, que frequentemente repetem aquilo que as teorias citadas nos capítulos iniciais já afirmaram, utilizando os depoimentos colhidos como espécie confirmação ou ilustração.

Difícil classificar o que Ecléa faz entre análise de discurso ou de conteúdo. Outros se empenharam mais nessa distinção (Bardin, 2011Bardin, L. (2011). Análise de conteúdo. Lisboa: Edições 70.; Minayo, 2001Minayo, M. C. S. (Org.). (2001). Pesquisa social: teoria, método e criatividade (18a ed.). Petrópolis, RJ: Vozes .). Ecléa compreende o trabalho de interpretação principalmente a partir de um esforço gestaltista em não perder de vista a totalidade da entrevista. Insiste no perigo de segmentar e categorizar apressadamente; insiste no caráter unitário e integrado dos depoimentos.

Em todo o meu trabalho sobre memória operou como um modelo exemplar de conhecimento psicológico o pressuposto mais geral da teoria Gestáltica, aquele que enlaça estruturalmente as formas de comportamento a complexos vivos de significação. O princípio fundamental de que existem campos de sentido não só no psiquismo individual - como nos demonstram os estudos célebres de Koffka e Wertheimer sobre percepção de objetos - mas também na rede interpessoal de que são exemplo as experiências do espaço social topológico de Lewin. (Bosi, 2003Bosi, E. (2003). O tempo vivo da memória: ensaios de Psicologia Social. São Paulo, SP: Ateliê Editorial., pp. 50-51)

[A entrevista] pode ser vista como um todo antes de ser segmentada pelo analista. Porque o sujeito aspira constantemente à totalidade, à plenitude de sua pessoa e sua história, mas a sociedade absorve o indivíduo somente aquele tanto que pode ser integrado no funcionamento social. (Bosi, 2003Bosi, E. (2003). O tempo vivo da memória: ensaios de Psicologia Social. São Paulo, SP: Ateliê Editorial., pp. 63)

O todo da entrevista não é homogêneo, tem contradições. Lacunas, lapsos, esquecimentos são importantes, revelam ideologia, tensões entre grupos de pertença, versões instituídas e aquilo que o depoente viveu. O pesquisador deve navegar nessa tensão, sinalizá-la, partir delas e buscar interlocuções entre entrevistas e autores.

Os lapsos são sinais da autenticidade da memória, do trabalho do depoente. Narrativas unilineares e seguras se arriscam a deslizar no estereótipo, em discursos prontos do grupo e da classe de pertença.

As interpretações não devem exaurir as entrevistas. Devem pontuar, sinalizar, avançar em um termo suficiente para disparar no leitor percursos de pensamento ainda incompletos, mas sugeridos pelo depoente e que não o dispensem. Esse termo é difícil de alcançar, requer que pensemos nas ausências e lacunas em nosso próprio texto.

Ecléa nos ensina a atentar para os marcos de significação concentrada, pontos onde a memória se detém, onde o depoente se esforça em especial para trazer aquilo que viveu.

Um vol d’oisseau sobre a evocação biográfica nos fará ver, como numa tapeçaria, um mosaico de áreas mais ou menos densas, mais ou menos ligadas, algumas abandonadas, outras cultivadas amorosamente. E pontos privilegiados, como torres ou marcos, focos de atração na paisagem. (Bosi, 2003Bosi, E. (2003). O tempo vivo da memória: ensaios de Psicologia Social. São Paulo, SP: Ateliê Editorial., p. 62)

Em sentido inverso aos marcos densamente narrados, há regiões áridas, esvaziadas, onde o narrador omite ou passa com brevidade longos períodos de vida. São sinais de impactos sociais profundos na vida do sujeito.

Nos idosos, as hesitações, as rupturas do discurso não são vazios, podem ser trabalhos da memória. Há situações difíceis de serem contadas já que pareceram absurdas às próprias vítimas delas.

O eclipse da palavra advém da destruição:

- do espaço biográfico das vítimas;

- da própria pessoa,

- da sua memória.

Disse o soldado nazista ao prisioneiro de Auschwits: “Nenhum de vocês restará para testemunhar, e mesmo que alguém escape, o mundo não acreditará nele. (Bosi, 2003Bosi, E. (2003). O tempo vivo da memória: ensaios de Psicologia Social. São Paulo, SP: Ateliê Editorial., p. 64)

Ao analisar as entrevistas ou temas teóricos em seus textos, Ecléa nos dá outras pistas de como procurou ouvir seus depoentes e compreendê-los. Uma delas encontramos quando se refere à distração, ponderando sobre as diferenças entre memória-hábito e memória-trabalho.

Se o espírito concentrado num alvo fica tenso, o espaço profundo e cumulativo da memória se estreita como um cone cujo vértice desce e penetra no real. É a percepção imediata do que nos seria útil apreender no momento, visando ação pragmática. Distração tem sua origem em dis-tração ou desvio do eixo de tração pelo qual somos puxados. O aluno escuta a aula e anota no caderno aquilo que da matéria lhe parece proveitoso. No entanto, em certos momentos, ele esquece de anotar para não perder as palavras do professor que narram algo que desperta seu interesse. Suspende a anotação e o espírito se perde em lembranças, ideias, relações com episódios vividos. Estes salutares momentos de distração vencem o utilitarismo e alargam o conhecimento. (Bosi, 2003Bosi, E. (2003). O tempo vivo da memória: ensaios de Psicologia Social. São Paulo, SP: Ateliê Editorial., p. 40)

Outra pista que Ecléa nos dá é a relação entre música e oralidade, denotando a existência de certo continuum nas entrevistas, que deve ser considerado durante as interpretações.

Insisto nos termos narrativa e oralidade. Ambas se desenvolveram no tempo, falam no tempo e do tempo, recuperando na própria voz o fluxo circular que a memória abre do presente para o passado e deste para o presente. Eu diria que a expressão oral da memória de vida tem mais a ver com a música do que com o discurso escrito. (Bosi, 2003Bosi, E. (2003). O tempo vivo da memória: ensaios de Psicologia Social. São Paulo, SP: Ateliê Editorial., p. 45)

Conceito central em Ecléa, inspirado em Simone Weil, é a atenção. Atenção e abertura ao objeto. Afetar-se com a experiência, constituir a pesquisa também a partir de uma disposição de entrega ao fluxo narrativo dos participantes e à própria teoria. Atenção dá trabalho. Reflete Gonçalves Filho (2008Gonçalves Filho, J. M. (2008). A letra viva de Ecléa Bosi. Psicologia USP, 19(1), 43-50. doi: 10.1590/S0103-65642008000100007
https://doi.org/10.1590/S0103-6564200800...
):

A atenção é mais que percepção, é percepção sem pressa. Percepção por muitos perfis, a atenção pede deslocamentos ao redor da coisa. A atenção é trabalho, diz Alfredo Bosi: quer alcançar tanto as regularidades quanto os acidentes da matéria. E pede paciência, que é a calma de acolher e assistir o tempo de aparição dos seres todos. A atenção é delicadeza, não arromba, não invade. E torna-se um máximo de delicadeza quando é atenção para o que nas coisas ou em alguém é segredo ou mistério. A atenção é a cura das conversas. Há conversas que são a coincidência de ideias, a justificação do medo, a confirmação de preconceitos: abominam as diferenças, o espanto e o conflito. Mas há as conversas feitas de atenção e que são como uma troca de lugares: fazem trocar de lugar com o interlocutor. Fazem passar para o lugar de outrem como se fosse meu. Fazem perceber o estranho como se fosse familiar e fazem perceber o familiar como se fosse estranho. A atenção é também o elemento do silêncio. O silêncio que toma a gente nos lugares em que parecemos sentir que tudo tem alma. O silêncio que a gente divide com as pessoas muito amadas. O silêncio que dividimos com os amigos mais eleitos. O silêncio dividido também com pessoas que mal conhecemos, mas com quem acontece de cruzar olhos desarmados na cidade. A atenção é o que mais devemos aos outros humanos. Os de perto e os de longe: uma forma incomparável de respeito. Ninguém é um só: uma pessoa é mais de uma e ligada a outras pessoas, ligada a coisas e lugares, natureza e cidades. A atenção tem gosto em ser cada vez mais devolvida a um, passando por seus outros. A atenção é amizade que não depende de intimidade e pode contar em praça aberta, entre cidadãos. A atenção é como um deslocamento político: retira a gente dos espetáculos, das imagens prestigiadas, socialmente controladas e que, tão controladas, já não fazem ver mais nada. A atenção desloca para fora do poder, retira a gente dos comandos, depõe a regra dos superiores, traz para perto dos pobres, para perto dos rebaixados. Faz ver pelo ângulo dos humildes e dos humilhados. (p. 46)

Observações para esses tempos

Nosso tempo é especialista em criar ausências: do sentido de viver em sociedade, do próprio sentido da experiência da vida. Isso gera uma intolerância muito grande com relação a quem ainda é capaz de experimentar o prazer de estar vivo, de dançar, de cantar. E está cheio de pequenas constelações de gente espalhada pelo mundo que dança, canta, faz chover. O tipo de humanidade zumbi que estamos sendo convocados a integrar não tolera tanto prazer, tanta fruição de vida. Então, pregam o fim do mundo como uma possibilidade de fazer a gente desistir dos nossos próprios sonhos. E a minha provocação sobre adiar o fim do mundo é exatamente sempre poder contar mais uma história. Se pudermos fazer isso, estaremos adiando o fim. (Krenak, 2019Krenak, A. (2019). Ideias para adiar o fim do mundo. São Paulo, SP: Companhia das Letras ., p. 13)

Retomo aqui brevemente lutas do presente, apenas para indicar a centralidade e atualidade da proposta metodológica de Ecléa que aqui procurei sistematizar.

No Brasil, é forte o ataque à memória das classes pobres. A produção de esquecimento não é acidental, mas parte de um projeto de dominação. Aquilo que poderia operar como marco organizador para possíveis leituras e resistências dissonantes é suprimido ou relegado a um plano inferior. Exemplos disso não faltam e demonstram claramente a consciência das classes dominantes sobre o caráter político da memória, desde a submersão de Belo Monte no Sertão nordestino até a demolição do pavilhão 9 do presídio do Carandiru, em São Paulo.

Os movimentos sociais têm se conscientizado e procuram disputar essa hegemonia. Tem ganhado força a luta pela memória, o reconhecimento desta em seu caráter identitário e politizador, enquanto direito individual e dos povos. Vemos militantes mais sensíveis e preocupados com suas memórias (Central Única dos Trabalhadores, 2020Central Única dos Trabalhadores. (2020). Centro de documentação e memória sindical da CUT. Recuperado de https://bit.ly/
https://bit.ly/...
; Movimento dos Trabalhadores Sem-Terra, 2020Movimento dos Trabalhadores Sem-Terra. (2020). Quem somos. Recuperado de https://bit.ly/3ITMesY
https://bit.ly/3ITMesY...
; União Nacional dos Estudantes, 2020União Nacional dos Estudantes. (2020). Depoimentos. Recuperado de https://bit.ly/3vOCPiI
https://bit.ly/3vOCPiI...
).

Retomo este texto durante a pandemia, em 2020, quando nossa relação com o tempo presente e futuro foi abalada. O passado também entrou em foco. Lembro-me do ataque aos monumentos de escravistas ocorridos no Reino Unido e nos Estados Unidos, decorrente dos protestos pelo assassinato de George Floyd pela polícia (Beiguelman, 2020Beiguelman, G. (2020). Ataques a monumentos enunciam desavenças pelo direito à memória. Folha de S. Paulo. Recuperado de https://bit.ly/3MHw74j
https://bit.ly/3MHw74j...
).

Entre os que resistem, merecem destaque os povos tradicionais que, de longa data, lutam contra um ataque cruel e sistemático às suas memórias e tradições. Talvez nenhum outro povo tenha experimentado tão concretamente a experiência do etnocídio, envolvendo um conjunto amplo e sofisticado de formas de extermínio.

Em contato recente com professores indígenas (Educação Intercultural e Sociedades Indígena, 2020Educação Intercultural e Sociedades Indígenas. (2020). Homepage. Recuperado de https://bit.ly/3vKn4cH
https://bit.ly/3vKn4cH...
), pude aprender o quanto a relação com o tempo lhes é cara e diferente da que estabelecemos na cultura ocidental. O tempo está nas coisas, no presente, na natureza e no cotidiano que os cerca. Essa relação, tida como anímica por nós, é avessa à apropriação reificada do tempo e da relação com as mercadorias.

Menciono aqui contribuições do escritor indígena Daniel Munduruku, em breves passagens que condensam essa experiência diferente com o tempo nas comunidades tradicionais. Creio que a relação com o que aqui foi exposto é evidente, dispensando interpretações.

O tempo indígena é circular, não é linear. É o tempo da natureza. Temos apenas passado e presente. O tempo da memória e o tempo do agora. Precisamos ir ao passado para dar sentido ao nosso existir agora. Esse é o movimento circular indígena. O velho educa as crianças, estabelecer o equilíbrio, a circularidade em relação ao tempo. E sabemos com é importante ouvir. Todo mundo que observa, sabe que é necessário silenciar. (Munduruku, 2020Munduruku, D. (2020). Literatura, ancestralidade e autonomia da cura. Recuperado de https://bit.ly/3vKn4cH
https://bit.ly/3vKn4cH...
)

O convívio com Ecléa nos corredores do Instituto de Psicologia da USP, nas aulas e reuniões de orientação, representava por vezes uma fissura, um estranhamento de ritmo. Nos corredores, lembro um colega falando sobre uma greve de professores, salarial. Ela responde: “vocês deveriam estar lutando para que os professores da educação básica ganhassem o mesmo que vocês”. Ou uma estudante falando sobre as atividades do Centro Acadêmico, que recebe a seguinte resposta: “você sabia que na data de hoje, em 1945, lançaram a bomba sobre Hiroshima?”, e se retira, deixando a colega pensando.

Nem sempre agradava. Muita gente dizia que ela não estava na realidade, não estava com os pés no chão ou coisa do tipo. Nem todos compreendiam. Muitos estudantes não gostavam de suas aulas, talvez acostumados com contatos mais dinâmicos, recheados com projeções em Datashow e estratégias de animação à semelhança das empregadas nos cursinhos pré-vestibulares.

Para além da necessária reconstrução de narrativas sobre as lutas dos oprimidos, sejam indígenas, mulheres, proletários, quilombolas, Ecléa nos ensina outra estrutura e forma de relação com o tempo. Conheci poucas pessoas cujo trabalho era tão coerente em relação à sua prática cotidiana. Assim era seu jeito e seus textos; seu método e estilo. E não há devaneio aqui. Sua relação com o tempo é pensada, objetiva: um ato político de desalienação, de reapropriação humana do tempo e da experiência roubados pelo capital. O estilo de Ecléa é, em si, um ato político, instrumento de resistência necessário no atual contexto em que vivemos. As comunidades tradicionais que conheci teriam gostado de Ecléa. A convidariam para ouvir e contar estórias à fogueira, com seus encantados.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    01 Abr 2022
  • Data do Fascículo
    2022

Histórico

  • Recebido
    26 Fev 2021
  • Aceito
    17 Jan 2022
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