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A depressão nos DSM: de reação a transtorno, de efeito a causa

Depression in the DSMs: from reaction to disorder, from effect to cause

La dépression dans les DSMs : de réaction à trouble, d’effet à cause

La depresión en los DSMs: de reacción a trastorno, de efecto a causa

Resumo:

Este artigo busca problematizar como o discurso sobre a depressão, nas três primeiras edições do Manual diagnóstico e estatístico de transtornos mentais , efetuou a apropriação da contradição sofrimento-patologia. Para tanto, a análise foi orientada pelos princípios da análise de discurso francesa, de Michel Pêcheux, desenvolvida, no Brasil, por Eni Orlandi. O estudo salienta que: 1) as duas primeiras edições do manual apresentavam a depressão como efeito; a partir da terceira há um entendimento da depressão enquanto causa; 2) nas duas primeiras edições do manual, sofrimento e patologia são um único e mesmo objeto, já na terceira edição ocorre uma cisão entre essas esferas; 3) o mecanismo discursivo da antecipação pode contribuir para a compreensão do processo de apagamento do sujeito da enunciação pelo sujeito do enunciado nos manuais diagnósticos.

Palavras-chave:
depressão; diagnóstico; sofrimento; patologia; análise do discurso

Abstract:

This paper problematizes how the discourse on depression upheld by the first, second and third editions of the Diagnostic and Statistical Manual of Mental Disorders appropriated the distress-pathology contradiction. Based on the principles of Michel Pêcheux’s French Discourse Analysis, developed, in Brazil by Eni Orlandi, the study emphasizes that: 1) the manual’s first and second editions understood depression as an effect, whereas the third depicted it as a cause; 2) in the first and second editions distress and pathology were one and the same, but the third edition splits them into two different spheres; 3) anticipation, as a discursive mechanism, can help to comprehend the process by which the subject of enunciation is suppressed by the subject of the statement in the diagnostic manuals.

Keywords:
depression; diagnosis; distress; pathology; discourse analysis

Résumé :

Cet article problématise la façon dont le discours sur la dépression soutenu par les trois premières éditions du Manuel diagnostique et statistique des troubles mentaux s’est approprié la contradiction souffrance-pathologie. Basée sur les principes de l’analyse du discours français de Michel Pêcheux, développée au Brésil par Eni Orlandi, l’étude souligne que : 1) les deux premières éditions du manuel considèrent la dépression comme un effet, alors que la troisième la décrit comme une cause ; 2) dans les deux premières éditions, la souffrance et la pathologie sont une seule et même chose, tandis que la troisième édition sépare ces sphères ; 3) l’anticipation, en tant que mécanisme discursif, peut aider à comprendre les processus par lequel le sujet de l’énonciation est supprimé par le sujet de l’énoncé dans les manuels diagnostiques.

Mots-clés :
depression; diagnostic; souffrance; pathologie; analyse du discours

Resumen:

Este artículo busca problematizar cómo el discurso sobre la depresión, en las tres primeras ediciones del Manual Diagnóstico y Estadístico de los Trastornos Mentales , se apropió de la contradicción sufrimiento-patología. Para ello, el análisis se guio por los principios del análisis del discurso francés, de Michel Pêcheux, desarrollado por Eni Orlandi en Brasil. El estudio destaca que: 1) las dos primeras ediciones del manual presentaban la depresión como un efecto, a partir de la tercera hay una comprensión de la depresión como causa; 2) en las dos primeras ediciones del manual, el sufrimiento y la patología son un mismo objeto, por otro lado, en la tercera edición hay una escisión entre estas esferas; 3) el mecanismo discursivo de anticipación puede contribuir a la comprensión del proceso de supresión del sujeto de la enunciación por el sujeto del enunciado en los manuales diagnósticos.

Palabras clave:
depresión; diagnóstico; sufrimiento; patología; análisis del discurso

Introdução

A primeira edição do Manual diagnóstico e estatístico de transtornos mentais (DSM) foi publicada pela Associação Americana de Psiquiatria (APA), em 1952, e buscou unificar a nomenclatura utilizada para designar os transtornos mentais. Com o passar do tempo, o manual sofreu profundas transformações, passando de um modelo diagnóstico estrutural, fundamentado principalmente na psicanálise e na psiquiatria psicodinâmica, para uma nosografia de agrupamento por convenção, cujos fundamentos se estabeleceram na medicina baseada em evidências (Dunker, 2014Dunker, C. I. L. (2014). Questões entre a psicanálise e o DSM. Jornal de Psicanálise, 47(87), 79-107. ).

Nesse sentido, especialmente a partir do DSM-III, operaram-se mudanças relevantes nos objetivos, na estrutura e na fundamentação do manual, bem como nas formas como ele concebe seus usos. As últimas edições do DSM apresentam novos grupos de classificação para novas patologias, categorias entendidas como mais precisas, baseadas em estudos neurológicos, estatísticos e genéticos. Relaciona-se com isso o aumento do número de categorias do último DSM, o qual mais que triplicou em comparação à sua primeira edição, que apresentava 106 categorias.

A história dos DSM está ligada, no século XX e na contemporaneidade, à da depressão. Essa história, no entanto, não é nova. Dunker ( 2021Dunker, C. I. L. (2021). Uma biografia da depressão. São Paulo, SP: Planeta. ) aponta as primeiras aparições dos discursos sobre o que hoje chamamos de depressão: na Antiguidade, Hipócrates descrevia como melancolia ou bílis negra os sintomas de abatimento, ansiedade, sentimento de temor, medo e outros tidos hoje como depressivos. Em 36 d.C., São Athanasius descrevia os sintomas de desânimo, solidão e lentidão para trabalhar como decorrência do chamado “demônio do meio-dia”. Na Idade Média, segundo Lacerda e Del Porto ( 2019Lacerda, A. L. T., & Del Porto, J. A. (2019). Depressão ao longo da história. In J. Quevedo, A. E. Nardi & A. G. da Silva (Orgs.), Depressão: Teoria e clínica (2a ed., pp. 19-27). Porto Alegre, RS: Artmed. ), a descrição e tratamento da depressão foram objeto de disputa entre padres e médicos. Esses autores apontam também o modo como a Igreja Católica desenvolveu a noção de preguiça, aproximando-a da melancolia e a atribuindo a demônios. Desde 2014, a divisão dos transtornos depressivos no DSM-5 inclui os transtornos que têm como característica comum “a presença de humor triste, vazio ou irritável, acompanhados de alterações somáticas e cognitivas que afetam significativamente a capacidade de funcionamento do indivíduo” (APA, 2014American Psychiatric Association. (2014). Manual diagnóstico e estatístico de transtornos mentais (5a ed.). Porto Alegre, RS: Artmed. , p. 155). Disso, depreendemos que a sintomatologia da depressão descrita nos DSM constitui mais um capítulo na história das formas de sofrimento, e que a busca por entender o que ele é e de onde vem, bem como a necessidade de categorizá-lo, deve ser compreendida historicamente.

Atualmente, segundo a Organização Pan-Americana da Saúde (“Depressão…”, 2022 Depressão. (2022). Organização Pan-americana de Saúde. Recuperado de https://bit.ly/40fEU4w
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), estima-se que mais de 300 milhões de pessoas sofrem com transtornos depressivos em todo o mundo, e que menos da metade delas recebe tratamento. A depressão, conforme dados da Organização Mundial da Saúde (World Health Organization [WHO], 2017 World Health Organization. (2017). Depression and other common mental disorders: Global Health Estimates. Geneva, Switzerland: World Health Organization. Recuperado de https://bit.ly/3SkCuPW
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), se afigura como a doença mais incapacitante do mundo, e é responsável por 7,5% dos anos vividos em inaptidão. No Brasil, sua prevalência é de 5,8%, atingindo mais de 11 milhões de pessoas (WHO, 2017 World Health Organization. (2017). Depression and other common mental disorders: Global Health Estimates. Geneva, Switzerland: World Health Organization. Recuperado de https://bit.ly/3SkCuPW
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). Em uma ampla série de estudos, cujos resultados foram publicados em 2011, avaliaram-se amostras populacionais de 18 países, um deles o Brasil (Bromet et al., 2011Bromet, E., Andrade, L. H., Hwang, I., Sampson, N. A., Alonso, J., Girolamo, G., …, Kessler, R. C. (2011). Cross-national epidemiology of DSM-IV major depressive episode. BMC Medicine, 9, Artigo 90. doi: 10.1186/1741-7015-9-90
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). Dentre os dez países de alta renda estudados, a prevalência do Transtorno Depressivo Maior (TDM) durante a vida foi de 14,6% e, nos últimos 12 meses, de 5,5%. Já dentre os oito países de média e baixa renda analisados (categoria em que o Brasil foi incluído), a prevalência de TDM durante a vida foi de 11,1% e, nos últimos 12 meses, de 5,9%. No entanto, autores apontam impasses relacionados às dificuldades que as transformações nosográficas e diagnósticas dos DSM impõem às pesquisas quantitativas comparativas históricas, como a dificuldade de organizar dispositivos de análise comuns para agrupamento de categorias estabelecidas sob critérios diferentes (Cardoso, Patusco, & Magalhães, 2019Cardoso, T. A., Patusco, L. M., & Magalhães, P. V. S. (2019). Epidemiologia do transtorno depressivo maior. In J. Quevedo, A. E. Nardi & A. G. da Silva (Orgs.), Depressão: Teoria e clínica (2a ed., pp. 28-38). Porto Alegre, RS: Artmed. ).

Apesar do aparente rigor com que a depressão é tratada no discurso psiquiátrico hegemônico, essa categoria diagnóstica – cujas definições nos propomos a analisar, neste trabalho, a partir do espectro mais amplo de crítica da racionalidade diagnóstica do campo da psiquiatria – não pode ainda ser averiguada com exames laboratoriais (Kirk, Gomory, & Cohen, 2013Kirk, S. A., Gomory, T., & Cohen, D. (2013). Mad science: Psychiatric coercion, diagnosis, and drugs. New Brunswick, NJ: Transaction. ; Lacasse & Leo, 2015Lacasse, J. R., & Leo, J. (2015). Challenging the narrative of chemical imbalance: A look at the evidence. In B. Probst (Ed.), Critical thinking in clinical diagnosis and assessment (pp. 275-282). New York, NY: Springer. ). Ademais, destacamos uma extensa literatura que problematiza a utilização de categorias realistas para a compreensão da depressão e de outros transtornos mentais enquanto fenômenos puramente orgânicos (Cooper, 2005Cooper, R. (2005). Classifying madness: A philosophical examination of the diagnostic and statistical manual of mental disorders. Dordrecht, Netherlands: Springer. ; Kincaid & Sullivan, 2014Kincaid, H., & Sullivan, J. A. (2014). Classifying psychopathology: Mental kinds and natural kinds. Cambridge, MA: MIT Press. ; Zachar, 2014Zachar, P. (2014). A metaphysics of psychopathology. Cambridge, MA: MIT Press. ). A partir disso, entendemos que a depressão depende, materialmente, dos critérios e dos termos utilizados para sua definição, isto é, das suas formas de existência verbal. Logo, “envolve tanto como o sujeito ‘se fala’ quanto a forma como ele ‘é falado’” (Dunker, 2021Dunker, C. I. L. (2021). Uma biografia da depressão. São Paulo, SP: Planeta. , p. 81).

Historicamente, a depressão passou a ganhar verdadeiro destaque a partir de dois acontecimentos: 1) a síntese dos primeiros benzodiazepínicos, na década de 1950, por Leo H. Sternbach, que desencadeou a criação acidental de um elemento, o clordiazepóxido, utilizado, posteriormente, em pacientes psiquiátricos, devido aos seus efeitos ansiolíticos (Silva, 1999Silva, J. A. C. (1999). História dos benzodiazepínicos. In M. A. Bernik (Coord.), Benzodiazepínicos: Quatro décadas de experiência (pp. 15-28). São Paulo, SP: Edusp. ; Sternbach, 1979Sternbach, L. H. (1979). The benzodiazepine story. Journal of Medicinal Chemistry, 22(1), 1-7. doi: 10.1021/jm00187a001
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); e 2) a ascensão do neoliberalismo, a partir de 1970, como carro-chefe das políticas econômicas de diversos países. Dunker ( 2020Dunker, C. I. L. (2020). A hipótese depressiva. In V. Safatle, N. da Silva Jr. & C. I. L. Dunker (Orgs.), Neoliberalismo como gestão do sofrimento psíquico (pp. 177-212). Belo Horizonte, MG: Autêntica. ), através de uma análise dos fundamentos do liberalismo – entendido como matriz política, econômica e filosófica do capitalismo até os anos 1970 –, identifica uma dispersão de discursos sobre a depressão marcada por dois vetores complementares: “o sofrimento é uma parte do progresso e da prosperidade” (p. 180) e, portanto, deve ser objeto de proteção – mas apenas na medida em que não prejudique o desenvolvimento econômico. Com a ascensão do neoliberalismo, entende-se que o procedimento mais vantajoso em relação ao sofrimento seria não mais de protegê-lo ou de evitá-lo, mas sim de administrá-lo, gerir o nível de sofrimento “produzido e administrado para aumentar o desempenho” (p. 182). O autor propõe, então, a hipótese depressiva , ou seja, a ideia de que a depressão se constitui como uma forma de sofrimento egossintônica e globalizada, redefinindo nossas formas de vida e caracterizando-se como a principal modalidade de sofrimento na contemporaneidade.

Desse modo, questionamos o lugar do sofrimento na vida social, bem como as estratégias de administração (e de produção) do sofrimento que uma dada formação social institui. Há que se compreender, nesse caso, a esfera do patológico definida não apenas do ponto de vista normativo, como oposição ao normal, mas como um terreno produzido de acordo com um conjunto determinado de regras e que responde às condições de existência material dos fenômenos em questão e de sua apreensão como objetos de conhecimento (Canguilhem, 1966/ 2009Canguilhem, G. (2009). O normal e o patológico (6a ed.). Rio de Janeiro, RJ: Forense Universitária. (Trabalho original publicado em 1966) ; Costa, 2014Costa, J. F. (2014). As fronteiras disputadas entre normalidade, diferença, patologia. In R. Zorzanelli, B. Bezerra Jr. & J. F. Costa (Orgs.), A criação de diagnósticos na psiquiatria contemporânea (pp. 171-187). Rio de Janeiro, RJ: Garamond. ; Dunker, 2015Dunker, C. I. L. (2015). Mal-estar, sofrimento e sintoma: Uma psicopatologia do Brasil entre muros. São Paulo, SP: Boitempo. ). Partindo da distinção proposta por Canguilhem (1966/ 2009Canguilhem, G. (2009). O normal e o patológico (6a ed.). Rio de Janeiro, RJ: Forense Universitária. (Trabalho original publicado em 1966) ) entre anomalia e anormalidade, compreendemos que “o patológico não é a ausência de norma biológica, é uma outra norma diferente, mas comparativamente repelida pela vida” (p. 57).

Vemos, assim, que nem todo sofrimento é um sofrimento patológico. Cada sociedade, de acordo com as posições ideológicas em jogo nos processos históricos, faz distinção entre aqueles sofrimentos que devem ser normalizados, naturalizados, e aqueles que devem ser submetidos a procedimentos administrativos e clínico-terapêuticos.

Nesse sentido, sofrimentos patológicos são aqueles sujeitos a uma forma bastante singular de gestão, pois uma patologia é uma categoria que traz em seu bojo, ao mesmo tempo e de maneira indissociável, modalidades de intervenção clínica e horizontes de valores

(Safatle, 2020bSafatle, V. (2020b). Em direção a um novo modelo de crítica: As possibilidades de recuperação contemporânea do conceito de patologia social. In V. Safatle, N. Silva Jr. & C. I. L. Dunker (Orgs.), Patologias do social: Arqueologias do sofrimento psíquico (pp. 7-31). Belo Horizonte, MG: Autêntica. , p. 9).

Além disso, as patologias, necessariamente, implicam uma tradução do sofrimento em modo de partilha de identidades e podem ser compreendidas como “setores fundamentais de processos de socialização” (Safatle, 2020bSafatle, V. (2020b). Em direção a um novo modelo de crítica: As possibilidades de recuperação contemporânea do conceito de patologia social. In V. Safatle, N. Silva Jr. & C. I. L. Dunker (Orgs.), Patologias do social: Arqueologias do sofrimento psíquico (pp. 7-31). Belo Horizonte, MG: Autêntica. , p. 9). Logo, divisamos, quanto à patologia, três pontos de suporte: ela implica a inscrição social do sofrimento, constitui-se como um dispositivo de controle e de gestão e pressupõe um horizonte de valores em que se expressam “modalidades de reprodução da vida social” (Safatle, 2020bSafatle, V. (2020b). Em direção a um novo modelo de crítica: As possibilidades de recuperação contemporânea do conceito de patologia social. In V. Safatle, N. Silva Jr. & C. I. L. Dunker (Orgs.), Patologias do social: Arqueologias do sofrimento psíquico (pp. 7-31). Belo Horizonte, MG: Autêntica. , p. 9).

Em relação ao sofrimento, entretanto, a questão se configura de maneira diferente. Constituindo-se entre as categorias do mal-estar e do sintoma, o sofrimento é definido por Dunker ( 2015Dunker, C. I. L. (2015). Mal-estar, sofrimento e sintoma: Uma psicopatologia do Brasil entre muros. São Paulo, SP: Boitempo. ), sobretudo, como uma experiência narrativa. Se, por um lado, o mal-estar diz da finitude do corpo, da precariedade das relações e dos artefatos culturais (Freud, 1930/ 2020Freud, S. (2020). O mal-estar na cultura. In S. Freud, Cultura, sociedade, religião: O mal-estar na cultura e outros escritos (M. R. S. Moraes, Trad., pp. 305-410). Belo Horizonte, MG: Autêntica. (Trabalho original publicado em 1930) ) e, assim, resiste à “vagueza de sua nomeação” (Dunker, 2015Dunker, C. I. L. (2015). Mal-estar, sofrimento e sintoma: Uma psicopatologia do Brasil entre muros. São Paulo, SP: Boitempo. , p. 19), o sofrimento, por outro lado, é determinado pela sua inclusão ou exclusão em modalidades de reconhecimento e partilha no interior de um espaço comunitário, através de práticas narrativas e discursivas. Por essa inclusão (ou exclusão), o sofrimento, sua poética e seus mecanismos de reconhecimento e partilha implicam o funcionamento – e o Real – da língua.

Assim, tanto patologias quanto formas de sofrimento constituem-se discursivamente, ainda que sob diferentes condições de produção. O discurso sobre a depressão, nesse sentido, institui-se no campo dinâmico de uma contradição: a depressão enquanto sofrimento, nas diferentes formas em que ela é discursivizada, suas modalidades de circulação, produção de sentidos, e o Real de que a língua, na sua materialidade, é inseparável; e enquanto patologia, inscrita nos discursos médico-administrativos, já com suas implicações morais, culturais, econômicas e políticas.

Nessa perspectiva, Silva Jr. ( 2020Silva, N., Jr. (2020). O mal-estar no sofrimento e a necessidade de sua revisão pela psicanálise. In V. Safatle, N. Silva Jr. & C. I. L. Dunker (Orgs.), Patologias do social: Arqueologias do sofrimento psíquico (pp. 35-58). Belo Horizonte, MG: Autêntica. ) examina as transformações epistemológicas da psiquiatria no decorrer do século XX, discorrendo sobre como ela passou “a definir de antemão e criar ativamente as patologias de sua competência, organizando-as em torno de sintomas que desaparecem sob a ação de drogas com ação neuroquímica” (p. 41). Entende, diante disso, que a nova compreensão das patologias, a nova diagnóstica, não pode ser apreendida apenas pela sua “eficácia” representacional, mas pelo que ela engendra – à medida que começa a fazer parte da linguagem comum nos modos de subjetivação contemporâneos –, o apagamento do sujeito da enunciação pelo sujeito do enunciado.

Nesse sentido, interrogar o efeito de transparência dos objetos científicos (no caso em questão, do campo da psicopatologia) impõe a compreensão do caráter discursivo da constituição desses objetos. Segundo Pêcheux (1984/ 2015aPêcheux, M. (2015a). Metáfora e interdiscurso. In E. P. Orlandi (Org.), Análise de discurso: Michel Pêcheux (pp. 151-161). Campinas, SP: Pontes. (Trabalho original publicado em 1984) ), os discursos têm uma materialidade que “remete às condições verbais de existência dos objetos (científicos, estéticos, ideológicos…) em uma conjuntura histórica dada” (p. 152). A análise de discurso (AD) apresenta-se, desse modo, como uma disciplina de entremeio (Orlandi, 2009Orlandi, E. P. (2009). Análise do discurso: Princípios e procedimentos (8a ed.). Campinas, SP: Pontes. ) que possibilita a compreensão dos processos discursivos nos quais tais objetos são produzidos. Dessa forma, para a construção deste artigo, tendo em vista a heterogeneidade das contribuições no campo da AD, utilizamos a perspectiva de Michel Pêcheux sobre o discurso, bem como as contribuições de Eni Orlandi no interior dessa linha teórica.

À vista disso, buscamos problematizar como o discurso sobre a depressão nos DSM se apropriou da contradição sofrimento-patologia e interrogar os efeitos dessa apropriação na compreensão hegemônica da depressão. Discutimos, também, a hipótese de Silva Jr. ( 2020Silva, N., Jr. (2020). O mal-estar no sofrimento e a necessidade de sua revisão pela psicanálise. In V. Safatle, N. Silva Jr. & C. I. L. Dunker (Orgs.), Patologias do social: Arqueologias do sofrimento psíquico (pp. 35-58). Belo Horizonte, MG: Autêntica. ) de que as formas de nomeação do sofrimento no desenvolvimento da história recente da psiquiatria efetuaram, progressivamente, o apagamento do sujeito da enunciação pelo sujeito do enunciado, tomando tal hipótese como guia das reflexões propostas.

Analisamos, para tanto, a construção discursiva do diagnóstico da depressão nos DSM e suas transformações no desenvolvimento histórico dos manuais, a partir das paráfrases e dos deslocamentos realizados na nomeação desse transtorno ao longo das três primeiras edições. O corpus da análise foi constituído por sequências discursivas (SD) extraídas das edições em inglês dos manuais, com foco nas diferentes categorias em que os transtornos depressivos foram classificados, na forma como foram nomeados e em enunciados-chave que funcionam como descritores das categorias. Esse procedimento se justifica por nos possibilitar compreender, a partir dos movimentos pendulares de descrição e interpretação (Orlandi, 2009Orlandi, E. P. (2009). Análise do discurso: Princípios e procedimentos (8a ed.). Campinas, SP: Pontes. ), tanto os deslocamentos operados nas formas de nomeação da depressão, quanto os enunciados que as discursivizam.

Ressaltamos, ainda, que esta pesquisa foi desenvolvida como desdobramento do projeto “Sofrimento psíquico e psicopatologia: uma análise de discurso a partir do Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (DSM-5)”, o qual visa compreender o sofrimento a partir do encontro epistemológico entre a psicopatologia e a psicanálise. Para tanto, propõe análises discursivas e psicanalíticas de materialidades linguísticas, contidas nos manuais estatísticos DSM e na Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados à Saúde (CID), as quais constituem discursos em torno das problemáticas de classificação e de distinção de doenças mentais.

Perspectiva de análise: a AD nas lacunas e entremeios

A AD de linha francesa nasce com a publicação da obra Análise automática do discurso (Pêcheux, 1969/ 2014aPêcheux, M. (2014a). Análise automática do discurso. In F. Gadet & T. Hak (Orgs.), Por uma análise automática do discurso: Uma introdução à obra de Michel Pêcheux (pp. 59-158). Campinas, SP: Editora da Unicamp. (Trabalho original publicado em 1969) ), constituindo-se como uma alternativa às metodologias qualitativas de análise de objetos textuais e de pesquisa nas ciências humanas e sociais. Inicialmente inscrita no encontro entre a linguística e o materialismo histórico, a AD passou, desde então, por diversas reformulações cuja consequência foi a inclusão, cada vez maior, de reflexões sobre o sujeito da psicanálise no seu campo (Pêcheux, 1983/ 2014bPêcheux, M. (2014b). Análise de discurso: Três épocas. In F. Gadet & T. Hak (Orgs.), Por uma análise automática do discurso: Uma introdução à obra de Michel Pêcheux (pp. 307-315). Campinas, SP: Editora da Unicamp. (Trabalho original publicado em 1983) ).

Um momento crucial para esse entrelaçamento foi a publicação de Semântica e discurso (Pêcheux, 1975/ 2014cPêcheux, M. (2014c). Semântica e discurso: Uma crítica à afirmação do óbvio (5a ed.). Campinas, SP: Editora da Unicamp. (Trabalho original publicado em 1975) ), obra em que, pela articulação entre a psicanálise, o materialismo histórico e a linguística, o autor busca criticar a exploração da semântica por filosofias de base idealista e universal. Na psicanálise, interessava a ele a questão do sujeito como efeito de discurso, isto é, “como efeito da linguagem enquanto realização do simbólico” (Henry, 1977/ 2013Henry, P. (2013). A ferramenta imperfeita: Língua, sujeito e discurso (2a ed.). Campinas, SP: Editora da Unicamp. (Trabalho original publicado em 1977) , pp. 180-181).

Ao mesmo tempo, Pêcheux (1975/ 2014cPêcheux, M. (2014c). Semântica e discurso: Uma crítica à afirmação do óbvio (5a ed.). Campinas, SP: Editora da Unicamp. (Trabalho original publicado em 1975) ) buscava defender aquilo que denomina caráter material do sentido . Tal defesa se deu pelo recurso a duas teses fundamentais: a primeira delas é a de que o sentido de uma palavra, expressão ou proposição “é determinado pelas posições ideológicas que estão em jogo no processo sócio-histórico” (p. 146), ou seja, seus sentidos mudam “ segundo as posições sustentadas por aqueles que as empregam ” (pp. 146-147). Isso significa que o sentido se constitui na referência às posições ocupadas, em um contexto sócio-histórico dado, pelos interlocutores em um processo discursivo. Tal referência se dá pelas formações ideológicas (FI), isto é, pelas relações de contradição, dominação e subordinação existentes no interior de uma prática social determinada em uma dada conjuntura sócio-histórica. As formações discursivas (FD), nesse sentido, dizem respeito àquilo que “determina o que pode e deve ser dito ” (p. 147), e “representam, ‘na linguagem’, as formações ideológicas que lhes são correspondentes” (p. 147).

A segunda tese de Pêcheux (1975/ 2014cPêcheux, M. (2014c). Semântica e discurso: Uma crítica à afirmação do óbvio (5a ed.). Campinas, SP: Editora da Unicamp. (Trabalho original publicado em 1975) ) defende que “ toda formação discursiva dissimula, pela transparência do sentido que nela se constitui, sua dependência com respeito ao ‘todo complexo com dominante’ das formações discursivas ” (pp. 148-149). Esse “todo complexo com dominante das formações discursivas” é o que o autor denomina interdiscurso, a memória discursiva, aquilo que “fala sempre antes, em outro lugar e independentemente” (p. 149).

A partir dessa tese, compreendemos como Pêcheux (1975/ 2014cPêcheux, M. (2014c). Semântica e discurso: Uma crítica à afirmação do óbvio (5a ed.). Campinas, SP: Editora da Unicamp. (Trabalho original publicado em 1975) ) aborda o funcionamento da ideologia e como esta se materializa na língua. Dois “esquecimentos” fundamentais organizam e possibilitam esse funcionamento. O segundo, da ordem do sentido e da enunciação, refere-se ao fato de que, no discurso comum, o dizer sempre poderia ser outro, ou seja, o modo de dizer implica um sentido e não outro (Orlandi, 2009Orlandi, E. P. (2009). Análise do discurso: Princípios e procedimentos (8a ed.). Campinas, SP: Pontes. ). Esse esquecimento é responsável por garantir a ilusão da transparência da linguagem e por possibilitar a evidência de uma relação direta entre o pensamento, as palavras e o mundo.

Já o primeiro esquecimento, da ordem da interpelação do indivíduo em sujeito e da ideologia, diz respeito à evidência do indivíduo-sujeito, ao modo como o eu concebe a si mesmo como origem de suas palavras e de seu sentido (Orlandi, 2009Orlandi, E. P. (2009). Análise do discurso: Princípios e procedimentos (8a ed.). Campinas, SP: Pontes. ). Consequência, portanto, do processo de assujeitamento e de sua impossibilidade de reconhecimento pelo sujeito na linguagem. Simultaneamente, no entanto, é condição de possibilidade de qualquer sujeito, uma vez que, conforme Lacan (1973/ 2008Lacan, J. (2008). O seminário, livro 11: Os quatro conceitos fundamentais da psicanálise (2a ed.). Rio de Janeiro, RJ: Zahar. (Trabalho original publicado em 1973) , p. 184), “o sujeito só é sujeito por seu assujeitamento ao campo do Outro, o sujeito provém de seu assujeitamento sincrônico a esse campo do Outro”.

Conforme Orlandi ( 2009Orlandi, E. P. (2009). Análise do discurso: Princípios e procedimentos (8a ed.). Campinas, SP: Pontes. ), as condições de produção do discurso compreendem tanto as circunstâncias da enunciação quanto o contexto sócio-histórico e ideológico em que um determinado processo discursivo acontece. Este implica, além disso, toda a memória discursiva, o interdiscurso, como condição necessária de produção do sentido, “que torna possível todo dizer e que retorna sob a forma do pré-construído, o já-dito que está na base do dizível, sustentando cada tomada de palavra” (p. 31).

Trata-se, assim, de estabelecer os pontos de contato entre os espaços da historicidade e da discursividade, pensando os textos como acontecimentos discursivos cujos efeitos de sentido ligam-se à memória da língua. No entanto, se a análise permite descrever e interpretar um processo discursivo, no interior de uma prática social inscrita em uma conjuntura sócio-histórica determinada, ela também permite entrever que “todo discurso é o índice potencial de uma agitação nas filiações sócio-históricas de identificação” (Pêcheux, 1988/ 2015bPêcheux, M. (2015b). O discurso: Estrutura ou acontecimento (7a ed.). Campinas, SP: Pontes. (Trabalho original publicado em 1988) , p. 56). Isso significa que, mesmo remetendo o discurso à noção de FD, não podemos reduzir o acontecimento do discurso à repetição e, assim, perdê-lo pela sua dissimulação em uma estrutura. Essa perspectiva, ao recusar a transparência da linguagem e a evidência do sujeito, busca divisar, na produção de sentidos, o trabalho da ideologia, do imaginário e da história, sem, no entanto, deixar de considerar a falha, o deslocamento, o inconsciente e a ruptura constitutivos daquilo que falta ao sentido.

Depressão: historicidade e discursividade do DSM-I ao DSM-III

No contexto da criação do DSM-I (APA, 1952American Psychiatric Association. (1952). Diagnostic and statistical manual of mental disorders. Washington, DC: APA. ), isto é, poucos anos após a Segunda Guerra Mundial, surgiu a necessidade de estabelecer uma nosografia comum, unificadora das línguas plurais e de sua poética múltipla sobre o sofrimento e a psicopatologia. Conforme o prefácio, ele visava dar conta da poliglossia de sistemas diagnósticos, a qual bloqueava a comunicação entre profissionais e a organização de estatísticas médicas sobre as doenças mentais. Desse modo, o manual surgiu antes como uma forma de categorizar e inventariar as formas do sofrimento psíquico que de orientar a prática clínica de médicos/as, psiquiatras e psicólogos/as.

Na primeira edição do manual, a depressão foi classificada como uma reação psiconeurótica e categorizada como “Reação depressiva”, entendida como a expressão de um conflito interno causado por uma perda. Tal compreensão remete, interdiscursivamente e pela referência às suas condições de produção, a uma dupla identificação. Por um lado, a psiquiatria se mantinha ligada ao entendimento psicanalítico e psicobiológico do sofrimento psíquico. O sintagma “ambivalência de sentimentos” liga o discurso do DSM-I à psicanálise pelo funcionamento da paráfrase conflito-ambivalência, enquanto a utilização do termo “reação” filia o manual aos pressupostos da psicobiologia de Adolf Meyer 1 1 Psiquiatra suíço, Meyer (1866-1950) foi presidente da APA. . Por outro lado, aquela compreensão põe em jogo, na descrição de um processo psíquico como patológico, o tema da perda, profundamente relevante em um contexto de pós-guerra. Isso pode ser percebido no seguinte enunciado, extraído da versão em inglês do DSM-I:

SD.1: “O grau da reação nesses casos depende da intensidade do sentimento ambivalente do paciente em relação à sua perda (amor, posse), assim como das circunstâncias realistas da perda [ênfase adicionada]”

(APA, 1952American Psychiatric Association. (1952). Diagnostic and statistical manual of mental disorders. Washington, DC: APA. , pp. 33-34, tradução nossa).

Através dessas materialidades, que marcam a presença do interdiscurso no intradiscurso e a discursivização de acontecimentos históricos e políticos, o dizer denuncia sua própria historicidade, remetendo a já-ditos em outros lugares, anteriores e independentes (Pêcheux, 1975/ 2014cPêcheux, M. (2014c). Semântica e discurso: Uma crítica à afirmação do óbvio (5a ed.). Campinas, SP: Editora da Unicamp. (Trabalho original publicado em 1975) ). Além disso, vê-se, no DSM-I, uma formulação, mesmo que precária e discreta, de uma hipótese etiológica, a qual preserva, ainda, a compreensão de que fenômenos da ordem da saúde e da doença devem ser posicionados em uma relação de continuidade (Bezerra Jr., 2014Bezerra, B., Jr. (2014). A psiquiatria contemporânea e seus desafios. In R. Zorzanelli, B. Bezerra Jr. & J. F. Costa (Orgs.), A criação de diagnósticos na psiquiatria contemporânea (pp. 9-31). Rio de Janeiro, RJ: Garamond. ). Desse modo, posição subjetiva e experiência de sofrimento pertencem à mesma ordem de realidade, uma vez que a depressão é compreendida como patologia determinada pelas condições e experiências vivenciadas pelo sujeito. Isso é demonstrado pela sequência:

SD.2: “A reação é desencadeada por uma situação atual [ênfase adicionada]”

(APA, 1952American Psychiatric Association. (1952). Diagnostic and statistical manual of mental disorders. Washington, DC: APA. , p. 33, tradução nossa).

Nessa perspectiva, a noção de reação ( reaction ) é crucial para a descrição da depressão, como o foi para a organização de todo esse manual. Conforme Safatle ( 2020aSafatle, V. (2020a). A economia é a continuação da psicologia por outros meios: Sofrimento psíquico e o neoliberalismo como economia moral. In V. Safatle, N. da Silva Jr. & C. I. L. Dunker (Orgs.), Neoliberalismo como gestão do sofrimento psíquico (pp. 17-46). Belo Horizonte, MG: Autêntica. , p. 38), “o sofrimento psíquico era analisado a partir de sua estrutura relacional em relação às injunções normativas do meio”, e a relação do sujeito com um outro, com um objeto ou com uma ideia era um eixo fundamental, tanto para a categorização e organização nosográfica quanto para a compreensão dos níveis e das condições de intervenção clínica; afinal, quem “reage” é um sujeito. Preservava-se, assim, a ideia de que o sofrimento psíquico, em suas diversas formas, modalidades e expressões, podia ser visto como índice dos diferentes impasses nos processos de individuação e socialização numa conjuntura sócio-histórica determinada. Dado que o DSM-I foi produzido com finalidades estatísticas, e não clínicas, preservava-se também uma indeterminação em relação às formas de expressão do sofrimento em sintomas, visto que a descrição do diagnóstico estaciona na hipótese etiológica e na estrutura de funcionamento do paciente. Produção de um espaço, portanto, de não absorção do sujeito da enunciação pelo sujeito do enunciado.

Já no DSM-II (APA, 1968American Psychiatric Association. (1968). Diagnostic and statistical manual of mental disorders (2a ed.). Washington, DC: APA. ), a depressão estabeleceu-se sob a classificação das neuroses – denominação consoante ao viés psicanalítico presente no DSM-I –, na categoria “Neurose depressiva”. Entretanto, apesar das semelhanças que compartilhava com a primeira edição – como a definição da causa dos sintomas motivada por um conflito interno ou por uma perda identificável –, as pequenas diferenças entre ambos já indicavam o caminho que os futuros manuais viriam a seguir. O principal ponto de divergência a ser destacado é o qualificador excessivo ( excessive ) para a reação, já apresentada anteriormente:

SD.3: “Esse transtorno é manifestado por uma reação excessiva de depressão . . . [ênfase adicionada]”

(APA, 1968American Psychiatric Association. (1968). Diagnostic and statistical manual of mental disorders (2a ed.). Washington, DC: APA. , p. 40, tradução nossa).

Nesse sentido, manteve-se o entendimento da depressão como um processo reativo. Não obstante, a presença deste já não era suficiente para se falar em um fenômeno patológico sobre o qual se pudesse estabelecer um diagnóstico. Assim, aquela mesma relação de continuidade presente no DSM-I foi mantida, com o acréscimo de uma separação entre uma reação que se encontra dentro da normalidade e uma reação patológica, excessiva. Ademais, pela primeira vez, encontramos a caracterização da depressão como um transtorno ( disorder ), termo utilizado para descrever a forma patológica dessa reação.

Além disso, uma mudança marcante presente nesse manual diz respeito aos seus objetivos. Em 1968, o DSM já se concebia como uma ferramenta útil em diversas áreas da vida social: hospitais psiquiátricos e gerais, clínicas, enfermarias, centros de saúde mental e até mesmo no espaço jurídico e industrial. Saía, portanto, do terreno acadêmico e da administração, e entrava nos escritórios, consultórios, clínicas e discursos cotidianos dos espaços institucionais.

Outro aspecto que merece nota é o lugar dedicado, na descrição da neurose depressiva, ao diagnóstico diferencial. Ao passo que, no DSM-I, havia apenas uma breve menção à diferença que deveria ser estabelecida entre uma reação depressiva psiconeurótica e sua correspondente reação psicótica, no DSM-II já se vê uma tentativa de estabelecer o diagnóstico “podando” suas extremidades, suas margens, os pontos nos quais ele poderia vir a ser outro. Assim:

SD.4: “Deve ser diferenciada da Melancolia involutiva . . . e da Doença maníaco-depressiva . . . [ênfase adicionada]”

(APA, 1968American Psychiatric Association. (1968). Diagnostic and statistical manual of mental disorders (2a ed.). Washington, DC: APA. , p. 40, tradução nossa).

Em uma visão de conjunto dos DSM como práticas discursivas de nomeação, evidencia-se, na SD.4, uma das dificuldades que essas práticas impõem: o sentido não pode ser fixado a uma materialidade sem que, nesse mesmo processo, algo escape.

Conforme Authier-Revuz ( 1995Authier-Revuz, J. (1995). Ces mots qui ne vont pas de soi – Boucles réflexives et non-coincidences du dire (Vols. 1-2). Paris, France: Larousse. ), isso se dá pela não coincidência entre as palavras e as coisas, bem como entre as palavras e elas mesmas. Nessa perspectiva, a materialidade da língua e o Real que ela comporta são de ordens não coincidentes e diferentes daquilo que denominamos cotidianamente “mundo real”, ou mesmo, “sentido real”.

Pêcheux (1975/ 2014cPêcheux, M. (2014c). Semântica e discurso: Uma crítica à afirmação do óbvio (5a ed.). Campinas, SP: Editora da Unicamp. (Trabalho original publicado em 1975) ) também argumenta que o sentido das palavras não está nelas mesmas, mas na sua referência às FI, representadas pelas FD. Assim, a relação do sujeito com o sentido se dá nos processos de identificação e desidentificação com uma FD (Indurski, 2020Indurski, F. (2020). Da interpelação à falha no ritual: A trajetória teórica da noção de formação discursiva. In R. L. Baronas (Org.), Análise de discurso: Apontamentos para uma história da noção-conceito de formação discursiva (pp. 300-318). Araraquara, SP: Letraria. ). Essa relação, no entanto, é marcada pela heterogeneidade, fragmentação, diferença e contradição, que Pêcheux (1988/ 2015bPêcheux, M. (2015b). O discurso: Estrutura ou acontecimento (7a ed.). Campinas, SP: Pontes. (Trabalho original publicado em 1988) , p. 51) chama de “trabalho do sentido sobre o sentido”.

Na esteira dessa reflexão, compreendemos como as duas primeiras edições do DSM filiaram-se à FD da depressão como efeito. Essa FD, no âmbito da descrição do sofrimento psíquico, funciona a partir de um pré-construído, segundo o qual o sofrimento (no nosso caso, a depressão) emerge da relação (frequentemente conflituosa/ambivalente) do sujeito com algo que ele toma como objeto, como ideia, como outro, ou seja, de uma estrutura relacional com a vida e com o meio. Esse pré-construído retorna no intradiscurso, como exposto acima, através de expressões como “reação” ( reaction ), “perda” ( loss ), “situação atual” ( current situation ).

Entretanto, no DSM-II, podemos notar, também, o modo como elementos lexicais – como a utilização do termo “transtorno” para descrever a depressão – e, mais amplamente, elementos no nível da orientação à prática diagnóstica – como a inclusão de diagnósticos diferenciais – denunciam a irrupção de elementos de outra FD no interior desse discurso. A partir da consideração de que um texto “pode ser atravessado por várias formações discursivas que nele se organizam em função de uma dominante” (Orlandi, 2009Orlandi, E. P. (2009). Análise do discurso: Princípios e procedimentos (8a ed.). Campinas, SP: Pontes. , p. 70), podemos descrever essa articulação entre FD no interior do DSM-II dizendo que há nele dominância da FD da depressão como efeito, subordinando outras FD ao seu domínio de sentido. Logo, o discurso sobre o sofrimento psíquico e, mais especificamente, sobre a depressão, aparece como um espaço em disputa.

Em 1980, o DSM chegava à sua terceira edição, apresentando 265 categorias diagnósticas. Afastando-se de seus antecedentes, esse manual passou por significativas alterações no que diz respeito à sua formulação, fundamentação e concepção de utilização. Enquanto as descrições acerca da reação depressiva e da neurose depressiva não ocupavam mais de meia página, a categoria diagnóstica do “Episódio depressivo maior”, no DSM-III (APA, 1980American Psychiatric Association. (1980). Diagnostic and statistical manual of mental disorders (3a ed.). Washington, DC: APA. ), contou com cinco páginas de texto. A fundamentação psicanalítica antes vigente foi abandonada para a adoção da racionalidade e dos critérios da medicina baseada em evidências (Dunker, 2014Dunker, C. I. L. (2014). Questões entre a psicanálise e o DSM. Jornal de Psicanálise, 47(87), 79-107. ). Tal mudança de terreno teórico implicou uma redefinição das categorias, bem como dos métodos e modalidades de aplicação do diagnóstico nas práticas clínicas e/ou não clínicas.

Localizada na classificação de “Transtornos afetivos”, a descrição do episódio depressivo maior passou a ser estabelecida a partir de uma série de sintomas explícitos, objetivos e que se propunham quantificáveis. Tal modelo difere radicalmente das primeiras edições do manual e insere a depressão em outros processos de significação:

SD.5: “Esses sintomas incluem alteração de apetite, mudança de peso, perturbação de sono, agitação ou retardo psicomotor, diminuição de energia, sentimentos de inutilidade ou culpa, dificuldade de concentração ou raciocínio, e pensamentos sobre morte ou suicídio, ou tentativas de suicídio”

(APA, 1980American Psychiatric Association. (1980). Diagnostic and statistical manual of mental disorders (3a ed.). Washington, DC: APA. , p. 210, tradução nossa).

Nesse sentido, podemos destacar como o tema da perda – que na primeira e segunda edições do DSM era relacionado à perda de algo ou alguém –, a partir do DSM-III, passa a ser significado de forma diferente. Não se trata mais da perda de alguém ou de um objeto estimado (como consta na SD.1), mas da perda de interesse do sujeito em relação às atividades que costumava realizar:

SD.6: “A característica essencial é ou um humor disfórico, frequentemente depressão, ou perda de interesse ou prazer em todas, ou quase todas, as atividades e passatempos habituais [ênfase adicionada]”

(APA, 1980American Psychiatric Association. (1980). Diagnostic and statistical manual of mental disorders (3a ed.). Washington, DC: APA. , p. 210, tradução nossa).

Outro ponto de divergência explicitado no DSM-III é a preocupação com possíveis expressões e enunciados que o/a paciente poderia utilizar para falar sobre os seus sintomas, evidenciando seu compromisso cada vez maior com o espaço da prática clínica:

SD.7: “Um indivíduo com síndrome depressiva vai, geralmente, descrever seu humor como deprimido, triste, desesperançoso, desencorajado, para baixo, ou em termos de outra variante coloquial . Algumas vezes, entretanto, a alteração do humor talvez não seja expressa como um sinônimo de humor depressivo, mas como uma reclamação de ‘não se importar mais’ , ou como uma dolorosa incapacidade de experienciar prazer [ênfase adicionada]”

(APA, 1980American Psychiatric Association. (1980). Diagnostic and statistical manual of mental disorders (3a ed.). Washington, DC: APA. , p. 210, tradução nossa).

Assim, percebemos como o DSM-III, na SD.7, faz uso de um mecanismo discursivo que Pêcheux (1969/ 2014aPêcheux, M. (2014a). Análise automática do discurso. In F. Gadet & T. Hak (Orgs.), Por uma análise automática do discurso: Uma introdução à obra de Michel Pêcheux (pp. 59-158). Campinas, SP: Editora da Unicamp. (Trabalho original publicado em 1969) ) denomina antecipação . Para ele, esse mecanismo

implica que o orador experimente de certa maneira o lugar de ouvinte a partir de seu próprio lugar de orador: sua habilidade de imaginar, de preceder o ouvinte é, às vezes, decisiva se ele sabe prever, em tempo hábil, onde este ouvinte o “espera” (p. 77).

Na SD.7, a apropriação do discurso cotidiano realizada pelo DSM-III define, por antecipação, a significação que determinados enunciados devem assumir nas condições em que a prática diagnóstica se estabelece. Esse é um dos mecanismos discursivos através dos quais se dá o processo de apagamento do sujeito da enunciação pelo sujeito do enunciado no DSM-III, uma vez que este tenta absorver o acontecimento discursivo, a enunciação, as práticas narrativas sobre o sofrimento do sujeito em uma estrutura de enunciados previamente significados, atribuindo, de antemão, sentido aos dizeres cotidianos em termos de sintomas, e/ou de não sintomas, da depressão.

Isso vem acompanhado de uma forma muito diferente de significar a depressão. Enquanto os DSM I e II (SD.2 e SD.3) se referiam a ela como uma reação do paciente a um acontecimento, como um sofrimento que se dá de forma secundária, um efeito (e, nesse caso, patologia e sofrimento são um único e mesmo objeto de conhecimento), no DSM-III, vemos, pela utilização da preposição “com” ( with ) e do termo “síndrome” ( syndrome ), que a depressão já é um fenômeno primário, uma causa de sofrimento. Cisão, portanto, das esferas do sofrimento, enquanto narrativa, e da patologia, enquanto apropriação científica do páthos como objeto de conhecimento, e estabelecimento da dominância da FD da depressão como causa.

Do mesmo modo, o transtorno e sua expressão passam a ser fenômenos diferentes, o que se coaduna com os pressupostos pragmatistas que permeiam o DSM-III, os quais implicaram o abandono quase completo da noção de doença mental, bem como o privilégio de descrições sindrômicas convergentes agrupadas por convenção em detrimento de qualquer reflexão etiológica (Dunker, 2014Dunker, C. I. L. (2014). Questões entre a psicanálise e o DSM. Jornal de Psicanálise, 47(87), 79-107. ; Safatle, 2020aSafatle, V. (2020a). A economia é a continuação da psicologia por outros meios: Sofrimento psíquico e o neoliberalismo como economia moral. In V. Safatle, N. da Silva Jr. & C. I. L. Dunker (Orgs.), Neoliberalismo como gestão do sofrimento psíquico (pp. 17-46). Belo Horizonte, MG: Autêntica. ).

No entanto, em relação a esse abandono, duas questões se mantêm em aberto: por que os efeitos da descoberta dos primeiros neurolépticos e antidepressivos (que data dos anos 1950) demoraram a influenciar o espaço de configuração e descrição das categorias diagnósticas? E por que se fez necessário que o saber psiquiátrico se reestruturasse, visando a uma fundamentação nas ciências biológicas? De acordo com Safatle ( 2020aSafatle, V. (2020a). A economia é a continuação da psicologia por outros meios: Sofrimento psíquico e o neoliberalismo como economia moral. In V. Safatle, N. da Silva Jr. & C. I. L. Dunker (Orgs.), Neoliberalismo como gestão do sofrimento psíquico (pp. 17-46). Belo Horizonte, MG: Autêntica. ), dois processos históricos que compuseram as condições de produção do DSM-III podem contribuir para explicar, ao mesmo tempo, essas indagações: a efervescência, entre os anos 1950 e 1970, de questionamentos do estatuto do saber psiquiátrico (sejam eles provenientes da antipsiquiatria, da análise institucional ou dos movimentos de reforma manicomial); e a prevalência da psicanálise, até o início dos anos 1980, como “horizonte de referência clínica, inclusive para a psiquiatria” (p. 38).

Nessa perspectiva, compreendemos que a FD da depressão como efeito se vincula aos pressupostos das FI associadas tanto à psicanálise quanto à psicobiologia, no que concerne aos modos de caracterizar a depressão. Do mesmo modo, a FD da depressão como causa remete aos pressupostos das FI biomédica e farmacêutica, as quais, em relação aos DSM, produziram, pelo estabelecimento de sua dominância em relação às demais FI, a reestruturação do saber psiquiátrico, postulando novos critérios de classificação e novos horizontes clínico-terapêuticos.

Tal reestruturação e seu horizonte implicaram os fenômenos descritos neste estudo: 1) uma transformação na forma hegemônica de compreender a depressão; 2) uma mudança na forma de apropriação da contradição sofrimento-patologia nos DSM; e 3) o processo de apagamento do sujeito da enunciação pelo sujeito do enunciado, conforme hipótese apresentada por Silva Jr. ( 2020Silva, N., Jr. (2020). O mal-estar no sofrimento e a necessidade de sua revisão pela psicanálise. In V. Safatle, N. Silva Jr. & C. I. L. Dunker (Orgs.), Patologias do social: Arqueologias do sofrimento psíquico (pp. 35-58). Belo Horizonte, MG: Autêntica. ).

Assim, a compreensão dominante da depressão nos DSM I e II postulava que o sofrimento deveria ser considerado a partir das relações estabelecidas pelo sujeito com os outros, com o meio e com eventos de sua vida, consequência da identificação desses manuais com o domínio de sentido da FD da depressão como efeito. Então, a partir do DSM-III, e graças à cisão entre as esferas do sofrimento e da patologia, a depressão passou a ser entendida como causa de sofrimento (fenômeno igualmente possibilitado pela filiação desse manual ao domínio de sentido da FD da depressão como causa), o que suscitou uma transformação radical nos modos de diagnosticá-la e categorizá-la. Compreendemos, além disso, que o apagamento do sujeito da enunciação pelo sujeito do enunciado, no desenvolvimento histórico da descrição da depressão nos DSM, é engendrado pelo mecanismo discursivo da antecipação, o qual possibilita o estabelecimento de significações prévias aos acontecimentos discursivos que se apresentam tanto em contextos clínicos quanto não clínicos.

Considerações finais

O propósito desta pesquisa foi problematizar, a partir da perspectiva da AD, como o discurso sobre a depressão nos DSM efetuou a apropriação da contradição sofrimento-patologia, bem como interrogar os efeitos dessa apropriação na compreensão hegemônica da depressão. O recorte que compôs o corpus analisado compreendeu os manuais DSM-I, DSM-II e DSM-III, justamente porque abarcam a grande modificação nominativa do fenômeno da depressão, que passou de uma reação – efeito de uma complexidade subjetiva na qual o sujeito está inserido, como fruto de um contexto sócio-histórico e político definido –, para se configurar como transtorno, causa de si mesmo. Os DSM IV e V mantêm, até os dias atuais, essa modificação na forma de nomear a depressão.

Como se trata de manuais diagnósticos com pretensões universais, a nomeação do fenômeno da depressão não é simplesmente a descrição de algo que existe no mundo, mas a criação de um evento. A depressão como um transtorno, que acontece como causa de si mesmo, passa a existir a partir da sua nomeação no DSM-III. Desse modo, insistimos, com Dunker ( 2015Dunker, C. I. L. (2015). Mal-estar, sofrimento e sintoma: Uma psicopatologia do Brasil entre muros. São Paulo, SP: Boitempo. , 2021), que as formas de sofrimento dependem dos modos como o sujeito “se fala” e como ele “é falado”, bem como das formas de reconhecimento e partilha no interior de práticas sociais historicamente determinadas.

Michel Pêcheux retoma a frase de Jacques Lacan (1973/ 2008Lacan, J. (2008). O seminário, livro 11: Os quatro conceitos fundamentais da psicanálise (2a ed.). Rio de Janeiro, RJ: Zahar. (Trabalho original publicado em 1973) , p. 29), “só existe causa para o que manca”, em seu artigo “Só há causa daquilo que falha ou o inverno político francês” (Pêcheux, 1979/ 2014dPêcheux, M. (2014d). Só há causa daquilo que falha ou o inverno político francês: Início de uma retificação. In M. Pêcheux, Semântica e discurso: Uma crítica à afirmação do óbvio (pp. 269-281). Campinas, SP: Editora da Unicamp. (Trabalho original publicado em 1979) ), salientando a impossibilidade lógica da ocorrência de uma causa qualquer, destacada da estrutura da língua. A causa é sempre a desestabilização de uma estrutura sedimentada. Nada em matéria de subjetividade vem do nada. Este é o grande equívoco ético, segundo Nietzsche (1888/ 2017Nietzsche, F. W. (2017). Crepúsculo dos ídolos ou Como se filosofa com o martelo. São Paulo, SP: Companhia de Bolso. (Trabalho original publicado em 1888) ), tomar o efeito como causa. Esta é a maneira pela qual os discursos passam a ser dominantes uns sobre os outros, apagando tudo que os antecede e se colocando como conhecedores da causa.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    28 Jun 2024
  • Data do Fascículo
    2024

Histórico

  • Recebido
    24 Mar 2023
  • Aceito
    11 Maio 2023
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