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Determinação de nitrato e nitrito em chás de peles de pescados empregados para tratamento de asma brônquica na região sul do Rio Grande do Sul

Nitrate and nitrite determination in fish skin teas employed for asthma treatment in the southern region of Rio Grande do Sul

Resumo

The objective of this paper was to determine nitrate and nitrite anions in toasted fish skin tea, which the population of southern Rio Grande do Sul believes to have pharmacological properties for trating asthma. Two methods were compared, an official and one described by Guozhen et al., that has the advantage of not needing reduction of nitrate to nitrite on a Cd column. The samples were the skin of the fish species Balistes capriscus (peixe porco) and Menticirrhus littoralis (papa-terra), both crude and toasted, as traditionally used. The method of Guozhen et al. was used due to its performance (detection limit 0.005 µmol/L NO3- and 0.02 µmol/L - NO2- and mean recuperation of 100 and 97% respectively for each anion) and results similar to those of the official methods under conditions used by the population, the estimated daily intake, of the teas is equivalent to 0.03 to 0.05 mg of nitrate and 0.007 to 0.014 mg of nitrite. These values are in accord with safety recommendations and don't represent a health risk.

nitrate; nitrite; fish skin


nitrate; nitrite; fish skin

ARTIGO

Determinação de nitrato e nitrito em chás de peles de pescados empregados para tratamento de asma brônquica na região sul do Rio Grande do Sul

Nitrate and nitrite determination in fish skin teas employed for asthma treatment in the southern region of Rio Grande do Sul

Ademir Larrea Bastos; Ana Luiza Muccilo Baisch; Leonor Almeida de Souza Soares; Janaína Fernandes de Medeiros Burkert; Eliana Badiale Furlong* * e-mail: dqmebf@furg.br

Fundação Universidade Federal do Rio Grande, CP 474, 96201-900 Rio Grande - RS, Brasil

ABSTRACT

The objective of this paper was to determine nitrate and nitrite anions in toasted fish skin tea, which the population of southern Rio Grande do Sul believes to have pharmacological properties for trating asthma. Two methods were compared, an official and one described by Guozhen et al., that has the advantage of not needing reduction of nitrate to nitrite on a Cd column. The samples were the skin of the fish species Balistes capriscus (peixe porco) and Menticirrhus littoralis (papa-terra), both crude and toasted, as traditionally used. The method of Guozhen et al. was used due to its performance (detection limit 0.005 µmol/L NO3- and 0.02 µmol/L - NO2- and mean recuperation of 100 and 97% respectively for each anion) and results similar to those of the official methods under conditions used by the population, the estimated daily intake, of the teas is equivalent to 0.03 to 0.05 mg of nitrate and 0.007 to 0.014 mg of nitrite. These values are in accord with safety recommendations and don't represent a health risk.

Keywords: nitrate; nitrite; fish skin.

INTRODUÇÃO

Na região sul do Rio Grande do Sul segundo dados fornecidos pelo CEPERG/RS1 (de 1999 a 2001), as espécies Balistes capriscus (peixe porco) e Menticirrhus littoralis (papa-terra) são pouco valorizadas industrialmente, sendo utilizadas para fabricação de subprodutos, como farinha e silagem.

A utilização de chás preparados com peles torradas de peixe porco e papa-terra pela população da região sul do Rio Grande do Sul, para tratamento de asma brônquica, chamou a atenção de pesquisadores da Fundação Universidade Federal do Rio Grande, no sentido de buscar uma forma de conferir caráter científico a um conhecimento popular. Foram desenvolvidos vários experimentos biológicos indicando que o efeito vasodilatador pode estar associado à presença de nitrato/nitrito nos chás das peles de pescado2. Cavalli2 demonstrou experimentalmente o efeito sobre a asma brônquica submetendo cobaias acometidas de crise asmática ao extrato de pele torrada de peixe porco, que reverteu o quadro pela simples aspiração do vapor. A partir desta constatação iniciou-se a busca por um procedimento analítico que pudesse quantificar a presença destes ânions com segurança, que fosse rápido, acessível e gerasse o mínimo de resíduos tóxicos ao final das determinações.

Diferentes autores atribuem a reversão do quadro de broncoconstrição ao óxido nítrico (NO), pois este estimula a enzima guanilato ciclase que eleva os níveis de GMPc, causando relaxamento da musculatura vascular lisa ou ativando canais de K+ dependentes de Ca++, o que leva a uma hiperpolarização das células da musculatura lisa independente dos níveis de GMPc2-5.

O NO, em humanos, pode ser sintetizado a partir de alguns mecanismos envolvendo reações enzimáticas. Outra forma de sintetizá-lo é através dos íons nitrato e nitrito administrados como medicação ou pela dieta. No caso de via oral, pela ação de bactérias na boca ou pela ação de enzimas digestivas, o nitrato pode ser rapidamente convertido a nitrito, que é reativo sob condições ácidas no estômago, podendo formar óxido nítrico2-5. Além desta possibilidade, o nitrito pode reagir com uma variedade de compostos orgânicos, especialmente aminoácidos, e formar substâncias cancerígenas, como as nitrosaminas6,7.

Grande número de metodologias analíticas têm sido propostas para determinação de íons nitrato e nitrito, incluindo a associação de procedimentos cromatográficos, espectrofotométricos e potenciométricos8-10. Os métodos espectrofotométricos são freqüentemente empregados, pelos baixos limites de detecção, pela rapidez, simplicidade e versatilidade de reagentes cromogênicos8,11.

Dentre os procedimentos mais conhecidos destaca-se o de Griess, desenvolvido em 1879, uma técnica simples e que se tornou oficial para quantificação de nitratos e nitritos, sob a forma do íon nitrito, após reação com sulfanilamida e etilenodiamina. A principal desvantagem é a necessidade de se empregar colunas de cádmio envelopado em cobre para redução do nitrato e uma solução de cloreto de cádmio para extração dos íons de amostras sólidas. A coluna de redução precisa ser regenerada após a passagem de algumas amostras e desta regeneração resultam resíduos que precisam ser descartados, bem como o próprio amalgama depois de um período de uso8,9,12.

Outro método espectofotométrico foi padronizado por Guozhen et al.11 para ser empregado em laboratórios com infraestrutra simples, pois possui as vantagens de não requerer emprego de colunas redutoras e de ser sensível a quantidades traço dos íons nitrato e nitrito, com um erro máximo de 5% na determinação, causado pela presença de outros íons interferentes. A tendência atual é disponibilizar procedimentos acessíveis e que gerem menos resíduos tóxicos para descarte. Outro aspecto considerado neste trabalho foi disponibilizar uma metodologia confiável, dentro deste cuidado com o tipo de resíduo produzido durante a determinação, e que permitisse avaliar os riscos de contaminação crônica que a população possa estar sendo submetida por suas próprias crenças.

Estes fatos nortearam o presente trabalho, que visou determinar íons nitrato e nitrito presentes em chás de peles torradas de Balistes capriscus e Menthicirrus litorallis, para estimar os riscos de contaminação pelo consumo destes no tratamento de asma brônquica. Para isto comparam-se duas metodologias, a oficial e outra descrita por Gouzhen et al.11.

PARTE EXPERIMENTAL

Equipamentos

Foram utilizados balança Analítica Gilbertini (0,0000 a 200,0000 g), espectrofotômetro UV/Vis, Varian, modelo Cary 100 e estufa com circulação de ar, marca Quimis.

Reagentes e soluções

Empregou-se solução extratora 1 (AOAC14): 50 g de CdCl2, 50 g de BaCl2 e 1 mL de HCl 18 M; solução extratora 2: 2,5 g de (NH4)2SO4 com ajuste de pH para 8,5 com solução de amônia diluída (30 %) completando o volume para 1 L com água; solução tampão de cloreto de amônio pH 9,6:5 g de NH4Cl em 50 mL de água, ajustando o pH com NH4OH concentrado, elevando o volume para 100 mL com água; solução estoque de nitrito de potássio 5000 µM; solução estoque de nitrato de potássio 4600 µM; solução de sulfanilamida (R1): 50 mL de HCl concentrado diluído em 300 mL de água, acrescidos 5 g do reagente sulfanilamida para volume de 500 mL; solução de dicloroidrato de etilenodiamina (R2): 0,5 g de dicloroidrato detilenodiamina dissolvidos em 500 mL de água; solução de r-nitroanilina 10 mM em ácido clorídrico 2 M; solução de a-naftilamina 10 mM em ácido clorídrico 1 M; solução de resorcinol 2% (m/v) e solução 0,05 M de brometo de cetiltrimetilamônio (CTMAB).

As soluções cromogênicas foram preparadas no máximo 24 h antes do uso.

Os sais para preparação das soluções estoque de nitrato e nitrito foram da Merck, o ácido clorídrico e os demais sais e reagentes cromogênicos foram da Synth.

Coleta e preparo das amostras

As amostras da espécie Balistes capriscus (peixe porco) foram coletadas em uma indústria pesqueira, nos meses de julho e agosto de 2003, e as amostras de Menticirrhus litoralis (papa-terra), no entreposto pesqueiro da cidade, no mesmo período. Os espécimes amostrados foram indivíduos adultos, sem distinção de sexo.

Os espécimes de papa-terra foram escamados e fileteados separando a pele do músculo. As peles foram homogeneizadas utilizando moedor manual de rosca sem fim. As amostras de peixe porco tiveram a pele separada do músculo, porém a maneira como as escamas aderem à pele não permitiram a perfeita escamação. Para homogeneizá-las foi empregado um moedor elétrico para romper a resistência ao corte. As porções homogeneizadas foram armazenadas sob congelamento (-18 °C) até o momento das determinações analíticas.

Uma parte das peles homogeneizadas dos dois pescados foi separada para ser tratada de forma similar ao procedimento popular de preparo dos chás para tratamento de asma brônquica. Isto consistiu em secá-las em estufa a temperaturas de 130 ou 160 °C por 30 ou 60 min para cada temperatura, macerando-as posteriormente com auxílio de graal e pistilo.

Preparo das amostras analíticas

A 5 g de cada amostra foram adicionados 100 mL da solução extratora 1 e 100 mL de água, agitando-as durante 1 h com agitador magnético à 30 ºC. Em seguida, foram adicionados à mistura 20 mL de NaOH 2,5 M, diluindo com água até 250 mL e filtrando posteriormente. Foram colocados 10 mL do tampão cloreto de amônio pH 9,6 em um balão volumétrico de 100 mL diluindo com a solução de amostra filtrada. O mesmo procedimento foi empregado com a solução extratora 2.

As peles secas (5 g) nas duas temperaturas foram homogeneizadas e submetidas a refluxo por 30 ou 60 min com 100 mL de água.

Metodologia oficial para determinação de nitrato e nitrito

Rendimento das colunas redutoras de cádmio

Para determinação do rendimento da etapa de redução do nitrato a nitrito, colunas plásticas de 15 cm de comprimento e 1 cm de d.i. foram preenchidas por amálgama, constituído por grãos de cádmio tratados com solução cúprica (cádmio envelopado com cobre).

Foram transferidos 100 mL de padrões de 10 µM de NO3-, 10 µM de NO2- e água (branco) para provetas acrescidos de 2 mL de NH4Cl (25%). De cada uma das soluções foram eluídos 70 mL pelas colunas de cádmio que foram descartados. Os 30 mL restantes também foram eluídos pelas colunas. Dos eluatos foram retiradas alíquotas de 5 mL as quais foram adicionadas de 100 µL da solução de sulfanilamida (R1) e 100 µL da solução de N-naftil etilenodiamina (R2) sob agitação. Após 10 min foram realizadas as leituras das transmitâncias das misturas a 543 nm.

Do padrão de 10 µM de NO2- preparado foi retirado uma alíquota de 5 mL, sem passar pela coluna (padrão de referência), sendo a transmitância determinada em 543 nm empregando-se cubetas de 1 e 5 cm, respectivamente, para nitrato e nitrito.

Curvas padrão para nitrato e nitrito

Foi preparada uma solução trabalho (ST) de nitrito de potássio 250 µM. Desta foram retiradas alíquotas para o preparo dos padrões, cujas concentrações variavam entre 0,25 e 2,5 µM. As soluções padrões de nitrato de potássio (0,25 a 15 µM) foram preparadas e previamente eluídas pelas colunas redutoras, conforme o procedimento descrito para o teste de recuperação. Nas alíquotas dos padrões foram adicionados 1 mL dos reativos R1 e R2, sendo as transmitâncias determinadas após 10 min a 543 nm em cubetas de 1 e 5 cm, respectivamente.

Redução de nitrato a nitrito

Para redução do nitrato a nitrito as soluções de amostras e padrão foram passadas pelas colunas de cádmio com rendimento previamente determinado para este experimento.

Determinação de nitrito em amostras analíticas

Foram tomados 5 mL dos extratos das amostras 100 µL da solução R1, 100 µL da solução R2 e a mistura foi agitada em banho ultrassônico. As transmitâncias das soluções foram determinadas após 10 min a 543 nm.

Determinação de nitrato em amostras analíticas

Foram tomados 15 mL dos extratos das amostras e 200 µL de NH4Cl (25% m/v) e colocados em provetas. Estas misturas foram passadas pelas colunas redutoras, sendo os primeiros 7 mL descartados. Para determinação dos íons na solução eluída restante foram tomados 5 mL. A estes foram adicionados 100 µL da solução R1 e 100 µL da solução R2. As transmitâncias foram determinadas após 10 min a 543 nm.

Método em estudo: Determinação de microquantidades de nitrato e nitrito 2

Curva padrão para nitrato

Foi preparada uma solução padrão de nitrato de potássio contendo 148 µg mL-1 NO3- (0,2415 g L-1 de nitrato de sódio, previamente seco em estufa à 100 °C). Foram retiradas alíquotas de 50, 80, 100, 150, 180, 200, 260, 280 e 300 µL para balões volumétricos de 25 mL (soluções padrão). Foram adicionados 0,5 mL de ácido clorídrico 2 M, 0,6 mL de resorcinol e 6,5 mL de ácido sulfúrico concentrado. Após 30 min, os volumes nos balões foram completados com água e as transmitâncias das soluções foram determinadas a 505 nm.

Curva padrão para nitrito

Foi preparada uma solução padrão de nitrito de potássio contendo 666 µg NO2-/L (1 g L-1 de nitrito de potássio previamente seco durante 1 h em estufa à 100 °C). Foram retiradas alíquotas para preparo dos padrões de 15, 30, 45, 60, 75, 95 µL para balões volumétricos de 50 mL. Foram adicionados 1 mL de hidróxido de sódio 2M; 6 mL de r-nitroanilina, após 15 min 4 mL de a-naftilamina e após 5 min 10 mL de CTMAB. Os volumes nos balões foram completados com água, agitados e as transmitâncias medidas a 530 nm.

Determinação de nitrato nas amostras

Para determinação de nitrato foram utilizados 25 mL das amostras, 1 mL de ácido clorídrico 2M; 1,2 mL de resorcinol e 13 mL de ácido sulfúrico concentrado. Após 30 min, as misturas foram diluídas com água a 50 mL e as transmitâncias lidas a 505 nm.

Determinação de nitrito nas amostras

Para determinação de nitrito foram utilizados 25 mL das amostras, 1 mL de hidróxido de sódio 2M, 6 mL de r-nitroanilina, repouso 15 min, 4 mL de a-naftilamina (repouso 5 min) e 10 mL de CTMAB. As misturas foram agitadas, avolumadas com água a 50 mL e as transmitâncias medidas a 530 nm.

Avaliação da performance dos métodos

A avaliação da recuperação do íon nitrato foi realizada adicionando-se 6, 12 e 18 mg do padrão de KNO3 a três amostras de pele de peixe porco torrada a 130 °C durante 30 min e três amostras de pele crua, que foram submetidas à extração com solução de sulfato de amônio.

Para o íon nitrito foi realizada adicionando-se 1, 2 e 3 mg do padrão de KNO2 a três amostras de pele de peixe porco torrada a 130 °C durante 30 min e três amostras de pele, crua submetidas à extração com solução de sulfato de amônio.

As determinações das concentrações dos íons nestas soluções foram realizadas segundo os procedimentos do método oficial e do método em estudo.

Os limites de detecção para os dois métodos em estudo foram estimados através da determinação das transmitâncias das provas em branco. Os procedimentos foram repetidos 6 vezes. Os desvios padrão das absorbâncias foram calculados, multiplicados por 3, sendo os limites de detecção estimados nas respectivas curvas padrão15,16.

Determinações estatísticas

Os resultados dos procedimentos foram comparados estatisticamente através de análise de variância e teste de Tukey empregando o software Statistic 5.0 no modo ANOVA/MANOVA.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Na Tabela 1 estão apresentados os resultados das quantificações dos íons nitrato e nitrito que foram determinados nas amostras constituídas de peles cruas extraídas, conforme o método oficial e o alternativo, e as tostadas, por 30 min, à 130 e 160 ºC, extraídas sob refluxo aquoso durante 30 min, empregando-se procedimentos espectrofotométricos recomendados pelos dois métodos para quantificação. O método oficial12,14 recomenda como solvente de extração uma solução aquosa de sais de cádmio e bário e requer a redução de nitrato a nitrito usando colunas redutoras de amalgama de cádmio. O método de Guozhen et al.11 determina separadamente cada ânion e pode empregar solução de sulfato de amônio para a extração, denominado método alternativo neste trabalho.

Os resultados da Tabela mostram que as quantidades de nitrato são superiores às de nitrito, nas diferentes condições de extração e quantificação, atingindo valores até 8 vezes maiores. Tal se justifica pelo fato do nitrato ser a forma oxidada mais estável do nitrogênio. As concentrações de nitrito só aumentam em baixos níveis de oxigênio, onde ocorre a redução do nitrato (denitrificação) ou durante a biodegradação de nitrato ou nitrogênio amoniacal8,11,12.

Os valores médios das quantidades de nitrato e nitrito nas peles cruas das duas espécies, determinados pelos dois métodos foram de 1,69 e 1,70 mg nitrato/100 g e 0,37 e 0,89 mg nitrito/100 g para peles de peixe porco e papa-terra, respectivamente. Cabe salientar que os resultados dos teores de nitrato para as duas espécies foram sempre superiores quando se realizava extração com cloreto de cádmio, especialmente no método oficial.

Quando foram determinados os íons nos extratos aquosos obtidos sob refluxo, os valores médios encontrados foram 2,58 e 3,06 mg de nitrato/100 g e 0,37 e 0,46 mg de nitrito/100 g, respectivamente, para peles de peixe porco e papa-terra. Neste caso os resultados encontrados pelos dois métodos diferiram menos entre si e o coeficiente de variação entre eles ficou em torno de 16%. Isto mostra que a extração dos íons nas peles cruas é fortemente influenciada pelo sistema extrator, com uma tendência a ter seus valores do ânion nitrato mais elevado quando se emprega solução de cloreto de cádmio.

A comparação com as informações disponíveis na literatura mostra que os resultados diferem dos mencionados por Gangolli et al.6 1,1 mg/100 g e 0,12 mg/100 g para nitrato e nitrito no músculo de pescados. Mesmo que no estudo as espécies e as porções estudadas tenham sido de outras espécies, as diferenças encontradas não levam a questionar os valores encontrados nas determinações realizadas.

Monser et al.8 determinaram nitrito em músculo de sardinha através da oxidação de um complexo azul de fosfomolibdênio e nitrato com o auxílio de colunas redutoras de cádmio. Seus resultados foram de 3,8 e 3,4 mg/100 g para nitrato e nitrito, respectivamente. Os valores de nitrato encontrados em pele de papa-terra neste trabalho, extraído sob refluxo durante 30 min e determinado pelo método alternativo, foi semelhante ao mencionado pelos autores. Trata-se de uma coincidência, pois nas demais condições de extração e quantificação foram muito diferentes, o que é decorrente das diferenças entre as espécies e da porção utilizada para a determinação.

Os dados da Tabela 1 foram comparados estatisticamente utilizando análise de variância, a 5% de significância, onde foi verificado que pelo menos um dos tratamentos para a determinação de nitrato e nitrito diferiu. Portanto, foi realizado um teste de diferenças de médias estatística, o teste de Tukey a 5% de significância, para se avaliar a diferença entre os tratamentos.

Na Figura 1 estão ilustrados os resultados do teste de Tukey para o conteúdo de nitrato e nitrito em pele de peixe porco. A Figura 2 mostra o resultado do teste para a pele de papa-terra.



Os resultados obtidos para o íon nitrito determinado em pele de peixe porco crua mostraram que a extração empregando solução extratora 1 (cloretos) difere significativamente dos demais pelo método oficial e pelo método em estudo. No entanto, após o tratamento térmico das peles, as respostas obtidas pelo método oficial ou pelo alternativo não diferiram significativamente, indicando que os resultados foram afetados pelo sistema de preparo da amostra e não pela reação química empregada para a quantificação. O mesmo caso foi observado para a pele de papa-terra, onde os resultados para as outras formas de extração diferiram do obtido com a solução extratora 1 significativamente, o que não ocorreu com as peles tratadas termicamente. Assim como no caso anterior, os dados reforçam que a diferença entre a quantificação pelos métodos alternativo e oficial decorre da etapa de extração e preparo da amostra e não pelo sistema quantitativo.

No caso do íon nitrato as diferenças entre os sistemas de preparo de amostra e sistemas extratores reforçam o observado para o nitrito, sempre com a tendência dos métodos não diferirem significativamente nos seus resultados quando a pele foi tostada.

O sistema extrator que emprega solução de sais de cloretos é desvantajoso quando se consideram os descartes de resíduos ao final das determinações, além do proveniente das colunas redutoras no processo de regeneração. Outro aspecto que chamou a atenção foi que os valores encontrados para íon nitrito, independentemente do reagente de derivação empregado, foram sempre maiores quando se empregava a solução extratora 1, sugerindo que o nitrato pode estar sendo reduzido já durante a etapa de extração em solução de cloreto de cádmio.

Estes dados foram bastante promissores, pois se o método alternativo não difere do oficial, quando não se emprega extração com soluções de cloreto de cádmio, ele pode ser empregado para avaliar o efeito do tratamento térmico nos íons nitrato e nitrito nos chás das peles de pescados consumidos pela população.

Para corroborar com estas observações os dois métodos foram comparados quanto aos limites de detecção e recuperação empregando peles cruas e torradas de peixe porco. Os resultados são mostrados na Tabela 2.

O autor do método em estudo11 mencionou uma recuperação média de 96% para nitrato e 97% para nitrito em estudo em água potável. Os resultados neste caso foram semelhantes a estes e aos do método oficial sendo, portanto, aplicáveis às determinações em soluções aquosas, como é o caso das amostras deste trabalho (chás).

Quanto ao limite de detecção observa-se que o método em estudo apresentou um limite de detecção 10 vezes menor para o íon nitrato que o método oficial. Quanto ao nitrito, os resultados de ambos foram próximos.

Considerando-se que o preparo doméstico das peles e dos chás nem sempre é facilmente controlável, o método alternativo foi escolhido para avaliar o efeito do tratamento térmico nos teores dos íons quando as peles são tratadas à 130 e 160 ºC por 30 e 60 min para as duas temperaturas. Estas diferentes combinações de tempo e temperatura visaram abranger as possibilidades de variação que podem ocorrer domesticamente no preparo dos chás.

Na Figura 3 pode-se observar que os níveis de nitrito mantiveram uma tendência à constância com a variação da temperatura e o tempo de torra na pele de peixe porco. No caso do papa-terra, a temperatura de tostagem e o tempo de refluxo provocaram maiores variações nos teores deste ânion. Possivelmente isto se deva ao fato de que o nitrito não é a forma mais estável dos óxidos de nitrogênio sendo, portanto, mais afetado pela temperatura de tostagem e pela composição da matriz. Esta diferença é demonstrada pelo teor de cinzas encontrado para as duas peles, 11 e 1%, respectivamente, de peixe porco e papa-terra. A maior variação nos teores de nitrato em função da temperatura também ocorreu na pele de papa-terra, indicando a influência da composição da matriz durante o tratamento térmico.


Um outro aspecto importante destes resultados é a indicação que o método alternativo pode detectar variações nas concentrações dos íons ocasionadas pelas condições de preparo.

A partir dos resultados encontrados nas condições testadas, sob o aspecto segurança para consumo humano, pode-se estimar o risco decorrente do consumo dos chás considerando-se as informações do "Safety Committee for Food (SCF)" da Inglaterra. Este recomenda uma ingestão diária alimentar máxima (IDA) de 1,08 g do íon nitrato e 1,8 mg do íon nitrito para adultos de 60 kg 6. As quantidades de nitrato e nitrito que variaram entre 1,5 a 3 mg/100 g e 0,35 a 0,7 mg/100 g, respectivamente, estão abaixo desta recomendação.

Segundo as informações dos consumidores a quantidade utilizada no preparo do chá contra os problemas respiratórios é de 2 g de pele seca e moída por L/dia, para um homem adulto de 70 kg (0,03 g/kg). Isto equivale a um consumo de 0,03 a 0,06 mg de NO3- e 0,007 a 0,014 mg de NO2-, ou seja, valores bem abaixo do recomendado. Além disso, Cavalli2, em testes de toxicidade com ratos machos Wistar, demonstrou que doses de 2,8 g/kg de extrato aquoso de pele de Balistes capriscus, o que equivale a 93,3 vezes o consumido por um homem adulto de 70 kg, não provocaram sinais visíveis de toxicidade ou mortalidade em nenhuma das cobaias.

CONCLUSÃO

A comparação entre os resultados e a performance dos métodos oficial e alternativo mostrou que este pode ser empregado para determinação do conteúdo de nitrato e nitrito em peles cruas e em chás de peles torradas. O método de Guozhen et al.11 neste trabalho teve um limite de detecção 10 vezes mais baixo para o íon nitrato que o método oficial. Quanto ao nitrito, os resultados de ambos foram semelhantes. As recuperações para os métodos também apresentaram valores próximos a 100%.

O consumo diário de 2 g de pele seca e moída para um homem adulto de 70 kg (0,03 g/kg) equivale, de acordo com os valores encontrados, a um consumo de 0,03 a 0,06 mg de NO3- e 0,007 a 0,014 mg de NO2-. Considerando os limites recomendados como seguros para consumo, um chá preparado com esta quantidade de pele não ocasionaria danos à saúde dos usuários.

Recebido em 7/3/05; aceito em 6/1/06; publicado na web em 5/5/06

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  • *
    e-mail:
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      06 Set 2011
    • Data do Fascículo
      Out 2006

    Histórico

    • Aceito
      06 Jan 2006
    • Recebido
      07 Mar 2005
    Sociedade Brasileira de Química Instituto de Química, Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), CP6154, 13083-0970 - Campinas - SP - Brazil
    E-mail: quimicanova@sbq.org.br