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Inovação Frugal e Sustentabilidade no Setor Calçadista

RESUMO

Objetivo:

analisar como as empresas de calçados podem inovar de maneira frugal em convergência com os princípios da sustentabilidade.Tal objetivo foi realizado com base em estudos que observam a relação entre a sustentabilidade e a inovação frugal, com ênfase em estratégias de bricolagem, sob uma perspectiva de aplicabilidade na indústria calçadista, por ser um setor de alto impacto ambiental.

Método:

a pesquisa faz uso do design science research. Para a coleta de dados se fez uso de diário de campo, para maior aprofundamento de compreensão do ambiente calçadista, além de análise secundária de documentos na internet e entrevistas.

Resultados:

o estudo propôs dois artefatos, um deles um artefato de tênis frugal e sustentável e, como segundo artefato de ação, também percebeu a necessidade da atuação colaborativa e constante entre universidade e empresas na busca por soluções frugais e sustentáveis, que possam beneficiar tanto as empresas, por meio de resultados lucrativos, quanto a universidade, por meio de pesquisas longitudinais e produção de artigos.

Conclusões:

a indústria calçadista anseia por inovações de baixo custo (frugais) e que sejam ao mesmo tempo sustentáveis, demonstrando capacidade e interesse em atender às demandas sociais e políticas por ações sustentáveis; para isso, uma maior proximidade com a universidade se apresenta como uma colaboração que pode produzir benefícios para ambos, com efeitos colaterais de impacto positivo para iniciativas ambientais, sociedade e políticas governamentais.

Palavras-chave:
bricolagem; tênis frugal; colaboração universidade e empresas; artefatos; indústria calçadista

ABSTRACT

Objective:

this article aims to analyze how footwear companies can innovate frugally in convergence with the principles of sustainability. This objective was achieved based on studies that observe the relationship between sustainability and frugal innovation, with an emphasis on bricolage strategies, from a perspective of applicability in the footwear industry, as it is a sector with high environmental impact.

Method:

the research uses design science research, and made use of a field diary, for greater depth of understanding of the footwear environment, as well as secondary analysis of documents on the internet and transcribed interviews with the seven experts.

Results:

the study managed to propose two action artifacts, one of them a frugal and sustainable sneaker artifact, and, as a second action artifact, it realized the need for collaborative and constant action between universities and companies in the search for frugal and sustainable solutions, which can benefit both companies, through profitable results, and the university, through longitudinal research and production of articles.

Conclusions:

the footwear industry yearns for low-cost (frugal) innovations that are at the same time sustainable, and demonstrates capacity and interest in meeting social and political demands for sustainable actions; in order to achieve this, greater proximity to the university presents itself as a collaboration that can produce benefits for both, with side effects of positive impact on environmental initiatives, society, and government policies.

Keywords:
bricolage; frugal sneakers; university and business collaboration; artifacts; footwear industry

INTRODUÇÃO

O termo ‘inovação frugal’ caracteriza-se pela capacidade de inovadores em encontrar soluções para problemas sociais, geralmente por meio da bricolagem, que se refere à solução de desafios por meio de recursos disponíveis, sem a necessidade de comprar novas matérias-primas (Soni & Krishnan, 2014Soni, P., & T. Krishnan, R. (2014). Frugal innovation: Aligning theory, practice, and public policy. Journal of Indian Business Research, 6(1), 29-47. https://doi.org/10.1108/JIBR-03-2013-0025
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; Weyrauch & Herstatt, 2017Weyrauch, T., & Herstatt, C. (2017). What is frugal innovation? Three defining criteria. Journal of frugal innovation, 2(1), 1-17. https://doi.org/10.1186/s40669-016-0005-y
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). Por causa disso, a inovação frugal ficou conhecida como a capacidade de ‘fazer mais com menos’ (Bhatti et al., 2013Bhatti, Y., Khilji, S. E., & Basu, R. (2013). Frugal innovation. In S. E. Khilji & C. Rowley (Eds.), Globalization, Change and Learning in South Asia. Chandos Asian Studies Series (pp. 123-145). https://doi.org/10.1016/B978-0-85709-464-3.50007-6
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; Radjou & Prabhu, 2015Radjou, N., & Prabhu, J. (2015). Frugal Innovation: How to do more with less. The Economist.; Sarkar & Mateus, 2022Sarkar, S., & Mateus, S. (2022). Value creation using minimal resources - A meta-synthesis of frugal innovation. Technological Forecasting & Social Change, 179, 121612. https://doi.org/10.1016/j.techfore.2022.121612
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), contribuindo dessa forma para questões da sustentabilidade.

Com uma produção anual de escala global de aproximadamente 23 bilhões de pares de calçados (Statista, 2022), a indústria calçadista oportuniza um estudo que visa a analisar o impacto ambiental das empresas pela perspectiva das dimensões da sustentabilidade (Elkington, 1994Elkington, J. (1994). Towards the sustainable corporation: Win-win-win business strategies for sustainable development. Scientific Research. California Management Review, 36(2), 90-100. https://doi.org/10.2307/41165746
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; Kuhlman & Farrington, 2010Kuhlman, T., & Farrington, J. (2010). What is sustainability? Sustainability, 2(11), 3436-3448. https://doi.org/10.3390/su2113436
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), e qual o papel que a inovação frugal pode desempenhar na busca por soluções que promovam a mudança de mentalidade (Radjou & Prabhu, 2015Radjou, N., & Prabhu, J. (2015). Frugal Innovation: How to do more with less. The Economist.; Soni & Krishnan, 2014Soni, P., & T. Krishnan, R. (2014). Frugal innovation: Aligning theory, practice, and public policy. Journal of Indian Business Research, 6(1), 29-47. https://doi.org/10.1108/JIBR-03-2013-0025
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) para a inovação frugal em convergência com a sustentabilidade.

Portanto, o problema de pesquisa que este estudo intenta investigar é: como as empresas de calçados podem inovar de maneira frugal em convergência com os princípios da sustentabilidade? O objetivo consiste em analisar de que forma a inovação frugal pode ser aplicada em empresas de calçados alinhada aos princípios da sustentabilidade. Para compreender como a sustentabilidade e a inovação frugal podem ser aplicadas à realidade das empresas, a pesquisa parte de um problema de sobras de materiais no processo produtivo em empresas de calçados situadas na região do Vale dos Sinos, Rio Grande do Sul, em um trabalho que envolveu a participação de sete especialistas em calçados por meio de um estudo de design science research (DSR), que tem como objetivo a resolução empírica de problemas com base em teorias acadêmicas (Dresch et al., 2015Dresch, A., Lacerda, D. P., Antunes, J. A. V., Jr. (2015). Design science research. In A. Dresch, D. P. Lacerda, & J. A. V. Antunes Jr (Eds.), Design science research: A method for science and technology advancement (pp. 67-102). Springer. https://doi.org/10.1007/978-3-319-07374-3_4
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; Lacerda et al., 2013Lacerda, D. P., Dresch, A., Proença, A., & Antunes, J. A. V., Jr. (2013). Design science research: Método de pesquisa para a engenharia de produção. Gestão & produção, 20, 741-761. https://doi.org/10.1590/S0104-530X2013005000014
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; Vaishnavi & Kuechler, 2021Vaishnavi, V., & Kuechler, W. (2021). Design science research in information systems. http://www.desrist.org/design-research-in-information-systems/
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).

A pesquisa contribuiu com a apresentação de duas propostas de artefatos: (a) um tênis frugal e sustentável, com design colorido e inovador que utiliza restos de tecidos da produção; e (b) um método de desenvolvimento de inovação frugal e sustentável em parceria entre empresas e universidade.

Portanto, entende-se que as indústrias, em particular a calçadista apresentada nesta pesquisa, anseiam por inovações frugais e que sejam ao mesmo tempo sustentáveis. Logo, desvelar o processo de desenvolvimento de um produto com a proximidade da universidade se apresenta como uma condição que pode produzir benefícios para ambos, com efeitos colaterais de impacto positivo para iniciativas ambientais, sociedade e políticas governamentais.

FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

Com o advento da Revolução Industrial e sua capacidade de produção em massa, pensadores começaram a alertar para os efeitos dos impactos negativos da ação humana e produtiva sobre o meio ambiente, ações estas que colocam em risco a possibilidade da vida humana no planeta na posteridade, o que levou ao desenvolvimento do conceito de sustentabilidade (Albert, 2022Albert, M. (2022). Assessing the sustainability impacts of frugal innovation - A literature review. Journal of Cleaner Production, 365, 132754. https://doi.org/10.1016/j.jclepro.2022.132754
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; Kuhlman & Farrington, 2010Kuhlman, T., & Farrington, J. (2010). What is sustainability? Sustainability, 2(11), 3436-3448. https://doi.org/10.3390/su2113436
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; Schumacher, 1973Schumacher, E. F. (1973). O negócio é ser pequeno (Small is beautiful). Zahar Editores.).

Dada a compreensão da importância do tema da sustentabilidade, sua definição ganhou aprofundamentos e detalhamentos que ajudam a compreender o papel dos atores envolvidos e a encontrar maneiras mais objetivas de mensurar os resultados alcançados na busca por melhorias, como é o caso do triple bottom line (tripé da sustentabilidade) de Elkington: ambiental, social e econômico (Elkington, 1994Elkington, J. (1994). Towards the sustainable corporation: Win-win-win business strategies for sustainable development. Scientific Research. California Management Review, 36(2), 90-100. https://doi.org/10.2307/41165746
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; Hossain, 2021bHossain, M. (2021b). Frugal innovation and sustainable business models. Technology in Society, 64, 101508. https://doi.org/10.1016/j.techsoc.2020.101508
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; Kuhlman & Farrington, 2010Kuhlman, T., & Farrington, J. (2010). What is sustainability? Sustainability, 2(11), 3436-3448. https://doi.org/10.3390/su2113436
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; Stöber et al., 2022Stöber, L. F., Sommer, D., & Ebersberger, B. (2022). The impact of frugal innovation on sustainability: A systematic literature review. International Journal of Innovation Management, 26(8), 2230002. https://doi.org/10.1142/S1363919622300021
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). Governos mundiais, atentos à necessidade de se criarem medidas práticas mais eficazes, em um esforço conjunto, estabeleceram os 17 objetivos para o desenvolvimento sustentável (Sustainable Development Goals) em 2015, com prazo para ser cumprido até 2030; dentre as ações estão exemplos como a eliminação da pobreza; a erradicação da fome; o foco na qualidade de vida e saúde; consumo e produção responsável, etc. (Albert, 2022Albert, M. (2022). Assessing the sustainability impacts of frugal innovation - A literature review. Journal of Cleaner Production, 365, 132754. https://doi.org/10.1016/j.jclepro.2022.132754
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; Hossain, 2021b; Stöber et al., 2022).

Mais recentemente, autores passaram a atentar para o fato de que a inovação frugal poderia se apresentar como parte da solução na busca por resultados voltados para a sustentabilidade. Bhatti et al. (2013Bhatti, Y., Khilji, S. E., & Basu, R. (2013). Frugal innovation. In S. E. Khilji & C. Rowley (Eds.), Globalization, Change and Learning in South Asia. Chandos Asian Studies Series (pp. 123-145). https://doi.org/10.1016/B978-0-85709-464-3.50007-6
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), Rao (2013Rao, B. C. (2013). How disruptive is frugal? Technology in Society, 35(1), 65-73. http://doi.org/10.1016/j.techsoc.2013.03.003
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) e Radjou e Prabhu (2015Radjou, N., & Prabhu, J. (2015). Frugal Innovation: How to do more with less. The Economist.) já apontavam para a possibilidade de a inovação frugal apresentar características de sustentabilidade. Entretanto, no estudo de Weyrauch e Herstatt (2017Weyrauch, T., & Herstatt, C. (2017). What is frugal innovation? Three defining criteria. Journal of frugal innovation, 2(1), 1-17. https://doi.org/10.1186/s40669-016-0005-y
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) essa relação não foi confirmada de maneira conclusiva, convidando pesquisadores a aprofundarem a temática. A inovação frugal é um fenômeno que descreve, em um primeiro momento, a cultura de inovação na Índia, cunhada por Navi Radjou como a capacidade de ‘fazer mais com menos’, por sua habilidade de proporcionar soluções com baixo custo de produção e com baixo preço de aquisição para consumidores da base da pirâmide, em situação de pobreza extrema (Bhatti et al., 2013; Onsongo et al., 2023Onsongo, E. K., Knorringa, P., & Beers, C. (2023). Frugal business model innovation in the Base of the Pyramid: The case of Philips Community Life Centres in Africa. Technovation, 121, 102675. https://doi.org/10.1016/j.technovation.2022.102675
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; Prahalad & Hart, 2002Prahalad, C. K., & Hart, S. L. (2002). The fortune at the bottom of the pyramid. Revista Eletrônica de Estratégia e Negócios, 1(2). https://doi.org/10.19177/reen.v1e220081-23
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; Radjou & Prabhu, 2015; Sarkar & Mateus, 2022Sarkar, S., & Mateus, S. (2022). Value creation using minimal resources - A meta-synthesis of frugal innovation. Technological Forecasting & Social Change, 179, 121612. https://doi.org/10.1016/j.techfore.2022.121612
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).

O termo ‘inovação frugal’ ainda é recente, obteve visibilidade principalmente em 2010, com a publicação de uma matéria na revista The Economist (2010) sobre esse tema e, portanto, ainda apresenta dificuldade quanto à sua definição e possíveis aplicabilidades (Sarkar & Mateus, 2022Sarkar, S., & Mateus, S. (2022). Value creation using minimal resources - A meta-synthesis of frugal innovation. Technological Forecasting & Social Change, 179, 121612. https://doi.org/10.1016/j.techfore.2022.121612
https://doi.org/10.1016/j.techfore.2022....
). Como tentativa de elucidar este conceito, os pesquisadores Weyrauch e Herstatt (2017Weyrauch, T., & Herstatt, C. (2017). What is frugal innovation? Three defining criteria. Journal of frugal innovation, 2(1), 1-17. https://doi.org/10.1186/s40669-016-0005-y
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) propuseram um estudo com revisão sistemática da literatura e entrevistas com especialistas (empresários e pesquisadores) para tentar identificar uma ferramenta de mensuração da inovação frugal. Os autores concluíram que a inovação frugal pode ser definida com base em três parâmetros fundamentais, que são: (1) redução substancial de custos; (2) foco nas funcionalidades essenciais; e (3) nível otimizado de desempenho. Outros autores, como Schleinkofer et al. (2019Schleinkofer, U., Herrmann, T., Maier, I., Bauernhansl, T., Roth, D., & Spath, D. (2019). Development and evaluation of a design thinking process adapted to frugal production systems for emerging markets. Procedia Manufacturing, 39, 609-617. https://doi.org/10.1016/j.promfg.2020.01.429
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), Hossain (2021aHossain, M. (2021a). Frugal innovation: Unveiling the uncomfortable reality. Technology in Society, 67, 101759. https://doi.org/10.1016/j.techsoc.2021.101759
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), Reina et al. (2021Reina, D. R., Corradi, A. A., & Rapini, M. S. (2021). Emergence and scale-up of frugal innovations: The relevance of university-industry interaction. Journal of Technology Management & Innovation, 16(3), 3-12. https://doi.org/10.4067/S0718-27242021000300003
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) e Hossain et al. (2022), também concordam com essa proposição.

Weyrauch e Herstatt (2017Weyrauch, T., & Herstatt, C. (2017). What is frugal innovation? Three defining criteria. Journal of frugal innovation, 2(1), 1-17. https://doi.org/10.1186/s40669-016-0005-y
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) propuseram uma redução de pelo menos 30% no preço de venda final em relação a outros produtos qualitativamente similares e concorrentes. Para os mesmos autores, em convergência com a literatura sobre inovação frugal, é fundamental que essa redução no preço seja percebida pelo cliente final (Sheikh et al., 2023Sheikh, F. A., Pugh, R., Wu, X., & Sarkar, S. (2023). Regional studies and frugal innovation: A missing link?. Regional Studies, 1-13. https://doi.org/10.1080/00343404.2023.2222136
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). Essa característica de ser capaz de inovar, mesmo em situações de restrição e limitação, revela a capacidade de transformar uma adversidade em vantagem competitiva, estimulando as empresas a serem mais eficientes no uso e reutilização de recursos financeiros e materiais (Asakawa et al., 2019Asakawa, K., Cuervo-Cazurrab, A., Un, C. A. (2019). Frugality-based advantage. Long Range Planning, 52(4), 101879. https://doi.org/10.1016/j.lrp.2019.04.001
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; Rao, 2017Rao, B. C. (2017). Advances in Science and Technology through frugality. Engineering Management Review, 45(1), 32-38. https://doi.org/10.1109/EMR.2017.2667219
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). Os custos podem ser ainda mais reduzidos quando as matérias-primas utilizadas vêm de fornecedores locais, ou são materiais reciclados ou, ainda, que seriam descartados pelas próprias empresas (Busch et al., 2018Busch, H. C., Dauth, T., Fischer, L., & Souza, M. (2018). Frugal innovation approaches to sustainable domestic energy: Two cases of solar water heating from Brazil. International. Journal of Technological Learning, Innovation and Development, 10(3-4), 231-257. https://doi.org/10.1504/IJTLID.2018.093725
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; Hossain, 2021bHossain, M. (2021b). Frugal innovation and sustainable business models. Technology in Society, 64, 101508. https://doi.org/10.1016/j.techsoc.2020.101508
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). Assim, representam uma característica da inovação frugal chamada de bricolagem, que é a capacidade de inovar utilizando os materiais disponíveis, sem que haja a aquisição de novos recursos (Agarwal et al., 2017Agarwal, N., Grottke, M., Mishra, M., Brem, A. (2017). A systematic literature review of constraint-based innovations: State of the art and future perspectives. IEEE Transactions on Engineering Management, 64(1), 3-15. https://doi.org/10.1109/TEM.2016.2620562
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; Bhatti et al., 2018Bhatti, Y., Basu, R. R., Barron, D. & Ventresca, M. J. (2018). Frugal innovation: Models, means, methods. Cambridge University Press. https://doi.org/10.1017/9781316986783.011
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).

Com base em recentes revisões sistemáticas que analisaram a relação entre a inovação frugal e a sustentabilidade, foi observado que existe, de fato, uma possível relação entre os dois temas e que a inovação frugal pode servir de percurso de inovação que promova a sustentabilidade (Albert, 2022Albert, M. (2022). Assessing the sustainability impacts of frugal innovation - A literature review. Journal of Cleaner Production, 365, 132754. https://doi.org/10.1016/j.jclepro.2022.132754
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; De Marchi et al., 2022De Marchi, V., Pineda-Escobar, M. A., Howell, R., Verheij, M., & Knorringa, P. (2022). Frugal innovation and sustainability outcomes: Findings from a systematic literature review. European Journal of Innovation Management, 25(6), 984-1007. https://doi.org/10.1108/EJIM-02-2022-0083
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; Shahid et al., 2023Shahid, M. S., Hossain, M., Shahid, S., & Anwar, T. (2023). Frugal innovation as a source of sustainable entrepreneurship to tackle social and environmental challenges. Journal of Cleaner Production, 406, 137050. https://doi.org/10.1016/j.jclepro.2023.137050
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; Silva et al., 2022Silva, F., Nodari, C. H., & Chaym, C. D. (2022, November). Construindo a ponte entre a inovação frugal e sustentabilidade: Uma revisão sistemática de literatura. Anais do XXV Seminários em Administração. São Paulo, SP, Brasil.; Stöber et al., 2022Stöber, L. F., Sommer, D., & Ebersberger, B. (2022). The impact of frugal innovation on sustainability: A systematic literature review. International Journal of Innovation Management, 26(8), 2230002. https://doi.org/10.1142/S1363919622300021
https://doi.org/10.1142/S136391962230002...
). Todavia, é importante destacar que, caso a intencionalidade para a sustentabilidade não seja observada pela prática da inovação frugal, resultados indesejados podem ser produzidos. Alertas e críticas têm sido feitos nesse sentido (Hossain, 2021bHossain, M. (2021b). Frugal innovation and sustainable business models. Technology in Society, 64, 101508. https://doi.org/10.1016/j.techsoc.2020.101508
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; Hossain et al., 2022; McMurray et al., 2019McMurray, A. J., Weerakoon, C., & Etse, D. (2019). Exploring the dark side of frugal innovation. In A. J. McMurray & G. A. de Wall (Eds.), Frugal Innovation: A Global Research Companion. Routledge.; Meagher, 2017Meagher, K. (2017). Cannibalizing the informal economy: Frugal innovation and economic inclusion in Africa. The European Journal of Development Research, 30, 17-33. https://doi.org/10.1057/s41287-017-0113-4
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; Pansera, 2018Pansera, M. (2018). Frugal or fair? The unfulfilled promises of frugal innovation. Technology Innovation Management Review, 8(4), 6-13. https://doi.org/10.22215/timreview/1148
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).

Um dos problemas observados é o de que ao oferecer produtos de valor muito reduzido, a inovação frugal pode justamente provocar problemas ambientais ao promover o consumismo e a acumulação, problemas ocasionados pela possibilidade de escalabilidade dessa inovação, e que justamente estudos sobre sustentabilidade buscam combater (Hossain, 2021bHossain, M. (2021b). Frugal innovation and sustainable business models. Technology in Society, 64, 101508. https://doi.org/10.1016/j.techsoc.2020.101508
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; Hossain et al., 2022). Gandenberger et al. (2020Gandenberger, C., Kroll, H., & Walz, R. (2020). The role of frugal innovation in the global diffusion of green technologies. International Journal of Technology Management, 83(1-3), 97-113. https://doi.org/10.1504/IJTM.2020.109218
https://doi.org/10.1504/IJTM.2020.109218...
) argumentam que o consumo global aumentará de qualquer forma, e que esse não é um problema que deva ser atribuído à inovação frugal. Na verdade, a inovação frugal seria uma estratégia para ajudar a reduzir os impactos indesejados da escalabilidade (Stöber et al., 2022Stöber, L. F., Sommer, D., & Ebersberger, B. (2022). The impact of frugal innovation on sustainability: A systematic literature review. International Journal of Innovation Management, 26(8), 2230002. https://doi.org/10.1142/S1363919622300021
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).

A inovação frugal apresenta as características para iniciar um diálogo com os diferentes atores sociais (sociedade, empresas, universidades e governos) na busca por soluções que levam em conta as necessidades das empresas por lucro sem ignorar os anseios sociais, políticos e ecológicos (Albert, 2022Albert, M. (2022). Assessing the sustainability impacts of frugal innovation - A literature review. Journal of Cleaner Production, 365, 132754. https://doi.org/10.1016/j.jclepro.2022.132754
https://doi.org/10.1016/j.jclepro.2022.1...
; Radjou & Prabhu, 2015Radjou, N., & Prabhu, J. (2015). Frugal Innovation: How to do more with less. The Economist.; Reina et al., 2021Reina, D. R., Corradi, A. A., & Rapini, M. S. (2021). Emergence and scale-up of frugal innovations: The relevance of university-industry interaction. Journal of Technology Management & Innovation, 16(3), 3-12. https://doi.org/10.4067/S0718-27242021000300003
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; Stöber et al., 2022Stöber, L. F., Sommer, D., & Ebersberger, B. (2022). The impact of frugal innovation on sustainability: A systematic literature review. International Journal of Innovation Management, 26(8), 2230002. https://doi.org/10.1142/S1363919622300021
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). Para que haja a compreensão das empresas com relação à importância da atenção que precisa ser dada a métodos de produção e à oferta de produtos e serviços que levam em conta problemas sociais, ambientais e econômicos, é preciso uma mudança na forma de pensar (mindset) e na maneira de compreender a inovação de modo que não se limite às fronteiras das empresas (Soni & Krishnan, 2014Soni, P., & T. Krishnan, R. (2014). Frugal innovation: Aligning theory, practice, and public policy. Journal of Indian Business Research, 6(1), 29-47. https://doi.org/10.1108/JIBR-03-2013-0025
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; Weyrauch & Herstatt, 2017Weyrauch, T., & Herstatt, C. (2017). What is frugal innovation? Three defining criteria. Journal of frugal innovation, 2(1), 1-17. https://doi.org/10.1186/s40669-016-0005-y
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).

A indústria calçadista mundial produz em torno de 23 bilhões de pares de calçados por ano, o que significa uma quantidade de cerca de três pares de calçados por habitante do planeta, considerando uma população mundial total de aproximadamente oito bilhões de pessoas (Pacheco-Blanco et al., 2018Pacheco-Blanco, B., Martínez-Gómez, M., Collado-Ruiz, D., & Capuz-Rizo, S. F. (2018). Sustainable information in shoe purchase decisions: Relevance of data based on source. Sustainability, 10(4), 1170. https://doi.org/10.3390/su10041170
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; Statista, 2022; Ted-Ed, 2020). Esses números representam o impacto e a responsabilidade da indústria calçadista no quesito sustentabilidade, ou seja, a potencialidade desta indústria, no desenvolvimento de ações sustentáveis e de proposição de campanhas de conscientização aos consumidores (Pacheco-Blanco et al., 2018; Polese et al., 2019Polese, F., Ciasullo, M. V., Troisi, O., & Maione, G. (2019). Sustainability in footwear industry: A big data analysis. Sinergie Italian Journal of Management, 37(1), 149-170. https://doi.org/10.7433/s108.2019.09
https://doi.org/10.7433/s108.2019.09...
; Ted-Ed, 2020).

PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

Esta pesquisa é orientada pelo método de design science research (DSR) (Dresch et al., 2015Dresch, A., Lacerda, D. P., Antunes, J. A. V., Jr. (2015). Design science research. In A. Dresch, D. P. Lacerda, & J. A. V. Antunes Jr (Eds.), Design science research: A method for science and technology advancement (pp. 67-102). Springer. https://doi.org/10.1007/978-3-319-07374-3_4
https://doi.org/10.1007/978-3-319-07374-...
; Lacerda et al., 2013Lacerda, D. P., Dresch, A., Proença, A., & Antunes, J. A. V., Jr. (2013). Design science research: Método de pesquisa para a engenharia de produção. Gestão & produção, 20, 741-761. https://doi.org/10.1590/S0104-530X2013005000014
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) e segue as diretrizes do modelo de DSR de Vaishnavi e Kuechler (2021Vaishnavi, V., & Kuechler, W. (2021). Design science research in information systems. http://www.desrist.org/design-research-in-information-systems/
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), em que a construção do artefato da pesquisa acontece em cinco etapas: (1) definição do problema; (2) sugestão; (3) desenvolvimento; (4) avaliação; e (5) conclusão. A apresentação desta última etapa de conclusão segue as definições de March e Smith (1995March, S. T., & Smith, G. F. (1995). Design and natural science research on information technology. Decision Support Systems, 15(4), 251-266. https://doi.org/10.1016/0167-9236(94)00041-2
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), para a caracterização do artefato, que neste estudo apresenta dois resultados (artefatos), ou seja, o método e a instanciação. A Tabela 1 ilustra as etapas da pesquisa.

Tabela 1
Etapas da pesquisa.

Na primeira etapa, em que foi identificado o problema de pesquisa nas empresas de calçados, realizou-se uma abordagem inicial (entrevista não estruturada) com os sete especialistas e fez-se um diário de campo para levantar informações iniciais para proceder com a pesquisa (Yin, 2016Yin, R. K. (2016). Pesquisa qualitativa do início ao fim. Penso.). Essa primeira abordagem com os especialistas identificou o problema de desperdício de matéria-prima de tecido que se utiliza no cabedal (parte superior) dos calçados no processo de produção. A sobra do tecido é revendida como sucata a preço muito abaixo do valor de compra inicial, ou ainda, em alguns casos, as empresas pagam para que outras empresas de reciclagem recolham e descartem o material. Também como parte do processo de identificação do problema, consultou-se o referencial teórico, com foco nas cinco revisões sistemáticas da literatura sobre inovação frugal e sustentabilidade dos autores: Iqbal et al. (2021Iqbal, Q., Ahmad, N. H., & Li, Z. (2021). Frugal-based innovation model for sustainable development: Technological and market turbulence. Leadership & Organization Development Journal, 42(3), 396-407. https://doi.org/10.1108/LODJ-06-2020-0256
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), Albert (2022Albert, M. (2022). Assessing the sustainability impacts of frugal innovation - A literature review. Journal of Cleaner Production, 365, 132754. https://doi.org/10.1016/j.jclepro.2022.132754
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), De Marchi et al. (2022De Marchi, V., Pineda-Escobar, M. A., Howell, R., Verheij, M., & Knorringa, P. (2022). Frugal innovation and sustainability outcomes: Findings from a systematic literature review. European Journal of Innovation Management, 25(6), 984-1007. https://doi.org/10.1108/EJIM-02-2022-0083
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), Silva et al. (2022Silva, F., Nodari, C. H., & Chaym, C. D. (2022, November). Construindo a ponte entre a inovação frugal e sustentabilidade: Uma revisão sistemática de literatura. Anais do XXV Seminários em Administração. São Paulo, SP, Brasil.) e Stöber et al. (2022Stöber, L. F., Sommer, D., & Ebersberger, B. (2022). The impact of frugal innovation on sustainability: A systematic literature review. International Journal of Innovation Management, 26(8), 2230002. https://doi.org/10.1142/S1363919622300021
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).

A segunda etapa refere-se ao momento de sugestão de uma possível solução para o problema de desperdício, em que se propôs a criação de um tênis frugal e sustentável com reaproveitamento do material que seria descartado com prejuízo financeiro. Nesta etapa aprofundaram-se as entrevistas não estruturadas, que ocorreram via aplicativo da Microsoft Teams, e com visitas às empresas para alimentar o diário de campo sobre a proposta do tênis, com os especialistas compilando as observações e informações que eram coletadas. Ainda, foram identificados e coletados dados secundários tanto de marcas nacionais como internacionais, em páginas da internet, vídeos no YouTube e, principalmente, Instagram (por ser uma ferramenta alimentada por algoritmo que retroalimenta a pesquisa inicial, do tema inicial de pesquisa, auxiliando significativamente a pesquisa secundária). Os dados secundários se referem principalmente à análise de preços dos calçados similares ao proposto por esta pesquisa, possibilitando a análise comparativa de redução de preço, de pelo menos 30%, corroborando a proposta de Weyrauch e Herstatt (2017Weyrauch, T., & Herstatt, C. (2017). What is frugal innovation? Three defining criteria. Journal of frugal innovation, 2(1), 1-17. https://doi.org/10.1186/s40669-016-0005-y
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). Essa análise de dados secundários também teve por objetivo observar a preferência e a aprovação dos clientes por calçados coloridos. Essas análises de documentos secundários são apresentadas nas Figuras 1 e 2, e também no decorrer da análise inferencial.

Figura 1
Comparação de produtos frugais com marcas líderes no mercado.

Figura 2
Análise de produtos inovadores em cores.

A terceira etapa, denominada desenvolvimento, incluiu o estudo de custo da viabilidade econômica e processual da proposta de tênis frugal e sustentável. O estudo da viabilidade econômica foi realizado pelo especialista 3. Além disso, essa terceira etapa contou com o acréscimo do trabalho de campo com três visitas técnicas e uma participação em evento (Yin, 2016Yin, R. K. (2016). Pesquisa qualitativa do início ao fim. Penso.) (Tabela 2). Essas atividades tiveram por objetivo aprofundar o conhecimento do ambiente da produção calçadista e a forma de atuação dos especialistas nesse contexto. Essa perspectiva é descrita nos estudos sobre inovação frugal como mindset do inovador frugal (Soni & Krishnan, 2014Soni, P., & T. Krishnan, R. (2014). Frugal innovation: Aligning theory, practice, and public policy. Journal of Indian Business Research, 6(1), 29-47. https://doi.org/10.1108/JIBR-03-2013-0025
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; Weyrauch & Herstatt, 2017Weyrauch, T., & Herstatt, C. (2017). What is frugal innovation? Three defining criteria. Journal of frugal innovation, 2(1), 1-17. https://doi.org/10.1186/s40669-016-0005-y
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). A Tabela 2 apresenta detalhes das quatro atividades.

Tabela 2
Informações sobre atividades de pesquisa de campo.

Na quarta etapa da pesquisa, que se refere à avaliação do tênis proposto e do modelo de desenvolvimento com base na inovação frugal e sustentável, deu-se início ao processo de entrevistas estruturadas com os especialistas (todo o processo de pesquisa refere-se sempre aos mesmos sete especialistas, conforme detalhado na Tabela 3) para apresentar e avaliar os resultados. O roteiro de entrevista se deu por meio de perguntas estruturadas com base no referencial teórico e das etapas prévias da coleta de informações. Nesta etapa de entrevistas estruturadas, procederam-se a gravação e a transcrição por meio do aplicativo da Microsoft Teams no mês de julho de 2023. As entrevistas tiveram uma duração aproximada de 45 a 60 minutos cada, gerando um total de 168 páginas de transcrição. Não foram utilizados softwares para a análise das transcrições. Foi realizada apenas uma rodada de entrevista estruturada com transcrições. Os sete especialistas participaram dos processos de: identificação do problema; sugestão; e desenvolvimento. Destes, apenas seis participaram dos dois processos restantes: avaliação e conclusão (o especialista 7 precisou se afastar da pesquisa por motivo de troca de empresa, impossibilitando a sua continuidade no estudo). A Tabela 3 identifica o cargo dos sete especialistas e o tempo de experiência.

Tabela 3
Descrição sobre os especialistas em calçados.

Os especialistas foram selecionados em virtude de sua experiência no trabalho de desenvolvimento e produção de calçados. Teve-se o cuidado de selecionar especialistas de empresas de calçados diferentes. As perguntas administradas aos especialistas foram as seguintes: ‘1. Existem outros problemas de desperdício de recursos?’; ‘2. Percebe-se uma necessidade de mudança de mentalidade para a inovação?’; ‘3. A empresa trabalha ouvindo a necessidade dos clientes e sociedade?’; ‘4. O que você acha da ideia deste projeto de criar uma marca com produtos baratos e inovadores para vender para uma classe mais necessitada, com o intuito de testar modelos inovadores?’; ‘5. Como você percebe o papel das empresas com relação à sustentabilidade?’; ‘6. O que você pensa sobre a interação universidade e empresas de forma permanente ao longo do tempo?’; ‘7. O que você pensa da inovação do tênis frugal e sustentável desenvolvido por esse projeto?’; ‘8. Quais são críticas a se fazer a esse projeto?’.

Ainda na etapa da pesquisa 4, de avaliação, deu-se continuação ao processo de análise de conteúdo. Essa etapa de análise de conteúdo seguiu a prescrição do método de Bardin (2006Bardin, L. (2006). Análise de conteúdo. Edições 70.) que compreendeu a sequência de: (1) coleta de material (leitura flutuante); (2) organização do material; (3) leitura focada; (4) definição de objetivo; (5) definição de pressupostos norteadores implícitos (no caso desta pesquisa, o pressuposto norteador implícito foi de criar um produto inovador com base em inovação frugal e sustentável); (6) codificação e categoria; (7) tratamentos dos dados e estatística; 8) apresentação da interpretação inferencial.

Os dados coletados por meio do trabalho de campo (Yin, 2016Yin, R. K. (2016). Pesquisa qualitativa do início ao fim. Penso.), das participações em eventos, dos dados secundários e das entrevistas estruturadas foram analisados sob as seguintes categorias: (1) bricolagem; (2) mudança de mentalidade (mindset); (3) foco no cliente; (4) inovação frugal; (5) sustentabilidade; (6) interação universidade e empresa; (7) críticas.

A quinta e última etapa, a conclusão, refere-se à apresentação dos resultados encontrados nesta pesquisa. O objetivo dessa seção consistiu em apresentar ao leitor um panorama das ações estratégicas praticadas por algumas empresas calçadistas no que tange à inovação frugal e à sustentabilidade e permitiu estabelecer uma relação inferencial sobre o comportamento dos consumidores. Esse estudo preliminar permitiu propor uma linha de criação para um tênis frugal e sustentável. Em seguida, são apresentadas duas propostas de artefatos para inovação frugal e sustentável. Os dois artefatos são indissociáveis, uma vez que o método desenvolvido para esta pesquisa deu origem e validou um produto de inovação frugal e sustentável, e por isso são apresentados em conjunto como resultado deste estudo.

RESULTADOS

Utilizando como métrica de análise a definição de Weyrauch e Herstatt (2017Weyrauch, T., & Herstatt, C. (2017). What is frugal innovation? Three defining criteria. Journal of frugal innovation, 2(1), 1-17. https://doi.org/10.1186/s40669-016-0005-y
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) para a inovação frugal, é possível encontrar no mercado algumas marcas de empresas produtoras de calçados que parecem atender aos requisitos, em especial a marca Ötzi (2023), da cidade de Sapiranga, no Rio Grande do Sul. Em comparação com o preço mínimo médio de marcas de referência no mercado, como Adidas (2023) e Nike (2023), que vendem seus produtos em uma faixa de preço inicial de R$ 249,99, a marca Ötzi (2023), ao vender por R$ 99,90, atende aos requisitos: (1) redução substancial de custos de no mínimo 30% no preço de oferta do produto em comparação com outras marcas; (2) foco nas funcionalidades essenciais; e (3) nível otimizado de desempenho (Hossain, 2021aHossain, M. (2021a). Frugal innovation: Unveiling the uncomfortable reality. Technology in Society, 67, 101759. https://doi.org/10.1016/j.techsoc.2021.101759
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; Hossain et al., 2022; Reina et al., 2021Reina, D. R., Corradi, A. A., & Rapini, M. S. (2021). Emergence and scale-up of frugal innovations: The relevance of university-industry interaction. Journal of Technology Management & Innovation, 16(3), 3-12. https://doi.org/10.4067/S0718-27242021000300003
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; Schleinkofer et al., 2019Schleinkofer, U., Herrmann, T., Maier, I., Bauernhansl, T., Roth, D., & Spath, D. (2019). Development and evaluation of a design thinking process adapted to frugal production systems for emerging markets. Procedia Manufacturing, 39, 609-617. https://doi.org/10.1016/j.promfg.2020.01.429
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).

Outras marcas, como Olympikus (2023) e Mormaii (2023), por exemplo, também atendem a esses requisitos, mas não parecem apresentar a inovação frugal como prioridade de sua estratégia competitiva da mesma forma que a empresa Ötzi (2023) demonstra, uma vez que o seu produto descrito como tênis preto 16001 AB, vendido por R$ 99,90, faz parte do mix de produtos da empresa por mais de três anos como um dos principais produtos.

Por meio dos dados secundários, buscou-se identificar o movimento de marcas, tanto brasileiras como internacionais, em explorar de forma inovadora novos estilos e padrões de cores em seus modelos. Um exemplo a se observar é o caso do modelo da marca Vans (2020), em parceria com o museu MoMA (Museum of Modern Art), de Nova York, em que os dois pés do mesmo par de tênis não respeitam um padrão de compatibilidade nem de cores, nem de formas dos tecidos do cabedal (parte superior).

Apesar de apresentarem indícios de inovação, nenhum destes exemplos encontrados apresentou características que preenchessem todos os itens de inovação frugal propostos por Weyrauch e Herstatt (2017Weyrauch, T., & Herstatt, C. (2017). What is frugal innovation? Three defining criteria. Journal of frugal innovation, 2(1), 1-17. https://doi.org/10.1186/s40669-016-0005-y
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), especialmente no que tange ao quesito preço acessível, uma vez que não são produtos voltados para consumidores de baixa renda (Figura 2).

Uma das características apresentadas na definição da inovação frugal é a interação com os clientes, ou melhor, foco nas necessidades reais dos consumidores, uma vez que a inovação frugal busca suprir deficiências no atendimento de necessidades, principalmente de consumidores em regiões de pobreza, conforme já informado no referencial teórico.

Com base nesse entendimento, foi identificado que algumas marcas de calçados usam do engajamento por meio da exclusividade como estratégia para competir. Tal abordagem requer preocupação e conhecimento das necessidades e desejos dos clientes e requer que as empresas estejam inseridas no ambiente, seja ele físico, seja cultural, dos seus consumidores (Mulgan, 2006Mulgan, G. (2006). The process of social innovation. Innovations, 1(2), 145-162. https://doi.org/10.1162/itgg.2006.1.2.145
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; Ploeg et al., 2022Ploeg, M., Knoben, J., & Vermeulen, P. (2022). We are in it together: Communitarianism and the performance-innovation relationship. Research Policy¸ 51(5), 104507. https://doi.org/10.1016/j.respol.2022.104507
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).

DUAS PROPOSTAS DE ARTEFATOS PARA INOVAÇÃO FRUGAL E SUSTENTÁVEL

Este estudo propõe dois artefatos após a aplicação do DSR, que são: (a) uma instanciação, que se refere a um tênis colorido que usa como matéria-prima o reaproveitamento de material; (b) e um método, que é o procedimento aplicado em colaboração entre universidade e especialistas em calçados para o desenvolvimento do tênis. Optou-se por propor dois artefatos em virtude de eles estarem interligados e serem indissociáveis, uma vez que para idealizar o tênis foi necessário seguir o método apresentado. De acordo com March e Smith (1995March, S. T., & Smith, G. F. (1995). Design and natural science research on information technology. Decision Support Systems, 15(4), 251-266. https://doi.org/10.1016/0167-9236(94)00041-2
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), quando o artefato se apresenta como um objeto ou solução, ele é considerado uma instanciação. No caso deste estudo, a instanciação trata da proposta de um tênis que usa como estratégia a inovação frugal e sustentável.

Esta pesquisa considerou empresas de calçado de grande porte, com mais de 10 mil funcionários e produção diária superior a 50 mil pares de calçados para outras marcas, em um sistema de produção business to business (B2B); ou com produção de marcas próprias; ou, ainda, em uma situação híbrida de produção, que engloba os dois casos. Empresas com essas características acabam gerando sobras de materiais que seriam utilizados na produção, mas que acabam por não serem usados, gerando assim resíduos que podem ser aproveitados (bricolagem). Sob esse aspecto, segundo os entrevistados 1 e 2, “esse é um problema que normalmente as pessoas não prestam atenção nisso daí”.

A proposta do tênis é de usar em seu cabedal (que corresponde ao tecido em toda a parte superior do tênis) os tecidos que foram comprados para a produção dos calçados, mas que acabaram não sendo utilizados. Em virtude da variedade não planejada de tipos diferentes de materiais de tecido que sobram, a proposta se refere à criação de um cabedal com cores aleatórias e diferentes em todos os pares de tênis, gerando assim um trabalho de cores, originalidade e exclusividade para cada cliente. O estilo e design do modelo de tênis é padronizado, e apenas o padrão de formas e cores da estampa seria variado, gerando uma aparência de retalhos no cabedal. Esse tipo de criatividade já é estimulado pela indústria calçadista, tanto que no momento da pesquisa sobre calçado colorido, o entrevistado 3 prontamente solicitou permissão para apresentar alguns projetos que também trabalham com cores ao dizer: “… eu vou te mostrar um projeto, que é uma coisa que eu estou desenvolvendo”. Entretanto, esse projeto apresentado pelo entrevistado 3 não tinha intenção comercial, assim como a proposta desta pesquisa, mas já mostrava a capacidade de pensar de maneira criativa e da percepção de que é possível trabalhar com padrões de cores diferenciados.

A primeira justificativa para essa opção de trabalho com cores se deve à pesquisa em sites e fontes secundárias, que demonstrou a aceitação do mercado por produtos coloridos e criativos (Figura 2). A segunda justificativa se deve ao fato de que esse trabalho, ao juntar e mesclar tecidos e cores, ajuda a reduzir o custo de produção do produto. Após a realização da análise de custos por um dos especialistas de custos em calçados (especialista 3), foi possível chegar a um valor de produção próximo de R$ 70,00. Esse cálculo considerou uma empresa de grande porte registrada no lucro real e com infraestrutura de produção já estabelecida. Ao considerar os três critérios da inovação frugal - (1) redução substancial de custos; (2) foco nas funcionalidades essenciais; e (3) nível otimizado de desempenho (Weyrauch & Herstatt, 2017Weyrauch, T., & Herstatt, C. (2017). What is frugal innovation? Three defining criteria. Journal of frugal innovation, 2(1), 1-17. https://doi.org/10.1186/s40669-016-0005-y
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) -, foi possível caracterizar esse produto como uma inovação frugal.

Outra característica apresentada no referencial teórico que ajuda a caracterizar esse tênis como uma inovação frugal é o fato de utilizar sobras de materiais disponíveis na própria empresa, o que elimina a necessidade de nova aquisição, e que pode ser identificado na inovação frugal como bricolagem. Outros materiais que podem ser aproveitados são sobras de linhas para costura. O fato de o produto permitir ‘brincar’ com cores aumenta a flexibilidade de aproveitamento de materiais.

Partes do produto que precisam ser adquiridos e necessitam de investimento adicional são: a sola, os atacadores e outros componentes. Esses custos de aquisição já foram incluídos no custo de R$ 70,00. O custo calculado também incluiu mão de obra, da qual a empresa já dispõe, bem como os custos com impostos. Com um custo aproximado de R$ 70,00 (custos totais: variáveis e fixos) e aplicando uma margem de erro de cálculo de 20% (R$ 14,00), ainda assim foi possível oferecer esse produto ao mercado por um preço final de R$ 95,00, atendendo assim, portanto, a outra característica da inovação frugal, que é oferecer produtos com preço acessível a clientes da base da pirâmide social. Essa análise de viabilidade de custos se deu por meio de auxílio do especialista 3 (gerente de administração de recursos humanos e custos) e com base nas informações comparativas coletadas dos dados secundários apresentados na Figura 1. A interpretação do especialista 3 sobre essa análise foi: “… eu acho genial. Eu acho bem interessante. Porque abrange tudo isso que a gente falou até agora, né? A sustentabilidade é o uso do desperdício, aproveitamento de materiais, cuidando da natureza …”.

Ao analisar essa inovação pela perspectiva das dimensões da sustentabilidade, foi possível considerar que: o item de menor impacto (ou impacto nulo) é o ambiental, pois, por um lado, trabalha com a abordagem da conscientização para a importância de se evitarem os desperdícios, nesse caso desperdícios de grandes proporções, quando se considera o impacto de produção de uma empresa calçadista, mas, por outro lado, não estimula a redução da produção ou o incentivo ao consumismo consciente (Mulgan, 2006Mulgan, G. (2006). The process of social innovation. Innovations, 1(2), 145-162. https://doi.org/10.1162/itgg.2006.1.2.145
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; Pisoni et al., 2017Pisoni, A., Michelini, L., & Martingnoni, G. (2017). Frugal approach to innovation: State of the art and future perspectives. Journal of Cleaner Production, 171, 107-126. https://doi.org/10.1016/j.jclepro.2017.09.248
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; Radjou & Prabhu, 2015Radjou, N., & Prabhu, J. (2015). Frugal Innovation: How to do more with less. The Economist.; Schumacher, 1973Schumacher, E. F. (1973). O negócio é ser pequeno (Small is beautiful). Zahar Editores.), uma vez que a empresa está apenas reaproveitando um material que, de qualquer forma, teria sido usado para produzir produtos (calçados) de consumo. Contudo, este estudo observou a conscientização dos especialistas da indústria calçadista para o problema do desperdício e para a oportunidade (e necessidade) em se mudar essa situação, conforme a fala do especialista 5: “… tá existindo desperdício de materiais, por mau uso … por compras erradas … gerenciamento errado … é uma questão de mudança de cabeça, de pensar em soluções sustentáveis”.

O quesito social foi atendido, uma vez que a marca se propõe a oferecer um produto por preço abaixo do preço praticado por outras marcas. O preço final estabelecido é de R$ 95,00. De acordo com este estudo, esta seria a marca com o preço mais acessível do mercado analisado enquanto estratégia intencional de produto focado em um público com menor poder aquisitivo. O quesito econômico foi atendido, uma vez que ajuda as empresas a repensarem seus processos internos para a busca por soluções lucrativas e viáveis de reaproveitamento de sobras de materiais ao mesmo tempo que estimulam criatividade e inovação.

O referencial teórico apresentado por este artigo evidenciou o entendimento de que o diálogo entre a inovação frugal e a sustentabilidade precisa acontecer entre diferentes esferas na sociedade, não podendo se restringir apenas a ações governamentais (Albert, 2022Albert, M. (2022). Assessing the sustainability impacts of frugal innovation - A literature review. Journal of Cleaner Production, 365, 132754. https://doi.org/10.1016/j.jclepro.2022.132754
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; Mazzucato, 2022Mazzucato, M. (2022). Financing the green new deal. Nature Sustainability, 5(2), 93-94. https://doi.org/10.1038/s41893-021-00828-x
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; Mulgan, 2006Mulgan, G. (2006). The process of social innovation. Innovations, 1(2), 145-162. https://doi.org/10.1162/itgg.2006.1.2.145
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; Radjou & Prabhu, 2015Radjou, N., & Prabhu, J. (2015). Frugal Innovation: How to do more with less. The Economist.; Reina et al., 2021Reina, D. R., Corradi, A. A., & Rapini, M. S. (2021). Emergence and scale-up of frugal innovations: The relevance of university-industry interaction. Journal of Technology Management & Innovation, 16(3), 3-12. https://doi.org/10.4067/S0718-27242021000300003
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; Stöber et al., 2022Stöber, L. F., Sommer, D., & Ebersberger, B. (2022). The impact of frugal innovation on sustainability: A systematic literature review. International Journal of Innovation Management, 26(8), 2230002. https://doi.org/10.1142/S1363919622300021
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). As soluções buscadas e propostas pela inovação frugal em convergência com a sustentabilidade não acontecem de forma pontual e isoladas no tempo; existe a necessidade de evolução e amadurecimento para responder às novas demandas à medida que o diálogo (e as ações) entre os atuantes do processo acontece (Mazzucato, 2022; Mulgan, 2006; Radjou & Prabhu, 2015; Reina et al., 2021).

Concomitantemente ao artefato proposto na materialização de um tênis com características de frugalidade e sustentabilidade, surgiu a percepção da necessidade da continuidade deste estudo entre universidade e empresas ao longo do tempo (ao invés de ser apenas um estudo pontual). Isso, particularmente, é do interesse de todos os envolvidos neste projeto, por significar vantagem para ambos. Todos os especialistas se mostraram interessados e dispostos a interagir mais com a universidade, conforme mostra a fala do especialista 4: “Eu acho que essa interação precisa ser mais assídua”. A proposta de artefato nesse sentido se refere ao método de estudo percorrido por esta pesquisa (Tabela 4). O ponto de sugestão é o de que essas pesquisas deveriam ocorrer a cada semestre dentro de uma empresa ou em relação com diversas empresas, dando assim sequência aos estudos e à construção de soluções. O intuito é fomentar o diálogo entre a universidade e as empresas de forma continuada. Apesar da intenção de participar, o entrevistado 1 também fez uma crítica à postura das universidades brasileiras, ao afirmar: “No Brasil, de forma geral, por questões culturais e ideológicas, as universidades são entes alheios às necessidades dos atores econômicos … é como se existissem por si (alheias às necessidades dos atores econômicos) …”.

Tabela 4
Método de pesquisa prática de aplicação semestral.

Logo, a universidade responsável pelo estudo ganha na produção científica com conhecimentos em convergência com as problemáticas práticas das indústrias, enquanto as organizações ganham com a possibilidade de contar com a ajuda da universidade no fomento de ideias e soluções para seus problemas. O que se observou por meio deste estudo é que as empresas não dispõem de tempo para pensar e repensar suas práticas e processos. Torna-se difícil para as organizações acompanharem a constante mudança das teorias e das demandas sociais por soluções, principalmente no que tange às questões socioambientais.

A razão para este artigo propor dois artefatos se justifica pelo fato de eles serem indissociáveis, uma vez que para gerar o artefato tênis foi necessário percorrer o método de pesquisa aqui utilizado, método este que, uma vez concluído, gerou observações e entendimentos que levam a pensar na necessidade e importância da continuidade ao longo do tempo desse tipo de estudo com a mesma universidade e as mesmas empresas.

DISCUSSÃO DOS RESULTADOS

A última etapa proposta pelo método DSR (design science research) prevê a conclusão do processo de pesquisa com a apresentação dos resultados aos especialistas envolvidos na solução do problema, de acordo com as diretrizes de Vaishnavi e Kuechler (2021Vaishnavi, V., & Kuechler, W. (2021). Design science research in information systems. http://www.desrist.org/design-research-in-information-systems/
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).

O estudo identificou que o desperdício é um problema para as empresas, de acordo com a perspectiva de todos os sete especialistas. A resposta do especialista 3 resume a percepção de todos os outros especialistas: “Sim, o produto, o sapato, ele gera um desperdício muito grande”. No entendimento dos especialistas 1 e 2, esse é um problema com implicações mais complexas no processo de desenvolvimento e produção do produto: “É algo que normalmente as pessoas não prestam atenção … porque isso não é levado lá no projeto, quando estou desenhando o projeto”. Essa leitura do desperdício que inicia com o desenho do projeto também foi alertada pelo especialista 6: “… um desperdício de maquete … teria que ser de repente só no desenho”. Desse modo, a técnica da bricolagem se mostra como uma ferramenta útil para as empresas, e juntamente com os especialistas, revelou a necessidade de se reduzir a ocorrência de decisões e processos que geram sobras de materiais.

Desse modo, a intensidade com que a bricolagem é adotada em uma organização está diretamente ligada ao conhecimento subjetivo sobre o uso de recursos, sendo fundamental para impulsionar a inovação em produtos, negócios e estratégias da empresa (Nodari et al., 2022Nodari, C. H., Alves, K. T., Lutz, L., & Froehlich, C. (2022). Theory of constraints as a driver for frugal innovation in health. International Journal of Innovation, 10(4), 760-783. https://doi.org/10.5585/iji.v10i4.21801
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; Sarkar & Mateus, 2022Sarkar, S., & Mateus, S. (2022). Value creation using minimal resources - A meta-synthesis of frugal innovation. Technological Forecasting & Social Change, 179, 121612. https://doi.org/10.1016/j.techfore.2022.121612
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). Para Gaur et al. (2014Gaur, A., Avison, D., & Malaurent, J. (2014). Together we will find a ‘Jugaad’: Resource bricolage in the Indian mobile payments sector. AMCIS 2014 Proceedings, 2. https://aisel.aisnet.org/amcis2014/ICTGlobal/GeneralPresentations/2
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) e Beise-Zee et al. (2021Beise-Zee, R., Herstatt, C., & Tiwari, R. (2021). Guest editorial: Resource-constrained innovation and frugal engineering. IEEE Transactions on Engineering Management, 68(3), 643-652. https://doi.org/10.1109/TEM.2020.3040526
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), um nível elevado de competências interpessoais é o ponto chave para o sucesso da bricolagem nas empresas, pois permite uma ‘mentalidade colaborativa’ e network. Por sua vez, a bricolagem possibilita um processo de coevolução mútua entre empresa e bricoleur (Cunha, 2005Cunha, M. (2005). Bricolage in organizations [FEUNL Working Paper No. 474]. Social Science Research Network. https://doi.org/10.2139/ssrn.882784
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), contribuindo para mudança no paradigma preço-desempenho (Busch et al., 2018Busch, H. C., Dauth, T., Fischer, L., & Souza, M. (2018). Frugal innovation approaches to sustainable domestic energy: Two cases of solar water heating from Brazil. International. Journal of Technological Learning, Innovation and Development, 10(3-4), 231-257. https://doi.org/10.1504/IJTLID.2018.093725
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) com grande potencial para ecoinovações (Pansera & Sarkar, 2016Pansera, M., & Sarkar, S. (2016). Crafting sustainable development solutions: Frugal innovations of grassroots entrepreneurs. Sustainability, 8(1), 51. https://doi.org/10.3390/su8010051
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; Sarkar & Pansera, 2017), inovações sustentáveis e sustentabilidade ambiental (Iqbal et al., 2020Iqbal, Q., Ahmad, N. H., & Halim, H. A. (2020). How does sustainable leadership influence sustainable performance? Empirical evidence from selected ASEAN countries. Sage Open, 10(4). https://doi.org/10.1177/2158244020969394
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; Rizzo et al., 2020Rizzo., F., & Deserti., A., & Komatsu, T. (2020). Implementing social innovation in real contexts. International Journal of Knowledge-Based Development, 11(1), 45-67. https://doi.org/10.1504/IJKBD.2020.106840
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).

Adicionalmente, os estudos da inovação frugal preveem a necessidade de uma mudança de mentalidade (mindset) para esse tipo de inovação, uma vez que, por exemplo, os inovadores frugais compreendem que a inovação não precisa ser criada com investimentos elevados e pode surgir da engenhosidade e preocupação em suprir setores desatendidos da sociedade (Radjou & Prabhu, 2015Radjou, N., & Prabhu, J. (2015). Frugal Innovation: How to do more with less. The Economist.; Soni & Krishnan, 2014Soni, P., & T. Krishnan, R. (2014). Frugal innovation: Aligning theory, practice, and public policy. Journal of Indian Business Research, 6(1), 29-47. https://doi.org/10.1108/JIBR-03-2013-0025
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; Weyrauch & Herstatt, 2017Weyrauch, T., & Herstatt, C. (2017). What is frugal innovation? Three defining criteria. Journal of frugal innovation, 2(1), 1-17. https://doi.org/10.1186/s40669-016-0005-y
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).

De forma geral, todos concordam com a importância, complexidade e necessidade de se inovar, de se pensar e agir diferente nas empresas. Cada especialista, no entanto, contribuiu com uma percepção particular com o momento que cada empresa vive. Para o especialista 6, as fábricas ainda têm uma mentalidade com foco no passado e precisam evoluir no aspecto inovação. Em contrapartida, o especialista 5 não percebe problema na necessidade de mudança de mentalidade para a inovação, pois compreende que a indústria calçadista é rápida e dinâmica, o que força as empresas a serem inovadoras, caso queiram permanecer competitivas no mercado. O especialista 5 adicionou: “… o fato de as fábricas de calçados terem relação com clientes internacionais de grandes marcas, essas sim muito inovadoras, que demandam das fábricas mudanças nos processos e nos produtos”. Ainda, conforme ele: “… as fábricas que não se adaptam a essa realidade são automaticamente excluídas desse mercado que é altamente competitivo”.

O especialista 4 disse: “… nunca passei por uma empresa que teve tanta mentalidade voltada para a inovação, com setores estruturados pensados somente para a inovação”. Essa mesma realidade foi observada na visita técnica à empresa de calçados de Campo Bom-RS, que também dedica setores exclusivos para a inovação. Ambas as empresas usam uma ferramenta similar de estímulo à inovação, que é uma área da empresa com arquivos de peças de calçados e materiais que possam ser consultados para estimular a inovação. Ou seja, existe um espaço de criatividade que transmite aos funcionários a mensagem de que a empresa incentiva a inovação, de acordo com observações realizadas na empresa.

O especialista 1 trouxe a perspectiva de que “… a inovação não exige uma mudança de mentalidade somente por parte da liderança”. Segundo ele, frequentemente, as pessoas reclamam da falta de abertura por parte da liderança para ouvir propostas inovadoras, mas o problema reside na forma como as ideias são apresentadas. Nas palavras do especialista 1: “É preciso que a proposta de inovação seja bem apresentada por quem tem a ideia … Eu tenho uma proposta de inovação, eu preciso desenhá-la”. De acordo com ele, é preciso tornar os ganhos visíveis ou como a empresa pode deixar de perder dinheiro.

A literatura sobre a inovação frugal mostra que ela ocorre a partir da percepção das necessidades dos clientes que não são atendidas, principalmente daqueles em situação de pobreza e precariedade (De Marchi et al., 2022De Marchi, V., Pineda-Escobar, M. A., Howell, R., Verheij, M., & Knorringa, P. (2022). Frugal innovation and sustainability outcomes: Findings from a systematic literature review. European Journal of Innovation Management, 25(6), 984-1007. https://doi.org/10.1108/EJIM-02-2022-0083
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; Radjou & Prabhu, 2015Radjou, N., & Prabhu, J. (2015). Frugal Innovation: How to do more with less. The Economist.; Sheikh et al., 2023Sheikh, F. A., Pugh, R., Wu, X., & Sarkar, S. (2023). Regional studies and frugal innovation: A missing link?. Regional Studies, 1-13. https://doi.org/10.1080/00343404.2023.2222136
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; Weyrauch & Herstatt, 2017Weyrauch, T., & Herstatt, C. (2017). What is frugal innovation? Three defining criteria. Journal of frugal innovation, 2(1), 1-17. https://doi.org/10.1186/s40669-016-0005-y
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). Das entrevistas com os especialistas, foi possível observar que nenhum deles trabalha para empresas que tenham como estratégia um produto no portfólio com o foco em atender as necessidades da base da pirâmide. Mesmo assim, os especialistas 3 e 6 revelaram estratégias voltadas para clientes como, por exemplo, tênis desenvolvidos com foco no conforto e desenvolvimento, do pé de crianças, no caso de uma marca infantil, e de um trabalho voltado para pessoas com deficiência, e que precisam de calçados com características específicas.

Para o especialista 1, “… a empresa quer saber como ela pode ganhar dinheiro com alguma inovação. Ela não vai investir em algo que não possa mostrar essa possibilidade”. Essa observação revela um impasse complexo de solucionar, uma vez que de um lado tem-se a perspectiva de produzir produtos que proporcionam lucro para as empresas, em detrimento do que as pessoas de fato precisam, e por outro lado, tem-se uma classe social desassistida e que economicamente pode não representar interesse comercial para as empresas.

Todavia, o impasse lógico não fica nesses dois pontos contraditórios, mas em um terceiro complicador que é introduzido quando se pensa nos desafios da sustentabilidade, que não necessariamente representa uma perspectiva de somente lucro para as empresas, mas que definitivamente se mostra como problemas sociais e ambientais a serem enfrentados pelas empresas. Com isso, questiona-se: qual o verdadeiro objetivo de as empresas existirem? Gerar apenas lucros? Ou atender, também, às necessidades socioambientais?

A inovação frugal pensada para a sustentabilidade parece oferecer uma via de diálogo que inicia um debate que leva em conta as demandas das empresas e da sociedade com relação a essas problemáticas, e essa parece ser uma evidência importante para os estudos em inovação frugal. Os entrevistados foram questionados sobre como percebem a potencialidade da inovação frugal. Apesar da crítica e racionalidade do especialista 1 quanto ao objetivo central das empresas em obter lucro, ele também revelou o fato de já ter trabalhado para uma empresa que desenvolveu, há trinta anos, um tênis com características muito similares a essas apresentadas neste estudo. Segundo suas palavras, “não era um campeão de vendas, mas teve boa aceitação”.

Os especialistas parecem compreender que este não é simplesmente um estudo voltado para a redução de custos, que é um ponto de alto interesse das empresas, mas que vai além, ao propor repensar a inovação e os potenciais da inovação frugal para as empresas e para a sociedade. Todos os especialistas avaliaram o projeto (artefato) como viável, não só no sentido do produto que foi projetado, mas com relação à mentalidade que esse tipo de projeto desperta nos empresários. Da mesma forma, todos os especialistas demonstraram interesse e engajamento em contribuir para a construção deste estudo, o que revela não apenas em palavras, mas também em ação, uma abertura por parte da indústria calçadista para inovar e disposta a compreender e aplicar a inovação frugal.

Todos os especialistas consideram a sustentabilidade um tema fundamental para as empresas de calçado. Em um primeiro momento, essa é uma percepção por parte dos especialistas que surge da cobrança sofrida pelas empresas, por parte do governo e dos clientes, no que tange às questões de sustentabilidade. Nesse sentido, o especialista 1 aponta: “É uma necessidade, médias e grandes empresas não têm outra opção, hoje isso se tornou fundamental”. O especialista 4 relatou situações em que os clientes, no meio de uma visita à empresa, interromperam o diálogo para se certificar de que a empresa cumpre com os requerimentos legais de sustentabilidade, caso contrário, não seria possível continuar as atividades comerciais. Apenas o especialista 5 identificou que algumas empresas buscam ações de sustentabilidade por acreditarem no ideal intrínseco dos movimentos ambientais. O especialista 6 considera que os movimentos em busca da sustentabilidade ainda são incipientes.

Ao longo desta pesquisa, que tinha como foco o desenvolvimento do artefato tênis colorido, percebeu-se a relevância e a importância deste estudo, principalmente no que tange à proximidade de relação entre a universidade e as empresas. Identificou-se, portanto, a necessidade de dar continuidade a este tipo de pesquisa ao longo do tempo, ao contrário de um estudo apenas pontual ou de apenas um semestre. Essa constatação também é apontada pela literatura de inovação frugal (Reina et al., 2021Reina, D. R., Corradi, A. A., & Rapini, M. S. (2021). Emergence and scale-up of frugal innovations: The relevance of university-industry interaction. Journal of Technology Management & Innovation, 16(3), 3-12. https://doi.org/10.4067/S0718-27242021000300003
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).

Os especialistas 1 e 5 demonstraram sua insatisfação com o fato de perceberem um distanciamento entre o trabalho que as empresas desenvolvem e os estudos que as universidades elaboram. Isso reforça a compreensão de que parece haver a necessidade de um trabalho de proximidade da universidade com as empresas. Os especialistas 3, 4 e 6 demonstraram motivação e interesse por um projeto nesse sentido. Vale destacar a resposta do especialista 3: “Na minha opinião, a interação entre universidades e empresas poderia beneficiar ambas as partes …”; e ainda: “… As empresas geralmente enfrentam desafios e problemas complexos que podem se beneficiar da experiência e conhecimento das universidades”.

No caso da presente pesquisa, essa proposta é ainda mais significativa pelo fato de a própria universidade dispor do Museu Nacional do Calçado, com um acervo de mais de 45 mil peças, e que tem por objetivo preservar e valorizar a história da produção industrial de calçados da região (Museu Nacional do Calçado, 2023). Esse fato demonstra a preocupação e valorização da universidade com relação ao trabalho da indústria calçadista, ao mesmo tempo que revela o interesse em colaborar por parte das empresas, uma vez que o museu conta com a doação de diversos itens de seu acervo por parte das empresas e dos empresários.

Todos os especialistas reforçaram a sua compreensão de que os dois artefatos propostos têm aplicabilidade, tanto no quesito criação de um tênis frugal e sustentável quanto na relação entre empresas e universidade. Os especialistas aproveitaram a oportunidade para propor outras ideias que poderiam ser exploradas ao longo de outros estudos. Essa atitude de participação e motivação por parte dos especialistas demonstra, mais uma vez, o interesse por parte das empresas em participar de ações de inovação e de interagir com diferentes atores sociais (nesse caso, a universidade) na busca por soluções lucrativas e educacionais. As palavras do especialista 4 sintetizam a observação dos demais especialistas quando disse: “Eu acho que é uma ótima ideia. Acho que demorou para a gente ter uma ideia dessas”.

Para o especialista 6, que é designer pleno de calçados, a ideia de um tênis muito colorido para um conceito frugal pode não ser uma boa estratégia. Segundo ele, um potencial público de produtos frugais não está disposto a comprar produtos “tão inovadores”. Para o especialista, ideias que focam na criatividade exploratória têm mais chances de sucesso com públicos em condição econômica mais elevada. Essa percepção do especialista 6 se confirma quando se analisa o estudo secundário apresentado na análise das marcas apresentadas neste artigo com calçados no Instagram. As marcas de produtos mais coloridas, e mais sustentáveis, eram também as mais caras.

Ainda para o especialista 6, é preciso levar em conta as características econômicas de um público de produtos frugais, que provavelmente resida em locais de pouca infraestrutura, inclusive de pavimentação de ruas, ou seja, em um caso desses, esse público evitaria comprar tênis brancos, pois sujariam com muita facilidade. Como crítica por parte dos outros especialistas, foi apontada a necessidade de um tênis frugal e sustentável, como o proposto, ter um plano de desenvolvimento de produto com uma visão clara de quem será o cliente final, ou seja, o consumidor de fato do produto proposto.

Portanto, apesar da ressalva do especialista 6, a questão fundamental, na atualidade, passa a ser como gerar e distribuir conhecimentos, regulamentações flexíveis, diversidade tecnológica, bem como aumentar a capacidade de aprendizagem sobre os impactos dessas inovações, de forma a preveni-los, dando suporte à transição para as dimensões da sustentabilidade (Brem & Ivens, 2013Brem, A., & Ivens, B. (2013). Do frugal and reverse innovation foster sustainability? Introduction of a conceptual framework. Journal of Technology Management for Growing Economies, 4(2), 31-50. https://doi.org/10.15415/jtmge.2013.42006
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; Silva et al., 2022Silva, F., Nodari, C. H., & Chaym, C. D. (2022, November). Construindo a ponte entre a inovação frugal e sustentabilidade: Uma revisão sistemática de literatura. Anais do XXV Seminários em Administração. São Paulo, SP, Brasil.). Neste contexto, a responsabilidade de assegurar a sustentabilidade recai em grande parte sobre as empresas, por serem consideradas as maiores geradoras de impactos ambientais em diferentes níveis, dependendo de suas atividades produtivas e da intensidade de uso de energia e recursos naturais, assim como pelo consumo de bens e serviços que produzem e vendem, crescente em massa. Estas empresas têm papel fundamental no desenvolvimento, difusão e adoção de tecnologias sustentáveis que se direcionem para o novo padrão (Agarwal et al., 2021Agarwal, N., Oehler, J., & Brem, A. (2021). Constraint-based thinking: A structured approach for developing frugal innovations. IEEE Transactions on Engineering Management, 68(3), 739-751. https://doi.org/10.1109/TEM.2020.3042929
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; Brem & Wolfram, 2014).

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O artigo teve como objetivo analisar de que forma a inovação frugal pode ser aplicada alinhada aos princípios da sustentabilidade em empresas de calçados. Foi possível identificar duas possibilidades de artefatos: um tênis frugal e sustentável; e um método de estudo em parceria entre universidade e empresas ao longo do tempo (ao invés de estudos pontuais).

Foi constatado que o problema de sobras de materiais na produção é causado por falta de comunicação entre setores e cadeia produtiva, pois os responsáveis pelos setores não param para pensar em soluções (inovações frugais) que promovam, inclusive, a sustentabilidade. Por outro lado, a pesquisa identificou o interesse e engajamento de representantes (especialistas) das empresas calçadistas em tentar encontrar soluções inovadoras, o que demonstra que existe interesse e abertura para novos estudos.

A proposta do tênis frugal e sustentável e a proposta de continuação de um projeto duradouro de pesquisa entre universidade e empresas foram planejadas e foram validadas com os especialistas, mas não tiveram tempo viável para a análise prática, portanto, sua aplicabilidade ainda precisa ser testada e implementada. Com efeito, os resultados mostram que as inovações frugais têm um potencial de transformação sustentável que deve ser observado. Os processos de desenvolvimento e difusão das inovações podem servir como elo de aproximação entre empresas e universidades e/ou centros de tecnologia, pesquisa e inovação, e de forma dialógica, conseguir articular os conhecimentos técnico-científicos e pesquisadores ao conhecimento tácito das organizações a outras epistemes, de onde surge, por exemplo, a gambiarra como um produto da capacidade e criatividade inovativa brasileira. Além disso, a proposta da pesquisa permitiu identificar como as empresas podem aprimorar seus processos internos e desenvolver novas soluções frugais para reduzir os riscos potenciais inerentes à produção. Dessa forma, uma contribuição prática desta pesquisa é a divulgação desta inovação frugal para a comunidade acadêmica, formuladores de políticas e, principalmente, para o setor calçadista proporcionando a difusão destas inovações e, por conseguinte, promovendo o desenvolvimento sustentável das regiões produtoras a partir dos resultados da pesquisa.

Uma das limitações do estudo é o fato de ele ter durado o período de menos de um semestre, sendo que uma das constatações da pesquisa foi a de que tanto universidade quanto empresas se beneficiariam com um projeto de trabalho duradouro ao longo do tempo.

A sugestão para pesquisas futuras é aplicar as propostas construídas nesta pesquisa e avaliar os resultados no setor calçadista, que pode ser estendido para outras indústrias e universidades. Sugere-se uma pesquisa com os potenciais consumidores deste tipo de produto para verificar o atendimento das necessidades e adequações necessárias. Além disso, poderia ser desenvolvida uma pesquisa sobre cocriação de valor e inovação frugal para identificar de que forma os diversos atores sociais poderiam contribuir e construir de forma colaborativa um produto oriundo de sobras de materiais de acordo com as necessidades e princípios da sustentabilidade.

Agradecimentos

Os autores agradecem ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq, Brasil), pelo apoio recebido na realização da pesquisa.

REFERENCES

  • Classificação JEL:

    M10
  • Relatório de Revisão por Pares:

    A disponibilização do Relatório de Revisão por Pares não foi autorizada pelos revisores.
  • Método de Revisão por Pares

    Este conteúdo foi avaliado utilizando o processo de revisão por pares duplo-cego (double-blind peer-review). A divulgação das informações dos pareceristas constantes na primeira página e do Relatório de Revisão por Pares (Peer Review Report) é feita somente após a conclusão do processo avaliativo, e com o consentimento voluntário dos respectivos pareceristas e autores.
  • Verificação de Plágio

    A RAC mantém a prática de submeter todos os documentos aprovados para publicação à verificação de plágio, mediante o emprego de ferramentas específicas, e.g.: iThenticate.
  • Disponibilidade dos Dados

    Os autores afirmam que todos os dados utilizados na pesquisa foram disponibilizados publicamente, e podem ser acessados por meio da plataforma Harvard Dataverse:
    Spech, Ismael; Froehlich, Cristiane; Bondan, Juliana; Nodari, Cristine Hermann, 2024, "Replication Data for: "Frugal Innovation and Sustainability in the Footwear Sector" published by RAC-Revista de Administração Contemporânea, Harvard Dataverse, V1.
    A RAC incentiva o compartilhamento de dados mas, por observância a ditames éticos, não demanda a divulgação de qualquer meio de identificação de sujeitos de pesquisa, preservando a privacidade dos sujeitos de pesquisa. A prática de open data é viabilizar a reproducibilidade de resultados, e assegurar a irrestrita transparência dos resultados da pesquisa publicada, sem que seja demandada a identidade de sujeitos de pesquisa.
  • 1

    # de revisores convidados até a decisão:

Editado por

Editores-chefes:

Marcelo de Souza Bispo (Universidade Federal da Paraíba, PPGA, Brasil) https://orcid.org/0000-0002-5817-8907
Paula Chimenti (Universidade Federal do Rio de Janeiro, COPPEAD, Brasil) https://orcid.org/0000-0002-6492-4072

Disponibilidade de dados

Os autores afirmam que todos os dados utilizados na pesquisa foram disponibilizados publicamente, e podem ser acessados por meio da plataforma Harvard Dataverse:

Spech, Ismael; Froehlich, Cristiane; Bondan, Juliana; Nodari, Cristine Hermann, 2024, "Replication Data for: "Frugal Innovation and Sustainability in the Footwear Sector" published by RAC-Revista de Administração Contemporânea, Harvard Dataverse, V1.

https://doi.org/10.7910/DVN/E6SQEA

A RAC incentiva o compartilhamento de dados mas, por observância a ditames éticos, não demanda a divulgação de qualquer meio de identificação de sujeitos de pesquisa, preservando a privacidade dos sujeitos de pesquisa. A prática de open data é viabilizar a reproducibilidade de resultados, e assegurar a irrestrita transparência dos resultados da pesquisa publicada, sem que seja demandada a identidade de sujeitos de pesquisa.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    19 Ago 2024
  • Data do Fascículo
    2024

Histórico

  • Recebido
    13 Out 2023
  • Revisado
    13 Mar 2024
  • Aceito
    07 Maio 2024
  • Publicado
    27 Maio 2024
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