RESUMO
Objetivo: analisar a constituição identitária de mulheres inseridas na política brasileira perante um cenário de micro e macroagressões.
Marco teórico: teoria da identidade, em que se define a identidade como um conceito autorreflexivo que permite a um indivíduo conhecer e compreender a si mesmo em meio às especificidades culturais, sociais e organizacionais.
Método: estudo qualitativo básico realizado com o auxílio de entrevistas semiestruturadas concedidas por mulheres inseridas em organizações do Poder Legislativo brasileiro e análise de conteúdo.
Resultados: os principais resultados demonstraram que a identidade de mulheres atuantes na política forma-se gradativamente, contudo, essa construção é permeada por tentativas de invalidações desde a intenção de candidatura. As invalidações por meio de microagressões perpassam o contexto organizacional e, por estarem presentes em maior escala, destacam o que se pontua como macroagressões.
Conclusões: O estudo contribui à literatura ao propor o conceito de macroagressões. Já em termos práticos, traz como contribuição discussões voltadas ao ODS 5 e à necessidade de uma maior inserção feminina em organizações da política brasileira.
Palavras-chave: mulheres; política; identidade; microagressões; macroagressões
ABSTRACT
Objective: analyze the identity constitution of women who have entered politics in Brazil, in the face of a scenario of micro and macroaggressions.
Theoretical approach: identity theory, in which identity is defined as a self-reflexive concept that allows individuals to know and understand themselves in the midst of cultural, social, and organizational specificities.
Method: basic qualitative study carried out with assistance of semi-structured interviews content analysis.
Results: the main results showed that the identity of women active in politics is gradually formed; however, this construction is permeated by attempts of invalidations since the intention of candidacy. The invalidations through microaggressions permeate the organizational context and, because they are present on a larger scale, they highlight what is pointed out as macroaggressions.
Conclusions: this study contributes to the literature by proposing the concept of macroaggressions. In practical terms, this study brings as a contribution a discussion focused on SDG 5 and the need for a greater female insertion in Brazilian political organizations.
Keywords: women; politics; identity; microaggressions; macroaggressions
INTRODUÇÃO
As mulheres estão cada vez mais inseridas em organizações, contudo, sua atuação em diversos setores ainda é permeada por adversidades devido a preconceitos e discriminações relacionados à atuação feminina, principalmente quando mulheres ocupam posições e cargos de liderança. Conforme pontua Basabe-Serrano (2020), um dos setores em que as mulheres são mais excluídas é o da esfera política.
Em todo o mundo, a participação feminina na política é inferior à masculina (Romero & Kerstenetzky, 2015), o que pode ser justificado pelo fato de as mulheres enfrentarem uma série de desafios que, comumente, não são enfrentados por homens. Ademais, por muitas vezes os partidos são mais responsivos às preferências de homens do que de mulheres em suas atuações e até mesmo em relação aos recursos distribuídos (Homola, 2019). Nesse contexto, dados do último ranking de representatividade feminina em congressos apontam que o Brasil, dentre 235 países pesquisados, ocupa a 146ª posição, demonstrando a necessidade de evolução nesse cenário (Inter-Parliamentary Union, 2022).
A sub-representação de mulheres em determinadas organizações pode trazer consigo uma série de consequências, interferindo inclusive em suas identidades e identificações com as atividades desenvolvidas. Compreende-se neste artigo a identidade como “o processo de construção de significado com base em um atributo cultural, ou ainda um conjunto de atributos culturais inter-relacionados, o(s) qual(ais) prevalece(m) sobre outras fontes de significado” (Castells, 2018, p. 58). Ressalta-se que nesse processo de construção, as interações sociais são um dos elementos de maior relevância (Berger & Luckmann, 2007; Caldas & Wood Jr., 1997; Fernandes et al., 2010).
Diante dessa perspectiva e considerando os inúmeros desafios enfrentados por mulheres que conseguiram se inserir em organizações que compõem a política brasileira, bem como o fato de esta instituição ser predominantemente masculina, esta pesquisa tem por objetivo analisar a constituição identitária de mulheres que se inseriram na política no Brasil, perante um cenário de micro e macroinvalidações.
Neste estudo, as microagressões são entendidas como formas de preconceitos, discriminações e insultos a determinados atores (Nair et al., 2019) e, quando atreladas às identidades, dividem-se em três formas: microassaltos, microinsultos e microinvalidações, caracterizando-se como formas sutis de dirimir a identidade destes em determinados contextos (Sue, 2010). Perante de tal concepção, propõe-se neste estudo o conceito de macroagressões que, diferentemente das microagressões, podem ser vistas em maior escala, principalmente quando se analisa um contexto macro, como, por exemplo, o nível nacional. As macroagressões abrangem tentativas de macroinvalidações partilhadas por uma grande parcela da população, como o próprio preconceito e a retração da população de um país à participação de mulheres na política.
Com auxílio da estratégia de estudo qualitativo básico (Merriam, 2009), foram realizadas entrevistas semiestruturadas com 16 mulheres inseridas em organizações da política brasileira, em específico em Assembleias Legislativas e/ou Câmaras de Vereadores e que, no momento das entrevistas, atuavam como vereadoras ou deputadas estaduais. Nas entrevistas, as participantes da pesquisa relataram suas trajetórias desde a pré-candidatura até o momento em que as entrevistas foram realizadas. A análise, feita por meio da análise de conteúdo, pautou-se em dois períodos: (a) o referente à construção identitária como mulher na política brasileira e às microagressões sofridas; e (b) o voltado ao momento em que as microagressões se interligam às macroinvalidações.
Os principais resultados demonstraram que a identidade dessas mulheres enquanto atuantes na política se forma gradativamente à medida que conquistam seus espaços e desenvolvem experiências neste cenário. Essa construção é permeada por tentativas de invalidações desde a intenção de candidatura. Foi possível perceber que as microagressões, ao contrário do que a literatura aponta e do que se esperava encontrar, agravavam-se à medida que tais mulheres alcançaram os cargos almejados e atingiam maior destaque nas organizações de suas atuações, que são Assembleias Legislativas e Câmaras de Vereadores. O fato trouxe à discussão as macroagressões e o seu destaque em tal cenário, caracterizando uma das contribuições deste estudo.
FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA
Identidade, microagressões e macroagressões
Pontuada, muitas vezes, como “a história que o sujeito contaria de si” (Fernandes et al., 2010, p. 37), uma identidade pode ser entendida como “o processo de construção de significado com base em um atributo cultural, ou ainda um conjunto de atributos culturais inter-relacionados, o(s) qual(ais) prevalece(m) sobre outras fontes de significado” (Castells, 2018, p. 58). Trata-se, pois, de um elemento de notável relevância por preencher lacunas existentes na vivência de um indivíduo, cujos aspectos referem-se à cultura e aos grupos dos quais este possa fazer parte (Caldas & Wood Jr., 1997).
A identidade constitui-se da atividade humana, especialmente por meio da linguagem e de símbolos compartilhados (Caldas & Wood Jr., 1997) e, por se tratar de um aspecto importante na vida das pessoas, é a responsável por permitir uma melhor compreensão das práticas tanto singulares como coletivas (Brown, 2020; Machado, 2003).
Uma identidade nunca é algo dado, o que se tem é sua contínua construção (Brown, 2019; Dubar, 2005). Sua formação ocorre, principalmente, devido à existência de processos de identificação que permitem ao indivíduo desenvolver a assimilação de aspectos ou atributos com os quais entra em contato, desenvolvendo percepções sobre si e sobre aqueles com quem convive, estabelecendo vínculos e constituindo a sua personalidade que, por consequência, reforçam a sua conduta quando inserido em um grupo específico (Freitas, 2005; Laplanche & Pontalis, 2001).
Entende-se que a construção identitária ocorre de forma gradativa, adaptando-se ao contexto relacional no qual o indivíduo se insere, sendo proporcional ao período e à sua fase da vida (Saraiva & Duarte, 2010). Quando, porém, trata-se de grupos minoritários em determinados ambientes, uma identidade pode sofrer o que é delineado por microagressão. Conforme exposto por Nair et al. (2019), as microagressões, quando não voltadas especificamente a uma identidade, denotam formas sutis de preconceitos, discriminações ou insultos.
O termo ‘microagressões’ foi cunhado nos anos 1970, referindo-se a “trocas sutis, atordoantes, muitas vezes automáticas e não verbais que se constituem em humilhações” (Pierce et al., 1977, p. 65). Os estudos iniciais a seu respeito tinham por foco questões voltadas ao racismo (Sue et al., 2007), contudo, Nair et al. (2019) apontam que o escopo do estudo a respeito das microagressões aumentou e, atualmente, são discutidas as implicações à identidade dos indivíduos e grupos acometidos.
Sue (2010) classifica as microagressões em três formas distintas: microassaltos (microassaults), microinsultos e microinvalidações. Os microassaltos são atitudes, crenças ou comportamentos conscientes, deliberados, sutis e explícitos a gênero, raça e sexo por meio de atitudes, crenças ou comportamentos tendenciosos, geralmente verbalizados. Os microassaltos geralmente têm por foco o ataque intencional à identidade grupal de uma pessoa e, apesar de compartilharem de características voltadas a preconceito e discriminação, devido à forte condenação pública desses tipos de comportamento, os microassaltos somente são expressos em condições que proporcionem ao perpetrador alguma forma de proteção.
Os microinsultos, por sua vez, são caracterizados por comunicações interpessoais ou ambientais que transmitem estereótipos, rudeza e insensibilidade à identidade racial, de gênero ou sexual de uma pessoa. Costumam se expressar por meio de insultos e representam desfeitas sutis, frequentemente fora da consciência do perpetrador, mas que transmitem mensagens ofensivas aos seus recipientes (Sue, 2010).
Por fim, as microinvalidações são comunicações ou ‘pistas ambientais’ que excluem, negam ou anulam pensamentos, sentimentos ou a realidade experienciada por certos grupos. Ocorrem de forma inconsciente, contudo, representam o tipo mais prejudicial das três microagressões por se darem de forma insidiosa e menos ‘clara’. Devido à sua ‘invisibilidade’, muitas vezes não são reconhecidas por quem as executa e por quem sofre as suas consequências (Sue, 2010). De acordo com Sue (2010), é essa característica que destaca sua força e que a torna algo poderoso no contexto organizacional e social. Nair et al. (2019) apontam como exemplo de microinvalidação a atribuição de pronome masculino a grupos que possuam participantes dos dois gêneros, e destacam que com sua existência as identidades de tais minorias passam a ser marginalizadas. Compreende-se que, de forma geral, as trocas provindas das microagressões, independentemente de suas vertentes, são tão difundidas e automáticas em meio às interações diárias que, muitas vezes, são até mesmo descartadas ou ofuscadas (Sue et al., 2007).
Sugere-se, neste artigo, que ao se considerar um ambiente macro, não se deva desconsiderar a existência, muitas vezes não tão sutil, de tais agressões. Assim, com a junção de tais aspectos, têm-se o que aqui se propõe como macroagressões que, em um contexto voltado à identidade, são agressões relacionadas à raça, cultura, gênero, entre outros, porém em maior escala, na tentativa de invalidar as identidades inseridas nesses cenários. Dessa maneira, o conceito de macroagressões utilizado neste estudo atrela-se às pressões e agressões advindas de uma sociedade patriarcalista sobre a identidade de mulheres. No caso em análise, as macroagressões têm por foco as mulheres inseridas em organizações do sistema político brasileiro, contudo, não se desconsidera a sua existência em outros ambientes organizacionais e até mesmo sociais.
Pontua-se que as macroagressões, mesmo as presentes em um cenário organizacional, são provindas da sociedade em geral. Se em circunstâncias características de microagressões os eventos resultantes davam-se de forma majoritariamente velada, em macroagressões tem-se o oposto, especialmente com o advento das tecnologias que permitem às pessoas o pronunciamento de suas expressões de ódio sem ‘receios’ ou ‘barreiras’.
As macroagressões não são veladas e, geralmente, manifestam-se por mensagens agressivas, como ocorrido nas eleições de 2018 e 2020 no Brasil, por meio de expressões de ódio às mulheres candidatas a cargos políticos, nas redes sociais e ações vindas, depois de eleitas, de seus próprios colegas. Tais agressões também se perpetuam por meio de insultos à aparência pessoal, formas ostensivas de humilhação que visam a ferir a identidade e autoestima de quem as sofre, dentre outras formas que aqui são elucidadas e que possuem o foco de impedir a constituição identitária de mulheres em contextos que não os tradicionalmente e culturalmente preestabelecidos. As macroagressões podem refletir a cultura patriarcalista de um país, a exemplo do que se visualiza no Brasil e é aqui debatido. A seguir, expõe-se um quadro-síntese (Tabela 1) com o propósito de diferenciar o que a literatura indica como microagressões do conceito de macroagressões aqui elucidado e proposto.
Entende-se que tanto as micro como as macroagressões são induzidas pela violência de gênero, uma vez que, conforme destaca por Bandeira (2014), esse tipo de violência ocorre motivado por expressões de desigualdades baseadas na condição do sexo, iniciadas, muitas vezes, no universo familiar, onde as relações de gênero constituem o protótipo de relações hierárquicas. Em seu levantamento bibliométrico sobre trabalhos acadêmicos que abordassem a mulher no campo da administração, Souza et al. (2021) discutem inclusive o fato de que muitas vezes, os próprios trabalhos acadêmicos naturalizam tal papel sem problematizá-lo. Neste escopo, é relevante salientar que mulheres que atuam em organizações sofrem com tais aspectos diariamente, sendo então importante discutir os motivos pelos quais opiniões e comportamentos desfavoráveis expressos de forma hostil, injusta e infundada influenciam o cotidiano não somente de organizações, mas da própria sociedade.
Assim, a próxima seção é dedicada ao contexto das mulheres na política, que constitui o campo empírico deste estudo.
Mulheres na política
Discutir a participação feminina requer o conhecimento de que quase nenhum país do mundo possui 50% ou mais de mulheres em suas Casas Legislativas (Paxton & Kunovich, 2003; Sacchet, 2018). Desde o início das democracias, as mulheres foram desencorajadas a participar do espaço político, pois quando a cultura política é colocada em discussão, existe a percepção de que o poder é algo voltado exclusivamente aos homens (Araújo, 2010; Karawejczyk, 2013; Pinto & Silveira, 2018; Tosi, 2016).
Historicamente, a política sempre foi considerada um ambiente de predominância masculina, uma vez que o exercício da cidadania somente era concedido a alguns homens selecionados de acordo com características sociais, como, por exemplo: condição financeira, status social, raça, dentre outros aspectos que ressaltavam o voto enquanto privilégio (Tosi, 2016). Como resultado de sua fundação, há uma mínima participação tanto de mulheres quanto de indivíduos marginalizados em organizações que compõem o sistema político e, conforme discutido por Paxton e Kunovich (2003), essa baixa taxa de participação, especialmente em relação às mulheres nos níveis mais altos da política, é um problema duradouro relacionado a essa estratificação existente no setor.
Outro fator que justifica a sub-representação de mulheres relaciona-se aos estereótipos de mulheres em posições de liderança. A existência de estereótipos de gênero acaba interferindo no desenvolvimento de uma melhor compreensão acerca do real papel da mulher na sociedade, bem como em suas competências ao atuarem na vida pública (Biroli, 2010). Os estereótipos ou estigmas voltados à figura feminina dentro do campo da política caracterizam manifestações do tradicionalismo de gênero, que se voltam a um conjunto arraigado de crenças sobre quais atributos são considerados ‘mais adequados’ social, política e culturalmente (Matos, 2020). Há, na literatura, indícios sobre o tema, os quais mostram que a própria população espera de candidatas mulheres padrões mais rigorosos quanto às suas posturas e qualificações, cujas exigências, de certa forma, limitam a execução de suas atividades. Percebe-se que essa limitação é imposta por meio de diversas barreiras às mulheres, pois tanto o mundo do poder quanto o da política não são paritários em termos de reconhecimento, determinando, dentre outras consequências, não somente a falta de apoio eleitoral por parte da população, mas também a má distribuição de recursos econômicos e o menor acesso a recursos partidários e às doações privadas (Bauer, 2020; Biroli, 2010; Pinto & Silveira, 2018; Schneider & Bos, 2014). O exposto traz à discussão que a forma como as mulheres são definidas na política carrega elementos voltados a como também são tratadas e vistas em demais áreas da vida social (Biroli, 2016). Para a autora:
"A violência política se manifesta como agressões e constrangimentos físicos, sexuais, psicológicos, simbólicos e econômicos que intimidam as mulheres na política, oneram suas carreiras e, em alguns casos, colocam em risco sua integridade física e suas vidas. Sua dimensão simbólica está relacionada à reafirmação dos papéis sexuais convencionais em ambientes políticos e sociais em transformação" (Biroli, 2016, p. 585)
Algumas pesquisas, contudo, demonstram que o gênero dos representantes políticos tem consequências importantes na formulação das políticas (Beaman et al., 2009; Grant et al., 2018). Na tentativa de reverter tal diferença, muitos países modificaram as suas constituições, leis eleitorais, ou os formatos dos partidos, adotando regras ou cotas à participação feminina (Hughes et al., 2019). De acordo com Krook (2009), as origens de muitas dessas políticas são resultantes da IV Conferência Mundial sobre a Mulher, realizada pela Organização das Nações Unidas (ONU), em Pequim, no ano de 1995. Sacchet (2018)aponta que as cotas são os mecanismos mais utilizados para tentativas de diminuir a discrepância no setor. A ideia central por trás de tais parcelas é assegurar o recrutamento de mulheres para o sistema político e tentar, de alguma forma, incentivar uma maior participação (Institute for Democracy and Electoral Assistance, 2018; Tribunal Superior Eleitoral, 2018a).
No Brasil, a instituição de cotas ocorreu por intermédio da Lei n. 9.504, de 30 de setembro de 1997, denominada Lei de Cotas (Lei n. 9.504, 1997), que definiu que o percentual de mulheres estaria na lista de potenciais candidaturas. Como a lei não abrangia as quantidades finais de mulheres candidatas, em 2009 alterações foram realizadas pela Lei n. 12.034 (2009) que, dessa vez, tornou obrigatório o preenchimento da candidatura com mulheres. Apesar de a nova lei trazer maiores restrições, ainda havia brechas que potencializavam a existência de candidaturas ‘laranja’. Foi em 2015, com a Lei n. 13.165 (2015), que os partidos passaram a ter que comprometer, no mínimo, 5% de seus recursos de campanha e 15% dos recursos do Fundo Partidário às candidaturas de mulheres. Por fim, no ano de 2022 com a Emenda Constitucional n. 117, os partidos políticos, além de cumprirem as cotas, tiveram que reservar ao menos 30% dos recursos provindos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha para financiar as candidaturas femininas. Além disso, a emenda também delineou que o mesmo percentual deveria ser considerado em relação ao tempo destinado à propaganda eleitoral gratuita no rádio e na TV (Emenda Constitucional n. 117, 2022).
Essas alterações, somadas a um maior acesso à educação, a oportunidades profissionais, leis que criminalizam a violência contra mulheres e uma participação política mais qualificada (Biroli, 2016), possibilitaram um aumento expressivo no número de mulheres candidatas a cargos políticos. Entretanto, mesmo assim, o contingente de mulheres eleitas ainda é muito baixo (Agência Senado, 2020). Apesar de existir uma sub-representação feminina, é importante ter-se em mente que isso não significa que as mulheres brasileiras não estejam envolvidas ativamente na política (Biroli, 2016). Krook (2009) aponta que, embora a instituição de cotas tenha por motivação o empoderamento de mulheres, elas também possuem uma dimensão pragmática, uma vez que são percebidas não como sendo o ideal, mas talvez, um dos poucos meios eficazes para aumentar a representação feminina. Matos (2020) pontua que ainda que muitas ações tenham sido bem-sucedidas, não ocorreram mudanças significativas ou sustentáveis nas atitudes políticas relativas às mulheres, especialmente às mulheres negras, dentro e fora das instituições. Conforme exposto por Sacchet (2018), a instituição das cotas não ‘resolveu’ o problema de sub-representação no Brasil. De acordo com a autora, isso não ocorreu porque o verdadeiro problema que causa a baixa participação de mulheres na política brasileira encontra-se no próprio sistema eleitoral do país ou, então, como ressalta Araújo (2010), esse problema tem suas raízes também no papel que os partidos políticos possuem nesse contexto, principalmente voltando à intencionalidade dos atores em relação à variável gênero e, também, às lógicas pragmáticas que envolvem as disputas eleitorais.
Atualmente, 52% da população votante no país é composta por mulheres, todavia, apesar dessa quantia representativa e das condições do exercício de soberania popular, as mulheres ainda são menos votadas que os homens (Tribunal Superior Eleitoral, 2018b). No governo em exercício, existem 77 deputadas dentre as 513 cadeiras totais na Câmara, representando 15% do total. Já no Senado existem 12 senadoras entre 81 eleitos, sendo então, aproximadamente, também 15% do total (Câmara dos Deputados, 2019). Em relação ao nível municipal, o percentual de mulheres eleitas para o cargo de vereadoras nas eleições de 2020 foi de 16,1%, e para prefeitas de apenas 4,4% (Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania, 2021).
Um fator interessante a se destacar é que, ao analisarem as mulheres com carreiras políticas longevas, Pinto e Silveira (2018) destacam que dentre o total de candidatas eleitas entre 1950 a 2014, a Região Sul do país foi a que menos elegeu mulheres no Brasil, enquanto a Região Nordeste foi a que mais teve mulheres eleitas no período citado. As autoras ressaltam que, considerando as populações de cada uma das regiões do país, a presença expressiva de mulheres na política nas regiões Norte, Centro-Oeste e Nordeste é muito significativa, apesar de tais regiões serem consideradas menos desenvolvidas e mais agrárias, fatores que, a princípio, dariam menor abertura às mulheres.
É importante salientar que as eleições ocorrem desde que a primeira vila portuguesa foi fundada no Brasil, em 1532, todavia, foi apenas com a Constituição de 1934 que as mulheres brasileiras passaram a ter o direito de exercerem seus votos sem restrição ou autorização de pai, marido ou homem responsável, pois por muito tempo o sufrágio não era visto como um direito, e sim um privilégio, geralmente atribuído à ‘cabeça política da família’ (Cajado et al., 2014). Anteriormente a tais datas, Grazziotin (2015) relata que foram organizadas campanhas sistemáticas contra a atuação de mulheres na política brasileira, as quais eram ridicularizadas e vistas como incapazes de ocupar postos eletivos públicos.
Apesar de a região possuir o maior número de mulheres presidentes eleitas no mundo (Aguilar et al., 2015; Reyes-Housholder, 2018), dados do DataSenado (2014) indicam que os partidos brasileiros ainda possuem muita dificuldade para o preenchimento da cota mínima de candidaturas femininas. O fato indica que a representatividade política feminina é uma problemática importante de ser trabalhada e estudada, pois somente com o seu aumento será possível verificar maior diversidade de pensamentos, novas vozes, novas políticas e aspirações que não sejam enviesadas a um público específico (Chattopadhyay & Duflo, 2004). Ao debater o contexto brasileiro, Matos (2010) ressalta que a ausência das mulheres em espaços decisórios da política institucionalizada é um fator determinante da qualidade do processo democrático, mas também da qualidade da atenção dada às políticas públicas e à superação de desigualdades sociais que assolam o país, cujos aspectos revelam dificuldades que, muitas vezes, não são colocadas em pauta quando o assunto é mulher na política. Dentre as temáticas que muitas vezes não recebem a devida atenção, têm-se a violência e assédio políticos contra mulheres e pessoas negras que constituem comportamentos que têm nas mulheres, especificamente, seu alvo, com o intuito de fazê-las abandonar a política, pressionando-as a desistir, primeiro como candidatas e, depois, a abandonar seus cargos. O foco de tal violência dá-se no intuito de excluí-las das esferas públicas, destituindo-se seus direitos e cidadania duramente conquistados (Matos, 2020).
Krook (2020), ao evidenciar e ressaltar as diversas formas pelas quais a violência contra as mulheres na política pode ocorrer, debate que esse tipo de violência representa uma ameaça à democracia, aos direitos humanos e à igualdade de gênero em todo o mundo, algo que não pode ser jamais normalizado como um custo inerente à participação política, e sim combatido, para que as mulheres em todo o mundo possam participar da política de forma plena.
Matos (2020) pontua que casos de violência ocorrem, pois mesmo tendo percorrido um longo caminho de lutas pela igualdade, as mulheres que almejam politicamente espaços de poder ainda são percebidas como ameaças aos privilégios de muitos homens. Biroli (2016) discute que a violência se relaciona à posição em que a sociedade coloca a mulher e ocorre quando a mulher evoca mudanças aos padrões reproduzidos em práticas cotidianas, assume diferentes papéis e ocupa diferentes lugares dos que anteriormente eram tidos como adequados. A autora discute que, de certa forma, a violência contra a mulher se reproduz porque se fundamenta em questões culturais e institucionalizadas e a pouca presença de mulheres na política institucional reduz as possibilidades de mudança e combates às violências sofridas. Nesta mesma seara, Krook (2020) afirma que a violência contra as mulheres na esfera política acaba sendo menos reconhecida como um ‘problema’ e inclusive as próprias mulheres políticas que sofrem com suas consequências consideram-na como uma espécie de ‘custo de se fazer política’.
Contudo, salienta-se que as mulheres possuem qualificações, experiências e posicionamentos que diferem dos homens e, de certa maneira, isso influencia diretamente a sua aceitação, que é significativamente maior entre as mulheres eleitoras por conta dos posicionamentos que, geralmente, são em função dos direitos da mulher e em questões voltadas à saúde e família (Bhalotra & Clots-Figueras, 2014; Costa e Schaffner, 2018; Ennser-Jedenastik, 2017; Ng & Muntaner, 2018).
Dessa forma, após expostos os conceitos que fundamentam este estudo, a seguir são especificados os procedimentos metodológicos utilizados nesta pesquisa.
PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS
Amparado em uma abordagem qualitativa (Stake, 2010), este artigo consiste em um estudo qualitativo básico (Merriam, 2009). Um estudo qualitativo básico é aquele que tem por meta descobrir e compreender um fenômeno de acordo com as perspectivas e visões de mundo das pessoas que nele estão envolvidas (Merriam, 2009).
Seleção de participantes
Para a seleção dos participantes desta pesquisa, buscou-se por mulheres que estivessem inseridas em organizações da política brasileira e que, atualmente, atuem em seus respectivos cargos. Assim, para a realização dessa seleção e com o propósito de delimitar o escopo da pesquisa, inicialmente acessou-se os sites de Câmaras Municipais e Assembleias Legislativas, que são as organizações consideradas nesta análise, com a finalidade de encontrar os contatos das mulheres ali atuantes. Ressalta-se que o foco dado a tais organizações provém de reflexões voltadas à inserção das mulheres nas esferas econômicas, sociais e políticas. Em específico, as organizações políticas ainda são predominantemente masculinas e, no contexto brasileiro, suas inserções só foram permitidas a partir do ano de 1932. Percebe-se, porém, que mesmo após 90 anos de tal mudança, ainda há a necessidade de uma maior representação feminina nesse setor.
Dessa maneira, feita a seleção das mulheres, as pesquisadoras acessaram os respectivos sites a fim de encontrar os seus contatos eletrônicos públicos (e-mail) e, por meio destes, verificar a possibilidade de agendamento da entrevista, momento em que foram explicados os objetivos da pesquisa e as questões de sigilo quanto à sua participação. Após o contato com cerca de 120 mulheres, as pesquisadoras receberam respostas positivas de apenas 16, que é o número total de respondentes desta pesquisa.
Atualmente, as 16 participantes ocupam cargos políticos em organizações do Poder Legislativo, tanto municipal como estadual, nas capitais dos estados do Paraná, Santa Catarina, Rio Grande do Sul e São Paulo. É importante mencionar que, de acordo com o Artigo 2º da Constituição do Brasil (1988), existem três poderes da União: o Executivo, o Legislativo e o Judiciário. O atual sistema político brasileiro constitui-se, igualmente, de três níveis com responsabilidades distintas voltadas à saúde, educação, segurança e justiça: municipal, estadual e federal. A escolha, além de se justificar por questão de acesso, também se deve ao fato de que a participação de mulheres no cenário político do Poder Legislativo ainda é crítica em virtude de o Brasil ocupar a 141ª posição no ranking de representatividade feminino em congressos (Inter-Parliamentary Union, 2022) e, em nível municipal, apenas 15% dos cargos disponíveis são ocupados por mulheres (Tribunal Superior Eleitoral, 2018a).
Para garantir o sigilo das suas identificações, os nomes das participantes foram substituídos por nomes de personagens femininas da mitologia greco-romana que possuíssem características que remetessem às causas defendidas por essas mulheres. Assim, a Tabela 2, a seguir, apresenta a breve caracterização das participantes da pesquisa.
Coleta e análise dos dados
Quanto à coleta de dados, esta foi realizada por meio de entrevistas semiestruturadas, cujas questões foram orientadas por um roteiro fundamentado na literatura apresentada e no objetivo delineado. Em suma, questionaram-se as participantes a respeito de sua trajetória (por exemplo: os caminhos que as levaram a ingressar na política e como foi o processo de eleição). Aspectos referentes à identidade das participantes também foram colocados em pauta em questões relacionadas à sua atuação, ao ambiente, e ao que, em suas visões, a política representava para elas, além dos desafios e entraves encontrados no percurso político, dentre outros aspectos que variavam conforme o desenrolar da conversa.
As entrevistas iniciaram-se em julho de 2019, no entanto, durante o ano de 2020, em virtude de tratar-se de ano de eleição, optou-se por não se realizar entrevistas. As entrevistas foram retomadas em abril de 2021 de maneira remota, em respeito às recomendações de isolamento social devido à pandemia de COVID-19. Todas as entrevistas, tanto presenciais quanto remotas, foram gravadas e, posteriormente, transcritas com o objetivo de obter-se uma melhor compreensão do que foi exposto.
O tratamento dos dados foi realizado a partir das transcrições das entrevistas, mediante o emprego da análise de conteúdo (Bardin, 2011; Saldaña, 2016). Esse tipo de análise permite ao pesquisador a interpretação de aspectos subjetivos presentes nos dados coletados, e é feita por meio de um conjunto de instrumentos metodológicos diversificados que se aplicam a diferentes tipos de discurso (Saldaña, 2016).
Seguindo os passos delineados por Bardin (2011), a análise foi dividida de acordo com as três etapas delineadas pela autora. A primeira etapa consiste na pré-análise que, conforme postulado por Bardin (2011), é a fase de organização dos dados. Organizou-se, assim, as concepções iniciais a respeito do que havia sido visto nas entrevistas, bem como as transcrições propriamente ditas. Esse primeiro momento é visto como um período de intuições, no entanto, seu objetivo é operacionalizar e sistematizar as ideias obtidas de maneira a possibilitar a condução de um esquema para as próximas etapas do plano de análise.
Na segunda etapa realizou-se a codificação e categorização dos conteúdos, em que foram definidas as dimensões de análise com base na literatura pesquisada e na emergência de temas no campo. Dessa maneira, as dimensões deste estudo são: ‘Da construção identitária como mulher na política brasileira às microagressões’ e ‘Quando as microagressões se interligam às macroagressões’. Em seguida, considerando-se a existência de unidades de contexto que permitem ao pesquisador codificar as dimensões delineadas e compreender a significação pertinente a cada uma delas, definiu-se para a primeira dimensão ‘dificuldades’, ‘identidade em construção’, ‘processo de eleição’, ‘adaptação ao contexto’, ‘aceitação’ e ‘microagressões’ como unidades de contexto. Já para a segunda dimensão, as unidades de contexto foram ‘atuação política: percepções’, ‘atuação política enquanto mulher’, ‘postura e posicionamentos’ e ‘cultura e macroinvalidações’, as quais permitiram analisar os conteúdos das transcrições.
Na terceira e última etapa, realizou-se o tratamento, inferência e interpretação dos resultados com o propósito de formar uma análise reflexiva a respeito do que foi encontrado nas entrevistas. Assim, a seguir expõem-se os principais resultados desta pesquisa.
ANÁLISE DOS RESULTADOS
Da construção identitária como mulher na política brasileira às microagressões
O Brasil possui 513 deputados federais e, destes, apenas 77 são mulheres. Dos 11 cargos referentes à Mesa Diretora que incluem suplentes, dois são ocupados por deputadas. Existem 25 Comissões Permanentes na Câmara de Deputados brasileira e, destas, quatro são presididas por mulheres (Câmara dos Deputados, 2019). Em ambientes organizacionais historicamente masculinos, as mulheres de todo o mundo tiveram de lutar para ter direito às suas atuações como cidadãs, e mesmo após esse direito ter sido adquirido por meio da possibilidade de voto, elas ainda enfrentam vários obstáculos que não são comumente encarados por homens nesse setor (Tosi, 2016). Em um país cuja população feminina soma mais de 50% do eleitorado (Tribunal Superior Eleitoral, 2018a), é possível afirmar que a sub-representação de mulheres na política brasileira ainda existe e é crítica (Inter-Parliamentary Union, 2022). Conforme pontuado por Matos (2020), no Brasil, as mulheres são maioria de eleitoras nas eleições e uma gigantesca minoria entre as eleitas.
Apesar da atuação feminina se fazer presente na região do mundo em que mais mulheres foram eleitas ao cargo máximo de democracias (Aguilar et al., 2015; Reyes-Housholder, 2018), o cenário por si só não é o mais convidativo à sua inserção, não apenas por questões culturais, mas, principalmente, devido às lógicas que são perpetuadas desde a fundação do processo (Araújo, 2010; Paxton & Kunovich, 2003). Mesmo assim, elas se fazem presentes, como é o caso das mulheres participantes desta pesquisa.
Em um primeiro momento, discutiu-se sobre a dificuldade de preenchimento de cotas e dos demais desafios existentes no contexto político brasileiro em relação às mulheres (DataSenado, 2014; Grazziotin, 2015; Krook, 2009; Sacchet, 2018), o que permitiu verificar que os desafios vão além das estruturas e delineamentos políticos.
Um primeiro exemplo disso volta-se ao fato de que nesta pesquisa foram entrevistadas 16 mulheres e, destas, apenas duas se autodeclararam como pardas. Este aspecto, do menor número de mulheres pretas e pardas entrevistadas, reflete o menor número destas mulheres eleitas em cargos políticos no Brasil, o que demonstra que a violência política de gênero se articula com a violência política racial, em uma perspectiva interseccional. Dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE, 2022) apontam que a população negra representa 55,8% dos brasileiros, e as mulheres negras ocupavam apenas 2% das vagas no Congresso Nacional em 2022 (Amorim, 2022). Assim, deparamo-nos com o reflexo de uma realidade vivenciada não somente na política, mas em mais setores no país e que exprime a sub-representação em seu cerne. Vê-se que as características sociais refletem nas vivências e nas dinâmicas das instituições políticas do país exprimindo a debilidade de um Estado realmente democrático, haja vista que de acordo com Matos (2010), a sub-representação nos espaços estatais é um dos principais indicadores da forte presença de padrões coloniais e patriarcais nos Estados latino-americanos.
No entanto, as mulheres que alcançam tais cargos veem-se diante de uma série de obstáculos a serem perpassados. Percebeu-se que a participação destas mulheres se atrela aos processos de identificação bem como às suas constituições identitárias, uma vez que, conforme delineado por Castells (2018) e Machado (2003), a identidade constitui-se por meio da atividade humana, delineando-se conforme o indivíduo entra em contato com elementos a ele significativos. Isso pode ser verificado na fala de Têmis: “Política para mim é ‘igual oxigênio’, porque é meu mundo, minha vida, quantos anos!! Só no partido que sou filiada, estou há 48! Eu ajudei a fazer o partido, eu fui a sétima inscrita no partido da cidade em que morava (Têmis, grifo nosso)”.
Ressalta-se que a formação da identidade também permite ao indivíduo desenvolver percepções sobre si e sobre seu meio, desenvolvendo vínculos e compondo sua personalidade (Freitas, 2005; Laplanche & Pontalis, 2001), fato que é destacado no relato de Nice: “Eu não sei, eu tenho convicção que a política para mim é como uma missão de vida” (Nice).
A identidade, de certa forma, pode ser interpretada como a história que uma pessoa conta a seu próprio respeito (Fernandes et al., 2010) e é algo em contínua construção (Brown, 2020; Dubar, 2005) representando relevância à sua existência (Saraiva & Duarte, 2010). Essa relevância, além de ser percebida nos relatos das participantes, tornou-se mais evidente com Métis, que afirmou sentir-se “um instrumento da sociedade” ao se enxergar enquanto mulher na política. Gaia também reforça tal visão ao indicar que a política “faz parte de quem eu sou” e, mesmo assumindo a consciência de existirem percalços à atuação feminina na política, Hemera afirmou que acredita “ter nascido para isso” (Hemera).
Fica evidente que a atuação dessas mulheres na política foi uma escolha pessoal baseada em suas vivências e no que acreditam, porém, no desenrolar de cada entrevista, mesmo que relatassem aspectos positivos quanto às suas atuações, as microagressões se faziam presentes (Nair et al., 2019; Sue, 2010). Um exemplo disso foi relatado por Deméter ao ressaltar que, por ter familiares na política, já tinha uma breve noção das especificidades do ambiente, contudo, ao efetivamente adentrar o meio, percebeu que o fato de ser mulher e possuir um pensamento diferente do dos homens ali atuantes era o que a motivava, mas ao mesmo tempo consistia em um desafio.
Todas as entrevistadas relataram já terem recebido ameaças quando discordavam da maioria presente em suas Casas Legislativas e, também, por defenderem projetos específicos. Nessas ameaças ocorriam retaliações a seus projetos nas Casas Legislativas até ameaças de morte feitas de maneira anônima. Algumas das entrevistadas afirmaram, inclusive, que já pensaram em abandonar suas atuações por conta das pressões e sentimentos ruins, tais como medo, tristeza, nojo e desgosto. O que se percebe aqui é que a ‘quebra’ de expectativas a respeito da atuação de mulheres em organizações que compõem o sistema político (que indicam que estas devem se submeter à maioria e evitar posicionamentos distintos) traz como resultado a existência de microinsultos que posteriormente se transformam em macroagressões, uma vez que essas disputas de poder visam diminuir a identidade da pessoa em tal ambiente devido, justamente, aos estereótipos a ela atribuídos (Sue, 2010). Além disso, nota-se que as macroagressões constituem-se e tomam força quando se encontram diante de um contexto de violência política contra mulheres. Como detalhado por Krook (2020) e Matos (2020), esse tipo de violência tem como alvo as mulheres e constitui uma violência ‘generificada’ na sua forma, com o propósito de desencorajar as mulheres a serem ou se tornarem ativas na política e, de certa forma, transforma-se em uma interferência ao processo político. Vê-se que, assim como discutido por Krook (2020), o tipo mais comum de violência contra mulheres na política se dá em termos de violência psicológica e, ao terem de lidar com tais circunstâncias e devido ao fato de serem minoria nesses ambientes, as possibilidades de mudança de tal cenário se tornam ainda mais desafiadoras (Biroli, 2016).
É importante destacar que as microagressões (Nair et al., 2019; Sue, 2010; Sue et al., 2007) fazem-se presentes durante toda a trajetória destas mulheres, desde o momento em que demonstram a intenção de se candidatar a algum cargo, durante os períodos de campanha eleitoral, até o final de seus mandados e, como discute Matos (2020), a violência política contra mulheres, perante um domínio da representação parlamentar branca e masculina, pode ocorrer em todas as fases desse processo desde o momento de acesso ao exercício político, durante a campanha eleitoral, nos primeiros meses em que assume o cargo e durante todo o restante de seu mandato representativo. Nesse sentido, Artemis afirmou ter sofrido muito durante o seu processo de eleição por se posicionar perante uma causa popularmente não tão priorizada e aceita, sendo alvo de preconceitos: “Foi muito sofrido, muito doloroso, fui muito perseguida, fui motivo de chacota”, “O que que aquela mulher está fazendo lá na Câmara?” O mesmo foi relatado por Hemera: “Eu vi/ouvi comentários extremamente desnecessários vindos de homens, do tipo ‘O que ela está fazendo aí? Vai lavar louça’ … eu sinto que a forma como os homens e até muitas vezes as mulheres se referem à parlamentar mulher é meio pejorativa, é meio pesada, sabe?” (Hemera).
Reia, por sua vez, também destacou uma situação semelhante quando estava em uma cerimônia solene: “Só estava eu de autoridade em cima do palco e meu marido na plateia, tinha uma pessoa do lado dele, cutucou ele e disse: ‘Para quem será que ela está ‘dando’ para estar lá em cima?’, meu marido falou que eu era esposa dele, o cara abaixou a cabeça e saiu” (Reia).
Os relatos das participantes expressam exatamente o que Pierce et al. (1977) delimitaram ao colocar em discussão a existência de microagressões. Nesse sentido, percebem-se também as vertentes voltadas à violência de gênero conforme fora salientado por Bandeira (2014) e em alguns artigos analisados por Souza et al. (2021). Existe, de certa forma, a naturalização do tipo de comportamento mencionado pelas entrevistadas, pois apesar de possuírem elementos condenados socialmente, ainda são perpetuados pela sociedade de forma ‘comum’ e, muitas vezes, inconsciente por parte de quem os realiza, concordando com o exposto por Sue (2010). Percebe-se, no entanto, que mesmo sendo algo direcionado, esses atos podem atingir não somente os atores em questão, mas também as pessoas próximas.
Ao discutirmos microagressões, é importante também ter em mente que estas podem e geralmente se fazem presentes de forma sutil dentro de um contexto organizacional. A esse respeito, a história de Têmis faz refletir sobre as diversas maneiras pelas quais as microagressões podem existir: ela e seu marido se candidataram juntos e, por consequência de suas atuações anteriores, elegeram-se juntos e assim atuaram na política por vários mandatos juntos, porém, dois meses antes de a entrevista ocorrer, o seu marido faleceu. Após retornar ao seu trabalho, seus colegas a questionaram se ela continuaria atuando tendo em vista que seu marido não estava mais com ela, o que fez com que ela respondesse: “Não me elegi por causa dele e creio que ele não ficaria feliz caso eu abandonasse aquilo que eu acredito e luto minha vida inteira”. Héstia também relatou casos em que a sua atuação foi questionada em virtude de sua vida privada. Em seu período de campanha, a deputada relatou que um dos pontos mais destacados e pelo qual foi mais atacada foi o fato de ser filiada a um partido diferente de seu marido. Pode-se interpretar a partir do que aqui foi exposto que a associação à atuação profissional de uma mulher a seu marido consiste em uma tentativa de invalidar a identidade que esta criou por conta própria no decorrer de sua carreira. Em seu estudo, Cajado et al. (2014) apontam que a atuação de mulheres, especialmente no contexto político, não é mais associada a seus ‘homens responsáveis’ como ocorreu no período de sufrágio. O que se percebe, entretanto, é que mesmo depois de tanto tempo, esse entrelaçamento ainda ocorre.
Saraiva e Duarte (2010) destacam que no contexto da construção de uma identidade, o indivíduo tende a se adaptar à sua conjuntura, e considerando que o sistema político é composto por organizações predominantemente masculinas não somente no Brasil, mas no mundo todo (Paxton & Kunovich, 2003; Sacchet, 2018), algumas entrevistadas, como é o caso de Hemera e Atena, relataram que sentiram a necessidade de alterar os seus comportamentos para se adaptarem à realidade das organizações em que atuam, e assim o fizeram. Esses relatos reforçam o que Machado (2003) debate em seu estudo, ou seja, de que os indivíduos se configuram e configuram suas identidades, direcionando-as de acordo com suas percepções de pertencimento a um ou vários grupos, dedicando ações de comum acordo. Entende-se aqui que essa adaptação e mudança ocorrem pela necessidade de aceitação nesse ambiente, tal qual aponta Machado (2003). Traz-se, também, à discussão a possibilidade de que essa adaptação ocorre como consequência das tentativas de invalidação em nível macro das mulheres que ali se inserem, conforme percebido na fala de Hera: “Eu confesso a você que o primeiro dia, que eu me elegi como vereadora, no primeiro dia que eu estava na sessão plenária… eu me perguntei, me questionei, ‘O que é que estou fazendo aqui?’, entendeu?! ‘Que ambiente é esse? O que estou fazendo aqui?’ Aí eu tive que tentar digerir isso tudo e entender que eu estava no lugar que eu quisesse estar. A mulher pode estar onde ela quiser estar” (Hera).
Nota-se, aqui, que existe uma tentativa por parte dessas mulheres de se criar uma identidade enquanto mulher na política, contudo, diante de um cenário de microinvalidações, essa identidade é ameaçada por dúvidas e pela relevância de ‘sentir-se aceito’ em uma organização ao interferir diretamente nos posicionamentos ali despendidos. Um exemplo disso é verificado nas reflexões que as participantes fizeram em relação às suas atuações, especialmente em circunstâncias nas quais seus posicionamentos iam contra a maioria das pessoas atuantes nas organizações pesquisadas. A fala de Héstia traduz um pouco do que foi exposto pelas demais: “Eu sinto que as mulheres não têm muito sangue frio para serem falsas … não posso ter que construir em cima do meu eu outra imagem para ser aceita… isso não me representa … não posso perder minha essência”. Nesse mesmo escopo, Hemera destacou que no começo de sua atuação enquanto mulher na política, procurava alterar seus comportamentos para não causar discordâncias com outros colegas, no entanto, destacou que atualmente verificava a necessidade de se posicionar de forma mais firme, pois, segundo suas palavras: “Ser mulher já não é muito fácil, ser mulher na política é um pouco mais difícil”. De acordo com os relatos, é possível perceber a relevância que a identificação possui no cenário organizacional. Verifica-se, então, que quando há identificação, os posicionamentos despendidos são feitos sem que se leve em consideração ser ou não aceito pelos demais. Os posicionamentos são efetuados com base no que se acredita e não por receio de sofrer algum tipo de invalidação por outras pessoas.
Em organizações do sistema político, como é o caso das Câmaras de Vereadores e Assembleias Legislativas, a aceitação acaba se tornando um componente crítico a essa trajetória diante das percepções de que o poder é algo masculino (Araújo, 2010; Karawejczyk, 2013; Pinto & Silveira, 2018; Tosi, 2016) e em virtude do rumo que a atuação das mulheres possa assumir nesse cenário (Bhalotra & Clots-Figueras, 2014; Costa e Schaffner, 2018; Ennser-Jedenastik, 2017; Ng & Muntaner, 2018). Nesse contexto, verifica-se que as microagressões tomam maior proporção, estando presentes no cotidiano não somente organizacional, mas também social, conforme se discorre a seguir.
Quando as microagressões se interligam às macroinvalidações
As microagressões, que ocorrem por intermédio das microinvalidações, trazem à discussão a marginalização de determinados atores e suas respectivas identidades no contexto organizacional. Entende-se, contudo, que a existência das microagressões pode estar atrelada à presença de conflitos de papéis e relações de poder nesse cenário, conforme expressa Gaia: “Política não é profissão, política é representação”. Neste mesmo sentido, Afrodite chegou a comparar a sua atuação política a um casamento “porque a política não tem limites, se você abrir a sua vida, sua agenda, seu tempo, as demandas são infinitas”. O mesmo foi destacado por Irene, que apontou que, em sua opinião, “a pior parte de trabalhar na política é conciliar o tempo”, destacando o salientado por Machado (2003) de que, conforme uma identidade se desenvolve, desenvolvem-se também reflexões a respeito da atuação do indivíduo propriamente dita.
Nessa perspectiva, salienta-se o que foi pontuado por Teia: “Muitas pessoas não acreditam na capacidade que a mulher tem de gerir o município, o estado ou o país, acham que a mulher não tem competência ou não tem firmeza para fazer esse tipo de coisa”. Perséfone também indicou tais questões ao relatar que por ter engravidado no período de seu mandato, seus próprios colegas de Assembleia começaram a excluí-la de demandas e diminuíram sua carga de atividades, não devido à empatia ou sensibilidade a seu respeito, mas “falavam - agora ela tem outros interesses que não fazem mais parte desse contexto”, o que, de acordo com a deputada, não fazia sentido, uma vez que assumir outros papéis em sua vida não excluiria aqueles que já possuía.
Durante as entrevistas, as participantes ressaltaram que existem aspectos referentes às tomadas de decisões e responsabilidades que vêm atreladas aos mandatos e à inserção da mulher no ambiente da política, frisando alguns pontos vistos na literatura de que o indivíduo pode transmitir uma ilustração de si mesmo que é construída ao pertencer a um grupo por conta de semelhanças ou diferenças (Caldas & Wood Jr., 1997; Fernandes et al., 2010). Nesse escopo, Hemera salientou: “A mulher já tem por instinto e pela sua própria natureza ser mais sensível, ser mais emoção do que razão e eu acho que isso é um pouco difícil de lidar… porque os homens, a gente vê a forma com que eles articulam” (Hemera).
Com a fala de Hemera é possível verificar a naturalização de características voltadas à violência de gênero, conforme pontuado por Bandeira (2014), e levando-se em conta o exposto por Souza et al. (2021), percebe-se uma dicotomia existente entre feminilidade versus masculinidade mencionada pelos autores, em que as características voltadas à sensibilidade, propensão ao cuidado, humildade, paciência e outros tipos de comportamentos são atribuídos às mulheres. Por consequência, têm-se associadas a elas profissões no campo da educação, cuidado, artes e não à gestão, que tem como pressupostos comportamentos voltados à autoconfiança, poder e habilidades de segurança, tidas como naturais a homens e não a mulheres (Souza et al., 2021). Vale salientar, também, que tais estereótipos, além de interferirem no desenvolvimento e compreensão dos papéis da mulher na sociedade, interferem em suas próprias percepções sobre si mesmas em relação às suas competências de atuação na vida pública, como já levantado nos estudos de Biroli (2010).
Têmis também afirmou que, muitas vezes, os sentimentos podem tentar interferir na atuação, porém, de acordo com a respondente, é necessário manter o foco. O exposto trouxe consigo a reflexão a respeito de como o gênero dos representantes políticos traz consequências às políticas a serem formuladas (Beaman et al., 2009; Grant et al., 2018). Compreende-se, no entanto, que tais particularidades indicadas (o ser sensível e trazer consigo as emoções) são um dos pontos que diferenciam a atuação de mulheres da dos homens, pois trazem ao ambiente maior sensibilidade a questões que por si só já são delicadas e carecem de atenção, conforme pontuado nos estudos de Chattopadhyay e Duflo (2004). Conforme exposto por Matos (2010), a ausência de mulheres em espaços decisórios da política acaba sendo fator determinante à qualidade não somente do processo democrático, mas também da qualidade das próprias políticas formuladas, evidenciando ainda mais a necessidade de um maior número de mulheres em tal setor.
Atena, Nice e Ananque, ao frisarem os estereótipos que encaram enquanto mulheres em organizações predominantemente masculinas, destacaram também a necessidade de mudanças de posturas e posicionamentos de forma a não deixar que essas percepções sejam maiores do que as suas atuações. Nessa seara, Nice destacou a relevância da postura nesse ambiente: “As pessoas não vão conseguir entender o teu recado se você não tiver firmeza, entende?” Ressalta-se, nesse sentido, o exposto por Schneider e Bos (2014) e Bauer (2020), de que se esperam posicionamentos mais brutos de mulheres devido à existência de estereótipos que, muitas vezes, acabam sendo barreiras para seus avanços em posições de liderança. Comumente, são atribuídas às mulheres representações que indicam que, por mais que possuam excelentes qualificações para tal desempenho, por conta de preconceitos latentes, não possuem o que é considerado necessário para executar tais papéis. Esses estereótipos e preconceitos caracterizam mulheres como sensíveis, dentre outras qualidades que contrastam com as expectativas de um político, pois, geralmente, esperam-se destes atores comportamentos mais agressivos. Diante das especificidades voltadas a estereótipos e poder, Eos relatou: “Vejo que a política é uma briga de galo e por vezes é difícil entenderem que têm mulheres fortes nesse setor”.
Ainda dentro do mesmo tópico, Ananque salientou: “as mulheres assumem mais coisas em casa, por isso se dedicam menos à carreira e à política e por isso temos mais homens que mulheres em cargos de liderança, não necessariamente é machismo, quando estamos em um ambiente masculino, têm mais predominância algumas características que as mulheres possuem dificuldade para agir no ambiente” (Ananque).
Entende-se com o exposto que a sub-representação de mulheres na política pode, em partes, justificar-se pelos valores que são perpassados culturalmente não somente dentro deste ambiente, mas também na sociedade em geral, uma vez que os obstáculos enfrentados por essas mulheres não se restringem aos limites organizacionais, e perpassam a própria população (Bauer, 2020; Pinto & Silveira, 2018; Schneider & Bos, 2014). A fala de Ananque é um reflexo disso, uma vez que indica o caráter sutil das microagressões. Mesmo tendo ciência do que ocorre, percebe-se que a entrevistada encontra justificativas em um nível macro para eximir quem comete a microinvalidação de tal ato, e é justamente em virtude de tais sutilezas que se entende a própria violência de gênero como um dos fatores que induzem a existência desses fenômenos. No entanto, esse ‘deixar passar’ é uma das razões que permitem que microinvalidações criem força e passem a atuar em nível macro, refletindo o que se pontua como macroinvalidações.
Essas macroinvalidações também ocorrem em cenários onde as mulheres acabam sofrendo preconceitos não somente de seus colegas de trabalho, mas da população em geral, extrapolando os níveis organizacionais, atingindo, também, o social. Atualmente, insultar uma parlamentar, tentar silenciá-la, ofendê-la ou atacá-la são exemplos de violência política contra mulheres, contudo, mesmo se tratando de violência, a falta de uma maior pressão pública torna tais comportamentos normalizados (Efraim, 2022). O autor destaca o caso de um eleitor que em redes sociais atacou a prefeita de sua cidade, chamando-a de ‘biscate’. Outro caso de destaque foi o sofrido por uma deputada do estado de São Paulo em que, em uma sessão plenária, sofreu assédio de um de seus colegas de plenário. O caso repercutiu nacionalmente por ter sido gravado por câmeras da sessão e o deputado em questão teve seu mandato caçado por seis meses (Reis, 2021). Outro exemplo é o de uma prefeita de uma cidade de Minas Gerais que, em época de campanha, ouviu de um dos eleitores da cidade o seguinte questionamento: “Se você está com essa agenda tão cheia assim, com filho pequeno, etc., como quer ser prefeita?” Na ocasião, a prefeita respondeu: “Vocês acham que candidatos homens recebem questões como essa?” (Caixeta, 2021). Em virtude de tais situações, em 2021 foi aprovada a Lei n. 14.192 (2021), que estabelece como crime assediar, constranger, humilhar, perseguir ou ameaçar, com menosprezo ou discriminação à condição de mulher ou à sua cor, raça ou etnia, tanto em relação a candidatas quanto a mulheres que já ocupem cargos eletivos. Com as participantes desta pesquisa foi possível verificar que as agressões derivadas do fato de serem mulheres não diferiam em virtude dos seus cargos, contudo, um fato que nos chamou atenção foi ter visto que quando deputadas, por conta de uma maior exposição, as agressões e invalidações possuíam maior quantidade de incidência.
Pontua-se que essas situações tenham ocorrido por conta de os papéis e níveis de poder possuírem relevância excepcional dentro de um contexto organizacional em que além de interferirem na constituição identitária das pessoas que lidam diretamente com ambos, afetam também as identidades constituídas pelo restante da organização, por consequência de que no mundo de papéis existem padrões não somente de poder, mas também de impotência e controle a serem desenvolvidos e exercidos para, por fim, permitirem a manutenção das identidades construídas.
Entende-se que isso ocorra conforme verificado em estudos anteriores, como é o caso de Castells (2018) e Simpson e Carroll (2008), em que se aponta que a construção de uma identidade é uma forma de autoconhecimento que permite ao ser humano ter consciência dos seus atributos emocionais, cognitivos e sociais, que são fontes de significado e autoconstrução (Castells, 2018; Simpson & Carroll, 2008). Ao se constituir uma identidade em determinado ambiente, pode-se também se despertar um senso crítico a respeito do que ocorre neste cenário, como é o caso da política, conforme visto no relato de Nice: “Acho que a gente precisa repensar o que nós somos e repensar esses costumes seculares que nos acompanham ao longo da história”.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Com o propósito de analisar a constituição identitária de mulheres que se inseriram na política brasileira, perante um cenário de micro e macroagressões, o presente estudo permitiu-nos compreender que, em organizações onde se tem a predominância de um determinado perfil, como em organizações da política, onde se tem a predominância masculina, a identidade de certas pessoas ali presentes ocorre de forma mais gradativa do que a esperada e é permeada por desafios que, muitas vezes, perpassam os limites organizacionais.
A literatura indica que a construção de uma identidade ocorre com base em atributos culturais que se inter-relacionam com outras fontes de significado (Castells, 2018). Quando, porém, há a internalização de tais elementos, percebe-se que pode haver confusão em relação ao que é uma identidade e o que constitui a própria pessoa conforme verificado nos relatos trazidos pelas participantes da pesquisa, uma vez que a formação da identidade em si é um dos componentes de suas personalidades.
O fato de a identidade ser um elemento crucial à atuação tanto pessoal quanto profissional de um indivíduo ressalta o quanto a existência de micro e macroagressões pode ter consequências consideráveis no contexto de construção dessa identidade, pois, além do ciclo natural de mudanças pessoais provindas de tal constituição, têm-se mudanças na forma de sua atuação profissional, as quais nem sempre podem ser benéficas ao indivíduo. Nas tentativas de construir uma identidade e querer se sentir aceito em um ambiente organizacional, questiona-se o quanto as adaptações de comportamento são realmente positivas.
Diversos são os desafios enfrentados por mulheres em um cenário organizacional e aqui se percebe que, a depender do cargo ocupado, esses desafios extrapolam os limites da organização e atingem o nível social. Ao invés de haver um incentivo à participação de mulheres em organizações onde são sub-representadas, tais movimentos as marginalizam ainda mais não só no contexto organizacional, mas também na sociedade, pois estas têm de lidar com tentativas de invalidar não só as suas identidades formadas, como também seus próprios posicionamentos.
Dessa maneira, como contribuição traz-se o conceito de macroagressões à discussão, uma vez que a literatura a respeito de identidade avalia as tentativas de invalidação a identidades em cenários específicos, relacionando-as às interações diárias. Não considera, todavia, a possibilidade de ocorrer por parte de maior parcela de atores, como, por exemplo, grande parte da sociedade de um país e em outros formatos de interações como os provindos da tecnologia, a exemplo das redes sociais. Enquanto a literatura sobre microagressões indica que estas constituem atos predominantemente velados e perpetuados em ambientes nos quais quem as execute se sinta relativamente seguro, no cenário das macroagressões tal preocupação não existe, uma vez que as agressões se dão de forma pública, explícita e podem possuir caráter permanente se registradas na internet. Pontua-se que enquanto as microagressões são, em sua essência, interpessoais, as macroagressões têm por característica serem organizacionais e sociais, ressaltando, assim, a sua abrangência e magnitude.
Outra contribuição refere-se à verificação de que mesmo em níveis mais altos de poder numa organização a identidade ainda assim pode estar sendo construída de forma gradativa, indicando que, conforme Castells (2018), essa construção pode ser contínua. Espera-se que com essa pesquisa, exista o fomento e maior interesse de pesquisas e conhecimentos teóricos na área de estudos organizacionais acerca das mudanças na identidade individual das mulheres em organizações, proporcionando um aumento do conhecimento sobre essa temática no contexto brasileiro.
Já em termos práticos, são trazidas como contribuições algumas questões voltadas ao Objetivo de Desenvolvimento Sustentável 5 (ODS 5), cujo propósito volta-se ao debate e busca pela igualdade de gênero, colocando em discussão a necessidade de se acabar com todas as formas de discriminação de mulheres e meninas. No ODS 5 também se discute a necessidade da garantia de participação plena e efetiva de mulheres e a igualdade de oportunidades para liderança em todos os níveis de tomada de decisão, como é o caso do nível político. Assim, ressaltam-se neste estudo reflexões sobre o quanto ainda existe a necessidade de ampliação do debate a respeito da atuação feminina na política e, também, em organizações predominantemente masculinas. Outra contribuição prática desta pesquisa é que ela possa despertar a atenção de mais mulheres e homens à temática, com o intuito de, além de incentivar uma maior participação feminina na política, colocar em discussão alguns pontos que são negligenciados não apenas pelo governo, mas, também, pelos partidos políticos e a população em geral. Como exemplo, cita-se o próprio apoio à mulher inserida na política não apenas por conta das cotas estabelecidas por lei e não apenas o apoio financeiro, mas também para que sejam encontradas maneiras de minimizar os conflitos e choques dessas atuações, e auxílios de forma com que os desafios levantados pelo estudo sejam ao menos minimizados.
Como sugestão para pesquisas futuras aponta-se a ampliação do escopo na área de administração e a atuação de mulheres em outras organizações predominantemente masculinas, bem como outras organizações componentes do sistema político. Apesar de já existir um debate nacional a respeito de aspectos subjetivos dentro das organizações, como verificado nos estudos de Silva e Francisco (2010), Ferraz (2019) e Faria (2019), e de também se verificarem discussões sobre a identidade no contexto organizacional brasileiro, a exemplo dos estudos de Machado (2003), Lourenço et al. (2017), e também de Araújo et al. (2022), sugere-se o desenvolvimento de mais estudos a respeito de como a identidade pode se entrelaçar com outros elementos presentes no contexto organizacional, como é o caso, por exemplo, das emoções e das relações de poder ali existentes.
REFERÊNCIAS
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Classificação JEL:
M0.
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Pareceristas:
Maíra Neiva Gomes (Universidade do Estado de Minas Gerais, Brasil)Marilia Duarte de Souza (Universidade Federal de Minas Gerais, Brasil)Beatriz Rodrigues Sanchez (Centro Brasileiro de Análise e Planejamento, Brasil)
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Relatório de Revisão por Pares:
O Relatório de Revisão por Pares está disponível neste link externo.
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Direitos Autorais
As autoras detêm os direitos autorais relativos ao artigo e concederam à RAC o direito de primeira publicação, com a obra simultaneamente licenciada sob a licença Creative Commons Atribuição 4.0 Internacional (CC BY 4.0).
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Financiamento
As autoras agradecem a Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) pelo suporte financeiro para a realização deste trabalho.
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Método de Revisão por Pares
Este conteúdo foi avaliado utilizando o processo de revisão por pares duplo-cego (double-blind peer-review). A divulgação das informações dos pareceristas constantes na primeira página e do Relatório de Revisão por Pares (Peer Review Report) é feita somente após a conclusão do processo avaliativo, e com o consentimento voluntário dos respectivos pareceristas e autores.
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Verificação de Plágio
A RAC mantém a prática de submeter todos os documentos aprovados para publicação à verificação de plágio, mediante o emprego de ferramentas específicas, e.g.: iThenticate.
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Disponibilidade dos Dados
As autoras afirmam que todos os dados utilizados na pesquisa foram disponibilizados publicamente, e podem ser acessados por meio da plataforma Harvard Dataverse:Fernandes, Camilla; Lourenço, Mariane Lemos, 2023, "Replication Data for: "A woman’s place is… in politics: Reflections about micro and macroaggressions of identities" published by RAC-Revista de Administração Contemporânea", Harvard Dataverse, V1.A RAC incentiva o compartilhamento de dados mas, por observância a ditames éticos, não demanda a divulgação de qualquer meio de identificação de sujeitos de pesquisa, preservando a privacidade dos sujeitos de pesquisa. A prática de open data é viabilizar a reproducibilidade de resultados, e assegurar a irrestrita transparência dos resultados da pesquisa publicada, sem que seja demandada a identidade de sujeitos de pesquisa.
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Editoras Convidadas:
Ludmila de V. M. Guimarães (Centro Federal de Educação Tecnológica de Minas Gerais, Brasil)Deidi Maca (Universidad Santiago de Cali, Colômbia)Josiane Silva de Oliveira (Universidade Federal de Goiás, Brasil)Janaynna de Moura Ferraz (Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Brasil)Luiza Farnese Lana Sarayed-Din (Universidade Federal do Rio de Janeiro, Brasil)Andrea Poleto Oltramari (Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Brasil; Universidade de Lisboa, SOCIUS, Portugal)
Disponibilidade de dados
As autoras afirmam que todos os dados utilizados na pesquisa foram disponibilizados publicamente, e podem ser acessados por meio da plataforma Harvard Dataverse:
Fernandes, Camilla; Lourenço, Mariane Lemos, 2023, "Replication Data for: "A woman’s place is… in politics: Reflections about micro and macroaggressions of identities" published by RAC-Revista de Administração Contemporânea", Harvard Dataverse, V1.
https://doi.org/10.7910/DVN/A6RJBL
A RAC incentiva o compartilhamento de dados mas, por observância a ditames éticos, não demanda a divulgação de qualquer meio de identificação de sujeitos de pesquisa, preservando a privacidade dos sujeitos de pesquisa. A prática de open data é viabilizar a reproducibilidade de resultados, e assegurar a irrestrita transparência dos resultados da pesquisa publicada, sem que seja demandada a identidade de sujeitos de pesquisa.
Datas de Publicação
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Publicação nesta coleção
23 Out 2023 -
Data do Fascículo
2023
Histórico
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Recebido
03 Out 2022 -
Revisado
14 Jun 2023 -
Aceito
19 Jun 2023 -
Publicado
10 Ago 2023 -
Publicado
21 Set 2023