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A publicação interna na emprêsa brasileira

ARTIGOS

A publicação interna na emprêsa brasileira

Nelson SavioliI; Wilson B. CandeloroII

ICoordenador de Publicações da Assessoria de Relações Industriais do Grupo Alcanbrasil

IIGerente da Assessoria de Relações Industriais do Grupo Alcanbrasil, Vice-Presidente da Associação Paulista de Administração de Pessoal e Coordenador da Revista da Associação Brasileira de Administração de Pessoal

A civilização humana só há bem pouco tempo conseguiu transportar para um veículo prático, no caso o papel, sua comunicação escrita. A invenção e o desenvolvimento da imprensa, na Idade Moderna, e a Revolução Industrial, no século dezoito, são os pressupostos relativamente recentes - se considerarmos os milhões de anos da evolução do Homem - da publicação interna das emprêsas, como veículo importante para a comunicação.

Com a Revolução Industrial e a modernização das técnicas de produção, as grandes corporações surgiram, agrupando centenas e, às vêzes, milhares de empregados. Para a humanização da vida na indústria e a democratização das oportunidades, foram sendo estabelecidas as normas do que se denominam atualmente Relações Industriais. Nesse campo, desenvolveram-se sobremaneira:

• a seleção,

• o treinamento,

• os planos assistenciais,

• a segurança,

• as relações trabalhistas,

• a avaliação de mérito e

• a avaliação de cargos e salários.

Entretanto, embora quase tôdas as emprêsas mantenham um departamento ou assessoria de comunicações internas, não dão, em geral, a devida atenção à comunicação entre os empregados nem entre êstes e a administração. O homem precisa comunicar-se, mormente na indústria, onde a técnica e a produção são os meios mais valorizados para o alcance dos objetivos.

A COMUNICAÇÃO NA EMPRÊSA

As comunicações com os empregados têm a sua imperiosa necessidade calcada no conceito do "trabalho de equipe" que regula os negócios e a indústria. Nas emprêsas em que a comunicação com os empregados é completa, conhecendo as intenções e os objetivos da direção, sentem-se inclinados a aceitar com maior compreensão o que a direção transmite. Os dirigentes das emprêsas, segundo NEWCOM B e SAMMONS,* * Vide Observações Bibliográficas. têm constatado que as esperanças de cada indivíduo, com respeito à sua própria segurança e a de sua família, são sempre as mesmas, seja o indivíduo patrão ou empregado.

A diversificação dos veículos de comunicação prova que o seu campo de ação é vastíssimo: exposições orais, filmes, alto-falantes, cartazes, volantes, manuais, cartas, etc., sobressaindo dentre êles, pela sua maior profundidade, os jornais de circulação interna.

O ÓRGÃO INTERNO

A publicação interna da emprêsa objetiva veicular notícias e dar orientação à comunidade industrial. O binômio empregador-empregado, para que a produção e o bemestar dos indivíduos seja o melhor possível, deve encarar a imprensa periódica interna com seriedade e franqueza. As boas relações entre a administração e os seus subordinados custam tempo e dinheiro.

Por essa razão, não se podem esperar resultados práticos de um momento para outro. O trabalho deve ser constante e os frutos aguardados com persistência, mas dentro de um tempo razoável de espera.

O noticiário das decisões da administração e das atividades dos empregados tem caráter prioritário. O conhecimento da política da emprêsa e das ocupações dos seus companheiros faz com que o empregado se sinta mais seguro. Nada é mais destruidor do moral de grupo de uma emprêsa do que o desconhecimento pelo empregado do "porquê" do seu trabalho.

A preocupação com a orientação do quadro de funcionários deve abranger os mais diversos campos: higiene e segurança, treinamento, órgãos cooperativos, problemas legais, campanhas periódicas, etc.

Seções, no órgão interno de entretenimento, como "curiosidades" e página humorística, devem restringir-se ao mínimo necessário, com o máximo bom-gôsto. Embora necessárias, tais seções, se usadas abusiva ou indevidamente. correm o risco de tornar a publicação vulgar e mesmo enfadonha.

TIPO E PERIODICIDADE DA PUBLICAÇÃO

O tipo de publicação tem correspondência com a sua periodicidade. Jornal ou revista? Em pesquisa realizada em 1967 pelo Departamento de Publicações da Alcan Alumínio do Brasil S.A., entre 21 editores de publicações de indústrias paulistas, a percentagem encontrada foi a seguinte:

Fundamentaram-se os inquiridos, para chegar a tal conclusão, em que "o formato da revista e os maiores recursos gráficos utilizados tornam a publicação mais valorizada aos olhos dos empregados e, com isso, a indução à leitura é maior. A revista é de manuseio e transporte mais fáceis. Em virtude do seu formato, é mais própria para coleção. Quase ninguém coleciona jornais".

Em favor do jornal disseram os editores que "em virtude do custo menor e da produção mais rápida, há a possibilidade de se divulgarem notícias mais atualizadas e de ser editado em intervalos menores".

O trabalho que uma indústria dedica ao seu órgão interno, editando-o em intervalos mais curtos, está na proporção direta da atenção que dedica ao noticiário atualizado sobre os empregados, proporcionando maior integração. O contato mais breve com os empregados, em edições semanais os quinzenais, traz, certamente, melhor intercomunicação, com noticiário mais recente e com freqüência maior, interessando mais o leitor. O número de páginas e a qualidade talvez sofressem um decréscimo, mas os objetivos de atingir o empregado, de fazê-lo participar da vida da emprêsa e, mesmo, de êle "ser notícia" seriam mais facilmente alcançados. O mensário, não obstante, é o que se adapta melhor às condições atuais.

DEPARTAMENTO RESPONSÁVEL

Conquanto o preenchimento das finalidades do órgão interno dependa, basilarmente, das pessoas a quem é confiado, a escolha de um departamento para responsabilizar-se pela feitura é da máxima importância. As funções de ligação entre a alta administração e os empregados, a integração entre as várias áreas da emprêsa, a elevação do entendimento social interno demandam a necessidade de enquadramento da publicação no setor de relações industriais, de preferência por ser um departamento exclusivamente dedicado às tarefas relacionadas com o pessoal. Faz-se mister o permanente contato dos redatores com o operariado e o quadro de funcionários, missão impossível de ser alcançada se o elemento tiver que responder por outras obrigações de natureza diversa.

Também a deslocação do órgão interno para departamentos como o de propaganda e relações públicas tende a provocar a sua "desumanização", dedicando grande parte das suas páginas às relações públicas externas e à promoção de vendas. Quando tal acontece, a publicação foge à sua finalidade, incutindo no leitor a impressão de que a atenção que lhe é devida está canalizada para fora de seu ambiente de trabalho.

Na maioria dos casas a elaboração do órgão interno é de responsabilidade de elemento que tem como função principal outra que não a de editar. Em geral, o responsável pela publicação é apenas o compilador de matérias esparsas, que lhe são canalizadas desordenadamente. Algumas emprêsas acrescentam o item "publicações" a um departamento afim, que cuida do órgão à medida que "folga" das atividades normais. Poucas são as que destinam um elemento exclusivamente para a função, dando-lhe meios e liberdade de ação. Como acontece em todo campo de relações humanas na indústria, o setor da publicação interna dos empregados, especialmente, é tratado como "recreação" ou, quando muito, como veículo das comunicações da administração aos empregados. Não se tem a consciência de que o órgão interno possa ser um ótimo catalizador do moral dos funcionários e um fator importante de boa motivação para o trabalho, de sua integração na emprêsa, o que faria dêle um elemento de incremento da produção, paralelo às diversas formas de racionalização do trabalho, do plano de incentivo e de promoção.

Somente quando a emprêsa brasileira tiver consciência do exato papel que o órgão interno pode representar, tanto em benefício do empregado como na melhoria das condições de trabalho e, conseqüentemente, de lucro, é que o editor de publicações terá o realce e a retribuição merecidos.

RELAÇÃO EMPREGADO-EMPRÊSA

A emprêsa é geralmente apresentada como uma organização formal, com funcionários, cargos e objetivos definidos. Sem dúvida, ela não é apenas isso, pois que aglomerar um grupo de homens, nomeá-los para cargos e funções não é, absolutamente, suficiente para se conseguir dêles uma participação atuante num sentido comum.

Interessa-nos muito ressaltar o fato de basear-se a emprêsa na divisão racional do trabalho, pois, quando fazemos algo para nós mesmos, quando somos mais ou menos auto-suficientes, sem dúvida as nossas necessidades de comunicação são mais restritas, porquanto grande parte delas nos terá como fonte e recebedor. Com essa divisão crescente do trabalho, decorrente do agigantamento da emprêsa, a cada um foi dada uma tarefa, que por si só nem sempre tem sua importância evidenciada; ela será uma dentre centenas de outras a serem feitas para atingir-se o objetivo comum.

A minimização de tarefas, decorrentes de coisas, tende a formar na mente do empregado um sentimento de marginalização, fazendo com que êle se sinta sem importância perante o grupo. A situação real é justamente o inverso, pois a especialização aumenta a produtividade, fazendo-o indispensável, mesmo que, aparentemente, a sua contribuição ao esforço geral pareça diminuta.

O órgão de integração num grupo ou numa emprêsa deve ser justamente aquêle veículo que promova a interpenetração entre as várias áreas. A focalização de determinado setor no órgão de divulgação para a comunidade demonstra a aceitação do grupo para com seu trabalho e, ao mesmo tempo, promove o setor aos olhos de todos.

Isto se assemelha a uma tela em frente à qual se sentam todos os componentes de um grupo; na tela focaliza-se a participação de cada um dêles dentro do grupo, o que sem dúvida promoverá, tranqüilamente, uma conscientização maior dos diversos aspectos que cada indivíduo vem assumindo dentro do grupo. Após algum tempo dessa prática de verdadeiras "sessões de integração", o grupo, sem dúvida, será mais homogêneo, e a maneira de uns indivíduos considerarem os outros será mais realística. A função de cada um estará mais conhecida e definida para êle mesmo e para os outros.

Não sòmente deve o órgão interno promover o inter-relacionamento dos empregados como, principalmente, deve proporcionar-lhes uma visualização perfeita dos objetivos, dos métodos e da política administrativa da emprêsa. Conhecedor da situação que o cerca, sabendo a exata posição da emprêsa quanto às matérias principais da sua vida, somente no tocante às posições e atividades que têm contato com cada empregado, pode êste desenvolver o seu juízo com respeito ao empregador e aplicar-se melhor ao trabalho.

Não só a fábrica e/ou escritórios diversos devem ser focalizados de maneira ampla, mas outras seções e departamentos. Um programa de publicações, em rodízio, acêrca dos vários departamentos, tende a criar um interconhecimento ideal para que cada trabalhador saiba o que os seus colegas realizam em prol da sua mesma emprêsa.

REAÇÃO DO EMPREGADO AO ÓRGÃO

Mesmo que o editor ou os colaboradores do órgão interno estejam em permanente contato com os empregados, a visão unilateral das relações pode ser viciada ou cursar um rumo rotineiro, sem reações e acontecimentos positivos ou negativos. O grande mal, já apontado, da pouca atenção ao empregado, tem seu saneamento, em primeiro lugar, em virtude de um permanente contato e, à medida do possível, da vivência em todos os setores da emprêsa. A existência de um elemento ou de uma equipe exclusiva do órgão pode possibilitar tal integração, que ensejaria a efetivação de reclamações, sugestões, etc., por parte dos empregados, através de uma forma direta. A existência de uma seção de "Cartas à Redação", rara no panorama atual das publicações de emprêsa, se bem conduzida, enseja ao empregado um contato indireto com tôda a comunidade industrial, com a vantagem da afirmação, através da assinatura da correspondência publicada, da sua participação no grupo. O número de colaboradores da publicação indica, também, a resposta dada pelos que se interessam em participar do órgão, ao apêlo da integração.

Iniciativa, pendor redacional e criativo, necessidade de projeção etc., diversificam os motivos para o aparecimento de colaboradores. Entretanto, qualquer que seja o motivo, é inegável que quanto maior fôr o número de colaboradores, melhor dar-se-á a ampliação das opiniões e dos entendimentos.

Outro problema de relevância é o da matéria não aproveitada, em geral de colaboradores que não têm muito contato com a coordenação do órgão. Se são boa política a procura e o recrutamento de colaboradores em grande número, deve-se ter em conta sempre a possibilidade de frustração e melindre resultantes do não-aproveitamento de matérias. Tal situação delicada tenderá a se agravar se a recusa, embora explicada e comunicada ao empregadocolaborador, fôr reiterada.

DIFERENÇA ENTRE ÓRGÃO RI E RP

Considerado sob o prisma da integração empregado-emprêsa, devemos salientar, ser um dos grandes "pecados", a confusão, atualmente existente, entre o órgão interno e as publicações de relações públicas e de promoção de vendas.

Com efeito, muitos editores preocupam-se em atingir objetivos, exclusivamente externos, em detrimento de noticiário direto e indireto acêrca dos empregados.

Não se deve condenar frontalmente tal confusão. O ideal seria, contudo, o aconselhamento aos responsáveis pelas publicações, ou, mesmo, à alta direção das emprêsas, no sentido de se criar uma mentalidade dicotômica sôbre tal assunto, fazendo-se completa diferenciação entre o órgão interno e o externo.

O órgão interno, por natureza, deve tratar do empregado, dando-lhe mesmo maior atenção do que às atividades da emprêsa e do seu noticiário. Embora pareça contraditório que a própria emprêsa-editôra dedique maior atehção ao quadro de empregados do que às suas atividades, tal posição explica-se em virtude de o empregado não só conhecer, em seu setor, o que faz a fábrica, mas, principalmente, porque êle se sente como um dos artífices da produção. Por isso, mais dó que a emprêsa, o órgão interno deve preocupar-se com os empregados, sua família, suas associações, e, sem exageros, do papel que desempenham dentro da emprêsa, criando especialmente ou desenvolvendo adequadamente o espírito de grupo e a noção de comunidade integrada.

São evidentemente dois públicos diversos:

• O externo é aquêle conjunto heterogêneo de pessoas às quais a emprêsa deve apresentar-se através dos seus produtos e das suas campanhas publicitárias, da utilização dos seus produtos em geral. Visa a criar uma boa imagem da emprêsa, no consenso geral da população, orientada para exaltar a qualidade e a boa aceitação dos seus produtos.

• O interno, por outro lado, é um público que tem um fator comum de importante homogeneidade: todos são empregados da emprêsa. Tal afirmação não quer dizer que o status e as condições sócioeconômico-culturais sejam as mesmas nos diversificados campos de operariado, mestria e administração.

Tendo uma formação que vai desde a mais baixa, a primária, até a de especialização universitária, a emprêsa abriga, em seu seio, uma gama enorme de diferentes indivíduos e de concepções de vida diversas.

O fator, anteriormente citado, de que todos são empregados da mesma emprêsa, no entanto, não pode e não deve ser esquecido. Da integração e da noção de equipe que tenha o seu quadro de funcionários, dependem o sucesso e o maior desenvolvimento da emprêsa.

Concluímos, por conseguinte, que o órgão interno deve tratar exclusivamente dos empregados e o órgão de relações Públicas e/ou de Promoção de Vendas, deve tratar da boa imagem social e comercial da indústria dentro das comunidades que atingem, o que não quer, necessàriamente, dizer que não possa ser o primeiro um ótimo veículo de relações públicas, no caso de mostrar perfeita integração entre emprêsa e empregados. Isto seria ressaltado pela exteriorização da idéia de que a vida interna da indústria é boa.

OBSERVAÇÕES BIBLIOGRÁFICAS

1. O presente artigo baseou-se no estudo do tema II da I Convenção Nacional de Editores de Jornais e Revistas de Empresas, A Importância do Órgão Interno na Integração dos Empregados, dos convencionais Luiz MOTA, NILO LUCHETTI, ONOFRE C. A. SAMPAIO, UBIRAJARA D. MENDES e os autores dêste trabalho.

2. Obras consultadas: NEWCOMB, James McRobert e SAMMONS, Marge, Employee Communications in Action, Harper Brothers, 1961; HOYLER, Siegfried, Revista da Abape, n.º 2, do 1.º trimestre de 1967, A Publicação Interna - House Organ, Moral de Grupo.

3. Para elaboração da tese apresentada à I Convenção Nacional de Editores de Jornais e Revistas de Emprêsa, foi realizada uma pesquisa com as 65 publicações participantes do concurso efetuado durante aquele certame. Pertencendo a empresas situadas nos estados de Minas Gerais, Guanabara, São Paulo, Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul, o levantamento pode, validamente, dar uma visão geral de como se edita atualmente o órgão interno no Brasil. Na verdade, foram 195 as obras analisadas, pois o regulamento do concurso exigia a apresentação dos três últimos números de cada órgão.

4. A pesquisa abrangeu 10 itens:

• tipo de publicação,

• periodicidade,

• departamento responsável,

• formato,

• número de páginas,

• número de cores,

• números publicados,

• focalização de empregado no órgão,

• tiragem, e

• custo unitário.

Os resultados encontrados foram os seguintes:

1. Periodicidade

2. Tipo de Publicação

3. Departamento Responsável

4. Formato

5. Número de Páginas

6. Número de Côres

A grande parte das publicações dos dois últimos grupos são impressas nas suas páginas interiores com apenas duas côres, aumentando o uso da côr na primeira e última capas.

7. Números Publicados

A constatação dos números publicados de cada órgão tornou-se impraticável em virtude das diversas formas de contagem: em numeração contínua desde o início, em numeração dividida anualmente, etc. Optou-se, então, pela idade da publicação. Tal prática também mostrou ser deficiente, pois a periodicidade, em relação à idade da publicação, influirá desigualmente no número de edições.

8. Focalização do Empregado no Órgão

Além da visão geral do setor de noticiário sôbre empregados, a pesquisa considerou três itens da matéria bastante expressivos:

• entrevistas com funcionários,

• noticiário esportivo, e

• publicação de fotografias de empregados na capa do órgão interno.

Os resultados estão dispostos através de graus de intensidade de atenção a cada item pesquisado.

9. Tiragem

10. Custo Unitário (outubro de 1967)

  • *
    Vide Observações Bibliográficas.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      03 Jul 2015
    • Data do Fascículo
      Dez 1968
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