ARTIGOS
A economia da diversificação*
Edith Penrose
Professora do Departamento de Economia da Universidade Johns Hopkins, Maryland, EUA
1. INTRODUÇÃO
Dentre as características mais marcantes das firmas do ramo de indústria e comércio, a diversificação de suas atividades - às vezes denominada diversificação da produção ou integração, e que parece acompanhar o crescimento dessas firmas - talvez seja a característica mais inadequadamente abordada pela análise econômica. Acusa-se com freqüência este processo de ineficiente, no sentido de que a produtividade tende a decrescer com o aumento do número de atividades às quais se aplica um certo elenco de recursos.1 A produção eficiente de um certo conjunto de recursos é o critério de que dispõe o economista para considerar como satisfatório o desempenho do processo produtivo e constitui o argumento fundamental em favor da existência de grandes firmas; as firmas mais bem-sucedidas, porém, e, sem sombra de dúvida, mais eficientes no mundo dos negócios são altamente diversificadas, fabricam produtos diversos, são extensivamente integradas e, aparentemente, estão sempre dispostas a aumentar o número de produtos de sua fabricação. Ampla gama de explicações ad hoc tem sido elaborada, desde as que argumentam com as incertezas e imperfeições do mercado, até as que se referem ao peso morto do passado. São suficientemente verdadeiras até onde alcançam; seu alcance, porém, não é muito grande.
Pode ser verdadeiro o fato de que, para muitas das linhas de produção (senão para a maioria), a produtividade e os custos, ceteris paribus, tenderiam a ser menores nas firmas mais especializadas que nas mais diversificadas e que, nos períodos favoráveis, os lucros sobre o investimento tenderiam a ser maiores. Esta afirmação não pode ser adequadamente testada, pois cada firma individual dispõe de diferentes serviços produtivos; seus produtos diferem dos de outras firmas, seja tecnicamente ou porque assim pareça aos olhos do consumidor; os sistemas de contabilização não são apenas diferentes, mas, sempre que houver uma variedade de produtos fabricados, haverá elementos arbitrários no cálculo dos custos; e assim por diante. Ainda que fosse válida a afirmação, sua relevância seria limitada na determinação da utilização mais lucrativa dos recursos, por parte de qualquer firma de iniciativa privada, sob condições de mudança. Isto se deve, em parte, ao fato de que uma firma especializada é altamente vulnerável num ambiente onde ocorrem modificações na tecnologia e no gosto dos consumidores. Freqüentemente ela pode fazer uso mais lucrativo de seus recursos, durante um período de tempo, por meio da diversificação de sua produção. Tal possibilidade decorre do fato de que a variabilidade das condições que determinam as oportunidades produtivas para a firma favorece continuamente a realização de novos investimentos, os quais são lucrativos para a firma que simultaneamente mantém, ou mesmo expande, aquelas linhas de produção com as quais já comprometeu seus recursos.
A explicação da diversificação da produção, com base nas assim chamadas imperfeições do mercado, repousa amplamente na tendência para o declínio da lucratividade dos mercados existentes, à medida que a produção se expande. Isto é, sem dúvida, um aspecto da questão, porém não necessariamente o mais importante. É o caso particular de alterações nos custos de oportunidade, para a firma, de seus próprios recursos. Não é necessário que os mercados existentes se tornem menos lucrativos em si mesmos, mas apenas que se tornem relativamente menos lucrativos para qualquer novo investimento que a firma deseje realizar. Isto pode perfeitamente ocorrer, tanto devido ao surgimento de novas oportunidades de investimento, como em razão do declínio das velhas oportunidades, ou ainda, devido ao fato de que os mercados para os produtos existentes não crescem com suficiente rapidez, proporcionando campo que satisfaça a capacidade interna de crescimento da firma. Como vimos, o surgimento de novas oportunidades depende não apenas de modificações nos preços, gostos e outras condições do mercado, mas também de tipos especiais de serviços produtivos e da experiência desenvolvida no âmbito da firma.
Novas oportunidades para expansão podem ser relacionadas a modificações das condições externas ou mudanças dentro da própria firma. Determinado tipo de competição, porém, relaciona essas modificações entre si. As ações dos concorrentes constituem uma parte do ambiente externo de uma firma individual e as técnicas por ela adotadas, para manter sua posição perante aqueles, têm por si mesma significativa influência na criação, pela firma, de novos serviços produtivos.
A relação entre a concorrência e a oferta interna de serviços produtivos assume importância especial quando a firma tem que se manter atualizada, com respeito às inovações tecnológicas, para competir com sucesso, e quando a lucratividade continuada da firma estiver associada com as possibilidades de inovação. O resultado dessas condições de concorrência tem sido a adoção quase que universal, por parte das grandes firmas, de laboratórios de pesquisa industrial, os quais aceleram imensuravelmente a criação dos serviços produtivos e a experiência, no âmbito da firma individual. O processo schumpeteriano de destruição criativa não destruiu a grande firma; ao contrário, ele a impeliu a ser cada vez mais criativa.
Nos EUA, onde o processo tem-se desenvolvido no mais alto grau, uma espécie de competição de criatividade tornou-se o elemento dominante no padrão de comportamento competitivo em muitas indústrias. Tanto produtores como consumidores parecem possuídos de uma compulsão obsessiva por tudo aquilo que é novo. No caso extremo, a firma individual é forçada a remodelar seus produtos - a criar o novo e o melhorado tanto no que se refira ao desempenho quanto ao design. Em grande escala, os novos produtos são superiores quanto ao seu desempenho; em âmbito considerável, porém, esses produtos são apenas novos e exteriormente diferentes, e podem ser vendidos desde que se convença o consumidor de que a novidade é o melhor. Uma vez estabelecida esta crença, um circulo vicioso quase irracional pode desenvolver-se, no qual o consumidor deve ter um novo modelo a cada ano e cada produtor deve, portanto, produzi-lo.
Independentemente, porém, do fato de que tal processo, quando levado a extremos,2 faça ou não sentido, ele tem considerável repercussão no tipo de crescimento das firmas. De um lado, este processo torna mais vulneráveis e restringe as perspectivas de crescimento das firmas que se limitam a uma estreita gama de produtos; por outro, obriga as firmas a se especializarem em uma faixa relativamente estreita de áreas básicas de produção e restringe o grau de diversificação de atividades fundamentais que elas podem alcançar. Daremos bastante atenção à relação entre diversificação e concorrência; antes de aprofundar este tópico, porém, devemos discutir o significado da diversificação e os tipos de oportunidades que a determinam.
2. SIGNIFICADO DA DIVERSIFICAÇÃO
Foram já bastante discutidas as ambigüidades inerentes aos conceitos de um produto ou uma indústria; as mesmas dificuldades se apresentam, necessariamente, quando se trata do conceito de diversificação. É comum que as firmas sejam caracterizadas como monoprodutoras ou multiprodutoras, altamente diversificadas ou não-diversificadas, etc. O sentido exato dos termos dependerá da disposição de bens definidos como produto singular significativo para a análise em apreço. Nestes termos, para alguns fins, uma firma que produza apenas sapatos pode ser considerada como não-diversificada, enquanto que, para outros propósitos, uma firma que produza sapatos de todos os tamanhos e tipos, para pessoas de todas as idades e de ambos os sexos, pode ser considerada como altamente diversificada. Não é possível, nem recomendável, tentar atribuir qualquer significado absoluto a esses termos. Por conseqüência, não somente não faz sentido empreender uma comparação do grau de diversificação entre diferentes firmas, como também são de utilidade bastante limitada as estatísticas quantitativas dos diferentes produtos fabricados por diversas firmas, especialmente se não se conhece a identidade das firmas a que se referem. O Temporary National Economic Committee, por exemplo, elaborou amplo estudo sobre a estrutura de 50 grandes companhias manufatureiras nos EUA, quanto aos produtos de sua fabricação. Dele constam tabelas complexas que oferecem uma variedade de informações sobre o número de produtos fabricados e a importância de cada produto para cada companhia.3 Esse estudo, não obstante a utilidade de suas muitas informações, não propicia qualquer auxílio à nossa análise (aliás, nenhum outro estudo poderia oferecer) uma vez que o número de produtos de uma firma não tem qualquer significado geral, se desacompanhado de informações pormenorizadas sobre a firma e seus produtos. A definição de produto é, na melhor das hipóteses, arbitrária; para que os critérios de definição de um produto tenham aplicação na comparação entre firmas, devem possuir o mesmo significado para todas elas e, antes de mais nada, estar relacionados com os motivos que levaram à discussão do número de produtos. As classificações censitárias de produtos não podem satisfazer essas condições. Segundo as classificações modificadas dos produtos, usadas pelo estudo do TNEC, por exemplo, um produto era, às vezes, definido em relação ao tipo de matéria-prima utilizada (consideravam-se diferentemente um cobertor de pura lã e um cobertor com 90% de lã); outras, quanto ao tipo de usuário (sapatos para meninas e crianças eram considerados separadamente dos sapatos para jovens e meninos); às vezes, a classificação dizia respeito ao processo de fabricação (sapatos cuja sola é costurada diretamente na parte superior do sapato são diferentes daqueles em que se utiliza uma vira4); outras, referia-se às combinações segundo as quais os produtos eram vendidos (neste caso, eram considerados produtos diferentes um terno de três peças mais uma calça extra e um terno de duas peças mais uma calça extra), e assim por diante.
Se a firma A fabrica vinte produtos e a firma B somente quatro, será sensato concluir que a firma A é mais diversificada? Modificar-se-ia nossa conclusão se viéssemos a saber que os vinte produtos da firma A são vinte tipos de sapatos, ao passo que os quatro produtos da firma B são tratores, rádios, motores para aviões e automóveis?
Recentemente a Federal Trade Commission (Comissão Federal de Comércio) divulgou amplo relatório sobre a diversificação produtiva nas mil maiores companhias manufatureiras dos EUA em 1950.5 O relatório apresenta estatísticas sobre a diversidade das atividades dessas companhias, medida pelo número de classes de produtos fabricados. São apresentadas algumas informações úteis sobre as diferenças entre companhias de diferente porte; novamente aqui, porém, devido à ambigüidade e à impossibilidade de comparação de classes de produtos, é impossível avaliar o significado da diversificação comparativa entre companhias diversas.6 Com dificuldades desse tipo defrontam-se as tentativas de comparar estatisticamente a estrutura produtiva de diferentes firmas. Tais dificuldades, entretanto, não interferem na análise da economia da diversificação, na medida em que esta se ocupa do estudo do processo, segundo este se desenvolve dentro das firmas. Os problemas mencionados não oneram igualmente o equacionamento do significado da diversificação, na análise das relações de mercado e das relações de produção, desde que saibamos com que tipos de firmas estamos tratando.7
Objetivando analisar o processo de diversificação, podemos afirmar que uma firma diversifica suas atividades sempre que, sem abandonar completamente suas antigas linhas de produtos, ela parte para a fabricação de outros, inclusive produtos intermediários, suficientemente diversos daqueles que ela já fabrica, e cuja produção implique em diferenças significativas nos programas de produção e distribuição da firma. A diversificação compreende, desta maneira, incrementos na variedade de produtos finais fabricados, incrementos na integração vertical e incrementos no número de áreas básicas de produção nas quais a firma opera. Este último tipo de diversificação è de fundamental importância e não pode ser avaliado pelo número de diferentes tipos de produtos, finais ou intermediários, fabricados. Uma firma que produzisse, por exemplo, vários tipos de freio a ar e passasse a fabricar equipamentos eletrônicos, estaria diversificando sua produção (desde que não abandonasse totalmente sua produção de freios a ar), ainda que, simultaneamente, reduzisse o número dos diversos tipos de freios a ar produzidos e, em conseqüência, o número total dos diferentes produtos por ela fabricados. Este exemplo chama-nos a atenção para o fato de ser inútil qualquer tentativa no sentido de medir a extensão da diversificação como tal, pois não existe uma medida única que atenda a todos os propósitos da análise. Será a firma produtora de freios a ar e de equipamentos eletrônicos menos diversificada, uma vez que houve uma redução no número total de produtos individuais fabricados? O tipo de diversificação é, evidentemente, diferente, e, para um estudo do crescimento das firmas, o tipo de diversificação e suas causas são de muito maior relevância do que o quantum de diversificação, seja lá o que isso possa significar.
2.1 Áreas de especialização
A diversificação pode ocorrer dentro das áreas de especialização existentes na firma, ou pode ser uma conseqüência de sua penetração em novas áreas. Uma firma sempre se dedica a um certo tipo de produção e tem uma posição em certos tipos de mercado: ambas as coisas serão chamadas, aqui, de áreas de especialização da firma.
A cada tipo de atividade produtiva que utiliza máquinas, processos, habilidades e matérias-primas, todas complementares e intimamente associadas no processo de produção, chamaremos base de produção ou base tecnológica da firma, independentemente do número ou tipo de produtos manufaturados. Uma firma pode ter diversas bases assim definidas e, mesmo quando guardam uma relação entre si, devida a elementos comuns, conhecimentos ou tecnologia empregada, elas serão tratadas como bases diferentes, se houver diferenças substanciais entre suas características tecnológicas. O grupo particular das atividades, que serão consideradas como uma única base de produção, variará para as diversas firmas. A importância característica de tais grupos repousa no fato de que os passos na direção de uma nova base exigem que a firma seja competente em alguma área tecnológica significativamente diferente.
Uma firma pode vender seus produtos em diferentes mercados, embora possuindo apenas uma base de produção. Os mercados, segundo este ponto de vista, são convenientemente classificados de acordo com o tipo de comprador a que eles servem, uma vez que algumas das mais importantes oportunidades para a diversificação surgem como resultado da relação entre a firma e seus clientes. Cada grupo de clientes, que a firma espera influenciar por meio do mesmo programa de vendas, é chamado área de mercado independentemente do número de produtos vendidos àquele grupo. Assim, grupos ocupacionais (como donas de casa, fazendeiros ou firmas industriais), organizações de distribuição (como diversos tipos de firmas de atacado ou varejo), grupos geográficos (no caso de firmas cujos mercados existentes são geograficamente limitados), diferentes grupos de renda e grupos sociais etc. podem constituir individualmente uma área de mercado diferente, se forem necessários diferentes programas de vendas para influenciá-los. Os critérios adequados para a delimitação de áreas de mercado diferem para diversas firmas; a importância das fronteiras está no fato de que o impulso em direção a uma nova área exige uma concentração de recursos no desenvolvimento de um novo tipo de programa de vendas e capacidade para enfrentar um tipo diferente de pressão competitiva.
Para cada mercado, pode-se produzir ampla variedade de produtos; e uma mesma base de produção pode servir a uma ampla variedade de mercados. A diversificação no âmbito da mesma área de especialização diz respeito à produção de um número maior de diferentes produtos baseados na mesma tecnologia e vendidos nos mercados da firma já existentes. A diversificação que implica na partida da firma para a conquista de novas áreas de mercado pode dar-se segundo uma das três seguintes maneiras: a) entrada em novos mercados com novos produtos, utilizando a mesma base de produção; b) expansão, no mesmo mercado, como novos produtos baseados em uma área de tecnologia diferente; c) entrada em novos mercados, com novos produtos, também baseados em uma área de tecnologia diferente.8 Estas categorias, evidentemente, não compreendem a diversificação que se dá mediante o aumento do número de produtos fabricados pela firma para seu próprio uso, categoria esta cuja discussão será melhor realizar à parte.
Muitas firmas têm-se diversificado segundo todas essas maneiras, tanto no âmbito de suas áreas existentes de especialização como fora delas; noutras firmas, o processo se deu segundo uma ou duas das maneiras apontadas. Poucas firmas, se é que existe alguma, podem ser consideradas como completamente não-diversificadas, desde que os conceitos de produto e, principalmente, produtos intermediários, sejam definidos com bastante rigor. Em quaisquer das circunstâncias, incluindo-se nestas o estágio de desenvolvimento tecnológico e o nível de organização das firmas concorrentes, um alto índice de diversificação é quase uma necessidade, no sentido de que nenhuma firma esperaria competir com sucesso se não produzisse pelo menos uma linha mínima de produtos ou um mínimo de suas próprias exigências intermediárias, sendo que o número de produtos envolvidos depende das circunstâncias.
Existe um pequeno número de estudos onde estão arroladas as causas da diversificação; tais registros estabelecem adequadas categorias classificatórias, nas quais podem associar-se quaisquer conjuntos de exemplos apresentados. Sua aplicação, porém, é limitada para permitir uma análise da relação entre a diversificação e o processo de crescimento. Relacionaremos aqui o processo de diversificação com as mutáveis circunstâncias internas e externas que afetam as oportunidades produtivas da firma, discutindo quais as forças que promovem a diversificação e as que limitam a liberdade de ação da firma nesse setor.
3. AS OPORTUNIDADES ESPECÍFICAS PARA A DIVERSIFICAÇÃO
Novas oportunidades de produção surgem das mudanças nos serviços produtivos e da experiência disponível na firma - do tipo que foi discutido nos capítulos anteriores - bem como das modificações no sortimento externo e nas condições do mercado, igualmente percebidas pela firma. Uma única oportunidade, no sentido aqui expresso, é mero componente de toda a oportunidade produtiva da firma, conforme anteriormente definida. Em outras palavras, é um dentre o conjunto de usos possíveis dos recursos da firma, em cada um dos quais a firma acredita poder realizar um lucro, sendo este calculado sem relação com o custo de oportunidade de seus recursos (ou seja, a firma calcula o lucro possível referente a cada oportunidade, sem considerar se ela será mais ou menos lucrativa do que as alternativas disponíveis). Assim, qualquer oportunidade especifica de diversificação é simplesmente uma oportunidade, não ainda a via de ação mais lucrativa - a firma desistiria dessa opção se acreditasse que outros produtos poderiam proporcionar-lhe maiores lucros, ou se considerasse que as ações necessárias não compensariam o risco ou não jusitificariam o volume de recursos a serem mobilizados para essa finalidade.
Não é necessário repetir, aqui, nossa análise sobre a existência, nas firmas, da sempre presente capacidade ociosa de serviços produtivos e do processo pelo qual ela é continuamente gerada pelas operações normais da firma. É fácil compreender, à luz deste processo, como e por que pode resultar lucrativo para a firma modificar os produtos de sua fabricação ou acrescentar novos tipos de produtos à sua linha de produção. Na discussão que se segue, trataremos das características de algumas das mais importantes fontes gerais de novas oportunidades para a diversificação.
3.1 A importância da pesquisa industrial
A pesquisa industrial é a investigação deliberada de propriedades ainda desconhecidas de materiais e máquinas utilizadas na produção (ou ainda, de seus modos de utilização ainda não desenvolvidos), com a finalidade expressa de melhorar os produtos existentes ou criar novos produtos e processos produtivos. O desenvolvimento sistemático e extensivo do laboratório de pesquisa industrial, no entanto, é de origem bastante recente. Neste século, apenas, foi que ele alcançou proporções tais que não se pode mais, sem mencioná-lo, discutir as atividades normais das grandes firmas.9 Muitos empresários bem cedo perceberam as possibilidades de melhorar, a longo prazo, as condições de lucratividade de suas próprias firmas, por meio da pesquisa sistemática das propriedades dos materiais e equipamentos com os quais elas trabalhavam. Isto ocorreu, de uma parte, devido ao fato de que eles sonhavam produzir novas coisas e, de outra, porque viam esse tipo de pesquisa como uma maneira de melhorar os produtos existentes e ampliar suas oportunidades.
Independentemente dos sonhos ou motivações dos empresários, independentemente dos processos históricos reais que condicionaram o seu desenvolvimento, porém, o laboratório de pesquisa industrial constitui a resposta lógica da firma individual ao desafio, inerente ao processo schumpeteriano, da destruição criativa. Toda firma especializada, afinal, é vulnerável. Sua lucratividade e sua própria sobrevivência como firma são ameaçadas, tanto por alterações adversas na demanda, pelo tipo de produto que produz, como pelo crescimento da concorrência exercida pelos outros produtores. Seu crescimento é limitado pelo crescimento do mercado de seus produtos reais ou da porção do mercado existente que ela pode conquistar. Por outro lado, conforme mostramos, suas oportunidades são, em grande escala, determinadas pelos recursos disponíveis. Os empresários e o pessoal de gerência trabalham dentro do quadro de referência proporcionado por esses recursos, e seus interesses e habilidades são por eles condicionados. À exceção de firmas que são dirigidas por empresários do tipo aventureiro, construtores de impérios, existe uma tendência de cada firma, em primeiro lugar, pelo menos, para se concentrar no desenvolvimento lucrativo daquilo que ela já possui.
Uma firma pode tentar assumir uma posição de salvaguarda de seus interesses destruindo ou evitando a concorrência efetiva de outras firmas, por meio de práticas competitivas ruinosas ou recursos monopolistas restritivos, que aliviam a necessidade de enfrentar ou se antecipar a sérias ameaças à sua posição. Em tais circunstâncias, uma firma poderá crescer durante um período considerável de tempo, dependendo da demanda de seus produtos, sem ser ameaçada pela concorrência, em termos de preço, nem pelo temor de que a evolução da competição tornará obsoletos seus produtos ou processos. São raros os exemplos de crescimento, durante longos períodos, passíveis de ser atribuídos exclusivamente a tais mecanismos protecionistas,10 embora essas características possam ser encontradas na evolução de quase toda grande firma.
A proteção conseguida contra os concorrentes, quando a firma explora ao máximo suas oportunidades de ganhos monopolistas, embora seja freqüentemente ampla, não pode ser total, nem absolutamente segura. Para muitas, se não para a maioria das firmas, a longo prazo, a garantia mais eficaz, tanto contra a concorrência direta como contra a concorrência indireta de novos produtos, está na sua habilidade em se antecipar às inovações nos processos, produtos e técnicas metodológicas, ou, pelo menos, em enfrentá-las à medida que surjam. Numa sociedade caracterizada por um espírito empresarial bastante difundido e por uma tecnologia altamente desenvolvida, a ameaça de concorrência por parte de novos produtos, novas técnicas, novos canais de distribuição, novas maneiras de influenciar a demanda do consumidor, constitui, sob vários aspectos, um tipo de influência muito mais importante que qualquer outro tipo de concorrência.11 Seu efeito principal é o de forçar uma firma, que deseja manter-se no mercado, a aprender tudo o que puder sobre o produto, sobre seu mercado e, em particular, sobre a tecnologia relevante no caso, e tentar antecipar-se às inovações de outras firmas.12
A maior parte das inovações dos processos produtivos origina-se de firmas industriais, e as primeiras firmas a introduzi-las são as que tendem a conseguir uma vantagem competitiva, pois podem proteger-se por meio de uma patente ou evitar a imitação de seu produto por outros meios, ou, ainda, pelo simples fato de terem sido as primeiras. As firmas têm bastante consciência deste fato e, para estudar a influência dos fatores ambientais sobre o seu crescimento, este seria um dos aspectos mais importantes a ser considerado. Já mencionamos que o meio ambiente exerce sua influência principalmente por meio de seus efeitos sobre as decisões empresariais. Se uma firma atentar para o caráter transitório das condições que criam sua própria oportunidade de negócios, pois novos artigos serão inevitavelmente introduzidos no mercado por outras firmas, sua resposta a .essa situação será uma ativa política de inovação por ela própria dinamizada.13 Ainda que o principal objetivo seja desenvolver meios de reduzir os custos e melhorar a qualidade dos produtos existentes, a exploração de recursos e as pesquisas envolvidas certamente acelerarão a produção de novos conhecimentos e a criação de uma nova série de processos produtivos, no âmbito da firma.14
Não há razão para supor que os novos conhecimentos e serviços serão úteis apenas em função da fabricação dos produtos já existentes de uma firma; pelo contrário, eles podem perfeitamente deixar de atender a este fim e, ainda assim, proporcionar a base que dará à firma vantagens em área totalmente nova. As oportunidades para uma firma são necessariamente ampliadas, quando ela se aplica ao conhecimento especializado de uma tecnologia que não seja, em si mesma, muito específica em relação a qualquer tipo particular de produto como, por exemplo, o conhecimento de diferentes tipos de processos de engenharia ou de química industrial.15
Assim, mesmo que a pesquisa tenha sido empreendida simplesmente porque a firma esteja convencida de que ela resultará em novas oportunidades lucrativas, ou porque a considere necessária à sua sobrevivência em um ambiente competitivo, ela permite, pelo menos às grandes firmas, evitar o processo de destruição criativa e desenvolver-se num mundo de contínuas novidades que, de outra forma, poderia tê-las destruído. Os resultados espetaculares da pesquisa industrial naturalmente estimularam as imitações, que costumam acompanhar qualquer inovação importante; firmas de todos os tipos convenceram-se de que um laboratório de pesquisas seria a panaceia para a solução de seus problemas. As perspectivas de oportunidades ilimitadas, assim evocadas, são pura ilusão para grande parte das firmas.16 Novos conhecimentos podem ser adquiridos, porém com grande dispêndio e, para a pequena firma, a utilização de seus recursos para fins de pesquisa, em geral, tem igual probabilidade de ser lucrativa como de constituir um desperdício, a menos que a firma venha desenvolvendo idéias específicas e razoavelmente originais. A avaliação dos resultados da pesquisa é extremamente difícil e os seus métodos são ainda bastante primitivos.17 O montante dos recursos a ser destinado à pesquisa é geralmente determinado sobre uma base arbitrária (por exemplo, uma certa percentagem das vendas), pois não existe, até o momento, uma forma razoavelmente precisa para determinar, a priori, o quantum de investimento que, em qualquer tipo particular de pesquisa, mostrar-se-á, afinal, satisfatório. A pesquisa é, essencialmente, uma atividade especulativa assumida com freqüência devido às necessidades ou por uma questão de fé.18
3.2 A significação do empenho em vendas
As oportunidades para a produção de novos produtos surgem não apenas a partir das atividades produtivas da firma - incluindo-se aí suas pesquisas tecnológicas - mas também de suas atividades de vendas. Esta segunda fonte de oportunidades é importante para todos os tipos de firmas, mas é, talvez, da maior importância para aquelas cujos processos produtivos sejam altamente especializados, relativamente ao tipo de produto para o qual são adequados; ou para aquelas firmas cujos processos podem ser simples e facilmente imitados, e são de natureza tal que a pesquisa traz muito poucos resultados que lhes proporcionem vantagens competitivas. É o que ocorre, por exemplo, com alguns tipos de processamento de alimentos, como a produção de leite ou a moagem de cereais, o processamento de tabaco e alguns tipos de fabricação de produtos têxteis. Sempre que uma firma adota políticas segundo as quais a venda de seus produtos é, de alguma forma, associada com a propaganda do próprio nome da firma, não apenas a demanda dos produtos existentes, mas também a de outros produtos da mesma firma tende a se modificar, de modo que a oportunidade produtiva para a firma se altera em função do próprio processo de geração da demanda. As perspectivas oferecidas pela diversificação serão bastante diferentes, caso a concorrência em um certo mercado force os preços para baixo (ou force a absorção dos custos de transporte), ou no caso em que ela exija da firma um esforço de vendas. No primeiro caso (redução de preços), trata-se da resposta de um mercado impessoal, onde a identidade do vendedor não tem qualquer importância. No segundo caso (ênfase nas vendas), esta será quase que necessariamente ligada não apenas ao produto, mas também ao nome ou marcas do vendedor, e, neste caso, a identidade da firma surge como um fator competitivo importante. Se, por exemplo, a firma deve criar novos mercados para seus produtos, ela estará virtualmente enquadrada nesta segunda condição, pois raramente é possível fazer a propaganda de um produto, ou de alguma forma elevar suas vendas, sem .estar simultaneamente fazendo a propaganda da fonte de oferta, se não visando o consumidor final, ao menos objetivando motivar os atacadistas ou varejistas.19
Quando uma porção significativa do processo de criação de mercados consiste num esforço pessoal de vendas dos quadros de uma firma, diversas alterações importantes têm lugar. Estabelece-se uma relação entre a firma e seus fregueses, o que, tudo o mais permanecendo inalterado, coloca a firma numa posição de preferência em relação aos recém-chegados ao mercado. Com freqüência, esta relação vai muito além da confiança amigável e pessoal de um homem para outro, e se estende para o campo de assuntos técnicos. A firma vendedora, por exemplo, faz esforços especiais no sentido de ajustar a qualidade e as características de seus produtos às exigências dos compradores. A firma compradora, por seu turno, empenha-se no sentido de informar o vendedor sobre suas necessidades peculiares, de modo a obter ajuda no sentido de satisfazê-las, e, assim, resolver seus próprios problemas. Isto tende a proporcionar um canal de acesso privilegiado à firma que conseguiu estabelecer tal relacionamento com o comprador, no caso de ela vir a interessar-se na colocação, no mercado, de outros produtos diversos daqueles que esteja fornecendo no momento. Deste modo, uma firma que tenha conseguido estabelecer este tipo de relação com os compradores defrontar-se-á com um conjunto diferente de oportunidades produtivas. Estas oportunidades podem continuar a crescer, à medida que a firma aprende mais e mais, não apenas sobre seus mercados, mas também sobre as potencialidades técnicas de seus próprios produtos.
O outro método usual de estabelecimento de um mercado se faz por meio das diversas formas de propaganda nos vários meios populares e das técnicas de comunicação com o público. A eficácia do tipo de propaganda a ser empregado está condicionada às características do produto, ao tipo de competição e às práticas usuais do setor particular de comércio ao qual pertence o produto. Também aqui ocorre com freqüência que a própria firma seja tão divulgada quanto
o produto, ou até mais. No caso de bens de consumo perecíveis, cuja quantidade ou tem pouca importância ou é razoavelmente evidente por meio de uma inspeção rápida, a reputação da firma faz, de fato, pouca diferença. Mesmo neste caso, porém, o consumidor pode, freqüentemente, preferir os produtos da firma mais conhecida ou que ofereça os produtos mais conhecidos, apesar de os produtos em questão serem iguais em suas características. No caso de bens cuja qualidade é de difícil avaliação, ou quando o serviço, probidade e continuidade do fornecimento constituem uma parcela real da utilidade que o consumidor adquire quando compra o produto, a reputação da firma é da maior importância, quer seja o comprador um fabricante, um comerciante ou simplesmente um consumidor individual.
3.3 A importância de uma base tecnológica
Embora o poder da firma no mercado seja freqüentemente mencionado com prioridade, entre as condições que determinam as possibilidades de uma diversificação bem-sucedida, constitui um erro dar-lhe relevância, em detrimento do desenvolvimento concomitante da base tecnológica da firma. Conforme será demonstrado, na seção relativa ao significado da concorrência para a diversificação, são igualmente precárias tanto uma forte posição no mercado, desprovida de uma base tecnológica, quanto um apurado desempenho tecnológico, associado a um fraco poder de venda. Além disso, quando o poder de uma firma não está intimamente associado ao seu poder tecnológico, mas baseia-se, principalmente, numa posição de relevância, em mercados importantes, torna-se-lhe mais difícil penetrar em áreas básicas de especialização totalmente novas. Uma firma, nessas condições, não só dificilmente desenvolverá habilidades que lhe possam proporcionar uma vantagem tecnológica substancial em um campo totalmente novo, como também estaria em desvantagem quanto às possibilidades de aquisição de outras firmas, em setores onde a tecnologia fosse substancialmente diferente.
Em primeiro lugar, na ausência de uma proteção legal, o simples fato de que uma firma, desprovida de superioridade técnica, possa estabelecer uma posição dominante no mercado é clara evidência de que a técnica da indústria, na qual a firma opera, é bastante padronizada ou muito simples e, conseqüentemente, as inovações podem ser facilmente alcançadas por outras firmas. Se isto não fosse verdade, poder-se-ia esperar que uma outra firma, da mesma indústria, estabelecesse uma superioridade técnica, que terminaria por solapar a posição de mercado da firma dominante. Quando a tecnologia de uma firma é padronizada e relativamente simples, dificilmente os seus serviços produtivos gerarão oportunidades de expansão para novas áreas onde seja necessária uma capacidade técnica superior ou incomum. Em outras palavras, os recursos disponíveis de uma firma desse tipo não favorecem o desenvolvimento de uma superioridade tecnológica especializada, quanto à utilização de matérias-primas, quanto a habilidades ou processos especiais, em áreas de operação substancialmente diferentes. A firma será, também, menos capaz de adquirir outra empresa cuja tecnologia seja substancialmente diferente, em parte porque sua gerência dificilmente se sentirá autoconfiante para operar em setores totalmente estranhos à sua experiência e, em parte, porque será, em geral, mais difícil para uma firma adquirir outras empresas, dotadas de qualificações técnicas especiais, a um preço compensador, se ela própria não dispuser de vantagens especiais no novo campo de atividades.20
Muitas firmas, nos EUA, expandiram-se rapidamente, devido à compra de outras firmas, em setores onde não detinham superioridade tecnológica evidente - por exemplo, firmas da indústria do leite - e conseguiram estabelecer fortes posições no mercado, em escala nacional. Essas posições facilitaram a diversificação em mercados complementares, freqüentemente realizada por meio da aquisição de outras firmas, possuidoras de marcas famosas ou capazes de proporcionar vantagens adicionais no que se refere à venda dos produtos. Na medida em que as firmas em expansão permanecem em .suas áreas de mercado originais, sua posição dominante no mercado pode protegê-las durante certo tempo. A transferência desta posição para outras áreas, no entanto, torna-se mais problemática, na medida em que os novos setores estejam mais distanciados dos setores de origem, e as necessidades de elevação da firma a uma posição privilegiada se tornem mais prementes, tanto do ponto de vista tecnológico, como do ponto de vista de vendas. Neste caso, encontramos firmas como a National Dary (Laticínio Nacional), cujo principal método de crescimento foi, inicialmente, a aquisição de produtoras locais, dando grande ênfase à pesquisa, na medida em que passou a processar outros produtos alimentícios, onde a inovação tecnológica constituía importante requisito competitivo.
A diversificação e a expansão, baseadas, principalmente, num alto grau de competência e conhecimento técnico em áreas especializadas de manufatura, são características de muitas das maiores firmas da economia. Este tipo de competência, aliado ao tipo de posição no mercado, que dele decorre, constitui a situação mais firme e duradoura que uma firma pode estabelecer. Evidentemente, essa posição tem como efeito secundário a propriedade de proporcionar à firma considerável margem de manobra, no sentido do controle monopolista dos mercados e utilização de práticas monopolistas restritivas. A expansão abrangente e indefinida, porém, não depende, em absoluto, do exercício direto do poder monopolista em qualquer sentido restritivo. A diversificação, resultante da expansão interna e externa, tende a ser abrangente, devido à ampla variedade de serviços produtivos gerados e devido ao fato de que suas vantagens competitivas, particularmente poderosas, atuam no sentido da aquisição de outras firmas. As oportunidades de expansão, tanto no âmbito das bases tecnológicas existentes, como por meio do estabelecimento de novas bases, são tão comuns que a firma tem que escolher cuidadosamente entre diversas possibilidades de ação.
3.4 Alguns exemplos
Uma das mais importantes corporações, nos EUA, hoje em dia, é a General Motors Corporation que, em 1956, foi a segunda maior corporação do país. Ela é conhecida principalmente como fabricante de automóveis, mas possui também ampla variedade de produtos, tais como diversos tipos de bens duráveis, locomotivas e motores para aviões, para mencionar apenas alguns dos mais importantes. A história da companhia é bastante conhecida: inicialmente, seu produto era o automóvel e sua área básica era a da aplicação da engenharia à produção em massa. As amplas linhas de sua diversificação podem ser facilmente delineadas, explicando coerentemente o seu desenvolvimento, não apenas a partir das áreas originais de atuação, mas, também, distanciando-se dessas áreas, à medida que se foram estabelecendo novas bases de produção.
Para não cansar o leitor, mencionarei aqui apenas as atividades diversificadas da General Motors que não pertencem à área geral da produção de automóveis. Uma de suas primeiras aquisições, fora do campo automobilístico, foi a da Guardian Frigerator Corporation, em 1919. Num certo sentido, essa compra foi acidental: a empresa citada fora adquirida por W.C. Durant, o fundador da General Motors, com seus próprios recursos, numa ocasião em que a Guardian Frigerator Corporation estava virtualmente falida, e ele sugeriu que a General Motors a comprasse. Foi lançado um programa de pesquisa e desenvolvimento e adotou-se o nome Frigidaire. Por volta de 1925, eis o que a companhia dizia do novo produto: "Este aparelho (geladeira) se presta à produção em massa, tanto no tocante ao tipo de manufatura, como em termos de suas possibilidades no mercado. A corporação acredita poder sustentar a posição dominante de que a Frigidaire agora desfruta, com base em sua larga experiência na produção em massa e em suas atividades de pesquisa, e devido à sua ampla capacidade de compra, em razão de seu grande volume de operações. Além disso, acreditamos que as possibilidades de mercado são bastante análogas às do mercado de automóveis" (Relatório anual, 1925).
Em outras palavras, a companhia acreditava que o tipo geral de serviços produtivos, já existentes, proporcionava uma base favorável para o desenvolvimento e ampliação da produção de geladeiras. Em breve a produção da Frigidaire foi organizada, constituindo uma nova e autônoma divisão de operações, de acordo com a "crença da General Motors, baseada na experiência anterior da corporação, de que a descentralização dessas atividades, por meio da atribuição das responsabilidades a gerências distintas e autônomas, resulta num aumento de eficiência, sob qualquer ponto de vista" (Relatório anual, 1928). A ampla base que levou a companhia a desenvolver seu produto foi sua competência no campo da engenharia aplicada â produção em massa. Novas diversificações ocorreram, porém, à medida que as subsidiárias passaram a desenvolver seus próprios produtos. Por volta de 1933, a divisão responsável pela Frigidaire tinha avançado bastante, no sentido de aprofundar ainda mais a diversificação: "Como parte de seu programa de fabricação, a Frigidaire desenvolveu uma linha de produção de aparelhos de ar condicionado, cobrindo, virtualmente, todos os campos de aplicação: o lar, o escritório, o hotel, o hospital, o vagão ferroviário e outros setores de aplicação industrial" (Relatório anual, 1934).
Durante o ano de 1936, a General Motors alargou ainda mais suas bases, "ao iniciar a produção de uma linha de fogões elétricos e outros acessórios e equipamentos elétricos. O objetivo principal não era a expansão, mas o de proteger, do ponto de vista comercial, as linhas de produtos já existentes, por meio do desenvolvimento de uma linha completa de aparelhos de utilidade doméstica de sua fabricação" (Relatório anual, 1937).
Já em 1927, a diversificação tinha avançado a tal ponto que a General Motors declarou: "(...) as rendas totais da corporação não devem ser tomadas como medida dos rendimentos de suas divisões responsáveis pela produção de automóveis. Apesar de as operações da corporação, no setor automobilístico, serem tão, se não mais, auto-suficientes quanto as de seus concorrentes, ainda assim, as operações no setor automobilístico contribuem com cerca de apenas cinqüenta por cento dos lucros totais da Corporação" (Relatório anual, 1928).
As mais importantes etapas seguintes, no sentido da diversificação, ocorreram em 1928, quando a General Motors adquiriu 40º% das ações da Fokker Aircraft Corporation of America.
Ao consolidar essa associação, a General Motors sentiu que - levando em consideração a relação mais ou menos íntima existente entre os processos de engenharia envolvidos na produção de aviões e automóveis - sua organização de operações, organização técnica e outras deveriam ser guindadas a uma posição onde teriam oportunidade de travar contato com os problemas específicos do transporte aéreo. O futuro do avião ninguém pode ainda afirmar com segurança. Por meio desta associação, a General Motors será capaz de avaliar o desenvolvimento da indústria e estabelecer suas políticas futuras com um conhecimento mais preciso dos fatos" (Relatório anual, 1929).
Em 1929, foi adquirida a Allison Aircraft Company e, por volta de 1938, a Allison Division, que fabricava motores para a aviação e "alcançara uma posição de importância no desenvolvimento e manufatura de motores de alta potência para a aviação. Devido ao florescente crescimento dos pedidos, as instalações para a manufatura estão sendo substancialmente.ampliadas, mediante a implantação de uma fábrica totalmente nova" (Relatório anual, 1939).
A guerra, naturalmente, apressou a exploração dessa base de operações e, hoje em dia, a fabricação de motores para aviões e centenas de outros produtos menores e correlatos constituem uma parte substancial das atividades da companhia.
No mesmo ano em que a General Motors ingressou na indústria aeronáutica, ela penetrou na indústria do rádio.
"A General Motors Corporation passou a se interessar pela indústria do rádio, em função de um estudo realizado visando a utilização do rádio em seus automóveis. Como conseqüência desse estudo, e reconhecendo o fato de que a General Motors já possuía o conhecimento técnico, a capacidade de produção e as oportunidades de distribuição, foi aconselhável capitalizar essas vantagens e ampliar ainda mais a diversificação das atividades da corporação, por meio do ingresso neste particular setor, onde existia uma oportunidade positiva" (Relatório anual, 1929).
A entrada da companhia no setor dos motores diesel também surgiu a partir de suas atividades de fabricação de automóveis: "Os laboratórios de pesquisa da General Motors iniciaram, desde 1928, dois anos antes da aquisição da Winton ou da Electro-Motive, o trabalho de desenvolvimento do motor leve, a diesel, de dois tempos. Nosso objetivo principal era desenvolver um motor diesel para caminhões, suficientemente prático, para que resultasse em grande economia de operação.21
Em 1930, as atividades de fabricação de motores foram ampliadas, quando ela adquiriu uma firma que fabricava usinas produtoras de energia elétrica, dotadas de motores que empregavam os ciclos Otto e diesel: "Tendo em vista a evolução geral, no sentido da fabricação de motores do tipo diesel, julgou-se aconselhável, para a corporação, tratar do problema de uma maneira prática. Sentiu-se, além disso, que o quadro de engenheiros e pesquisadores da corporação poderia contribuir para o progresso nessa direção" (Relatório anual, 1929).
Em 1933, foram introduzidas melhorias nos motores diesel: "Com o objetivo de explorar agressivamente as possibilidades desse novo tipo de produto, a corporação autorizou recentemente a construção de uma fábrica, para a produção de motores diesel para trens elétricos, o que tornará possível a produção completa de locomotivas elétricas a diesel, projetadas e fabricadas inteiramente no âmbito das atividades da corporação" (Relatório anual, 1934).
A política de diversificação geral foi resumida no Relatório anual de 1937: "A política da corporação é no sentido da manutenção de uma cobertura, tão ampla quanto possível, nos diversos campos de atuação em que ela esteja envolvida, levando em consideração, naturalmente, as possibilidades mercadológicas de tais produtos. O alcance de suas atividades tem-se expandido continuamente ao longo dos anos, não tanto como resultado de uma política definida, porém devido ao fato de que, mediante a evolução dos métodos produtivos, surgem, freqüentemente, oportunidades para o engajamento na produção de componentes adicionais. Isso resulta na expansão das possibilidades de lucro e, ao mesmo tempo, proporciona uma fonte de fornecimento mais segura, mais eficiente e mais agressiva do que geralmente se dispõe no mercado externo. Igualmente importante é o fato de que, fora do círculo de atividades de pesquisa e produção, surgem freqüentemente oportunidades para expansão lucrativa na manufatura de inovações técnicas, mais ou menos independentes do esquema que caracteriza a corporação, as quais, entretanto, possuem traços comuns em termos de suas características técnicas. Além disso, freqüentemente desenvolvem-se meios e modos segundo os quais a exploração de produtos já existentes pode ser acelerada, e aplicam-se práticas avançadas de engenharia e pesquisa, expandindo os mercados.
A solidez desse tipo de posição básica, desenvolvida pela General Motors, foi admiravelmente demonstrada pela rapidez com que se puderam implementar as profundas adaptações exigidas pela produção, em tempo de guerra.
"Uma das mais importantes políticas de longo alcance da General Motors teve por objetivo a promoção do progresso técnico em suas atividades de pesquisa, projeto e produção, o que resultou no aperfeiçoamento gradual e constante dos produtos da corporação. Hoje em dia, a experiência assim acumulada, a capacidade de adaptação às mudanças e o domínio da técnica de aplicação dos princípios da produção em massa tornaram-se valores inestimáveis ao tratamento dos problemas técnicos apresentados pela produção de complicadas máquinas de guerra" (Relatório anual, 1941).
O mesmo princípio se aplica aos problemas técnicos apresentados pelas adaptações necessárias à manutenção e ampliação das atividades de uma firma em tempo de paz.
Um tipo de companhia bastante diverso, de menor porte que a General Motors, mas que igualmente ilustra alguns dos princípios da diversificação, é a General Mills Incorporated. Fundada em 1928, por uma consolidação de cinco companhias moageiras, absorveu, no ano seguinte, algumas outras companhias e criou um laboratório de pesquisa industrial. Seus produtos, originariamente, eram farinha, rações comerciais e mistura de cereais.
Em 1937, estes eram, ainda, os únicos produtos mencionados no relatório anual da companhia. As atividades de pesquisa, porém, foram enfatizadas desde o princípio, tanto no que se refere à química dos produtos alimentícios básicos, como no que diz respeito aos problemas mecânicos de seu processamento. Por volta de 1938, a diversificação de grande alcance, que viria a ocorrer, foi insinuada em seu relatório aos acionistas.
Este relatório, embora não mencionasse a restrição às possibilidades de expansão na produção de farinha, deixava evidente, na linguagem adequada às relações públicas, que a companhia acreditava que seu futuro estava na diversificação: "É cada vez mais evidente que o progresso, tanto para a sociedade como um todo como para as unidades produtivas individuais nela contidas, depende, acima de tudo, da abertura de novas fronteiras no esforço utilitário e lucrativo, mediante o desenvolvimento de novos produtos e serviços. Este desenvolvimento só pode ser alcançado por meio de pesquisas eficientemente conduzidas e adequadamente financiadas, em íntima associação com as realidades da produção e da comercialização, e em função das necessidades do consumidor (...)"
"A General Mills, Inc. comprometeu-se decisivamente com uma política de expansão de suas atividades de pesquisa (...) De igual importância é o departamento de desenvolvimento mecânico (...) Os problemas inerentes à transformação dos grãos de cereais em produtos alimentícios aceitáveis são, principalmente, de natureza física e o departamento de desenvolvimento mecânico já obteve melhoramentos excepcionais e lucrativos, no que diz respeito a máquinas e processos utilizados pela companhia. Aqui, assim como no laboratório de pesquisas, o progresso já alcançado é duplamente significativo, devido às promessas que ele reserva para o futuro (...) A companhia está engajada no desenvolvimento experimental e teste de produtos suplementares, coerente com a certeza de que seu progresso futuro depende não apenas de fazer as mesmas coisas de uma maneira cada vez melhor, mas também de fazer novas coisas, que ampliem a faixa de aceitação de seus produtos pelo público" (11º Relatório anual).
Os relatórios subseqüentes revelam uma ampliação progressiva da linha de produtos da firma - diversos gêneros alimentícios, produtos vitaminados e enriquecimento vitamínico de antigos produtos, suplementos alimentares dietéticos e utilização de produtos agrícolas com fins não alimentícios. Foi desenvolvido, além disso, um diversificado departamento mecânico, para a produção de maquinaria destinada ao processamento de alimentos. Novas matérias-primas, como a soja, tornaram-se importantes e resultaram na produção de óleo e resinas poliamidas. A partir do momento em que a pesquisa, no campo da química dos alimentos, revelou-se significativa, a companhia passou a ter continuamente, em perspectiva, o potencial das oportunidades para o processamento de novos produtos. Sua principal atividade, porém, continuou sendo o processamento de grãos de cereais em farinha, alimentos empacotados e rações para animais.
Outro campo de atividades produtivas, em que a General Mills se envolveu, éd e particular interesse, porque ilustra os efeitos da guerra sobre os serviços produtivos disponíveis para as firmas e também os efeitos da competição sobre as tentativas de diversificação. Qualquer fator que altere as relações de vendas da firma individual ou o caráter de suas atividades produtivas fará com que se alterem substancialmente suas oportunidades no sentido da fabricação de novos produtos. A mobilização da indústria para a produção, durante a guerra, obrigou inúmeras firmas à fabricação de produtos para cuja produção elas reuniam pequena e às vezes nenhuma experiência. Quando as mesmas firmas passaram novamente a dedicar seus esforços à produção, em tempo de paz, elas se aperceberam de que tinham desenvolvido amplos serviços produtivos, adequados à fabricação de manufaturados bastante diversos daqueles de antes da guerra, serviços que, seguramente, permaneceriam não utilizados na ausência de diversificação. Esses serviços incluíam não apenas conhecimentos e experiência de gerência, mas também referiam-se à própria fábrica e aos equipamentos, sem falar dos excepcionalmente grandes volumes de ativo líquido. Era natural esperar um aumento do interesse nas possibilidades de utilização desses serviços, na produção de artigos adequados ao tempo de paz, e, parte da ansiosa procura de novos produtos, no período de pós-guerra, pode ser assim explicada.
O departamento de desenvolvimento mecânico da General Mills foi elevado à categoria de divisão em 1940 e dedicou-se à produção de material bélico. As ferramentas e equipamentos, que haviam sido utilizados para pesquisas de métodos de fabricação e para o desenvolvimento de máquinas de empacotamento e moagem, foram convertidos à produção de equipamentos e instrumentos de controle de tiro e outros instrumentos de precisão. A companhia assinalou que as características da produção de alimentos, durante a guerra, "constituíram um crescimento natural, a partir de nossas atividades usuais, mas nossa ampla operação atual, em termos de manufatura de instrumentos de precisão para a Marinha dos EUA, levou-nos a um campo totalmente diverso. Nossa interessante, porém complicada, experiência na produção de peças e equipamentos de precisão aponta no sentido de oportunidades futuras, no setor dos produtos mecânicos" (Relatório anual, 1943).
Em 1946, com a expiração dos contratos para a produção de equipamentos bélicos, a divisão mecânica passou a produzir ferros elétricos, os primeiros de uma série de aparelhos de uso doméstico. A partir daí, seguiu-se a produção de panelas de pressão, torradeiras, batedeiras elétricas, cafeteiras também elétricas e outros artigos. Oito anos mais tarde, a nova linha foi abandonada, o ramo de artigos elétricos foi vendido e a divisão mecânica retornou às suas antigas especialidades - a produção de diversas linhas de equipamento industrial e de equipamento de precisão para as Forças Armadas.22 O resultado dessa tentativa ilustra uma das restrições que a competição impõe às firmas que se esforçam em diversificar suas atividades. A concorrência exige uma certa dose de especialização, como veremos um pouco mais adiante, porque obriga as firmas a amplos investimentos em qualquer novo campo em que penetrem, se desejarem aí permanecer e serem bem-sucedidas.
A diversificação da General Mills é abrangente e continuada. À primeira vista, parece também compreender uma gama de produtos não relacionados entre si, desde "comidas finas até máquinas eletrônicas".23 Se, entretanto, o processo de diversificação for examinado detalhadamente, verificar-se-á que o movimento progressivo, no sentido da fabricação de diversos produtos, baseou-se, sem dúvida, nas áreas de especialização já existentes na firma, sejam elas alimentos ou processamento químico da celulose, produtos de cereais para consumo doméstico ou equipamento mecânico.
A mobilização da indústria, para a produção de material bélico, não apenas modificou significativamente o caráter da base de produção de muitas firmas, como também modificou as oportunidades de vendas, devido ao impulso que ela deu à prática da subempreitada. Foram estabelecidas ligações que se mantiveram sob outras formas, após o encerramento do programa de produção bélica. Por sua vez, as discussões que se sucederam ao período de pós-guerra, sobre as possibilidades de diversificação, especialmente para as firmas pequenas e "doentes", salientaram as oportunidades que poderiam advir da contratação de seus serviços, para produzir parte das necessidades de firmas maiores.24
Encerremos aqui nossa discussão sobre a origem das oportunidades para a diversificação. Não incluímos duas considerações que são, freqüentemente, apontadas como incentivos ou causas da diversificação: o fato de uma firma possuir grandes reservas monetárias e a existência de oportunidades favoráveis para a aquisição de outros negócios em atividade. A primeira não constitui, propriamente, um incentivo à diversificação; ela pode representar um incentivo, ou mesmo uma pressão, no sentido da expansão, sem nada ter a ver com o fato de esta afetar produtos já existentes ou traduzir-se pela fabricação de novos. A segunda consideração é mais complexa, sendo necessária uma discussão à parte. É inquestionável o fato de que grande parte das diversificações decorrentes de aquisições não teriam ocorrido de outra forma; por outro lado, a diversificação, em qualquer direção considerada, não ocorrerá, normalmente, mediante a aquisição, a menos que a firma tenha, para diversificar-se nessa direção, razões outras que não a simples possibilidade de adquirir uma outra firma em condições favoráveis.
4. O PAPEL DA AQUISIÇÃO
A aquisição desempenha um papel tão importante nas atividades de diversificação de uma firma, que muitos autores, ao se proporem a discussão da diversificação, discutem-na apenas sob o aspecto da aquisição.25 Nossa análise do efeito da criação continua de novos serviços produtivos e conhecimentos sobre a oportunidade produtiva de uma firma foi desenvolvida com referência à expansão interna: a discussão da expansão, mediante a aquisição, foi deixada para um capítulo posterior. Parte desta discussão deve ser antecipada aqui, pois este método de expansão proporciona vantagens peculiares, enquanto meio de assumir a fabricação de novos produtos.
É evidente que os custos de investimento necessários e as dificuldades técnicas e gerenciais, inerentes à entrada em um novo campo de atividades, podem ser reduzidos, se a firma adquirir um estabelecimento já em atividade. A fábrica pode, geralmente, ser adquirida a um preço consideravelmente inferior ao seu custo de reprodução, conseguindo-se assim uma valiosa posição no mercado que, na inocorrência da aquisição, poderia levar anos para ser alcançada. Dessa forma, a pressão imediata dos concorrentes pode ser consideravelmente reduzida. É de especial importância o fato de que uma firma possa adquirir uma equipe de gerência experimentada, assim como conhecimento técnico e mão-de-obra habilitada. A aquisição pode ser, desta forma, utilizada como um instrumento para a obtenção de serviços produtivos e conhecimentos necessários ao estabelecimento da firma em novo setor. O acréscimo de novos serviços gerenciais e técnicos é, geralmente, muito mais importante do que a eliminação da concorrência ou a redução dos custos de entrada no novo setor. Por esse motivo, a aquisição constitui, com freqüência, um meio particularmente adequado para a familiarização com as técnicas e problemas de um novo setor, quando a firma se propõe a decidir se a expansão nesse campo é ou não adequada à utilização de seus recursos. A aquisição, ademais, freqüentemente dispensa despesas em dinheiro. Firmas cuja situação financeira não é sólida e cujos serviços técnicos e gerenciais são altamente específicos, com relação aos seus produtos existentes, encontram, virtualmente, na aquisição, a única maneira de diversificar suas atividades.
Apesar de todas as vantagens que pode proporcionar, porém, a aquisição não é, absolutamente, uma panaceia sempre disponível para resolver os problemas da firma em dificuldades. Tampouco permite a uma firma próspera uma diversificação indiscriminada e ilimitada. A firma que pretenda diversificar-se e crescer, por meio de aquisições, não pode escapar totalmente às limitações, que lhe impõem seus próprios recursos existentes, quanto à taxa ou direção da expansão. O próprio crescimento externo pressupõe a existência, na firma, de certas qualidades empresariais, pois a integração (no sentido empregado neste estudo) bem sucedida entre as firmas adquirente e adquirida, em uma única empresa, exige os serviços da firma adquirente.
Conseqüentemente, existe um limite à taxa de expansão de uma firma, mesmo se a aquisição for o seu método principal, pois os problemas gerenciais de regulamentação das relações entre a firma matriz e a nova aquisição não podem ser evitados. Devem ser elaboradas políticas globais homogêneas, coordenados os procedimentos de contabilização e coordenadas as políticas de pessoal, bem como numerosas outras questões de responsabilidade dos departamentos de apoio administrativo.26 Quando a aquisição conduz uma firma a novos campos pouco familiares, relativamente aos seus antigos setores de atividades, os problemas trazidos pela integração são menores em algumas direções, porém maiores em outras: pode-se permitir à firma recém-adquirida maior autonomia em sua própria área, sem risco de conflito com a política e as atividades da companhia matriz; por outro lado, podem-se agravar as dificuldades para o estabelecimento de uma relação adequada entre as duas companhias.27
Este limite sobre a taxa de expansão implica que nenhuma firma pode adquirir qualquer outra, potencialmente disponível, a qualquer momento. Deve, antes, fazer uma triagem, uma vez que os erros podem custar-lhe caro, optando por empresas.que tendam a complementar ou suplementar suas atividades já existentes. Tal empenho se justifica, em parte, devido às predileções e à experiência anterior de sua gerência, e, por outro lado, pelo fato de que essas empresas tenderão a parecer mais lucrativas. A lucratividade de uma firma, cuja aquisição esteja sendo considerada, depende da comparação do preço a ser pago por ela com a expectativa de sua contribuição aos rendimentos da empresa matriz. Uma vez que a aquisição é uma compra em que o preço deve satisfazer tanto ao vendedor como ao comprador, a firma adquirida deve ter mais valor para a firma adquirente (ou a ela combinada) do que tem para si mesma (ou em si mesma), pois somente nessas condições um estará disposto a vender e o outro a comprar, pelo mesmo preço.28 Em cada caso particular, motivos especiais podem originar as necessárias diferenças de valoração (questões relativas a impostos, desejo dos proprietários de se aposentar, etc); mas o motivo básico mais importante é o fato de que a firma adquirida complemente a firma adquirente de um modo tão especial que ambas possam esperar alcançar um acerto mutuamente favorável. Conforme veremos no item seguinte, a expansão por meio de aquisição não significa, necessariamente, que uma firma esteja penetrando em setor para o qual não possua qualificações. A aquisição é, freqüentemente, um processo lucrativo exatamente devido ao fato de a firma possuir qualificações especiais no novo setor.29
Assim, os recursos existentes numa firma não apenas limitarão a medida segundo a qual uma expansão bem-sucedida pode realizar-se por meio de aquisição, mas influenciarão, também, a direção da expansão externa. Não é, portanto, surpreendente que os estudos de fusões e diversificações revelem apenas a existência de uma minoria de firmas penetrando em campos de atividade totalmente diversos; e, mesmo nesses casos, há quase sempre entre as atividades das firmas que participam da fusão uma relação maior do que se evidencia à primeira vista.30 Quando a diversificação envolve não apenas a entrada em novos mercados, mas também o estabelecimento de uma nova base de produção, a vantagem competitiva nesse novo campo pode ser avaliada a partir do desenvolvimento, pela firma, de determinados serviços produtivos - dentro do quadro de suas atividades produtivas correntes - que sejam particularmente valiosos em função da nova atividade. Tais serviços poderão decorrer do aperfeiçoamento de um processo especial de fabricação, de um tipo particular de processo químico ou a partir do conhecimento aprofundado de material ou resíduo, de processo, cuja utilização lucrativa a firma tenha descoberto. Entre as centenas de exemplos de diversificação examinados no decorrer desse estudo, somente em um pequeno número de casos pareceu não haver qualquer relação entre a tecnologia da nova e da velha base de produção, e isto apesar do fato de que uma grande parte das diversificações se deu por meio de aquisições.31
O fato de que as firmas, em sua grande maioria, são especializadas em relativamente poucas áreas amplas de atividades - mesmo quando tenham tido à sua disposição oportunidades de diversificarem-se mais extensivamente por meio da aquisição - não é inteiramente explicado pela sua tendência a restringir as tentativas de diversificação a áreas onde anteriormente possuam qualificações. Afinal, exemplos há de verdadeiras aquisições conglomeradas e de firmas que, evidentemente, não realizaram qualquer esforço no sentido de se estabelecer num campo particular de atividade, passando da fabricação de um produto para outro de maneira heterogênea, livre e essencialmente não coordenada. Durante consideráveis períodos de tempo, as atividades produtivas de algumas firmas mantiveram-se dispersas e desconexas, não parecendo haver qualquer sentido na escolha de seus produtos. Reservando-o, embora, para discussão posterior, mencionamos anteriormente o fato de que o processo de aquisição rápido e abrangente pode criar firmas que, em certos estágios de seu crescimento, possuem uma estrutura organizacional de tal modo anômala e amorfa que é difícil perceber o sentido em que podem ser chamadas de firmas industriais. Esse processo resulta, analogamente, na dispersão das atividades produtivas de uma firma, apresentando uma estrutura de produtos extremamente confusa.
A lucratividade e mesmo a sobrevivência de uma firma que, em lugar de se concentrar no desenvolvimento intensivo de cada um de seus campos de atuação, salta de um tipo de produção para outro, em resposta a modificações nas condições externas, depende totalmente da habilidade de seus empresários em realizar transações financeiras inteligentes, avaliar corretamente as mofificações no mercado e passar da fabricação de um para outro produto em resposta a essas alterações. Fortunas pessoais foram levantadas dessa maneira, mas, embora o fato seja característico dos primeiros anos de existência de algumas firmas, nenhuma organização industrial duradoura é jamais mantida por este tipo de adaptação ou crescimento. Mais cedo ou mais tarde, essas firmas ou se arruinam ou se aplicam à produção em setores selecionados. A existência da concorrência é a responsável por esse fato. As oportunidades de passar para a fabricação de novos produtos podem constituir um forte incentivo à firma, no sentido da diversificação de suas atividades produtivas. Amplas podem ser as possibilidades de adquirir firmas lucrativas, em campos de atuação não relacionados. É mister, no entanto, considerar as pressões competitivas externas, reais e potenciais.
5. O PAPEL DA COMPETIÇÃO
Duas são as maneiras de uma firma enfrentar a ameaça dos concorrentes: alçar-se a uma posição monopolista no mercado ou elevar o seu nível de domínio da tecnologia relevante. Nenhuma delas, entretanto, é de per si suficiente para neutralizar completamente a vulnerabilidade da firma a mudanças adversas na demanda total dos produtos de sua fabricação. A melhor maneira de uma firma garantir-se contra essa vulnerabilidade é por meio da produção, a mais ampla possível, de produtos variáveis, reduzindo, assim, sobre a firma como um todo o impacto resultante não só de alterações na demanda total, mas também de modificações de sua posição competitiva com relação aos produtos individuais. Está extremamente disseminada a idéia de que a fabricação de muitos produtos constitui a melhor barreira contra todos os alterações adversas e, portanto, a melhor maneira de contrabalançar a vulnerabilidade da firma a tais alterações.32 Tal noção tem, naturalmente, um elemento significativo de validez; ao mesmo tempo, porém, carrega em seu bojo perigos, também significativos, pois a firma sem nenhuma especialização é quase tão vulnerável quanto a firma altamente especializada, em condições de concorrência intensa, especialmente quando esta competição está associada a rápidas inovações.
5.1 A necessidade de um investimento continuado em campos existentes
Numa indústria competitiva e tecnologicamente progressista, uma firma que se especialize em determinados produtos só pode manter sua posição no mercado se for capaz de desenvolver profundo conhecimento tecnológico e mercadológico, que a mantenha atualizada e a capacite para absorver inovações que afetem seus produtos. Esta proposição é válida, independentemente do número de produtos em que a firma seja especializada. Uma firma cuja diversificação decorre de grande número de produtos, que não guardem entre si intima relação, em termos dos conhecimentos tecnológicos e mercadológicos empregados, deverá estar numa situação que lhe permita dedicar recursos suficientes ao desenvolvimento de cada tipo de produto e, conseqüentemente, manter sua posição competitiva em cada mercado específico. Em outras palavras, ela deverá continuar a investir em cada um dos campos ou estar preparada para retirar-se do mercado.
A saída do mercado é freqüentemente dispendiosa, no sentido de que o valor de venda dos recursos existentes, seja como sucata, seja para algum uso alternativo, pode ser consideravelmente menor do que seu valor em termos de uso corrente. Desta forma, se a capacidade da firma em auferir rendimentos pode ser mantida, apenas em função de investimentos adicionais, os retornos sobre tais incrementos podem ser realmente altos.33 As firmas encontram, nesse fato, poderoso incentivo no sentido de continuar a investir nos seus campos de produção já estabelecidos, na medida em que o lucro bruto alcançado supere o lucro bruto passível de ser obtido, a partir da utilização alternativa dos novos fundos de investimento, aliada ao valor venal dos recursos, ou de sua adaptação a novos usos. Isto não significa que a firma devera manter a lucratividade de todos os produtos de sua fabricação, em todos os seus mercados. Muitos produtos podem ser, com relativa facilidade, transferidos de um para outro uso, dentro de uma dada base de produção e entre grupos de bases de produção intimamente relacionados. Dentro dos limites de mobilidade dos recursos, uma firma pode reduzir ou ampliar sua linha de produtos a baixo custo.34 Isto, porém, também requer investimentos em pesquisas, testes e inovações.
Se reduções nos custos e melhoria na qualidade dos produtos concorrentes devem ser enfrentadas, não apenas serão necessários novos investimentos, como também, com freqüência, expansão em mercado crescente, pois o fato de a firma dominar uma fatia do mercado é, às vezes, em si mesmo, importante consideração de ordem competitiva. Em algumas indústrias, por exemplo, na produção de certos tipos de bens duráveis, a aceitação dos produtos pelo consumidor é influenciada pelo fato de o produtor poder argumentar ser um dos líderes na fabricação, de determinados produtos. É neste sentido que se afirma, e com razão, que o crescimento é condição essencial à sobrevivência.
Uma firma pode penetrar em diversos campos. Para manter-se, porém, a salvo de pressões competitivas, deve estar preparada para continuar canalizando fundos para cada um desses campos. A necessidade continuada de novos investimentos constituirá uma restrição ao número de campos em que a firma poderá manter-se. Quanto mais se distanciar de suas áreas correntes de especialização, maior será o esforço que dispenderá na consecução da competência necessária, não só para lidar com a produção e as condições atuais de mercado, mas também para fazer as adaptações e inovações que lhe permitam estar à altura dos concorrentes.35 Longos períodos de crescimento, por meio de aquisição, impõem periodicamente uma reavaliação das linhas de produtos. Reduções e supressões podem revelar-se imperativas para que a lucratividade, em cada uma das linhas remanescentes, permaneça estável.
5.2 Diversificação da linha completa de produção
Uma firma é, não raro, praticamente forçada a uma considerável diversificação, ao tentar manter sua posição em determinado campo de atividades. Conforme vimos -anteriormente, grande parte da pesquisa, responsável pelas oportunidades de fabricação de novos produtos, é, em si mesma, uma resposta às exigências da competição. Esta impele a firma a aproveitar-se das vantagens inerentes às oportunidades criadas, não apenas pela redução de custos e aprimoramento da qualidade, mas também pelo acréscimo de novos produtos à sua linha atual. Sempre que uma firma tem a oportunidade de fabricação de novos produtos que, juntamente com os já existentes na sua linha de produção, a tornem capaz de suprir mais ampla variedade de necessidades de seus consumidores, ela terá incentivo para fazê-lo, ná medida em que, sendo conveniente aos consumidores, tal fato pode proporcionar-lhe vantagem sobre seus concorrentes e permitir-lhe atrair uma freguesia nova, independentemente de quaisquer vantagens proporcionadas pelo produto em si. Assim, a perspectiva de lucratividade, a partir de um avanço pioneiro seu, aliada à expectativa de que a inovação possa ser implementada por alguma outra firma, em algum outro momento, encorajará a firma a prosseguir. Se a nova linha for bem-sucedida, outras firmas serão forçadas a acompanhá-la no processo; a necessidade de levar adiante a fabricação de uma linha completa de produtos torna-se, então, uma razão importante para a diversificação.36
Quando os fregueses esperam obter um conjunto de utilidades de um mesmo produtor, torna-se extremamente difícil para este manter sua posição no mercado, a menos que ele, por sua vez, os produza. E para uma firma não diversificada é difícil produzir até mesmo uma parte desse conjunto de utilidades. Já houve época, nos EUA, em que era razoável para uma firma dedicar-se exclusivamente à produção de máquinas de lavar roupa. Hoje em dia, poucas donas-de-casa estariam dispostas a comprar suas máquinas de lavar e máquinas de secar roupas de companhias diferentes. Assim, a combinação de oportunidades, resultantes de pesquisas tecnológicas e de uma posição no mercado, pode levar a uma diversificação que é, em primeira instância, a resposta voluntária da firma a oportunidades de ampliar as suas vantagens mediante o uso de serviços produtivos e conhecimentos tecnológicos. Uma diversificação desse gênero, uma vez implantada, cria uma relação de complementaridade habitual e aceita, que se impõe ao reconhecimento dos concorrentes, independentemente de suas particulares habilidades produtivas. As áreas básicas de produção nas quais uma firma individual deve ser competente são mais amplas em indústrias onde este processo é significativo e as dificuldades que se opõem às novas firmas que desejem entrar para a referida indústria são proporcionalmente maiores. Grande parte da diversificação das firmas, que varia de indústria para indústria, pode ser referida a este processo. Ele parece ser particularmente importante nas indústrias onde existe um pequeno número de grandes firmas concorrentes e também nas que produzem bens de consumo duráveis. A diversificação que se dá, com vistas à produção de inovações já introduzidas por firmas concorrentes, não gera, necessariamente, o tipo de complementaridade atrás mencionada, pois as firmas podem introduzir substitutos para seus próprios produtos, visando atrair os fregueses de outras firmas. A introdução de um novo tipo de cigarro - longo ou com filtro - por exemplo, pode motivar os consumidores a abandonar sua preferência por uma certa marca, em benefício do concorrente, e compelir os demais produtos a seguirem o inovador, para conservar séu próprio mercado. Ainda assim, a primeira firma a inovar pode conseguir uma liderança que atraia permanentemente um certo número de consumidores para seus produtos.37
5.3 Competição e diversificação em novas áreas
Embora seja lucrativo, para uma firma, continuar a investir ou mesmo expandir-se em seus campos de atuação existentes, com vistas a garantir que os recursos por ela empregados proporcionem retornos tão elevados quanto possível, não lhe será necessariamente lucrativo tentar conseguir qualquer melhoria significativa em sua posição, se tal melhoria implicar numa significativa aplicação adicional de recursos. Tendo alcançado posição satisfatória e razoavelmente segura em suas áreas de especialização, uma firma que disponha de recursos para expansão, superiores àqueles necessários para a manutenção de sua posição nessas áreas, pode descobrir que as oportunidades de expansão em novas áreas revelam-se mais promissoras do que um alargamento da expansão nas áreas existentes. Se a posição da firma é suficiente para garantir uma significativa economia nos setores de produção e vendas, bem como as vantagens resultantes de uma larga aceitação e confiança por parte do consumidor, o montante de investimentos necessário ao incremento de produção dos artigos já existentes pode ser considerado relativamente não-lucrativo, quando novas e atraentes oportunidades se apresentarem para a utilização de seus recursos financeiros.
Ao entrar em qualquer novo campo de atividades, uma firma deve levar em consideração não apenas a taxa de retorno que pode esperar de seu novo investimento, mas também a possibilidade de seus recursos serem suficientes para garantir a taxa de investimento que lhe permitirá manter-se à altura das inovações e da expansão de seus concorrentes, no seu e no novo campo de atuação. Quando uma firma investe num novo campo, alicerçada numa inovação revolucionária e a salvo da concorrência, por meio da proteção de uma patente ou de outros mecanismos restritivos, deve estar ciente de que será superada, se negligenciar o desenvolvimento de novas vantagens relativas.
Se a diversificação ocorrer por expansão interna, o estabelecimento e conservação da posição na área nova imporá a aplicação de recursos gerenciais e técnicos em proporção maior do que se ocorresse por meio da aquisição de estabelecimento lucrativo e bem administrado, já atuante nesse campo. Neste caso, a firma adquirente pode, com freqüência, esperar que a adquirida seja capaz de sustentar-se a si própria, no sentido de que qualquer novo investimento necessário será proveniente de suas próprias operações bem sucedidas. Descobrir, adquirir e, em seguida, implantar a coordenação administrativa necessária exige a aplicação dos recursos existentes, nos diversos setores já mencionados. Desse modo, estabelece-se um limite à taxa de expansão por meio de aquisição que, aliado ao fato de que a firma deve ser capaz de enfrentar a concorrência em cada uma de suas áreas básicas, tende a encorajar uma dose considerável dc especialização em áreas de operação definidas de modo amplo.
As firmas, em sua maioria, realmente se especializam. Fazem-no, porém, num sentido muito mais amplo do que a lógida da eficiência industrial poderia sugerir. O tipo de especialização que ambicionam é o desenvolvimento de singular habilidade e vigor, em áreas extensamente definidas, que lhes dará uma posição de destaque perante os concorrentes existentes e em potencial. A longo prazo, a lucratividade, sobrevivência e crescimento de uma firma não dependem tanto da eficiência com que è capaz de organizar a produção de uma gama (que pode ser até bastante diversificada) de produtos, mas sim de sua habilidade em estabelecer uma ou mais bases amplas e invulneráveis, a partir das quais possa adaptar e estender suas operações em um mundo incerto, mutável e competitivo. Não é a escala de produção da firma e nem mesmo, dentro de certos limites, o seu tamanho que se devem considerar em primeiro plano, mas, de preferência, a natureza da posição básica no mercado que ela é capaz de estabelecer para si mesma.
A observação superficial do conjunto de produtos fabricados por muitas grandes corporações, hoje em dia, pode, à primeira vista, contradizer esta análise. Não obstante, se atentarmos para as firmas estabelecidas, com uma longa história de crescimento bem-sucedido, e observarmos, em particular, a gênese de sua diversificação, perceberemos que sua força reside no estabelecimento e conservação de uma posição básica, em relação ao uso de certos recursos e tecnologia e com respeito à exploração de determinados mercados.38 Embora limitadas a uma estreita gama de produtos, essas firmas raramente exploraram as economias de produção, organização e crescimento, valendo-se de posições monopolistas, ou quase, no mercado, em um pequeno número de áreas razoavelmente bem definidas. O vigor característico das grandes firmas não decorre da aplicação variada de recursos em diversos campos, mas do fato de que possuem setores específicos que funcionam como trincheiras profundas para sua defesa. Apesar disso, assim como existe um limite à taxa de crescimento das firmas, mas não há limitação à sua dimensão em termos absolutos, também é limitada a taxa em que podem ingressar em novos campos, mas não o número de campos em que podem atuar, em determinado período de tempo. Afinal, foi apenas nas últimas décadas que se desenvolveu consideravelmente o processo de crescimento e diversificação das corporações. A diversificação extrema pode caracterizar algumas firmas; no entanto, a especialização, definida de modo amplo, constitui antes a regra do que uma exceção.
6. DIVERSIFICAÇÃO COMO UMA SOLUÇÃO PARA PROBLEMAS ESPECÍFICOS
Mesmo numa economia em crescimento, onde, em conseqüência, não ocorrem recessões acentuadas nas atividades econômicas em geral, a demanda de determinados produtos pode ser instável, crescer a uma taxa bastante reduzida ou até mesmo entrar em declínio. Além disso, a demanda dos produtos de uma determinada firma pode retrair-se seriamente, em virtude de sucessivas e bem-sucedidas incursões de seus concorrentes. A diversificação é aventada, geralmente, como solução para os problemas que a firma individual enfrenta, em razão de alterações desfavoráveis nas condições da demanda.
6.1 Flutuações temporárias da demanda
As flutuações sazonais e cíclicas da demanda, o acúmulo típico da demanda de muitos tipos de bens duráveis, as flutuações devidas à popularidade temporária de novos produtos, etc. originam uma subutilização periódica de recursos, com oscilações extremamente acentuadas nas rendas das firmas que fabricam produtos sujeitos a essas influências. Tais condições estimulam as firmas no sentido da busca de novos produtos que permitam uma utilização mais satisfatória de seus recursos e reduzam as flutuações nos lucros. Se, no entanto, partimos da premissa de que o principal interesse das firmas se refere aos lucros totais, nem o pleno uso dos recursos, nem a estabilização dos rendimentos são suficientes para justificar a diversificação, a menos que esta implique uma perspectiva de aumento nos lucros totais.39
Não há dúvidas quanto à lucratividade que a diversificação pode proporcionar, se a firma, nesses períodos em que a demanda de seu principal produto for baixa, for capaz de fabricar outros, cuja produção não seja conflitante com sua capacidade de aproveitar ao máximo as oportunidades, quando aquela demanda for alta. As firmas cujos produtos estão, por exemplo, sujeitos a flutuações sazonais podem fabricar outros, fora da estação, utilizando parte de seus recursos existentes, para depois abandoná-los, no auge da estação, em favor de seu principal produto.40 A demanda do novo produto flutuará inversamente em relação à demanda dos produtos anteriores. O mercado pode tornar-se mais permeável a entradas e saídas, ou a firma pode produzir para estoque, enquanto aguarda a chegada da próxima estação. Nestas condições, o novo produto não interferirá com a exploração máxima dos velhos produtos e representará evidente vantagem produtiva.
O problema torna-se mais complexo quando o volume de produção do novo produto não pode variar consideravelmente, em curtos períodos de tempo, mas deve ser mantido e até expandido, mesmo quando for alta a demanda do produto básico. A firma não pode abandonar seus novos fregueses, ainda que por breves períodos, sem arriscar-se a perdê-los completamente. Se o novo produto utiliza uma parte dos recursos empregados na produção dos já existentes - como deve ser o caso, uma vez que o propósito inicial da diversificação foi o de permitir utilização mais ampla dos recursos e ajudar a enfrentar os custos fixos da firma -, a fabricação do novo produto poderá interferir com a produção básica, quando sua demanda for elevada. Neste caso, a firma, ao preencher os vales da curva de demanda, terá que aparar seus picos. Na medida em que uma firma possa prever, com considerável precisão, o volume das flutuações e comparar os lucros auferidos nos vales com o custo da redução de ganhos nos picos, seus planos, no sentido da supressão das flutuações na utilização dos seus recursos e das oscilações nos seus rendimentos, podem levar em conta, explicitamente, o efeito sobre os rendimentos totais. Se estes não revelarem crescimento, a firma, após minuciosos cálculos, deverá renunciar à diversificação, já que as flutuações nas rendas não são particularmente significativas em si. Excetua-se a hipótese, ao longo de períodos relativamente prolongados, se, tanto o momento de ocorrência, como o valor das oscilações, são suficientes para a firma calcular seus rendimentos totais, ao longo de um certo período. A não ser em circunstâncias especiais (por exemplo, responsabilidades para com a comunidade; questões relativas a impostos), uma firma não deveria sacrificar seus altos rendimentos em favor de rendimentos mais baixos, apenas porque estes possam estar mais uniformemente distribuídos ao longo do tempo.
As dificuldades reais surgem quando as flutuações da demanda não são facilmente previsíveis. Neste caso, agravam-se não apenas os problemas de gerência financeira, mas ocorre também a lucratividade desconhecida dos períodos de pico e a duração ignorada dos períodos correspondentes âos vales Obrigam a firma a calcular seus rendimentos ao longo de um ciclo, dando grande desconto em face das incertezas. Mantidos constantes os demais fatores, será razoável para uma firma optar por renda média mais segura,' em detrimento de alta renda mais incerta. Existe uma proposição segundo a qual os rendimentos provenientes de produtos cuja demanda é constante são mais facilmente previstos do que os proporcionados por outros, de demanda imprevisivelmente flutuante. A incerteza, em si mesma, portanto, inclinará a firma á fabricação de produtos que proporcionem uma renda estável, atitude abandonada apenas no caso de os rendimentos, esperados com maior confiança e proporcionados por produtos de demanda instável, serem suficientemente altos para contrabalançar o desconto dado, necessariamente, em função da margem de incerteza das previsões.
Exceto em casos de variações sazonais, raramente é possível prever com precisão as variações da demanda. Quanto menos acuradas as firmas considerarem suas previsões, mais incertas serão as expectativas de lucro; conseqüentemente, a firma dará maior ênfase à possibilidade de conseguir a utilização mais completa de seus recursos e um fluxo de renda mais estável, do que à sua capacidade de atender plenamente ao pico da demanda dos produtos existentes.
Encontram-se nesta categoria as firmas cujos produtos são particularmente susceptíveis a movimentos cíclicos. O momento em que ocorrem essas flutuações cíclicas, bem como o valor delas, não são passíveis de uma previsão razoável, porém, ainda assim, a experiência passada nos leva, necessariamente, a concluir que as recessões têm boa probabilidade de ocorrência. As firmas que produzem bens duráveis e, especialmente, as que produzem bens duráveis de produção, podem esperar, seguramente, fortes flutuações na demanda, mesmo na ausência de fortes flutuações no nível geral de atividades da economia. Incapazes de prever tais variações, com um mínimo de precisão, freqüentemente elas tentam realizar uma diversificação, passando a fabricar produtos cuja demanda ê influenciada por fatores que influenciam seus mercados principais. Assim, os fabricantes de bens de produção tentam aproximâr-se do consumidor final e os produtores de bens de luxo buscam fabricar produtos menos sensíveis a alterações na renda dos consumidores.41
O tipo de diversificação que objetiva compensar as flutuações temporárias da demanda - variações que são esperadas com certeza, mas que não podem ser previstas com precisão suficiente para permitir que o cálculo dos lucros ultrapasse o terreno das especulações - aproxima-se bastante da diversificação como mecanismo a que se recorre para enfrentar as incertezas em geral. Os maiores e mais penetrantes efeitos da incerteza - que originam a crença de que é, de alguma forma, mais seguro manter uma carteira diversificada, e que geram uma desconfiança generalizada em colocar todos os ovos na mesma cesta, mesmo se esta for carregada com muito cuidado - não são superados, simplesmente, por meio de um ajuste no cálculo dos rendimentos líquidos. Mais de uma firma já aderiu à filosofia de que há maior segurança em produzir ampla gama de produtos, do que em concentrar-se em artigos que, mesmo depois dos devidos descontos práticos, em função dos riscos assumidos, pareçam ser os mais lucrativos. Em outras palavras, a diversificação torna-se uma barreira, não contra aquelas mudanças que são esperadas com certeza (embora aqui também desempenhe esse papel), mas contra mudanças dè qualquer tipo, que os azares do jogo possam vir a provocar. Na prática, entretanto, as firmas reconhecem o fato de que diferentes tipos de produtos estão sujeitos a diferentes tipos de riscos e, dentro dos limites permitidos pelos seus recursos produtivos, elas escolhem uma gama de produtos capaz de proporcionar a maior proteção contra os vários tipos de riscos definiveis.
6.2 Alterações adversas permanentes na demanda
Quando o principal motivo de uma firma para a diversificação é assegurar completa estabilidade do lucro, em face de uma incerteza generalizada, ela está preocupada tanto com as possíveis alterações adversas, a longo prazo, na demanda de alguns de seus produtos, quanto com suas possíveis flutuações. De fato, a expectativa de que a demanda de seus principais produtos venha, eventualmente, a enfraquecer é uma das principais razões pelas quais uma firma busca novos artigos. Neste caso, a firma que se diversifica porque espera que a demanda de seus produtos venha a declinar distingue-se da firma cuja demanda de produtos existentes apresente crescimento demasiado lento para que possa satisfazer seus desejos de expansão. Não há nenhuma diferença substancial entre as duas firmas, exceto, talvez, o fato de que a primeira pode estar disposta a atuar em função de oportunidades menos atraentes do que a segunda, para a qual a diversificação pode não ser apenas uma questão de crescimento continuado, mas, até mesmo, uma condição de sobrevivência.
Às vezes, a necessidade de busca de novos produtos se faz sentir sobre uma firma às voltas com um declínio inesperado da demanda de seus produtos básicos, para o qual ela não esteja preparada, e que pareça ser de caráter permanente. As firmas, nestas condições, têm as maiores necessidades de diversificação e, freqüentemente, as menores possibilidades de realizá-la. Alterações fundamentais na demanda, como as que resultam de modificações na tecnologia ou nos gastos dos consumidores, raramente ocorrem tão repentinamente ou deixam de ser precedidas de sinais que as indiquem, de tal modo que a firma não possa aparelhar-se, enquanto desfruta de posição suficientemente forte, e coordenar as vantagens necessárias para entrar, com sucesso, em um novo campo. A ausência de tal preparo ê prova evidente de que os recursos da firma são altamente especializados ou de que sua capacidade empresarial não é muito elevada.
6.3 A direção da diversificação
A diversificação - fabricação de novos produtos - é a opção óbvia para as firmas que se encontrem em quaisquer das circunstâncias já esboçadas. Tais firmas caracterizam-se por um motivo comum, a diversificação, que não decorre nem da percepção de novas oportunidades específicas para assumir a produção de determinados novos artigos, nem das pressões de inovações competitivas. Em outras palavras: para elas, o desejo de diversificação precede a percepção de quaisquer oportunidades especiais nesse sentido; e o problema ê encontrar produtos que se ajustem a esse propósito. Mais uma vez, entretanto, tal procura é limitada pela insuficiência ou inadequação dos serviços produtivos disponíveis. Dentre eles ressaltem-se, como os mais importantes, os chamados intangíveis serviços gerenciais e tecnológicos. Empreendimentos exigem imaginação empresarial; grandes empreendimentos exigem talento gerencial; a entrada em campos altamente especializados requer especialização em alguma habilidade; realizar uma aquisição requer dinheiro ou, ao menos, uma posição suficientemente forte no mercado de capitais e boa reputação em geral, para que seja lucrativo para uma firma aceitar suas ações como pagamento. Será realmente muito difícil para uma firma, que não preencha nenhuma dessas condições, diversificar-se, passando a fabricar produtos que proporcionem uma margem de atuação promissora, no futuro.
Quando as firmas não dispõem de quaisquer vantagens especiais, que facilitem sua entrada em novos campos, e não estão em condições de adquirir firmas sólidas e bem-sucedidas, já atuantes no campo, devem, como qualquer empresário novo e medianamente bem dotado, buscar campos onde a entrada seja fácil e não sejam requeridas habilidades especiais. Desde que haja possibilidades alternativas suficientes, nada impede sua entrada nesses campos, nesmo quando a tecnologia e os mercados não se relacionarem completamente às suas atividades básicas. A diversificação assim ensaiada, porém, pode ter vida curta, pois é exatamente nesse tipo de campo que a concorrência tende a ser mais intensa, onde são altas as percentagens de negócios malsucedidos e, ainda, onde poucas firmas, desprovidas de vantagens especiais, conseguem manter-se por muito tempo.
Ao considerar o papel dos recursos existentes na determinação da direção da diversificação, promovida em função dos benefícios que ela, em si mesma, pode proporcionar, devemos fazer uma distinção entre o tipo de serviços produtivos necessários para efetivar uma expansão interna e o tipo de serviços produtivos necessários para realizar uma aquisição. A fábrica existente, o equipamento, os tipos de matérias-primas, as habilidades, a experiência e as idéias originais serão muito mais importantes no caso de expansão do que no de aquisição. A tarefa de ingressar e a de se manter no novo campo, apesar da concorrência, serão mais fáceis se estiverem disponíveis outras vantagens, além da capacidade empresarial e gerencial. Quando for possível expandir e diversificar mediante a compra de outras firmas, as únicas restrições quanto à direção ou quanto ao alcance da expansão dizem respeito à capacidade empresarial para descobrir uma firma adequada e negociar a aquisição; e aos recursos gerenciais necessários para realizar a integração. O critério de seleção das firmas a serem adquiridas pode ter pouca relação com os serviços produtivos existentes na firma adquirente, mas deve referir-se, indubitavelmente, à maneira segundo a qual o novo produto irá suplementar, em termos de relações no mercado, as atividades produtivas básicas da firma: se sazonalmente, ciclicamente, geograficamente ou de alguma outra maneira relevante. Apesar dessa razoável liberdade de escolha, entretanto, a diversificação totalmente conglomerada é relativamente rara, como foi atrás mencionado, pois sempre que uma firma possua vantagens específicas, tais como afinidades, tecnológicas e mercadológicas com os novos produtos, sua posição competitiva fica consideravelmente fortalecida. Por esse motivo, verificamos que as companhias, ao buscarem novos produtos, enfatizam suas especialidades produtivas peculiares, embora seja possível, especialmente para as grandes corporações, uma diversificação bem-sucedida "mesmo em campos completamente alheios às suas atividades principais.
7. DIVERSIFICAÇÃO COMO UMA POLÍTICA GERAL PARA O CRESCIMENTO
Há nítida distinção entre os objetivos da diversificação, ou seja: responder a oportunidades específicas, resolver problemas peculiares de demanda e adotar uma política geral para o crescimento. Na prática, são inextricavelmente interligados: a mesma ação de diversificação pode ser explicada com referência a qualquer um desses motivos, ou aos três, simultaneamente. Muitos sustentam ser a diversificação uma política adequada a uma firma em crescimento - política no sentido de que o planejamento da firma deveria estar constantemente buscando novos campos lucrativos de atividades, nos quais pudesse ingressar. Sugeriu-se anteriormente que a diversificação é um dos meios de proteger a firma, como um todo, contra alterações previsíveis e imprevisíveis, que possam afetar de maneira adversa os produtos individuais. Em outras palavras, ela proporcionaria uma espécie de seguro contra riscos e incertezas, para os quais, de outra forma, não haveria proteção possível. As firmas que se diversificam, principalmente por esse motivo, estão presumivelmente agindo na certeza de que um crescimento lucrativo, a longo prazo, pode ser melhor assegurado por meio da diversificação. Esta não é, porém, a principal razão pela qual a diversificação, como política de crescimento, é tão importante. Existem razões ainda mais fortes para que uma firma, que aspire ao crescimento, possa diversificar-se.42
Anteriormente, analisamos a natureza das restrições internas ao crescimento das firmas, bem como a natureza das forças internas atuantes no sentido da expansão. Entre estas forças devem ser arroladas não apenas as oportunidades específicas apresentadas pelos recursos internos de uma firma, mas também os serviços gerenciais não utilizados. Se as firmas não estão preocupadas em maximizar a taxa de retorno de um certo volume de capital, e sim fazer crescer seus lucros totais, por meio do aumento de seus investimentos totais, neste caso, evidentemente, sempre que as suas gerências acharem que a capacidade de crescimento das firmas é maior que o permitido pelos mercados e pelos produtos existentes, elas terão aí um incentivo para diversificar-se.43 A possibilidade de fabricar novos produtos e de conseguir novos mercados libera a firma de restrições à sua expansão, impostas pela demanda de seus produtos básicos, embora ela permaneça limitada pelas restrições impostas por seus recursos disponíveis.
O amplo desenvolvimento de técnicas eficientes para a implantação de uma gerência descentralizada, bem como as amplas oportunidades de expansão, mediante aquisição, nos tempos modernos, torna possível às firmas alcançar taxas extremamente rápidas de crescimento, pelo menos até certo ponto. Parece provável que poucos mercados individuais possam crescer tão rapidamente quanto firmas de porte médio. Deve-se, portanto, esperar que a diversificação venha a tornar-se a palavra de ordem para as firmas razoavelmente bem estabelecidas, que possuam recursos gerenciais eficientes, operando dentro de uma estrutura administrativa bem articulada e que desejem aumentar seus lucros a uma taxa mais rápida do que permitam seus recursos básicos. Os mercados existentes poderão ser lucrativos e crescentes. Tudo o que se exige, porém, para motivar a diversificação é que eles não cresçam com rapidez tal que impliquem a utilização total dos serviços produtivos disponíveis à firma individual.
8. INTEGRAÇÃO VERTICAL
Uma forma especial de diversificação, que em muitos casos tem grande importância para o crescimento de uma firma, é a que envolve o aumento do número de produtos intermediários que ela produz para seu próprio uso. Uma firma pode integrar retrospectivamente e começar a fabricar produtos que, até então, comprava de terceiros. Ou pode integrar pioneiramente e iniciar a fabricação de novos produtos (inclusive serviços de distribuição) que estejam mais próximos do consumidor final, na cadeia de elos produtivos. Neste processo, alguns dos produtos finais existentes podem tornar-se produtos intermediários. Ambos os processos são métodos de crescimento. Não é nossa intenção, aqui, fazer uma análise abrangente e exaustiva da integração vertical, mas apenas discutir alguns dos fatores mais importantes que afetam a decisão de uma firma, no sentido de aplicar seus recursos disponíveis neste tipo de atividade produtiva, ao invés de aplicá-los na maior expansão de seus produtos principais ou em novos produtos.
Grande parte da discussão que apresentamos acerca da diversificação, enquanto fabricação de novos produtos finais, é igualmente aplicável à diversificação vertical; todos os seguintes fatores desempenham um papel semelhante: oportunidades que surgem, em função da natureza dos recursos produtivos da firma, e que lhe dão vantagem na produção de alguns de seus próprios requisitos; oportunidades de mercado, no caso de integração pioneira; pressões competitivas de vários tipos ou problemas especiais que se colocam em função das incertezas.
Partamos da mesma premissa básica de que as firmas, em geral, dedicam seus recursos àquelas áreas de atividade produtiva que, segundo acreditam, serão as mais lucrativas, dado o devido desconto aos riscos e à incerteza. Num sentido puramente formal, conclui-se dai que a integração retrospectiva terá lugar apenas se se esperar que ela reduza os custos, pois a decisão de promovê-la é uma alternativa à compra de materiais ou processos que integram os custos da produção existente. Em última análise, a lucratividade da integração retrospectiva é medida em termos de seu efeito sobre os rendimentos líquidos da firma. Por isso, a oportunidade de aumentar os lucros, por meio dessa integração, deve ser considerada da mesma forma que outras oportunidades produtivas para a firma: o lucro adicional esperado deve ser comparado com a perspectiva de lucro em função de usos alternativos dos recursos necessários.44 Em conseqüência, embora as firmas possam ser perfeitamente capazes de produzir muitos dos produtos que utilizam, a um preço inferior ao que teriam de pagar por eles, a canalização de recursos para esta finalidade pode ser muito menos lucrativa do que sua diversa utilização.
As economias relevantes na produção, proporcionadas pela integração retrospectiva, podem ser divididas em duas categorias: economias relativas à eficiência na organização da produção básica da firma, e economias relativas aos preços que devem ser pagos pelos suprimentos. Na primeira categoria, enquadram-se todos os problemas relativos à obtenção dos suprimentos do tipo necessário, de qualidade satisfatória, em quantidades adequadas e no tempo oportuno. As dificuldades na obtenção de suprimentos são particularmente evidentes: quando as ferramentas e materiais devem obedecer a especificações rigidas de qualidade e projeto; em indústrias de crescimento acelerado; quando os diferentes níveis da indústria não se expandem simultaneamente;45 quando existem íntimas ligações tecnológicas entre os diversos estágios da produção, onde as pressões monopolistas dos fornecedores se fazem sentir ou onde existam dificuldades periódicas de obtenção de materiais necessários devido a flutuações intensas da oferta ou da demanda.46 Finalmente, a integração retrospectiva, como outras formas de diversificação, é promovida por um desejo de evitar o risco de flutuações e proporcionar maior segurança à firma, em face de uma incerteza generalizada. Neste último caso, é puramente formal a afirmação de que uma redução no custo constitui condição para uma integração retrospectiva bem-sucedida, pois o custo se reduzirá apenas devido a um elemento arbitrário, não calculável e essencialmente psicológico, decorrente da atitude da firma em face da incerteza. Esta discussão das condições que propiciam a integração retrospectiva refere-se, principalmente, à integração como um método de assegurar à firma suas fontes de suprimento. Não é necessário que ocorram, ou que sejam temidas, porém, grandes dificuldades na obtenção de suprimentos; irregularidades ainda que pequenas, no fluco de operações, especialmente se forem imprevisíveis, intensificam os problemas gerenciais na organização eficiente da produção básica da firma. Por isso, quando uma gerência eficiente for um recurso escasso, haverá uma forte tendência no sentido da integração, visando reduzir as dificuldades- de gerência das operações de planejamento, controle e previsão de futuros investimentos. Qualquer economia devida a reduções nos custos pode ser extremamente difícil de avaliar. A natureza e o número de serviços gerenciais, passíveis de serem liberados para outros usos, podem ser praticamente impossíveis de serem identificados e a integração pode ocorrer menos em função de cálculos econômicos do que em razão de cálculos de engenharia visando a eficiência. Além disso, uma vez que a gerência freqüentemente é, em si mesma, especializada, uma companhia pode muito bem perceber que as maiores oportunidades para a utilização de seus serviços especializados estão em alguma forma de integração retrospectiva.47 Esta pode, por sua vez, parecer lucrativa porque favorece tal redução nos custos - decorrente da produção de itens necessários à firma, a um custo consideravelmente inferior ao preço de mercado - de modo que os lucros totais apresentam um índice de aumento maior do que ocorreria em função de qualquer outro liso alternativo de recursos. Os fornecedores de um produto indispensável a uma firma podem estar organizados num monopólio fechado que restrinja sua produção e eleve seus preços em tal medida que torne a integração lucrativa para seus fregueses. Ou, ainda, uma firma pode dispor de vantagens produtivas especiais que a tornem capaz de produzir a um custo excepcionalmente baixo. Neste caso, a firma pode até mesmo produzir para o consumo externo, além de satisfazer suas próprias necessidades.
Mutatis mutandis, a integração pioneira, por sua vez sujeita a inúmeras influências, pode, diversamente da integração retrospectiva, lançar a firma tanto em novos mercados como em novos tipos de produção. A entrada em novos mercados exige, como vimos, maior canalização dos recursos para o setor de vendas. Na medida em que a comercialização dos novos produtos possa ser efetuada pela mesma organização que dela se desincumbia antes de realizada a integração, pode não haver necessidade de inversão de novos recursos. Se, no entanto, houver necessidade de desenvolver técnicas de vendas substancialmente novas e de criar novos canais de distribuição, as tarefas da firma não diferirão, fundamentalmente, das que foram discutidas com referência a outras formas de diversifcação em novos mercados.
A integração vertical é um método pelo qual uma firma tenta manter sua posição competitiva e melhorar a lucratividade de seus produtos básicos. Grande parte da integração pode se referir diretamente à eficiência técnica - em termos da relização de uma seqüência de operações, bastante próximas umas das outras - à manutenção de um fluxo estável de suprimentos e à maior estabilidade dos mercados. Parte dessa integração é lucrativa devido à alta capacidade de uma firma no sentido de produzir pelo menos uma parcela de suas próprias necessidades. Tal como ocorre em outras formas de diversificação, porém, uma vez que a firma tenha comprometido seus recursos com qualquer tipo de atividade produtiva, será freqüentemente lucrativo prosseguir nessa atividade, mesmo após a superação das condições que fizeram com que a decisão inicial de integrar parecesse promissora. Ocasionalmente, uma firma envida esforços especiais para promover o desenvolvimento de outras firmas capazes de suprir suas necessidades, porque percebe a possibilidade de maiores benefícios na utilização alternativa de seus recursos. Quando o avanço tecnológico, no setor de produção de alguns dos produtos intermediários da firma, se processar com rapidez e impuser habilidades técnicas que não estejam intimamente relacionadas àquelas nas quais a firma está especialmente capacitada, poderá deixar de ser compensador continuar investindo na integração para manter-se à altura do restante da indústria. Não é, igualmente, incomum que as firmas percebam, desde o início, ter sido um equívoco a ação no sentido da integração, e, reconhecendo-o, voltarem atrás. Esta parece ser uma trajetória bastante comum de integração, que envolve um movimento da firma no sentido da manufatura para vendas a varejo, ou no sentido das vendas a varejo para a manufatura. Por outro lado, a economia administrativa no controle de operações e o planejamento do capital de investimento, ainda que não tenham sido originariamente causas importantes da integração, constituem, às vezes, uma razão importante para sua manutenção, desde que aquela tenha sido eficientemente organizada.48
9. A FIRMA COMO UMA FONTE DE RECURSOS
A discussão do papel da diversificação no processo de crescimento, mais que qualquer outra coisa, revela a importância de que, conforme já assinalamos, a firma é essencialmente uma fonte de recursos, cuja utilização é organizada no quadro de uma estrutura administrativa. Em certo sentido, os produtos finais fabricados por uma firma, em qualquer momento, representam uma das diferentes maneiras da utilização de seus recursos, ou seja, uma casualidade no desenvolvimento de suas potencialidades básicas. Os produtos mudam no decurso dos anos. Muitas firmas, hoje em dia, produzem poucos ou nenhum dos produtos nos quais baseavam sua reputação e sucesso iniciais. Sua força básica desenvolveu-se como que acima ou abaixo do nível de produto final - evoluiu em termos de tipos especializados de tecnologia ou em termos de posição no mercado. Dentro dos limites fixados pela taxa, segundo a qual a estrutura administrativa da firma pode ser adaptada e ajustada a escalas de operação cada vez maiores, não há nada inerente à natureza da firma ou de suas funções econômicas que impeça a expansão indefinida de suas atividades.
A evolução contínua dos serviços produtivos e o reiterado enriquecimento da experiência, no âmbito de uma firma, aliados à permanente modificação das circunstâncias externas, proporcionam a essa mesma firma uma constante mutação nas oportunidades produtivas. Nem todas as firmas, certamente, possuem qualificações que lhes permitam tirar partido dessas oportunidades. Para nossa finalidade de análise, porém, é suficiente ter dado uma idéia de quais sejam essas qualificações, ter analisado os fatores determinantes da direção de expansão das firmas que possuam as qualificações necessárias e ter mostrado que não existe, necessariamente, qualquer limite ao crescimento, no decorrer do tempo.
A adaptação e os ajustamentos que a firma tem que realizar, à medida que se expande, são diretamente influenciados pela resistência externa à expansão. Mostramos como a necessidade da manutenção de uma posição competitiva, em seus setores básicos de atividade, limita a taxa de diversificação de uma firma e como, às vezes, afeta-lhe o padrão de diversificação, embora tenhamos abordado, apenas superficialmente, outros fatores que influem na taxa de crescimento das firmas.
A despeito das oportunidades e pressões que levam as firmas a produzir mais ampla gama de produtos, provavelmente a maioria delas retira a maior parte de seus rendimentos de um número relativamente pequeno de produtos intimamente relacionados. Não é de surpreender que isto seja verdadeiro para as firmas de pequeno e médio portes, em vista das dificuldades que acompanham uma diversificação extensiva. Idêntico fato parece ocorrer, no entanto, com muitas grandes firmas.49 Nenhum estudo empírico foi até hoje realizado, abrangendo e pormenorizando todos os aspectos da diversificação. A informação não consta de estatísticas publicadas e as firmas individuais relutam em fornecer os dados quantitativos e qualitativos necessários, mesmo quando disponíveis, o que, aliás, é improvável para a maioria das firmas, no que diz respeito ao início de sua diversificação.50 Sabemos que, hoje em dia, a diversificação está bastante disseminada.51 Ignoramos a extensão do processo no início do século. Embasados nos relatórios anuais das corporações, podemos depreender que as grandes firmas, em sua maioria, enfatizam intensamente as possibilidades de diversificação. Especialistas em gerência, executivos de firmas e analistas autorizados exaltam suas virtudes,52 em discursos e textos publicados. A função da diversificação como método de expansão da firma pode estar crescendo em importância; é uma probabilidade, mas também pode ser uma impressão totalmente falsa. De qualquer forma, conclui-se, a partir de nossa análise, que qualquer alteração nas circunstâncias, ampliando as oportunidades produtivas das firmas ou aumentando sua capacidade gerencial para o crescimento, em relação à intensificação da demanda de seus produtos básicos, tenderá a atuar no sentido de um aumento da diversificação.
Assim, talvez seja razoável supor que o desenvolvimento e a disseminação de técnicas de organização gerencial descentralizada; a ascensão de uma classe de profissionais no setor de gerência; as ações governamentais (especialmente a política tributária), que criam condições favoráveis para a realização de aquisições; o amplo desenvolvimento da pesquisa industrial e a conseqüente ampliação da gama de conhecimentos nos setores químico, mecânico, eletrônico e demais campos fundamentais da ciência industrial, gerando, no âmbito da firma individual, uma tecnologia adequada a uma larga faixa de produtos; todos esses fatores, enfim, tenderão a elevar a taxa de crescimento das firmas. Resta-nos, ainda, discutir os fatores que influenciam as alterações na taxa de crescimento; antes de fazê-lo, porém, devemos analisar, mais sistematicamente do que foi possível até agora, o processo de aquisição e de fusão.
Referências bibliográficas
- 1 Nicholas Kaldor, por exemplo, conclui que a "diversificação da produção é sempre gravada de algum ônus; isto é, a produtividade física de uma dada quantidade de recursos, calculada em termos de qualquer dos produtos, será sempre menor quanto maior for o número de bens independentes cuja produção seja solicitada simultaneamente". Ele cita a seguinte evidência para comprovar sua proposição: "A prova de que é isto o que ocorre, no caso de grande parte dos bens produzidos conjuntamente, é o fato de que o desenvolvimento de uma indústria é sempre acompanhado por uma especialização ou desintegração, isto é, a redução do número de bens produzidos por firmas individuais". Kaldor, Nicholas. Market imperfection and excess capacity. Económica, 2:48, 1935 (New Series). E, segundo P. Sargant Florence: "Assim, a integração, no âmbito de uma fábrica ou de uma firma, deve ser considerada responsável por uma ineficiente produção, em pequena escala, até que haja prova em contrário". The Logic of British and American industry. London, Routledge and Kegan Paul, 1953. p. 74.
- 3 Temporary National Economic Committee (TNEC). The Structure of industry. Washington D.C., 1941. Parte 6: The Product structures of large corporations. (Monograph nş 27).
- 21 The Development and Growth of General Motors (O Desenvolvimento e Crescimento da General Motors), depoimento de Harlow H. Curtice, presidente da General Motors Corporation, perante a subcomissão do Senado dos EUA para assuntos antitruste e de monopólio. Comissão do Poder Judiciário, 2 de dezembro de 1955.
- O ramo de utilidades domésticas empregava apenas uma pequena fração do número total de funcionários, das instalações e do volume de vendas da divisão mecânica, cujos funcionários vinham dedicando seus esforços, principalmente, á produção de equipamentos para outras indústrias e para as forças armadas. Aprofundar o desenvolvimento das atividades relativas às utilidades domésticas implicaria um investimento maior do que as perspectivas futuras pareciam justificar. A venda deste setor de operações possibilitou uma especialização mais eficaz quanto ao desenvolvimento e produção de instrumentos eletromecânicos de precisão". Annual report. 1953 54.
- 25 Veja, por exemplo, Meiklejohn, David S. Financial aspects of diversification. Charting the Company's Future, New York, n. 108, 1954, American Management Association (Financial Management Series); e Foulke, Roy. Diversification in business activity. New York, Dun and Bradstreet, 1956.
- 36 Ás vezes, é necessário que uma firma fabrique uma linha completa de produtos, não tanto para conveniência do consumidor, mas devido à relação tecnológica entre os diversos produtos; isso também promove a integração vertical. Eis o que Passer escreveu, a respeito da integração e da diversificação nas primeiras companhias de material elétrico, por exemplo: "os produtos elétricos deveriam constituir partes de um sistema de iluminação, geração ou distribuição de energia elétrica. Para assegurarem-se de que os componentes do sistema operassem conjuntamente de uma maneira satisfatória, os fabricantes perceberam ser vantajoso produzir todos, ou quase todos, os componentes de qualquer sistema que eles decidissem colocar no mercado. Descobriram ser vantajoso, também, vender e instalar sistemas completos. Foram, principalmente, as características sistêmicas dos produtos elétricos que fizeram com que uma firma de material elétrico fabricasse uma linha completa de produtos e assumisse a responsabilidade de colocá-los nas mãos dos usuários". Passer, Harold C. Development of large-scale organization: electrical manufacturing around 1900. Journal of Economie History, 12(4) Fali 1952. p. 390.
- 52 São típicos os comentários de C.W. Walton, gerente geral da divisão de adesivos e revestimentos da Minnesota Mining and Manufacturing Company: "As possibilidades de crescimento da corporação são ilimitadas, se ela empregar os modernos métodos atuais de pesquisa da diversificação e da comercialização de novos produtos, na condução de seus negócios". Apud: Corporate growih through diversification research and new producís commercialization. Michigan Business Papers, nş 28.
- Conference on sales management. Ann Arbor, University of Michigan, 1934. p. 15.
Datas de Publicação
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Publicação nesta coleção
08 Ago 2013 -
Data do Fascículo
Dez 1979