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Matemática de crédito ao consumidor

ARTIGOS

Matemática de crédito ao consumidor

Edmundo Éboli Bonini

Professor Contratado do Departamento de Métodos Quantitativos da Escola de Administração de Empresas de São Paulo, da Fundação Getúlio Vargas. Professor das Faculdades de Ciências Econômicas e Administrativas da Universidade de São Paulo, Faculdade de Ciências Econômicas de São Paulo, Faculdade de Ciências Econômicas de São Luís, Escola de Engenharia Mauá e Faculdade de Ciências Econômicas da Universidade Mackenzie

Desde que se iniciou no Brasil a chamada "reforma do mercado de capitais" êste setor passou a concentrar as atenções de todos os segmentos da economia nacional. As diferentes entidades que compõem o setor financeiro começaram a ser alvo de especial curiosidade. As Bolsas de Valores dos Bancos Comerciais, dos Bancos de Investimentos e sobretudo das Financeiras começaram a ser objeto de atenção especial.

Essa atenção não se circunscreveu às suas funções como peças de um mecanismo maior. Ao contrário, a mecânica de funcionamento de cada uma delas, sobretudo daquelas que foram particularmente influenciadas pela mencionada reforma, vem despertando inusitado interêsse. O funcionamento de entidades como a Bôlsa, as Financeiras ou os Bancos de Investimento, a par das sutilezas próprias de qualquer emprêsa, pressupõe também tôda uma técnica de análise, sem a qual não seria êle satisfatório.

Nessa matéria tem papel destacado a matemática financeira, indispensável para a correta tomada de decisões sôbre empréstimos ou inversões efetuadas por essas emprêsas.

O presente artigo aborda a questão do crédito ao consumidor e a interveniência das financeiras em operações dêsse tipo.

Em função da carência de capital para a aquisição de produtos de consumo durável e veículos, as financeiras podem emitir títulos (letras de câmbio), para a obtenção de capital e entregá-las aos consumidores de capital para a aquisição de bens.

O fluxograma apresenta-se da seguinte forma:

Portanto, temos duas fases do processo do fluxo do capital:

1. Obtenção por parte da financeira do capital no mercado.

2. Entrega do capital ao mercado consumidor (usuários).

EXEMPLOS DE CÁLCULOS

A financeira para a obtenção de dinheiro no mercado doador, deverá, evidentemente, pagar algumas comissões, taxas e também apresentar uma certa rentabilidade, tais como:

• Rentabilidade para o mercado doador (Letra de Câmbio).

• Corretagem para o vendedor da Letra de Câmbio.

• Corretagem de Aceite (Receita da financeira).

• Outras Corretagens (Receitas das financeiras).

• Imposto sôbre Operações financeiras (IOF).

Iremos, a título de exemplo, considerar as seguintes taxas:

• 32% ao ano

• 5% " "

• 5% " "

• 1,6% " "

• 1% " "

Consideremos que o Mercado Consumidor deva. ...... NCr$ 12. 000,00, a serem pagos à financeira em 12 promissórias de NCr$ 1.000,00 cada. Para a obtenção dêste capital, a financeira lançará no mercado doador letras de câmbio. Suponhamos que sejam 12 letras de câmbio de NCr$ 1.000,00. Como o prazo mínimo de vencimento da letra é de 6 meses, teremos que a primeira terá o valor de NCr$ 6.000,00 e as sucessivas de NCr$ 1.000,00, de acordo com o seguinte diagrama:

1. A que valor serão colocadas no Mercado Doador as letras de câmbio? De acordo com o primeiro exemplo, temos uma taxa ‘ = 32 % a.a. Assim, a letra de câmbio com o vencimento para 6 meses terá o valor no mercado doador de:

Sendo que K1 é o coeficiente que deverá multiplicar as letras de câmbio com o vencimento para 6 meses. Portanto, teremos:

6.000,00 X 0,862069 = 5.172,414 (Anexo 1 Anexo 1 )

Para as outras letras com vencimentos sucessivos, os coeficientes serão:

e assim, genericamente, teremos:

e os respectivos valores serão:

Temos, então, no Anexo 1 Anexo 1 , o dinheiro proveniente do "mercado doador".

2. A financeira terá de pagar uma taxa de corretagem (β) sôbre a venda das letras de câmbio. Consideremos que a taxa seja da ordem de 5% ao ano. Assim, temos que para a primeira letra a financeira pagará 0,025. Observar que as comissões são pagas sôbre o líquido das letras. Os outros coeficientes para a obtenção da corretagem serão:

e assim, genéricamente, teremos:

Temos no Anexo 2 Anexo 2 a corretagem a ser paga pela financeira, sendo que o mesmo foi obtido multiplicando-se cada parcela de capital recebido do mercado doador pela correspondente taxa do prazo CK)- Assim, temos que, por exemplo, para o dinheiro proveniente do mercado pelas 6 letras de valor nominal NCr$ 1.000,00 cada uma e que a Financeira recebeu NCr$ 5.172,414 deverá pagar ao corretor (µλ1) ou seja NCr$ 5.172,414 X 0,025 = 129,310350; a segunda letra com vencimento para 7 meses e de valor nominal de NCr$ 1.000,00 a financeira receberá do mercado doador NCr$ 842,694, conforme Anexo 1 Anexo 1 e deverá pagar ao corretor (µ1λ2) ou seja NCr$ 842,694 X X 0,029166 = 24,578013, conforme Anexo 2 Anexo 2 e assim por diante.

3. A financeira, para aceitar a operação de crédito, cobrará uma comissão de 5% ao ano, sendo que esta comissão comportar-se-á de acordo com a corretagem, uma vez que a mesma é de 5% ao ano, por hipótese.

4. A financeira cobrará também outras comissões que, somadas, serão 1,6% ou 0,016 e, desdobradas, serão: 0,016 = (0,005 + 0,005 + 0,005 + 0,001). Portanto, teremos de obter os coeficientes para: 0,005 (γ) e 0,001 (δ). Assim, temos:

Para 0,005(γ)

Assim, temos o Anexo 3 Anexo 3 , obtido através da multiplicação dos coeficientes Mj+1 pelos capitais líquidos provenientes do mercado doador (Anexo 1 Anexo 1 ).

Para a taxa: 0,001 (δ)

Assim, temos que o Anexo 4 Anexo 4 é obtido através da multiplicação Nj+1, pelos capitais líquidos provenientes do mercado doador (Anexo 1 Anexo 1 ).

5. O imposto sôbre operações financeiras (IOF) é de 1% e incide sôbre a soma dos valores nominais das letras e da corretagem, cujos cálculos estão apresentados no Anexo 5 Anexo 5 .

COMENTÁRIOS FINAIS

I. A financeira funciona apenas como uma intermediária entre o mercado doador e o mercado consumidor. Por isso, em nosso Anexo 6 Anexo 6 , apresentamos os seguintes elementos:

(1) Capitais.

(2) Correção monetária = capitais - capitais provenientes do mercado doador (Anexo 1 Anexo 1 ), que corresponde o lucro do mercado doador (lucratividade das letras de câmbio).

(3) Corretagem.

(4) Comissão da financeira.

(5) Imposto de Operações Financeiras (IOF).

(6) Outras comissões [3 X Anexo (3) Anexo 3 + Anexo (4) Anexo 4 ].

(7) Somas dos itens (2) + (3) + (4) + (5) + (6) = = despesas e lucratividade da financeira.

(8) Líquido = capitais (1) - despesas (7), que corresponde à quantia que será dada ao mercado consumidor (usuários).

II. Determinação da taxa de juros para o mercado consumidor, isto é, para os usuários. O montante do capital líquido recebido pelo mercado consumidor deverá ser igual ao montante das prestações. Assim, temos dois critérios:

• a capitalização simples, e

• a capitalização composta.

Determinação da taxa

• Capitalização simples

M = M'; sendo M = montante do capital líquido (8), Anexo 6 Anexo 6 e M' = montante das prestações a serem pagas pelos usuários.

Considerando-se n =12, C1 = 1.000,00 e C = 9.105,46; vem:

ao mês. Para o cálculo de outros capitais, o procedimento é análogo.

• Capitalização Composta

M = M'; sendo M = montante do capital líquido (8), anexo 6 Anexo 6 e M' = montante das prestações a serem pagas pelos usuários.

Considerando n = 12|C1 = 1.000 eC = 9.105.46, temos:

, observando a tabela para n = 12 encontramos i aproximadamente igual a 0,045 ou 4,5% ao mês.

Obs.: Um processo mais refinado para o cálculo da taxa na capitalização composta pode ser feito através de um processo iterativo. (Aproximações sucessivas.)

Seja:

Esta fórmula vai servir-nos para determinar i, por aproximações sucessivas. A aproximação ih, de ordem h de i, determina-se pela aproximação de ordem ih-i, pela seguinte fórmula de recorrência:

Como ponto de partida para a primeira aproximação io de i, vamos estabelecer um valor menor que i, mas que seja próximo de seu valor.

Para isso vamos desenvolver a potência (1 + i)-n de acôrdo com a lei binomial de NEWTON.

êste desenvolvimento apresenta uma série convergente Substituindo na igualdade α o têrmo (1 + i) -n pelo desenvolvimento acima, vem:

dividindo-se ambos têrmos por n.i, obtemos:

desprezando

e os sucessivos, temos a seguinte desigualdade:

Podemos, então, tomar como primeira aproximação de i o valor do segundo membro da desigualdade, isto é:

Em nosso exemplo anterior, teríamos:

III. A financeira ao vender o crédito ao consumidor, ou seja, o financiamento ao mercado consumidor, diz que a taxa de juros é obtida através da seguinte fórmula:

onde N = número de prestações, i = taxa de juros do empréstimo, C1 = valor de cada prestação, C = = líquido recebido.

Portanto, para C = 9.105,46, N = 12 e Ci = 1.000,00, teremos:

= 0,31789 e a taxa mensal será

im = = 0,0265 ou 2,65% ao mês.

CRÍTICA

Observamos aqui que não há para o cálculo da taxa a aplicação fundamental do princípio da amortização de um empréstimo ou seja:

"O montante do capital emprestado deverá ser igual ao montante das prestações."

Anexo 1 Anexo 1

ANEXO 2 Anexo 2

ANEXO 3 Anexo 3

ANEXO 4 Anexo 4

ANEXO 5 Anexo 5

ANEXO 6 Anexo 6

Anexo 1

Anexo 2

Anexo 3

Anexo 4

Anexo 5

Anexo 6

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    03 Jul 2015
  • Data do Fascículo
    Dez 1968
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