Acessibilidade / Reportar erro

Treinamento para o futuro

ARTIGOS

Treinamento para o futuro

Edela Lanzer Pereira de Souza

Doutora em Filosofia e Livre-Docente em Psicologia Organizacional do Programa de Pós-Graduação em Administração da UFRGS

1. INTRODUÇÃO

Já é lugar-comum dizer-se que estamos numa era de mudanças. Também não é novidade enumerar longas listas de inovações tecnológicas e mudanças sociais cada vez mais aceleradas. A literatura é farta em descrever a descontinuidade do nosso tempo. Buchen (8, p. 134) afirma com graça: "O século XX pode ser sumarizado como sendo o século que se excedeu a si mesmo, que foi à Lua antes de estar quer confortável quer despossuído da Terra, que deixou o passado para trás mais longe e mais rápido que qualquer idade anterior ou mesmo todos os séculos combinados e, acima de tudo, pulou para o século XXI sem ter a cortesia de permitir que o século atual chegasse ao seu fim cronológico natural."

Essa descontinuidade traz consigo várias conseqüências que não podemos ignorar. Na medida em que formos envolvidos passivamente no roldão, sofreremos ansiedade, tensão, desgaste, insegurança. É preciso que nós, como treinadores e agentes de mudança, tenhamos uma atitude proativa e não meramente reativa. Nos velhos moldes de Comte, é preciso prever e prover.

E é a isso que nos propomos aqui. Nosso trabalho, após esta breve introdução, será dividido em duas partes: a) uma previsão do futuro das organizações e seus administradores; b) uma sugestão de conteúdos e metodologias de treinamento, para enfrentar esse futuro e "tornar possível a indivíduos, grupos e organizações sua viabilidade, sua adaptação a novas condições, a aprender com a experiência, a mover-se no sentido de maior maturidade e, mais importante, a resolver problemas". (26, p. 1).

2. PROSPECÇÃO

Recenseando a bibliografia, encontramos vários autores especulando sobre o futuro.

Os cientistas mais ligados à sociologia, como Beitz & Washbum (5, p. 13) são mais inclinados a visualizar um quadro global centrado em valores comunitários. Eles declaram: "Uma sociedade organizada burocrática e hierarquicamente, com mais peso no topo, terá de ceder lugar para uma sociedade que será orientada no sentido de atender às necessidades reais das pessoas. É uma questão de mudar atitudes e identidades, de tornar o atendimento das necessidades humanas mais importante do que dar suporte a egos executivos inseguros; e é uma questão de mudar instituições, de tal forma que as pessoas possam participar diretamente do controle de decisões políticas, sociais e econômicas que afetam suas vidas."

Já os autores que trabalham em consultoria organizacional têm uma visão menos geral e menos indiferenciada.

Hicks (19, p. 425), por exemplo, prevê organizações contingenciais fortemente humanísticas, porém mais completas, porque incluirão os fatores da situação, inclusive o meio tecnológico e econômico. "Administração contingencial, por exemplo, quer dizer que se deverá aplicar o enriquecimento da função, considerando que alguns empregados não querem suas tarefas enriquecidas. Alguns preferem trabalho mais fácil e rotineiro. Alguns se perturbam com desafios. Outros preferem uma situação amigável e não se preocupam com o conteúdo de trabalho. Cada pessoa e situação são diferentes". Mais adiante ele enfatiza essa multiplicidade, quando esclarece: "A teoria contingencial sustenta que diferentes formas de delineamento organizacional e estilo administrativo são apropriados em circunstâncias diferentes. O desafio está em descobrir o modelo apropriado para dada situação" (p. 429).

Leavitt (25, p. 325) também prevê uma diferenciação organizacional cada vez maior e mais complexa, com multiplicidade de subsistemas e objetivos, ao mesmo tempo se estendendo para fora das fronteiras nacionais, sob pressões de ambiente. "Tais grandes organizações diferenciadas provavelmente serão menos democráticas no geral do que as de hoje - se entendermos por democracia que todos os membros são tratados do mesmo modo. Pelo contrário, as pessoas serão tratadas diferentemente, dependendo do subsistema no qual trabalhem. Na verdade, a mesma pessoa pode se achar altamente controlada numa parte da organização, por algum período de tempo, e depois ter muita liberdade em outra unidade, por outro período. (...) As organizações também necessitarão de pessoas flexíveis, adaptáveis e cognitivamente abertas, bem como pessoas tecnicamente habilitadas, para servir nas interfaces entre sistemas."

Além disso, Leavitt prenuncia a perda de legitimidade e eficácia do poder baseado na autoridade, dado o poder dos especialistas, que não se deixam controlar facilmente. "O movimento geral será de organizações concebidas mais politicamente. As formas exatas não são claras, mas muitos administradores das próximas décadas provavelmente se tornarão administradores-diplomatas, administradores-negociadores, administradores-arbitros, em vez de administradores-legisladores. Lidarão não apenas com grupos altamente diferenciados dentro de suas organizações, mas com organizações externas altamente interdependentes" (p. 328).

Nessa linha também se expressa Bennis (6, p. 107), quando comenta as relações entre micro e macrossistemas, ressaltando a dificuldade de consenso e a necessidade de negociações. Nas situações de macropoder o líder está mais envolvido com atividades interorganizacionais, as quais inescapavelmente reduzem suas interações com os membros do seu grupo.

Greiner (16), no seu modelo de crescimento organizacional, prevê que haverá maior trabalho em equipes intersetoriais e necessidade de soluções rápidas para os problemas. Em conseqüência haverá uma saturação psicológica dos funcionários que ficam emocional e fisicamente exaustos pela intensidade do trabalho em grupo e a forte pressão das soluções inovadoras. Ele admite a coexistência de duas estruturas organizacionais: uma rotineira, para as tarefas habituais, e uma reflexiva, para desenvolvimento. Os funcionários poderiam fazer rodízio entre ambas, conforme as necessidades pessoais e da organização.

Os ingleses Emery & Trist (11, p. 172), do Instituto Tavistock de Londres, enfatizam que os novos valores terão de "aumentar nossa capacidade de lidar com os níveis crescentes de complexidade, interdependência e incerteza que caracterizam o ambiente turbulento contemporâneo". Eles ainda chamam a atenção para as três formas de adaptação passiva que tendem a ser usadas: a superficialização, a segmentação e a dissociação. Essas formas não são as mais desejáveis, porque implicam perda de integração.

Não pretendemos citar todos os livros que trataram do tema. Os autores citados já bastam para se perceber algumas direções, quais sejam:

a) uma diferenciação intra-organizacional cada vez maior;

b) uma multiplicidade de estilos gerenciais necessários;

c) uma vulnerabilidade crescente ao ambiente e ecologia externos;

d) uma difusão e ambigüidade de objetivos e estratégias (falta de clareza);

e) uma grande interdependência intra e interorganizacional.

A partir daí podemos inferir os treinamentos que se fazem necessários para capacitar os administradores e subordinados a sobreviver sadia e produtivamente nessas circunstâncias tão instáveis.

Novamente não pretendemos esgotar o assunto. Mas podemos apontar algumas direções ainda não bem atendidas hoje e depois sugerir os treinamentos específicos, indicando conteúdos.

Os administradores de amanhã precisarão estar capacitados a:

a) correr riscos em alto grau de incerteza;

b) suportar tensão sem chegar ao stress;

c) reconhecer diferenciações contextuais;

d) encontrar alternativas rápidas de solução;

e) manejar poder e influência;

f) identificar suas próprias potencialidades e limites.

Baseados nestes seis objetivos, indicaremos os seis treinamentos requeridos.

3. TREINAMENTOS

Convém frisar que esses treinamentos não serão realizados com crianças e que, portanto, os conceitos pedagógicos precisam ser revisados. É a andragogia que nos dá elementos para orientar o ensino para adultos, o qual, segundo Malcolm Knowles (23, p. 45) se baseia em quatro pressupostos:

a) o adulto não é mais dependente e sim capaz de autodirigir-se;

b) o adulto conta com um grande lastro de experiências, sobre o qual constrói e amplia;

c) o adulto apreende melhor os conteúdos relacionados aos seus papéis sociais presentes;

d) o adulto está mais interessado na solução de problemas do que na aquisição de conteúdos.

Assim sendo, a metodologia de ensino não poderia ser predominantemente expositiva e sim vivencial, respeitando a heterogeneidade do grupo, e baseando-se em interesses emergentes, em contraposição aos tradicionais currículos com temas prefixados pelo professor para cada aula.

Isto, no entanto, não exime o treinador de motivar seus treinandos, de reconhecer a oportunidade dos assuntos, de alargar horizontes e facilitar a aprendizagem, através de uma organização adequada dos recursos de ensino.

Argyris & Schon (3, p. 99) lembram que "a aprendizagem efetiva:

a) é baseada em experiência causada pessoalmente;

b) é geralmente produzida através da expressão e exame de dilemas;

c) valoriza individualidade e expressão de conflitos;

d) deve ser guiada por um instrutor que tem mais fé nos participantes do que eles têm em si; que reconhece as limitações dos métodos de aprendizagem dos participantes; cuja idéia de racionalidade integra sentimentos e idéias; que pode encorajar a espontaneidade".

Passemos agora aos comentários sobre os seis treinamentos sugeridos para os administradores de amanhã.

3.1 Decisão e sobrevivência em situações de incerteza

As verdades absolutas vão diminuindo com o passar dos anos. Paradigmas são contestados, mitos são desvendados, convicções são derrubadas com descobertas de fatos novos. Não é só o avanço da ciência que torna obsoletas crenças antigas. É também o grande volume de conhecimentos gerados que tornou impossível a um homem dominá-los todos. As mentes enciclopédicas não existem mais. Como diz John Gall (14, p. 20) apropriadamente: "Enquanto um sistema existe apenas na cabeça do seu criador, concordamos que possa ser conhecido em todas as suas implicações. Mas assim que esse sistema é transladado ao mundo real, em materiais e pessoas, ele se torna algo mais. Torna-se uma coisa do mundo real e meros mortais nunca poderão conhecer tudo o que há para saber sobre o mundo real. Aí reside a inevitabilidade do princípio de incerteza generalizada."

Em outras palavras: é o volume e a complexidade das informações que tornam impraticável o seu domínio. Os fenômenos - especialmente os humanos - são multicausais, multifacetados, muitas vezes contraditórios e ambíguos. Objetividade e subjetividade se entrelaçam, razões emocionais pesam tanto ou mais do que as lógicas, motivos inconscientes influem nas ações de forma acobertada. Não é só a carência de informação que perturba, é também o seu excesso e contradição. Espera-se que "o líder tenha a objetividade gerencial apropriada, necessária perspectiva e julgamento. As pessoas que se relacionam com ele têm todas sua própria área de competência, orientação, interesses particulares e pontos cegos baseados em seus papéis e percepções. De alguma forma o gerente terá de ter a visão ecumênica e a imparcialidade necessária (7, p. 172).

O administrador, conseqüentemente, precisa ser treinado a reconhecer, selecionar e lidar com essas variáveis, assumindo riscos calculados. Ele pode aprender a reduzir e a tolerar a ambigüidade, a instabilidade do sistema, sem sofrer crises de identidade. Esta aprendizagem não é fácil, mas é viável e é urgente. Já existem metodologias específicas para isso, dentre as quais podemos citar Humble (20), Schon (34), Argyris & Schon (3) elngalls (21).

Estes autores propõem treinamentos em que as aulas expositivas são substituídas por tarefas nas quais os participantes se exercitam em tomar decisões em situações de risco, diminuir os graus de incerteza, colher informações precisas, diagnosticar valores, enfrentar discordâncias e lidar com sentimentos.

3.2 Resistência à tensão e controle de stress

Stress não é sinônimo de tensão, simplesmente; embora assim seja usado popularmente. Stress é uma reação orgânica não específica, desencadeada por demandas excessivas. Assim sendo, um certo grau de stress é inevitável, e pode ser desencadeado tanto por pressões agradáveis como desagradáveis. Suas conseqüências, no entanto, podem até causar a morte.

A partir da década de 30, Hans Selye vem-se dedicando ao estudo do stress e em 1950 publicou A fisiologia e a patologia da exposição ao stress: um tratado baseado nos conceitos de síndrome de adaptação geral e doenças da adaptação.

Neste trabalho, revelou que os organismos submetidos a pressões crescentes primeiro respondem com uma queda de reação, depois com uma reação compensatória exagerada e, por fim, com um colapso.

A partir daí muitos estudiosos se dedicam ao assunto, inclusive na área empresarial. Dentre esses, destacam-se o trabalho de Robert Kahn e sua equipe do Instituto de Pesquisa Social (ISR) da Universidade de Michigan (22), os quais pesquisaram o stress organizacional causado por ambigüidade e conflito nos papéis. Analisaram as causas e os fatores intervenientes que desencadeiam ou reduzem tensão, tais como: indefinição de expectativas, tipos de personalidade, estilos de relacionamento interpessoais, posição hierárquica, estrutura organizacional etc.

O assunto é crucial para administradores que, por suas funções, parecem estar particularmente sujeitos a stress. Nos EUA e Europa já estão sendo tomadas medidas saneadoras a respeito.

Anderson e equipe (1) investigaram diferentes percepções e reações a situações ambientais de emergência e descobriram que o estilo do executivo proprietário é decisivo para a sobrevivência da empresa.

Friedman e Rosenman (13) identificaram com clareza dois tipos básicos de conduta (o tipo A e o tipo B) que são mais e menos propensos a doenças cardíacas e circulatórias. Eles são categóricos quando afirmam: "Na maioria dos casos, o padrão de conduta tipo A pode ser alterado e alterado drasticamente; e é um engano terrivelmente perigoso acreditar no contrário" (p. 209).

Os autores apresentam um estudo detalhado, especialmente do tipo A, que se caracteriza por: facilidade em irritar-se, competitividade, pressa, gosto por números e tom de voz enérgico. A maioria dos homens americanos aí se encontram. O tipo B caracteriza-se por maior descontraimento, desapego ao relógio, expressão vocal pouco modulada e maior alegria de viver.

Na Holanda, variados recursos têm sido usados, com sucesso, para ajudar executivos a reduzir o stress, principalmente através da utilização da arte: pintura, poesia e música (9).

3.3 Contextualismo e manejo de clima organizacional

Este é um assunto novo, que está clamando por atenção. Pode ser examinado em duas dimensões.

Primeiro, a urgência de criarmos tecnologia própria. A maior parte do nosso know-how é importado. Aqui mesmo, para este trabalho sobre o futuro, estou utilizando bibliografia estrangeira, porque não encontrei dados nacionais. É bem verdade que "a técnica, por ser baseada em princípios científicos, é universal. Sua utilização e aplicação ocorrem, no entanto, numa realidade cultural que não é somente tecnológica" (41, p. 71), e sofrem o crivo e o ajuste de valores e necessidades locais. Esta é uma abordagem contextual, sociocultural, quase geográfica, de caráter amplo.

A segunda dimensão em que o assunto pode ser abordado é a visão de contexto em termos mais imediatos, situacionais e contingenciais. Por exemplo: qual o estilo de liderança mais indicado quando a tarefa é rotineira, o chefe é fraco e suas relações com os subordinados são pobres? Ao longo dessa linha encontramos os trabalhos de Fiedler (12), Reddin (31), Hersey e Blanchard (18).

Aqui, para o nosso caso, queremos enfatizar a necessidade de preparar o administrador no sentido de desenvolver maior acuidade perceptiva e flexibilidade de conduta para detectar e manejar as variáveis presentes, quer em termos organizacionais internos (39), quer em termos de circunstâncias externas. O manejo de clima é uma decorrência dessa conscientização.

Colocada assim, de forma ampla, a proposta parece ambiciosa e vaga. O pessoal de mercadologia, no entanto, já conseguiu operacionalizar várias dimensões contextuais, através da segmentação do mercado, quer em termos de território físico, quer em termos de classes sociais e de grupos psicológicos de referência.

3.4 Criatividade e solução de problemas

Entre o rol de treinamentos aqui propostos para o futuro, o de criatividade é o mais oferecido atualmente, contando inclusive com bibliografia em português. Infelizmente, esses cursos não vão além da técnica de brainstorm, em que os participantes são estimulados simplesmente a pensar em voz alta, lançando alternativas de solução para um problema dado. Conforme alertam Davis & Scott (10, p. 8) "é importante notar que cientistas, industriais, políticos, artistas, escritores e pesquisadores médicos do futuro estão hoje em nossas escolas. No entanto, as práticas educacionais presentes falham tipicamente em promover crescimento criativo, talvez até tolham a imaginação dos nossos estudantes".

Aqui, eu gostaria de sugerir treinamentos bem mais eficazes, já utilizados na Europa e nos EUA com sucesso.

Um deles é o de sinética. Sinética é uma palavra grega que significa junção de elementos diferentes, aparentemente irrelevantes.

A teoria sinética se apoia nas seguintes hipóteses:

a) a eficiência criativa das pessoas pode ser muito aumentada se compreenderem os processos psicológicos pelos quais operam;

b) no processo criativo, o componente emocional é mais importante que o intelectual; o irracional é mais importante que o racional;

c) são esses componentes emocionais e irracionais que podem e precisam ser entendidos, a fim de aumentar a probabilidade de sucesso numa situação de solução de problemas (15).

Esses treinamentos envolvem diversas técnicas, das quais Rickards (32) nos dá uma descrição detalhada, dividindo-as em individuais e grupais. Entre elas podemos destacar as "excursões fantásticas" e as "redefinições sucessivas" como particularmente interessantes.

As primeiras exploram o cabedal inconsciente e as divagações lúdicas. As redefinições seguem uma sistemática prescrita que leva a precisar com mais clareza os conceitos e objetivos inicialmente difusos.

A outra abordagem adotada por Nevis & Danzig (29) no desenvolvimento da criatividade é o ataque aos bloqueios. Esses autores identificaram 14 condições que inibem o processo criador, e seus treinamentos consistem em examinar e reduzir essas travas. Evidentemente esse tipo de curso, convém frisar mais uma vez, não é expositivo, nem teórico, e sim eminentemente vivencial.

3.5 Poder e mecanismos de influência

Se recensearmos a bibliografia das ciências comportamentais, veremos que só após a década de 60 é que começaram a surgir as publicações sobre poder. A ênfase anterior, na década de 50, era sobre relações humanas, comunicação, dinâmica de grupo e liderança, em conseqüência dos desastres da II Guerra Mundial. Poder era sinônimo de prepotência e, portanto, tabu. Essa visão distorcida do poder está sendo corrigida. Hoje, poder pode ser definido de duas maneiras:

a) poder é capacidade de influência;

b) poder é liberdade de escolha.

Note-se bem que o fenômeno pode ser analisado por ângulos diversos e, por isso mesmo, precisa ser melhor conhecido.

Como Kotter (24) e Nierenberg (30) apropriadamente chamam atenção, o administrador depende das atividades de outros e, portanto, precisa estar a par da dinâmica dos processos de poder e de negociação.

McClelland (27), que vinha-se dedicando ao estudo do motivo de realização, atualmente se dedica ao estudo do motivo de poder. Os fatos que despertaram seu interesse para a nova área de pesquisa foram vários. Constatou, por exemplo, que os administradores de maior sucesso não tinham índices de motivação para a realização, conforme supunha, mas que tinham interesses por poder. Observou também que os hippies e os adeptos das religiões orientais, embora não fossem competitivos e não lutassem para galgar poder, acabaram exercendo uma grande influência na sociedade americana. Partindo dessas constatações, empreendeu uma pesquisa ao longo de vários anos, cujos resultados foram publicados recentemente sob o título: Poder: a experiência interior (livro este ainda não traduzido para o português).

Num artigo do ano passado, McClelland & Burnham (28) resumem assim seus achados: "A preocupação do gerente com o poder deve ser socializada, controlada, de modo que a instituição como um todo, e não apenas o indivíduo, se beneficie. Homens e nações com este perfil de motivação são construtores de impérios; eles tendem a criar moral elevado e a expandir as organizações que chefiam."

Carl Rogers (33), o conhecido autor da psicologia não-diretiva, acabou também de publicar um livro sobre poder, no qual analisa sua dinâmica e se mostra preocupado com as dificuldades que os administradores têm de revelar suas emoções. Segundo ele, essa inibição os distancia do homem integral. Essa mesma inibição dos sentimentos foi encontrada por McClelland (27) e Argyris (2). E isso nos leva a propor a forma de treinamento de que trata o subitem seguinte.

3.6 Diagnóstico e auto-avaliação de capacidades pessoais

Por último, mas não menos importante, vem a recomendação para treinamentos em autoconhecimento e desenvolvimento pessoal. A instabilidade do presente e a incerteza do futuro só podem ser enfrentadas a partir de uma sólida confiança em si mesmo, nas capacidades e limitações bem conhecidas, nas aspirações realistas e bem definidas. O mundo é conhecido e interpretado através dos olhos da nossa percepção (38, p. 78). Nós somos o centro do nosso mundo psicológico e, por isso mesmo, torna-se crucial conhecermo-nos melhor. Nós somos indivíduos, mas não tão singulares que não tenhamos padrões comuns com outros, os quais permitem estabelecer tendências e prever crescimento.

Assim sendo, é da mais alta conveniência para o administrador diagnosticar suas próprias capacidades, bem como a das pessoas com as quais trabalha.

Atkins (4) elaborou um instrumento já traduzido para o português e utilizado por nós com sucesso. Trata-se de uma forma de medir estilos interpessoais de relacionamento no trabalho, quer em condições de stress, quer em condições favoráveis. O autor chama a atenção de que tanto as semelhanças como as diferenças podem contribuir para um melhor desempenho organizacional.

Outras dimensões que precisam ser melhor conhecidas são os níveis de maturidade e as crises existenciais da pessoa adulta. Até há bem pouco tempo, os estudos evolutivos restringiam-se ao desenvolvimento infantil. Hoje começam a surgir trabalhos analisando as etapas e os problemas típicos da idade adulta. Esta não é fácil. "Como na infância, cada passo não só representa novas tarefas evolutivas, mas requer um abrir mão das técnicas que foram úteis antes. (...) As épocas de crise, de mudanças construtivas ou desestruturadas não são apenas predizíveis, mas são desejáveis. Elas representam crescimento" (37, p. 31).

Assim sendo, a vida afetiva precisa ser melhor conhecida, expressa e controlada em moldes mais maduros, não devendo ser reprimida, nem manifesta ineficazmente. E aí temos toda a tecnologia da Gestalt a nos assessorar no como alcançar isso (17).

A Gestalt enfatiza o apercebimento do aqui e agora, reconhecendo a legitimidade das polaridades afetivas e sua integração através de um processo mais intuitivo do que racional (40).

Para finalizar, eu gostaria de citar Salye (36), que em seu último livro revela o seu próprio código de vida, o qual, no meu entender, é consentâneo com o nosso, que somos treinadores e consultores. Diz ele: "Meu código se baseia na visão de que, para alcançar paz de espírito e realização, através da auto-expressão, a maioria dos homens necessita dedicar-se a um trabalho a serviço de uma causa que respeitem. (...) Meu credo, o qual é baseado em leis biológicas, é de que, para a maioria das pessoas e certamente para a sociedade como um todo, o melhor motivo não é 'ama teu semelhante como a ti mesmo' (pois isso é impossível), mas sim 'faz por merecer o amor do teu semelhante'. Isto permite que expresses teus talentos, mantendo segurança e paz de espírito. Isto ocorre através de uma forma de egotismo altruístico, o qual dá vasão ao egocentrismo da matéria viva, sem causar sentimentos de culpa- sem ficar sujeito a ataques ou hostilidades, uma vez que é útil para todos" (p. 4-6). E, mais adiante: "Altruísmo pode ser visto como uma forma modificada de egotismo, uma espécie de egoísmo coletivo, que ajuda a comunidade, despertando gratidão" (p. 53).

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

1. Anderson, Carl et alii. Managerial response to environmentally induced stress. Academy of Management Journal, 20(2):260-72, 1977.

2. Argyris, Chris. How tomorrows executives will make decisions. In: Davis, K. & Scott, W. Human relations and organizational behavior. New York, McGraw-Hill, 1969, p. 190-8.

3. ______ & Schon, Donald. Theory in practice: increasing professional effectiveness. São Francisco, Jossey-Bass, 1974.

4. Atkins, Stuart. Helping people deal with their differences. The Journal of Applied Behavioral Science, 13(1):110-116, 1977.

5. Beitz, Charles & Washburn, Michael. Creating the future. New York, Bantam, 1974.

6. Bennis, Warren. A funny thing happened on the way to the future. In: Thomas, J. M. & Bennis, W. C, ed. Management, change and conflict. Middlesex, Penguin, 1972.

7. ______. The unconscious conspiracy: why leaders can't lead. New York, Amacom, 1976.

8. Buchen, Irving. Humanism and futurism: enemies or allies. In: Toffler, A., ed. Learning of tomorrow. New York, Vintage, 1974.

9. Buntinx, Henry. O administrador, sua pessoa, sua cultura e seu stress. IDORT, São Paulo, jul./ago. 1977.

10. Davis, Gary & Scott, Joseph, ed. Training creative thinking. New York, Holt, 1971.

11. Emery, F. E. & Trist, E. L. Towards a social ecology: contextual appreciation on the future in the present. London, Plenum, 1975.

12. Fiedler, Fred. Engineer the job fit the manager. In: Cummings, L. L. & Scott, W.E. Readings in organizational behavior and human performance. Home-wood, Ill., Irwin & Dorsey, 1969.

13. Friedman Meyer & Rosenman, Ray. Type A behavior and your heart. Geenwich, Fawcett Crest, 1975.

14. Gall, John. Systemantics: how systems work and especially how they fail. New York, Quadrangle, 1977.

15. Gordon, William J. J. Synetics. New York, Harper & Row, 1961.

16. Greiner, Larry. Evolução e revolução no desenvolvimento das organizações. São Paulo. Expansão, 21 mar. 1973.

17. Herman, Stanley. Toward a more authentic manager: using Gestalt concepts for management style in consonance with individual personality. Training and Development Journal, Oct. 1971.

18. Hersey, Paul & Blanchard, Kenneth. Psicologia para administradores de empresas. São Paulo, EPU, 1974.

19. Hicks, H. G. & Gullett, C. Ray. Organizations: theory and behavior. New York, McGraw-Hill, 1975.

20. Humble, John, ed. Improving the performance of the experienced manager. London, McGraw-Hill, 1973.

21. Ingalls, John. Human energy: the critical factor for individuals and organizations. Reading, Mass. Addison-Wesley, 1976.

22. Kahn, Robert et alii. Organizationsal stress: studies in role conflict and ambiguity. New York, Wiley, 1964.

23. Knowles, Malcolm. The adult learner: a neglected species. Houston, Gulf, 1973.

24. Kotter, John. Power, dependence and effective management. Harvard Business Review, Cambridge, July/Aug. 1977.

25. Leavitt, Harold et alii. The organizational world. New York, Harcourt Brace Jovanovich, 1973.

26. Lippitt, Gordon. Visualizing change: model building and the change process. La Jolla, Univ. Associates, 1973.

27. McClelland, David. Power: the inner experience. New York, lrvington, 1975.

28. ______. & Burnham, D. O poder é a grande motivação dos bons gerentes. Exame, São Paulo, 27 abr. 1977.

29. Nevis, Edwin; Danzig, Elliot & Nevis, Sônia. Blocks to creativity. Washington, D.C, NTL, 1971.

30. Nierenberg, Gerard. Fundamentals of negociating. New York, Hawthorn, 1973.

31. Reddin, William. Eficácia gerencial. São Paulo, Atlas, 1975.

32. Rickards, Tudor. Problem solving through creative analysis. Epping, Essex, Gower Press, 1975.

33. Rogers, Carl. Carl Rogers on personal power: inner strenght and its revolutionary impact. New York, Delacorte, 1977.

34. Schon, Donald A. Beyond the stable state. New York, Norton, 1973.

35. Selye, Hans. The physiology and pathology of exposure to stress: a treatise based on the concepts of the general-adaptation syndrome and the diseases ofadaptation. Montreal, Act, 1950.

36. Selye, Hans. Stress without distress. New York, Signet, 1975.

37. Sheehy, Gail. Passages: predictable crises of adult life. New York, Bantam, 1977.

38. Souza, Edela L. P. Desenvolvimento organizacional: casos e instrumentos brasileiros. São Paulo, Edgard Blücher: Porto Alegre, FDRH, 1975.

39. ______. A análise transacional na supervisão escolar. Porto Alegre, Livr. Edit. Porto Alegre, 1975.

40. ______. Alguns conceitos operacionais de psicoterapia gestáltica. Psicologia Clínica e Psicoterapia. Belo Horizonte, Interlivros. 1(2):47-54, dez. 1977.

41. ______. Clima e cultura organizacionais: como se manifestam e como se manejam. São Paulo, Edgard Blücher; Porto Alegre, PPGA, UFRGS, 1978.

42. Thomas, J. M. & Bennis, W. G., ed. Management, change and conflict. Middlesex, Penguim, 1972.

43. Toffler, Alvin, ed. Learning for tomorrow. New York, Vintage, 1974.

  • 1. Anderson, Carl et alii. Managerial response to environmentally induced stress. Academy of Management Journal, 20(2):260-72, 1977.
  • 3. ______ & Schon, Donald. Theory in practice: increasing professional effectiveness. São Francisco, Jossey-Bass, 1974.
  • 4. Atkins, Stuart. Helping people deal with their differences. The Journal of Applied Behavioral Science, 13(1):110-116, 1977.
  • 5. Beitz, Charles & Washburn, Michael. Creating the future. New York, Bantam, 1974.
  • 7. ______. The unconscious conspiracy: why leaders can't lead. New York, Amacom, 1976.
  • 9. Buntinx, Henry. O administrador, sua pessoa, sua cultura e seu stress. IDORT, São Paulo, jul./ago. 1977.
  • 10. Davis, Gary & Scott, Joseph, ed. Training creative thinking. New York, Holt, 1971.
  • 11. Emery, F. E. & Trist, E. L. Towards a social ecology: contextual appreciation on the future in the present. London, Plenum, 1975.
  • 13. Friedman Meyer & Rosenman, Ray. Type A behavior and your heart. Geenwich, Fawcett Crest, 1975.
  • 14. Gall, John. Systemantics: how systems work and especially how they fail. New York, Quadrangle, 1977.
  • 15. Gordon, William J. J. Synetics. New York, Harper & Row, 1961.
  • 16. Greiner, Larry. Evolução e revolução no desenvolvimento das organizações. São Paulo. Expansão, 21 mar. 1973.
  • 17. Herman, Stanley. Toward a more authentic manager: using Gestalt concepts for management style in consonance with individual personality. Training and Development Journal, Oct. 1971.
  • 18. Hersey, Paul & Blanchard, Kenneth. Psicologia para administradores de empresas. São Paulo, EPU, 1974.
  • 19. Hicks, H. G. & Gullett, C. Ray. Organizations: theory and behavior. New York, McGraw-Hill, 1975.
  • 20. Humble, John, ed. Improving the performance of the experienced manager. London, McGraw-Hill, 1973.
  • 21. Ingalls, John. Human energy: the critical factor for individuals and organizations. Reading, Mass. Addison-Wesley, 1976.
  • 22. Kahn, Robert et alii. Organizationsal stress: studies in role conflict and ambiguity. New York, Wiley, 1964.
  • 23. Knowles, Malcolm. The adult learner: a neglected species. Houston, Gulf, 1973.
  • 24. Kotter, John. Power, dependence and effective management. Harvard Business Review, Cambridge, July/Aug. 1977.
  • 25. Leavitt, Harold et alii. The organizational world. New York, Harcourt Brace Jovanovich, 1973.
  • 26. Lippitt, Gordon. Visualizing change: model building and the change process. La Jolla, Univ. Associates, 1973.
  • 27. McClelland, David. Power: the inner experience. New York, lrvington, 1975.
  • 28. ______. & Burnham, D. O poder é a grande motivação dos bons gerentes. Exame, São Paulo, 27 abr. 1977.
  • 29. Nevis, Edwin; Danzig, Elliot & Nevis, Sônia. Blocks to creativity. Washington, D.C, NTL, 1971.
  • 30. Nierenberg, Gerard. Fundamentals of negociating. New York, Hawthorn, 1973.
  • 31. Reddin, William. Eficácia gerencial. São Paulo, Atlas, 1975.
  • 32. Rickards, Tudor. Problem solving through creative analysis. Epping, Essex, Gower Press, 1975.
  • 33. Rogers, Carl. Carl Rogers on personal power: inner strenght and its revolutionary impact. New York, Delacorte, 1977.
  • 34. Schon, Donald A. Beyond the stable state. New York, Norton, 1973.
  • 35. Selye, Hans. The physiology and pathology of exposure to stress: a treatise based on the concepts of the general-adaptation syndrome and the diseases ofadaptation. Montreal, Act, 1950.
  • 36. Selye, Hans. Stress without distress. New York, Signet, 1975.
  • 37. Sheehy, Gail. Passages: predictable crises of adult life. New York, Bantam, 1977.
  • 38. Souza, Edela L. P. Desenvolvimento organizacional: casos e instrumentos brasileiros. São Paulo, Edgard Blücher: Porto Alegre, FDRH, 1975.
  • 39. ______. A análise transacional na supervisão escolar. Porto Alegre, Livr. Edit. Porto Alegre, 1975.
  • 40. ______. Alguns conceitos operacionais de psicoterapia gestáltica. Psicologia Clínica e Psicoterapia. Belo Horizonte, Interlivros. 1(2):47-54, dez. 1977.
  • 41. ______. Clima e cultura organizacionais: como se manifestam e como se manejam. São Paulo, Edgard Blücher; Porto Alegre, PPGA, UFRGS, 1978.
  • 42. Thomas, J. M. & Bennis, W. G., ed. Management, change and conflict. Middlesex, Penguim, 1972.
  • 43. Toffler, Alvin, ed. Learning for tomorrow. New York, Vintage, 1974.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    08 Ago 2013
  • Data do Fascículo
    Jun 1979
Fundação Getulio Vargas, Escola de Administração de Empresas de S.Paulo Av 9 de Julho, 2029, 01313-902 S. Paulo - SP Brasil, Tel.: (55 11) 3799-7999, Fax: (55 11) 3799-7871 - São Paulo - SP - Brazil
E-mail: rae@fgv.br