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A ciência da administração e a SBPC

NOTAS E COMENTÁRIOS

A ciência da administração e a SBPC

João Evangelista Mendes da Rocha

Ex-aluno da Escola Brasileira de Administração Pública da Fundação Getúlio Vargas. Membro da SBPC

Subordinou-se ao tema central Ciência, tecnologia e Brasil democrático a 37ª Reunião Anual da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência. (SBPC); realizada em Belo Horizonte, na Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), de 10 a 17 de julho último, nela foram apresentados cerca de três mil trabalhos científicos, distribuídos por 76 diferentes áreas de conhecimento, além de 260 conferências, simpósios, mesas-redondas e palestras.

Em artigo anterior, mostramos e criticamos a posição da administração, como ciência, em face das demais, nas duas reuniões anteriores da SBPC e focalizamos; 1. sua insignificante participação a nível de trabalhos encaminhados; 2. o desinteresse, que ainda ocorre, das entidades e associações ligadas à administração por um evento tão importante como esse da reunião anual da SBPC, em que todas as ciências se irmanam para o bem comum e, por isso mesmo, de marcante oportunidade para os destinos da ciência da administração.

Este ano, o quadro manteve-se praticamente inalterável nesses dois aspectos, considerando que tivemos apenas um trabalho a mais, no campo específico da administração, totalizando cinco, comparando com os quatro do ano anterior. A participação de qualquer associação, conselho ou entidade de administradores continuou nula, quando pouco mais de 40 representantes de sociedades científicas fizeram-se presentes ao evento.

Na época conjunta - economia e administração - surgiram 43 trabalhos e, só a título de comparação, em educação o número chegou a mais do dobro, ou seja, 92. Isto dentro da nossa área - ciências do homem - que englobou, além dessas três disciplinas citadas, mais outras nove, totalizando, nessa área, 408 trabalhos. Como curiosidade, outra área - ciências da matéria - apresentou, só no campo da física, 432 temas, o suficiente para superar o daquela área.

Começamos a mostrar a síntese dos cinco trabalhos de administração apresentados na reunião por aquele que foi elaborado em outra área - afim, mas não específica, como é a educação - e intitulado O taylorismo na educação. Este trabalho, oriundo do Instituto de Biociência da Universidade de São Paulo, focalizou, com muita propriedade, a inadequação do taylorismo à arte do ensino, já que sua característica fundamental é meramente técnica. O autor considerou que há uma influência perniciosa no ensino do método mecanicista e taylorista e, entre outros exemplos, apontou o destaque dado aos alunos que mais produzem - os de notas melhores e conceitos de louvor e a programação inflexível do ensino. Defendeu uma relação mais humana na escola. Dos cinco catalogados no grupamento economia-administração assim podemos referenciar: 1. processo de treinamento de recursos humanos numa abordagem sistêmica. Trata-se de um estudo que veio do Instituto de Planejamento de Presidente Prudente da Universidade Estadual Paulista. E feito nas indústrias têxtil e de confecções da Grande Natal sobre o nível de treinamento nessas indústrias; 2. um estudo sobre a distribuição do controle em organizações formais. Também oriundo da instituição anterior, dois tipos de organização foram pesquisados: um hospital e uma escola. O gráfico de controle utilizado foi o de Tanebaum e Kahn e avaliados os controles ativo e passivo; 3. uma experiência de estágio para alunos do Curso de Licenciatura em Matemática, junto à disciplina administração. A finalidade deste trabalho, também originário de Presidente Prudente, foi estudar o método quantitativo aplicado aos problemas da área da administração, bem como a elaboração de gráficos de controle durante o estágio dos alunos de matemática em duas organizações formais: o hospital e a escola. De nossa parte, há bastante tempo voltados para esse estudo interdisciplinar - matemática e administração - temos observado que a validade do método quantitativo na área da administração, a exemplo da economia, vem-se acentuando sobremaneira, no que pese ao entendimento de muitos quanto à sua inaplicabilidade num campo basicamente social como o de nossa área. Livros e mais livros estão aí mesmo na defesa dessa tese de estreita compatibilidade entre as duas ciências, como por exemplo, para citarmos só um, Introdução quantitativa às decisões administrativas, de Leonardo W. Hein, que, na introdução de seu prefácio, assim se manifesta de forma até afetuosa: "Estamos testemunhando um romance, eventualmente, um casamento, entre as áreas tradicionais de matemática e a administração de empresas." E, agora, vem aguçar ainda mais nosso interesse o referido trabalho apresentado na última reunião da SBPC; 4. percepção e análise de variáveis organizacionais e individuais em órgãos estatais. Esperanças e realidades. Oriundo igualmente do Instituto de Planejamento de Presidente Prudente, o autor focalizou, através de uma pesquisa, a diferença de percepção em uma organização: o real e o ideal e seu reflexo no comportamento das pessoas. O papel do gerente de recursos humanos dentro da concepção de que toda empresa tem função social. Entre outras, duas variáveis foram apontadas como responsáveis pela diferença entre o real e o ideal: a) aceitação de sugestões; b) participação dos subordinados nas decisões da organização; 5. formação de administradores públicos do Brasil e as dimensões da racionalidade. Neste trabalho, que veio da Escola de Administração da Universidade Federal da Bahia, o aspecto substantivo da racionalidade foi destacado como a questão nevrálgica do ensino da administração pública e que se deve sobrepor aos outros itens meramente burocratizantes e observados de 1930 para cá e que foram frutos da racionalidade funcional. De nossa parte, diríamos que o autor do trabalho apresentado na reunião, ao considerar, na questão do ensino da administração pública, a importância da racionalidade, ponderou a distinção de um ponto muito discutido da ação administrativa, que é o relacionado com os dois tipos de racionalidade: o funcional e o substantivo ou substancial, a cujo tema Max Weber e Barnard, entre outros, tanto se dedicaram.

Eis uma ligeira referência acerca dos trabalhos de administração apresentados na última reunião da SBPC, cujo conhecimento mais profundo mereceria certamente um interesse especial por parte dos nossos companheiros administradores.

E à medida que fôssemos adquirindo consciência do valor qualitativo desses trabalhos e da importância científica das reuniões da SBPC, não há dúvida de que novos trabalhos, e em maior número, aí desembocariam, e temas tão atuais e tipicamente de administração, como os que se seguem a título de sugestão, poderiam ser amplamente debatidos: 1. modernização e democratização das estruturas na administração pública; 2. reestruturação de órgãos públicos versus extinção; 3. inchação e ineficiência de autarquias por falta de controle; 4. reformulação e adaptação regional do currículo no ensino da administração; 5. centralização versus descentralização; 6. gerência democrática versus gerência autoritária ou paternalista; 7. a teoria Z e a eficácia da empresa japonesa; 8. auditoria administrativa e seu atual papel da administração estatal; 9. o sentido democrático de uma administração transparente.

Esperamos que tal ocorra e as nossas instituições de ensino de administração tomem a vanguarda desse tipo de ação, a exemplo das nossas congêneres das outras áreas de conhecimento que, sem comparação, apresentaram e debateram seus mais variados problemas. E aqui fica, por último, mais um registro estatístico, para reflexão, extraído da 37ª Reunião da SBPC: número de instituições de ensino que apresentaram trabalhos sobre administração, 3, enquanto que em genética, para citarmos apenas uma área, cerca de 100 instituições.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    21 Jun 2013
  • Data do Fascículo
    Dez 1985
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