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Método da taxa interna de retorno: caso de taxas múltiplas

ARTIGOS

Método da taxa interna de retorno - caso de taxas múltiplas

Adary Oliveira

1. INTRODUÇÃO

Os métodos de engenharia econômica têm sido minuciosamente analisados e comparados entre si por estudiosos, resultando daí observações que desaconselham suas aplicações em casos diversos. Dos métodos conhecidos, um dos mais discutidos tem sido o da Taxa Interna de Retorno, no caso particular que apresenta múltiplas taxas.

O presente artigo analisa comparativamente os procedimentos sugeridos por Ezra Solomon e Pierre Massé para o caso em que ocorrem múltiplas taxas internas de retorno num projeto de investimento.

Acrescenta uma descrição sumária do método da taxa interna de retorno e sugere um outro procedimento para eliminação da dualidade. Conclui afirmando que o método da TIR não deve ser aplicado para problemas que apresentem mais de uma inversão do fluxo de caixa.

2. DEFINIÇÕES

A taxa interna de retorno é a taxa de desconto que faz com que o valor atribuído a receitas futuras iguale o custo do investimento, isto é, a taxa que anula o valor atual do projeto.

Na linguagem do analista financeiro, a taxa interna de retorno de um projeto de investimento é a taxa que iguala o valor atual das saídas de caixa, prevista ao valor atual das entradas estimadas.

Matematicamente, a taxa interna de retorno de um projeto é a taxa de desconto r, real e não-negativa, para o qual se verifica a relação.

Pj(1 + r)-n = 0

Os projetos de investimento em que

Po < 0

Pj> 0 para j = 1, 2, ...................... n

e

Pj > - Po

ou, de uma maneira mais geral, em que

Po < 0

Pj< 0 para j = 1, 2, ...................... k

Pj> 0 para j = k + 1, K + 2, ........... n

terão sempre uma taxa de retorno r, real e não-negativa, e será única. São caracterizados, conforme se pode notar pelas expressões anteriores, por duas propriedades:

• só há uma mudança de sinal na seqüência de seus fluxos de caixa;

• após um espaço de tempo em que as despesas excedem ou igualam as receitas, passamos a ter, até o fim do horizonte de dados, receitas superiores ou iguais às despesas.

Há, entretanto, certas espécies de projetos, não-enquadrados no tipo mencionado, em que é possível a existência de mais de uma taxa, real não-negativa, que anule o valor atual do projeto, constituindo assim exemplos de taxas múltiplas de retorno.

A escolha ou determinação da taxa interna de retorno mais adequada para esses tipos de projeto é aquela abordada nas análises de Ezra Solomon e Pierre Massé, que a seguir são consideradas.

3. ANÁLISE DE EZRA SOLOMON

O autor inicia a análise através de um exemplo:

"Suponhamos que a proposta que está sendo alvo de consideração seja a instalação de uma sonda petrolífera que extrairia do subsolo uma quantidade fixa de petróleo mais rapidamente do que a que está em uso. Suponhamos que, operando-se a sonda existente, o investidor possa esperar US$ 10.000 ao fim de um ano e US$ 10.000 no fim do segundo ano. Suponhamos que, instalando a sonda maior com um custo líquido atual de US$ 1.600, ele possa esperar USI 20.000 no fim de um ano e nada no fim de dois anos. A instalação da segunda sonda pode ser considerada como um projeto que possui as seguintes características de fluxo de caixa:

Tendo sido efetuado o cálculo para determinação da taxa que iguale a zero a soma algébrica das saídas e das entradas de caixa descontadas, foram encontrados dois valores: 25% e 400%.

O autor indaga: "Qual das duas taxas é a medida correta do valor do investimento do projeto, 25% ou 400%?

E responde textualmente: "Nenhuma dessas taxas constitui uma medida do valor do investimento, nenhuma é importante para a lucratividade do projeto em consideração e nenhuma, portanto, é correta. Seu defeito prende-se à aplicação incorreta da 'prescrição normal' para a identificação da taxa de retorno."

Critica a validade de aceitação de qualquer taxa calculada com o seguinte exemplo que indica uma conclusão absurda:

Quanto maior o valor da instalação da sonda maior a taxa interna de retorno.

O autor sugere que os valores antecipados da receita, no caso dos US$ 10.000, sejam reaplicados à taxa de mercado, 23%, até o final do período. O montante obtido, US$ 12.300, subtraído dos US$ 10.000 correspondentes ao período t2, resultaria em US$ 2.300. Para que o investimento de US$ 1.600 possa no final de dois anos corresponder ao montante de US$ 2.300, a taxa interna de retorno deverá ser de aproximadamente 20%.

E conclui: "Utilizando-se esse método, pode-se encontrar uma taxa de retorno única e significativa para qualquer grupo de entradas e saídas de caixa."

4. ANÁLISE DE PIERRE MASSÉ

Massé denomina de B (i) = 0 a equação de n-ésimo grau que será usada na determinação das taxas múltiplas, sendo B o valor presente líquido das entradas e saídas de caixa; B(i), é uma função não-monotonicamente decrescente e B (i) = 0 é uma equação com raízes positivas ou negativas, reais ou imaginárias.

Supondo ser io a taxa de mercado, pressupõe a existência de duas situações:

a) B(io) > 0

b) B(io) < 0

No primeiro caso, B (i0) > 0, admitindo que B(i) se tornará negativo quando i tender para o infinito - B (oc) < 0 - argumenta o autor que existirá pelo menos uma raiz real entre os pontos de abscissa i e + oc, e admite como taxa interna de retorno a menor delas, a mais próxima de io.

Sendo r a raiz, teremos

B(r) = 0 e (r) < 0

No segundo caso, B (i0) < 0, admite o autor que, para valores pequenos de i(i = - 1 + ), a função assumiria valores positivos, B (-1 + ) > 0, e haveria pelo menos uma raiz real entre i0e -1 + . A taxa interna de retorno seria a maior das raízes, a mais próxima de i0.

Sendo r' essa raiz

B(r') = 0 e (r') < 0

Sumarizando, conclui que a taxa de retorno é um número r, próximo da taxa de mercado i0, tal que

B(r) = 0, < 0 e

r é maior ou menor que i0conforme B (i0) seja maior ou menor que zero.

5. COMENTÁRIOS E ANÁLISE COMPARATIVA

O que o autor Ezra Solomon sugere é que as saídas de caixa, isto é, os rendimentos sejam levados para tempo futuro a uma taxa igual à do mercado, de modo a eliminar as inversões intermediárias do fluxo de caixa. O novo fluxo apresentar-se-ia com uma única taxa interna de retorno. No exemplo dado, a taxa assim obtida foi de 20% aproximadamente (19,896%).

Do mesmo modo, pode-se sugerir que as entradas de caixa, isto é, as novas inversões, sejam trazidas para o presente, instante inicial, à taxa de mercado vigente, que eliminaria as inversões intermediárias. O novo fluxo também se apresentaria com uma única taxa de retorno. No exemplo considerado, ela seria de 21,8%.

Em resumo, o método sugerido por Solomon transformaria o projeto num outro em que um investimento inicial de US$ 1.600 gerasse, a uma taxa de 20%, um montante de US$ 2.300, no final de dois anos. O que é sugerido transformaria o projeto num outro em que um investimento inicial de US$ 8.209 gerasse, a uma taxa de 21,8%, um montante de US$ 10.000, no final de um ano. Não havendo restrição de capital, o último seria mais interessante.

O autor Pierre Massé comete duas omissões na sua explanação.

Primeiramente, B (-1 + ) só é positivo quando B(0) o é; o que pode ser traduzido pela expressão

Pj > - Po

Isso, aliás, pode ser verificado no exemplo apresentado por Solomon, onde B(0) = -1.600 e, portanto, para i0 = 23%, B(i0) < 0; e não há nenhum valor positivo de B(i) entre i0e - 1 +

Em segundo lugar, entre i0 > 0 e 1 + pode ocorrer um valor de r entre -1 e 0 e portanto r < 0, o que contraria a sua definição.

Considere-se agora um exemplo onde se possa fazer uma análise comparativa entre os três métodos comentados. Seja um projeto com o seguinte fluxo de caixa:

onde

P0 = - 156.000 P0 < 0

P1 + P2 + P3 = 608.400 - 789.360 + 340.704 =

= 159.744

159.744 > 156.000

P1 + P2 + P3 > - P0

O projeto apresenta três taxas internas de retorno: 20, 30 e 40%. Para uma taxa de mercado de 15%, faz-se a seguir a aplicação dos três métodos:

a) Método de Solomon

O método de Solomon não resolveria esse problema. A aplicação de US$ 608.400 por um período, a 15%, daria US$ 699.660 inferior a US$ 789.360, o que não eliminaria a inversão de fluxo intermediária como se pretendia.

b) Método sugerido

-156.000 - 789.360 (1 + 0,15)-2 + 608.400 (1 + r)-1 + 340.704 (1 + r)-2 = 0 a solução da equação dá como raiz

r = 0,18878 ou r = 18,9%

c) Método de Massé

B(í) = - 156.000 + 608.400 (1 + i)-1 - 789.360 (1 + i)-2 + 340.704 (1 + i)-3

io = 0,15

B(io) = 192,32 > 0

Entre i e + oc existem as raízes reais

r1 = 0,20, r2 = 0,30 e r3 = 0,40, sendo a menor delas r1 = 0,20; então a taxa interna de retorno será r = 0,20 ou r = 20%

Admitindo-se agora que a taxa de mercado seja de 25% e aplicando-se os três métodos, tem-se:

d) Método de Solomon

Da mesma maneira não pode ser aplicada pois 608.400 (1,25) = 760.500 < 789.360, não eliminando assim a inversão do fluxo de caixa (a inversão só seria eliminada para taxas iguais ou superiores a 30%);

e) Método sugerido

- 156.000 - 789.360 (1 + 0,25)-2 + 608.400 (1 + r)-1 + 340.704 (1 + r)-2 = 0, resolvendo r = 0,31270 ou r = 31,3%

f) Método de Massé

io = 0,25

B(io) = - 29,95 < 0

Entre ioe - 1 + existe a raiz real r = 0,20 que é a taxa interna de retorno: 20%.

6. CONCLUSÃO

Os três métodos apresentados, apesar de acompanhados de fundamento lógico, apresentam resultados conflitantes e até mesmo absurdos quando aplicados a um mesmo problema.

Tal ocorre sobretudo porque quando se admite uma taxa de mercado como base de comparação, subentende-se que esta traduza o resultado de um projeto cujo modelo é do tipo descrito no item 2 deste trabalho, conhecido como modelo tipo convencional. Assim, a comparação de problemas de modelos diferentes, um convencional e um não convencional, não pode apresentar resultados de coerência irrefutável.

Conclui-se, portanto, afirmando que o método da taxa interna de retorno é um método válido para problemas do tipo descrito no item 2, não devendo ser aplicado para aqueles que apresentem mais de uma inversão do fluxo de caixa.

BIBLIOGRAFIA

  • Sólon, Ezra. The Arithmetic of capital - Bual geting decisions. Journal of Business, v. 29, Apr. 1956.
  • Massé, Pierre. Optimal investment decisions. Prentice-Hall, 1962. cap. 1.
  • Faro, Clóvis J.D.L.D. de Engenharia econômica - elementos. Rio de Janeiro, APEC, 1972.
  • Van Home, James C. Política e administração financeira. Trad. Livros Técnicos e Científicos, Rio de Janeiro, 1974.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    08 Ago 2013
  • Data do Fascículo
    Jun 1979
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