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A natureza jurídica das atividades das Bolsas de Valores

ARTIGO

A natureza jurídica das atividades das Bolsas de Valores

Ary Oswaldo Mattos Filho

Professor pleno na Escola de Administração de Empresas de São Paulo, da Fundação Getúlio Vargas; mestre em direito pela Universidade de São Paulo e pela Harvard Law School; doutor em direito pela Universidade de São Paulo; visiting scholar na Harvard law School

1. TIPOLOGIA

Historicamente se verifica que os processos de regulamentação eficazes tendem a ocorrer quando, e tão-somente quando, haja necessidade social de coibir ou dirigir a ação da comunidade. Este foi o caminho percorrido na história da intermediação de bens e valores, sendo esta uma das razões pelas quais a regulamentação do Estado ocorreu primeiramente junto à atividade de intermediação, já existente, e somente muito tempo depois é que surge o controle sobre as Bolsas, como algo diferenciado de seus membros componentes. Estas, na realidade, representam a cristalização de uma série de regras criadoras de direitos e obrigações, as quais foram informalmente se acumulando com o fluir do tempo, e que passaram a ser seguidas em função da sanção imposta pelos membros da própria comunidade dos intermediadores, aos que as transgrediam.

Tais regras informais se dirigiam somente aos agentes de intermediação, já que não havia qualquer instituição que os unisse, mas apenas o interesse material representado pela junção da oferta e da demanda de determinado produto. A interseção dos interesses dos vendedores e compradores ocorria sempre em local de comum aceitação, e em horários previamente combinados. Esta é a razão pela qual as legislações mais antigas não tratam de regulamentar as atividades das Bolsas, porém a dos agentes intermediadores.

À medida que o mercado se expandiu, ocorreu a tendência ao aparecimento de sua especialização, de acordo com o produto transacionado. De outro lado, segundo a importância que cada um destes segmentos de mercado passou a ter na economia da comunidade, tem início o processo de interferência do Estado que, com sua regulamentação, passou a criar regras tendentes a torná-lo mais equitativo no relacionamento entre os comitentes e os agentes intermediadores.

Entretanto, o exercício do Poder de Polícia do Estado nem sempre pode ser atribuído à busca da eqüidade. Não se deve esquecer que, por vezes, tais normas foram criadas com o intuito de, ao se encontrar uma nova forma negocial ou de prestação de serviços, fornecer ao Estado, via tributação, uma nova fonte de receita. Outras vezes foi a normalização utilizada como meio de controle da atividade negocial, pela criação de oligopólios.

O que resulta de concreto é que qualquer que tenha sido o motivo de promulgação de normas restritivas, temos que estas surgiram primeiramente dirigidas aos agentes intermediadores de negócios, somente bem mais tarde apanhando as Bolsas. De tal premissa decorre que a complexidade normativa, importando sempre num volume maior de restrições comportamentais, acompanhou sempre de perto a evolução da importância econômica que determinado mercado específico assumisse, bem como, e por conseqüência, em face de repercussão social pelo seu sucesso ou insucesso. Tal afirmação prende-se ao fato de que a norma pressupõe a existência de um mercado ativo com o qual ela possa interagir; ou seja, que a lei não cria a demanda e oferta, massa crítica ao surgimento do mercado.

As Bolsas, portanto, surgiram da necessidade do mercado, a qual nasce da demanda coletiva e não por determinação legal. Dentro de tal princípio o nascimento, a vida e a morte das Bolsas se distinguem pelo grau de interferência que o Estado exerça para, ao atender os reclamos de uma necessidade de mercado, permitir o seu adequado funcionamento. Assim é que as Bolsas podem atuar livremente, sob a tutela ou mesmo com suas atividades exercidas diretamente pelo próprio Estado.

No que diz respeito à criação das Bolsas, temos que estas podem nascer:

a) por vontade de seus membros fundadores, sem que haja nenhuma restrição ou intervenção legal para sua criação;

b) por vontade de seus criadores, porém com necessidade de obtenção da autorização prévia de funcionamento outorgada pelo Estado;

c) mediante prévia autorização de lei, mas sendo a atividade exercida privadamente;

d) como atividade exercida diretamente pelo Estado, quer através da administração direta, quer através da administração indireta;

e) como atividade privada exercida através de concessão outorgada pelo Estado, já que, nesta hipótese, tal função lhe compete originariamente.

No que diz respeito ao exercício da atividade de intermediação, tarefa esta cumprida pelos membros da Bolsa, temos que ela pode-se classificar pelas seguintes variáveis:

a) realizada diretamente pelo Estado, através de atos praticados por seus servidores;

b) delegada pelo Estado a terceiro, a fim de que este exerça a função de competência originária do Estado;

c) exercida pelo cidadão ou empresa privada, como atividade própria e não delegada, sendo sua atividade, entretanto, previamente autorizada;

d) praticada pelo cidadão ou empresa, sem qualquer controle ou restrição estatal.

Na verdade, o grau de interferência do Estado quanto ao exercício da atividade de intermediação, de forma necessária, irá se refletir na maior ou menor restrição quanto ao surgimento das Bolsas. A categorização destas últimas segundo o grau de intervenção do Estado na vida das mesmas tem sido aceita pelos doutrinadores brasileiros.1 1 Ver Carvalho de Mendonça J. X. Tratado de direito comercial brasileiro. Rio de Janeiro, Livraria Freitas Bastos, v. 6,1. 4, p. 288, n. 1.589, nota 1: "Seguem o sistema liberal a Inglaterra, os EUA, a República Argentina (Cód. Comercial, art. 76), e a Bélgica (Cód. Comercial arts. 61 e segs.) onde as bolsas são instituídas e conservadas por associações comerciais... Adotam o sistema tutelar do Estado: aFranca(Cód. Comercial, art. 71); Portugal (Cód. Comercial, arts. 82 e 87) e Austria, onde a constituição das Bolsas depende do consentimento dos ministros das Finanças e do Comércio, depois de ouvidas as Câmaras do Comércio e Indústria, ficando sujeitas à fiscalização governamental, embora tenham administração autônoma. " Em 1959 tal divisão é aceita e repetida por Oscar Barreto Filho, ver Revista dos Tribunais, São Paulo,Ed. Revista dos Tribunais, .253 (48): 9e, recentemente, Bulgarelli Waldiro, Enciclopédia do direito. São Paulo, Saraiva, verbete "Bolsa de Valores", p.88, item 3. Muito embora correto o método, devem ser assinaladas as mudanças legislativas ocorridas e que alteram os exemplos utilizados. Assim é que tem sido colocada a legislação norte-americana na condição de liberal,2 2 Ver Barreto Filho Oscar. op. cit. p. 9: "Aprovam-se como seguidores do sistema liberal a Inglaterra, os EUA, a Argentina e a Bélgica, onde as Bolsas são instituídas e mantidas por sociedades privadas. " No mesmo sentido ver Bulgarelli Waldiro. op. cit. p. 88: "O regime da liberdade é basicamente o existente na Inglaterra, EUA e Argentina, em que as Bolsas são constituídas livremente, sem qualquer ingerência estatal." quando, ao que tudo indica, tal classificação foi válida somente à época de Carvalho de Mendonça, ao tempo em que não havia sido criada a Securities and Exchange Comission. De fato, a partir da legislação federal norte-americana de 1934, as Bolsas de Valores, para que pudessem operar, passaram a necessitar da autorização prévia do Governo federal.3 3 Ver art. 19, do Securities Exchange Act of 1934, que diz: "The Commission shall, upon the filling of an application for registration as a national securities exchange, registered securities association, or registered clearing agency(...) within ninety days of the date of publication of such notice(...). A) by order grant such registration, or B) institute proceedings to determine whether registration should be denied(...)" Assim, a partir daquela época, o controle estatal passou a ser exercido, criando-se o modelo hoje seguido por inúmeros países.4 4 Ver Rabut, Albert. Le droit de bourses de valeurs et des agents de change. Paris, Litec - Librairies Techniques, p. 9: "En vertu de l'article 71 du Code de Commerce, la Bourse de Valeurs est la réunion des agents de change sans l'authorité des pouvoirs publics" Posteriormente, pelo Decreto de 30 de março de 1967, detalhou-se em seu art. 3? de sorte que: "La création et la supression d'une Bourse de Valeurs sont décidées par arrêté du ministre de l'Économie et des Finances, après avis de la Chambre Syndicale de la Compagnie des agents de change et de la Commission des opérations de Bourse". Em resumo, na tentativa de se oferecer uma tipologia diferenciadora, e não um levantamento estatístico, pode-se exemplificar como modelos:

a) liberal - o da Inglaterra, numa posição solitária, no qual a atividade de reguladora do Estado se manifesta de forma extremamente discreta, e assim mesmo por acordo de mútua conveniência entre o mercado e o Governo. Tal conduta vem sendo mantida por alguns séculos,5 5 Ver Berman, H.D. The stock exchange. London, Pitman Publishing, p. 167: "(...)The Royal Commission, set up in 1877, which concluded that the Stock Exchange Rules were capable of affording relief and exercising restraint for more prompt and often more satisfactory than any within reach of the Courts of Law and to the Cohen Commission's opinion that the Stock Exchange Regulations could be made more stringent than the law because, since they lacked statutory authority, they could be waived or relaxed when the merits of individual cases warranted it!' e a pergunta que hoje se coloca é se tal modelo seria viável em outro país, já que lhe parece indispensável a existência de uma maneira comportamental semelhante à do cidadão britânico, para que possa haver sucesso no aproveitamento do modelo inglês. Mas, mesmo na Inglaterra, o modelo vem sofrendo tentativas de revisão, as quais, se aceitas, o aproximarão do modelo americano;6 6 Ver Review ofInvestitor Protection do Prof. L.C.B. Gower, London, Her Majesty's Stationery Office, Jan. 1984, p. 10, "(...)under that approach there would be a comprehensive new Act, self regulatory agencies would be recognized by regulation of the investment industry under the surveillance of any appropriate government Department or Agency(...)" Este trabalho pedido pelo governo inglês ao Prof. Gower e que não foi submetido ao Parlamento propõe-se a reestruturar o mercado de valores mobiliários inglês com a criação de um órgão semelhante à Securities and Exchange Commission americana. Ver também Rabut, Albert, op. cit. p. 104: "Le rôle ainsi attribué à la Commission des opérations de Bourse offre beaucoup d'analogie avec celui de la Securities and Exchange Commission américaine, dont l'autorité est considérable".

b) autorização administrativa do Estado- parece que a grande maioria dos países que possuem Bolsas, com algum significado econômico, incliriam-se por este modelo que, baseado na sistemática americana, vem adquirindo um crescente número de adeptos.7 7 Ver Japanese securities regulations, por Luis Loss, Makato Yazawa e Barbara Ann Banof, Boston, Little, Brown, p. 107: "Thecurrent Securities and Exchange Law was enacted in 1948 under the guidance of the United States Occupation Authorities(...)" e p. 109: "Securities Exchange are now required to obtain a licence from the minister of Finance. The minister may refuse to issue a licence if(. ..)". Neste rol, deve ser colocada a legislação brasileira, como mais adiante se explicará melhor. Nestes casos, entretanto, as Bolsas não exercem função delegada do Estado, mas sim uma atividade privada que é por ele fiscalizada. Esta característica fundamental coloca as Bolsas na mesma categoria das instituições financeiras, como os bancos, sociedades corretoras etc, as quais, por exercerem uma atividade economicamente importante, têm suas atividades reguladas e fiscalizadas, mas não são quer concessionários, quer permissionários de serviços públicos. Nesta hipótese, as Bolsas se formam pela livre vontade de seus associados, mas dependem, para o seu funcionamento, de prévia autorização do Estado. Desta forma, este último estimula a sua criação e, após o nasscimento, exerce a fiscalização de acordo com a lei;

c) criação por lei - aqui agrupamos as hipóteses nas quais as Bolsas não são criadas por um ato de vontade de seus associados, mas por lei. Enquanto na hipótese anterior o ato que dá nascimento à sociedade ou associação Bolsa é a vontade de seus sócios ou associados constituintes, na presente situação o nascimento independe de qualquer outra manifestação de vontade que não a do Estado. Nesta hipótese, a Bolsa é uma extensão indireta do Estado ou, por vezes, o próprio Estado exercendo diretamente as funções intermediadoras. Neste caso estariam, mesmo assim de forma não muito clara, as antigas Bolsas de Valores oficiais no Brasil, situação esta mantida até 1965, quando surge, com o advento da lei de mercado de capitais,8 8 Lei nº 4.728, de 14 de julho de 1965. a nova e atual estrutura das Bolsas de Valores. Permanece, entretanto, o modelo diferenciado para as Bolsas de Mercadorias e outras que não intermediem valores mobiliários.

2. EVOLUÇÃO BRASILEIRA

As Bolsas são herdeiras diretas das feiras medievais, nas quais a periodicidade e a especialização foram fatores fundamentais de crescimento. Com o aumento geográfico das cidades, pelo adensamento populacional e, conseqüentemente, com o incremento da demanda e oferta, as feiras tendem a se fixar em lugares predeterminados, estreitando a periodicidade de suas reuniões, bem como se fixam os horários de funcionamento. Obviamente, se não tivemos esta fase no Brasil, dela sofremos influência direta via nossa aculturação ibérica, bem como pelas necessidades comerciais forçadas pelos estrangeiros que à época conosco transacionavam.9 9 Ver Carvalho de Mendonça. Tratado de direito comercial brasileiro. Rio de Janeiro, Freitas Bastos, v. 2, p. 310, nota 4: "Desde 1808 até 1849 (quando foi publicado o Decreto nº 648), o exercício da corretagem na praça do Rio de Janeiro efetuou-se livremente, por um grupo de indivíduos na sua quase-totalidade estrangeiros, que seguiam as praxes e as leis dos países de que eram originários, imprimindo assim a esse mercado uma feição típica, misto de praxes inglesas, francesas e alemãs, entre si antieconômicas e contraditórias (Relatório do presidente da Câmara Sindical dos Corretores de Fundos Públicos da Capital Federal. 1900. p. 27)(. ..)" Este foi o pano de fundo que presenciou o aparecimento (como de resto em outros países) do corretor antes da formalização de sua instituição, sendo que o intermediário, como já visto, de muito precedeu a qualquer ato normativo governamental.

A primeira notícia que se tem no Brasil da interferência do Estado no mercado de corretagens diz respeito à cobrança de tributo pelo ato de intermediação. Assim, o orçamento imperial para 1844 previa a cobrança do imposto do selo sobre tais negócios jurídicos ocorridos no Império, inclusive nas emissões e transações de alguns valores mobiliários. Tal imposto, se não pago, tendo sido a transação feita por corretor, acarretaria multa tributária maior, inclusive com a possibilidade de inabilitação do mesmo.10 10 Ver Lei nº 317, de 21 de outubro de 1843 que, em seu art. 13 estabeleceu: "As letras de câmbio(...) notas promissórias, que forem passadas ou emitidas dentro do Império, sem que tenham pago o selo marcado na tabela A, não poderão ser protestados, nem atendidos em juízo" e, em seu § 4º. "(...)se porém o negociador da letra, escrito, ou nota for corretor não só ficará sujeito ao dobro das multas, como na reincidência ficará inábil para servir como corretor".

A existência da previsão orçamentária pressupõe que tal atividade fosse já então considerada como economicamente relevante, a ponto de justificar a incidência tributária. O ato de corretagem, entretanto, não sofria qualquer restrição, quer quanto ao agente de intermediação, quer quanto à divisão dos corretores segundo a atuação por mercados especializados. Tal mudança ocorreu antes da edição do Código Comercial, novamente por intermédio de diploma legal voltado aos aspectos tributários.11 11 Ver Decreto nº 417, de 14 de junho de 1845, que versa sobre "(...)a arrecadação do imposto sobre os corretores". Com efeito, o Decreto nº417/45 define que os corretores são agentes intermediadores de mercadorias, navios, fundos públicos, letras de câmbio, "bilhetes à ordem" e outros papéis de emissão comercial.

Porém, os corretores passam a pertencer a duas categorias distintas, a saber: a) os corretores gerais, que possuíam autorização para intermediar qualquer gênero de transação; b) corretores parciais, cuja autorização especificava restritivamente o mercado de atuação. A profissão, talvez por necessidade do erário público, institucionaliza-se na esfera de atuação do Estado, na medida em que os corretores passam a ser eleitos ou demitidos por autoridade governamental,12 12 Ver Decreto nº 417, de 14 de junho de 1845: art. 2º "Os corretores... serão nomeados na Corte pelo Tribunal do Tesouro, e nas províncias pelas Tesourarias, ouvido o Corpo do Comércio, por intermédio das Comissões da Praça, ou dos negociantes mais notáveis do lugar, onde as não houver;'; art. 3º "(...)e os corretores uma vez demitidos(...)"; art. 10 "Os corretores que se acharem culpados de contravenção nas disposições deste Regulamento serão, segundo as circunstâncias, suspensos ou demitidos pela autoridade que os nomeou(...)". sendo que as cartas de nomeação é que passam a especificar o campo de atuação dos mesmos.13 13 Ver Decreto nº 417 de 14 de junho dc 1845 part. 5;' "Os corretores nem por si, nem por interposta pessoa, nem como sócios, nem como comissários, poderão fazer por sua conta transações, não-compreendidas no número daquelas de que o título de sua nomeação, e menos ser fiadores de quaisquer que sejam feitas por seu intermédio." Também, pela primeira vez, é reconhecida por norma legal a existência dos corretores que atuavam na Corte, por oposição àqueles que operavam nas províncias: ou seja, legalmente é reconhecida a existência de praças distintas. Como se discutirá mais adiante, tal distinção ganha relevo em 1896, quando a então Província de São Paulo, por ato do Presidente do Estado, passa a nomear os corretores de fundos públicos.14 14 Ver Lei nº. 479, de 24 de dezembro de 1896, do estado de São Paulo. A época, o exercício do cargo de corretor não era monopólio de classe, já que se permitia a corretagem do próprio negócio, ou mesmo para terceiro, se o ato fosse praticado gratuitamente ou remunerado a preço menor do que os praticados pelos corretores nomeados pelo Governo.15 15 Ver Decreto nº 417 de 14 junho de 1845: art. 13 - "Pela existência dos corretores não ficam inibidos os comerciantes, e mesmo os que o não forem, de tratar de todos os seus negócios por si, seus agentes, e caixeiros, e bem assim por qualquer pessoa que nisso intervenha gratuitamente, ou por menos que os ditos corretores."

Em 1849,16 16 Ver Decreto nº 648, de 10 de novembro de 1849. a atividade dos corretores é dividida segundo o critério da pecialização profissional. Termina-se com a div, o entre corretores gerais e parciais, passando estes a se agruparem em três categorias distintas: a) de fundos públicos; b) de navios; c) de mercadorias. Além da categorização profissional mais precisa, a lei estabelece pela primeira vez o limite máximo de corretores de fundos públicos, que à época não excederia a 10, sem que, entretanto, qualquer limite fosse imposto às duas categorias remanescentes. Qualquer que fosse a categoria do corretor, este recebia uma "patente" outorgada, na Corte, pelo Ministro da Fazenda e, nas províncias, pelos respectivos presidentes dos estados. Muito embora não exercendo função pública, os corretores eram obrigados a prestar juramento antes de iniciar o exercício de suas atividades,17 17 Ver Decreto nº 648, de 10de novembro de 1849:art. 15. "Antes de exercerem quaisquer atos próprios de seus cargos prestarão juramento de bem servir, na Corte, nas mãos do ministro da Fazenda ou do inspetor-geral do Tesouro, e nas províncias, nas mãos dos seus presidentes." permanecendo a possibilidade da cassação da patente e conseqüente cessação do exercício da atividade, caso estes não pagassem o tributo que era devido anualmente.18 18 Ver Decreto nº 648, de 10 de novembro de I849:art. 13."O corretor de fundos públicos pagará nesta Corte o imposto anual de (...), o de mercadorias (...) e o de navios (...) (art. 14) (...) O imposto do artigo anterior será pago adiantado, e o Corretor já em exercício que não o satisfizer até o fim do terceiro mês do ano financeiro, será demitido." Agora, diferentemente da legislação de 1843, o corretor recebe, para poder operar, uma patente governamental, podendo a mesma ser retirada por falta de pagamento dos tributos devidos pelo exercício profissional. Assim, este intermediador passou a recolher dois tributos distintos: de um lado, o imposto do selo calculado sobre as operações que fizesse; de outro lado, passou a pagar pela obtenção da patente, outorga esta indispensável para o exercício profissional.

A partir de 1849, os corretores passam a exercer ofício vitalício, estabelecendo o decreto19 19 Ver Decreto nº 648, de 10 de novembro de 1849, art. 17. que os mesmos poderiam ser suspensos ou demitidos de seus cargos pelo poder concedente da patente. Assim, eles passam a pertencer a uma categoria diferente daquela até então existente. Deixam de exercer profissão e passam a ocupar cargo, tendo uma posição no limbo que separa a atividade privada da atividade pública. Mais tarde, como se verá adiante, tal posição nebulosa resolveu-se, por lei, no sentido de que os corretores exercessem função pública. Porém, se de um lado os corretores, pela legislação de 1849, passaram a exercer cargo, de outro, é criado o órgão diretivo dos intermediadores, o qual não recebia influência direta do Governo .Como surgimento da Junta dos Corretores, eleita pelos corretores pertencentes às três classes de intermediadores (títulos públicos, navios e mercadorias), cria-se uma instância intermediária entre o corretor e o Governo, já que à Junta foram atribuídas funções de vigiar, censurar, suspender, fiscalizar, decidir contestações dos corretores, bem como apresentar, para o Governo, os novos candidatos a estes cargos.

Neste momento, fica bem nítida a distinção entre corretores livres e oficiais. Os primeiros eram exercentes de atividade que prescindia de autorização governamental, já que enquadrados na condição de comerciantes ou agentes livres. Os segundos, que intermediavam títulos públicos de emissão do Império ou das províncias, necessitavam de autorização do Governo, o qual se manifestava pelo ato administrativo de nomeação para os corretores de fundos públicos da antiga capital federal, bem como pelas necessárias matrículas obtidas perante as juntas comerciais. Os corretores oficiais tinham competência para intermediar, além dos fundos ou títulos públicos, os valores mobiliários de emissão privada, metais e câmbio.

Os Decretos de 1845 e 1849, muito embora claramente denotassem preocupações tributárias, acabaram por produzir algumas mudanças fundamentais para os corretores. Em resumo, dividiu-se a categoria por classes de especialização; estabeleceu-se para os corretores de fundos públicos, embrião dos corretores de valores mobiliários, o exercício da atividade com limite de ocupantes e este passou a depender da concessão de patente, suscetível, esta, de ser cassada pelo não-pagamento das obrigações tributárias devidas ao Estado pelo exercício da atividade. Criou-se a Junta dos Corretores, órgão de classe, que se auto-regulava, embrião dos atuais

Conselhos de Administração das Bolsas de Valores. Porém, ambas as legislações eram voltadas fundamentalmente para a figura do corretor, sendo que a figura associativa dos mesmos, hoje Bolsa de Valores, não mereceu qualquer atenção legislativa.

A organização fundamental era o conjunto de corretores ligados entre si pelo interesse mercantil, tendo suas atividades normatizadas pela Junta dos Corretores. A única menção que o Decreto de 1849 faz não é ao corpus, mas ao locus de reunião.20 20 Ver Decreto nº 648, de 10 de novembro de 1849, art. 68. "Os corretores reunir-se-ão na mesma casa que serve agora de Praça de Comércio (...)" Estes se reuniam na casa que servia de Praça de Comércio, pagando, para tanto, à Comissão da Praça, ou seja, quantias fixas por anúncio de compra e venda que fosse afixado no quadro de avisos e ofertas; contribuíam, também, com as multas devidas por infringências às normas, bem como com os emolumentos cobrados pelos corretores nas certidões por eles passadas.21 21 Ver Código Comercial art. 32: "Praça de Comércio é não só o local, mas também a reunião dos comerciantes, capitães e mestres de navios, corretores e mais pessoas empregadas no comércio. Este local e reunião estão sujeitos à polícia e inspeção das autoridades competentes."

O Código Comercial, que surge em 1850, dá à Praça de Comércio uma categoria mais abrangente, na medida em que passa a ser o local físico além do ato de reunião dos corretores. A dualidade de categorias, bem como a denominação Praça de Comércio, só vem a ser alterada no mundo legal em 1893,22 22 Ver Decretou:' 1.359 de 20 de abril de 1893, o qual cria a "Bolsa de Fundos Públicos". muito embora o regimento interno da Junta dos Corretores do Rio de Janeiro, já em 1877, mencionasse o termo Bolsa como o lugar de reunião.23 23 Ver art. 1º do Regimento Interno da Junta dos Corretores da Praça do Rio de Janeiro, de 12 de abril de 1877: "A Bolsa é o lugar no salão da Praça de Comércio ou da Associação Comercial, destinado às operações de compra e venda de títulos públicos, de ações de bancos e companhias, de valores comerciais e finalmente de metais preciosos." Assim, Praça de Comércio era o imóvel no qual bens e valores eram intermediados pelos corretores, então qualificados como agentes auxiliares do comércio.

Em 1851 é regulada a atividade do corretor, agora tendo como preocupação básica não mais a matéria tributária, mas sim o próprio negócio de intermediação.24 24 Ver Decreto nº 806, de 26 de julho de 1851. Esta normalização aplicava-se à Praça do Rio de Janeiro, já que as outras não eram relevantes, em face do diminuto poder econômico das províncias. Os corretores agora são nomeados pelos Tribunais do Comércio, mantidas as três categorias de corretores: os de fundos públicos, os de navios e os de mercadorias. Porém, o número máximo de corretores, então existente para os que intermediavam fundos públicos, é estendido às duas categorias remanescentes.25 25 Ver art. 2º Lei nº 806,de20dejulhode 1851: "(...) não excederá de 10 o número de corretores de fundos públicos, de oito o dos navios, e de 10 o dos de mercadorias". O exercício passa, então, a ser personalíssimo, não sendo válido o ato de intermediação quando praticado por pessoa não-nomeada.26 26 Ver art. 10, Lei nº 806, de 26 de julho de 1851: "O ofício de corretor é pessoal, e não pode ser substituído; pena de nulidade dos atos de corretagem que forem praticados pelo substituto." O decreto inova, fundamentalmente, quando atribui poderes ao Tribunal do Comércio, os quais hoje são concedidos à Comissão de Valores Mobiliários (CVM). Assim, o Tribunal do Comércio era competente para multar, suspender e destituir os corretores, cabendo da decisão recurso para o Conselho de Estado, instância hoje existente na figura do Conselho Monetário Nacional (CMN).27 27 Ver art. 16, Lei nº 806, de 26 de julho de 1851: "São competentes para multar, suspender c destituir os corretores: 1" o Tribunal do Comércio, com recurso para o Conselho d'Estado(...) 2" as justiças ordinárias (...)" Porém, como instância primeira é reforçada a figura da Junta dos Corretores, como colegiado dotado de poder decisório para censurar atos de seus associados, fiscalizá-los, decidir das disputas entre os corretores, ou entre eles e os comitentes, bem com fixar, diariamente, o valor do câmbio, fundos públicos, descontos, metais preciosos, fretes e mercadorias. Se achado conveniente, a Junta dos Corretores poderia denunciar seu membro corretor diretamente ao Tribunal do Comércio, evitando seu julgamento interna corporis.

Dez anos após, em 1861, a corretagem passa a ser monopólio dos corretores,28 28 Ver Decreto 2.733, de 23 de janeiro de 1861, art. 1º: "As transações sobre ações (...), fundos públicos... câmbios, empréstimos comerciais (...) só terão lugar por intermédio de corretores de fundos públicos competentemente nomeados, sob pena de nulidade (...)" muito embora fique transparente o interesse do Estado, na medida em que torna o corretor solidariamente responsável pelo imposto do selo devido na transação. O monopólio era de tal ordem que mesmo as transferências privadas, ocorridas nas sedes das sociedades por ações, deveriam ser feitas na presença de um corretor de fundos públicos. Tal reserva, mais tarde, foi abrandada e, posteriormente, extinta para as transações ocorridas fora da Praça de Comércio.

Em 1876, passa a ser mandatória a existência de um lugar distinto nas praças de comércio para as apregoações dos corretores de fundos públicos.29 29 Ver Decreto nº 6.132, de4demarçode 1876, art. 1º: "Nos edifícios destinados para praças de comércio, haverá um lugar especial, separado e elevado, onde, à vista do público, se reunirão os corretores de fundos quando tiverem de propor e efectuar transações sobre: I. Fundos públicos, nacionais ou estrangeiros; II. Letras de câmbio, III Empréstimos comerciais; IV. Ações de companhias autorizadas e admitidas pelo Estado." Este local privativo de tais corretores só poderiam adentrar os corretores de mercadorias, quando tivessem que intermediar negociações com metais preciosos. Ocorre nesta época a divisão física, criada por lei, entre os corretores, separação esta que veio a se acentuar com o passar do tempo, criando, no futuro, categorias e normalizações distintas entre os corretores de valores e os de mercadorias.

A década de 90 é fértil quanto à normalização sobre as atividades de corretagem. Os decretos passam a estruturar a atividade de intermediação de valores, estabelecendo as grandes linhas que foram mantidas até o advento da Resolução nº39/65 do Conselho Monetário Nacional. Em 1893, é baixado pelo Governo federal o regulamento para os corretores de fundos públicos do Distrito Federal,30 30 Ver Decreto nº 1.359, de 20 de abril de 1893. o qual veio a substituir o Decreto n.806, de 1851, bem como consolidou um número razoável de normas editadas durante esta fase. A natureza jurídica do ofício de corretor é tida como ofício público,31 31 Ver Decreto nº 1.359 de 20 de abril de 1893, art. 1º: "O cargo de corretor de fundos constitui um ofício público." situação esta aplicável somente aos corretores de fundos públicos, visto que os mesmos, dentre outros valores mobiliários, compravam e vendiam, principalmente, títulos de dívida de emissão governamental. Os corretores não adentraram a categoria dos funcionários públicos, mas tornaram-se exercentes de uma atividade pública. Neste contexto eles passam a ser nomeados pelo presidente da República, por decreto, sendo o ato referendado pelo ministro da Fazenda. A nomeação, entretanto, deveria ser precedida da indicação feita pela Câmara Sindical, substituta da Junta dos Corretores. Diante do Governo deveria o candidato, antes de qualquer ato governamental, proceder ao depósito da caução garantidora de sua atuação como intermediador. Legalmente, portanto, o presidente da República somente poderia nomear após a motivação dada pela agora denominada Câmara Sindical. Ou seja, embora nomeada pelo Executivo para exercer um ofício público, a Câmara Sindical representava um elo fora da hierarquia administrativa, bem como da discricionariedade do Poder Executivo. Porém, resta de concreto que os corretores deixam de receber autorização de funcionar pela outorga de "patente", bem como deixam de ser agentes auxiliares do comércio. Eles são nomeados e exercem uma função pública. Como tal, a segunda instância punitiva deixa de ser o Registro do Comércio e passa a ser o ministro da Fazenda.32 32 Ver Decreto nº 1.359, de 20 de abril de 1893, art. 11: "O corretor pode ser suspenso: a) pela Câmara Sindical, com recurso para o ministrada Fazenda..., b) pelo ministro da Fazenda, sem recurso...". Mais do que isto, o ministro da Fazenda pode punir, de forma originária, os corretores, sem qualquer necessidade de audiência à Câmara Sindical. De outro lado, a competência oligopolística de realizar toda e qualquer operação é quebrada, prescindindo-se da figura do corretor se a operação for feita diretamente entre o vendedor e o comprador, fora da Bolsa.

O número de corretores continua sendo determinado pelo Governo, tendo, entretanto, aumentado para 40. A primeira instância reguladora e punitiva continua sendo a Câmara Sindical, que tem suas funções acrescidas. Entretanto, pode o ministro da Fazenda prescindir de tal instância, na medida em que queira interferir diretamente. É importante ressaltar que a palavra" Bolsa" aparece de forma específica, como designativa do local no qual as operações são realizadas.33 33 Ver Decreto nº 1.359, de 20 de abril de 1893, art. 98: "A Bolsa é o lugar, no salão da Praça de Comércio...", art. 99: "Só aos corretores de fundos é permitido o acesso dentro da balaustrada da Bolsa...". Bolsa é o local, em apartado, localizado dentro da Praça de Comércio. Assim, em 1876 já se exige a existência de um lugar em separado para as intermediações dos corretores de fundos públicos e, em 1893, por decreto governamental, tal local adquire a denominação própria; a qual, como mencionei anteriormente, já fora utilizada nos atos e regulamentos internos dos corretores de fundos públicos.

Em 1896 o estado de São Paulo promulga lei34 34 Ver Lei (do estado de São Paulo) nº 479, de 24 de dezembro de 1896, a qual foi regulamentada pelo Decreto estadual nº 454, de 7 de junho de 1897. que delega poderes ao então presidente do Estado, para que este dê provimento aos cargos de corretores de fundos públicos, por decreto expedido pelo secretário da Fazenda, mantida a característica de exercício de função pública. A mesma lei fixou o número de corretores de fundos públicos em 15 para a capital e sete para a cidade de Santos. Nesta época os estados dão início à legislação própria sobre a atividade dos corretores, situação que, muito embora contestada por alguns juristas, tendo em vista a competência da União para legislar sobre matéria de direito comercial, só veio a ser alterada com a edição das Leis nos. 4.595/64 e 4.728/65. Assim, a partir desta época, passam a coexistir normas federais e estaduais legislando sobre a atividade de corretagem de fundos públicos e bolsas oficiais de valores. As normas federais estão voltadas para as atividades exercidas no Distrito Federal e as estaduais, para as intermediações ocorridas nos respectivos estados. É de se ressaltar, entretanto, que a legislação paulista é cópia exata da legislação federal,35 35 Ver Decreto nº 2.475, de 13 'de março de 1897. situação que permite restringir os comentários unicamente ao decreto federal.

O Decreto nº 2.475, de 13 de março de 1897, consolida a legislação anteriormente vigente, mantendo o caráter de ofício público para o cargo de corretor de fundos públicos, sendo necessária a expedição de patente governamental para o exercício do cargo. Do outro lado, é mantida a necessidade de sua assistência nas intermediações, sob pena de nulidade do ato, ressalvada a hipótese de compra e venda direta entre os comitentes, situação na qual se obrigavam a comunicar a operação à respectiva Câmara Sindical.

Em 21 de setembro de 1932 é publicado o Decreto nº21.854, o qual, inovando em vários aspectos, tais como operações à vista e a termo, ordem operacional a ser seguida nos pregões, introdução do pecúlio das caixas de garantia (ordem dos atuais fundos de garantia), não altera a natureza jurídica das Bolsas ou da figura do corretor.

A próxima modificação relevante ocorre em 29 de dezembro de 1953, com a edição da Lei nº2.146, a qual, diminuindo a autonomia das Bolsas estaduais, uniformiza critérios não só para a Bolsa do Rio de Janeiro, então Distrito Federal, mas também para as Bolsas estaduais.36 36 Ver art. 19: "Continua em vigor, no que não colidir com a presente lei, toda a legislação federal e estadual referente à matéria." Desta lei, entretanto, é relevante ressaltar as inovações em face da legislação anterior. As Bolsas foram consideradas como órgãos auxiliares do poder público; muito embora não-dotadas de personalidade jurídica, foram tidas como "órgãos", cuja função seria a de, inclusive, fiscalizar o lançamento de valores mobiliários quando subscritos pelo público. Este é o embrião do qual veio a resultar o parágrafo único do art. 17, da Lei nº6.385/76,37 37 Ver parágrafo unido do art. 17, da Lei nº 6.385/76: "Às Bolsas de Valores incumbe, como órgãos auxiliares da Comissão de Valores Mobiliários, fiscalizar os respectivos membros e as operações nelas realizadas." hoje vigente.

A esta altura, o debate acerca da natureza jurídica das Bolsas andava acirrado, sendo a análise feita pelo mais largo e abrangente espectro.38 38 ver Barreto Filho, Oscar. op. cit. p. 13: "Impõe-se, portanto, como ponto de partida, a análise de natureza jurídica da Bolsa de Valores de São Paulo, para defini-la como pessoa jurídica ou não, e, no caso afirmativo, se trata de pessoa jurídica de direito público ou de direito privado, e ainda na primeira das hipóteses, se reveste as características de autarquia ou de entidade paraestatal típica. Como problemas paralelos dever-se-á, também, indagar se a Bolsa de Valores constitui repartição pública lato sensu, ou estabelecimento de utilidade pública." As Bolsas não possuíam personalidade jurídica de direito privado, já que eram compostas de corretores que se registravam individualmente perante a Junta Comercial ou isoladamente eram nomeados pelo Governo e que, como tal, elegiam suas Câmaras Sindicais. Elas não pertenciam à administração pública direta ou indireta, já que dotadas de patrimônio próprio formado individualmente pelos corretores. Mas possuíam regras de aposentadoria criadas por lei; os corretores exerciam ofício público, e as Bolsas eram órgãos auxiliares do Governo.39 39 Ver Pontes de Miranda. Tratado de direito privado. São Paulo, Ed. Revista dos Tribunais, §4.745, p. 420: "A intervenção do Estado na criação das Bolsas e na edição de regras jurídicas sobre elas e suas atribuições de modo nenhum torna de direito público as Bolsas, ou as próprias Câmaras Sindicais, ou os corretores oficiais. A ingerência publicistica não chega a publicizar o instituto da Bolsa, ou da Câmara Sindical. A Bolsa e a Câmara Sindical desempenham o papel que o Estado quer e esperava que fosse desempenhado, não as faz seus órgãos. Salvo se admitirmos que haja órgãos heterotópicos, órgãos fora do organismo. A muleta seria órgão. A cadeira de roda seria órgão (. ..)". Todo este emaranhado parece advir da legislação que, ao sabor de adventos momentâneos, foi-se acumulando por camadas sucessivas.desfigurando e confundindo a natureza jurídica das Bolsas de Valores. Tanto isto é real que as Bolsas de Mercadorias, nascidas da matriz comum, por não sofrerem os atropelos legislativos, mantiveram suas eventuais ações muito menos tumultuadas.

Se olharmos esta evolução em suas grandes linhas, veremos os corretores, que eram livres no exercício de suas profissões, passarem a necessitar, ato seguinte, da patente; o seu número passa a ser objeto de regulação; a legislação destina lugar específico para a intermediação de fundos públicos e, finalmente, a Bolsa é tida como órgão auxiliar do Governo. A qualificação das Bolsas de Valores como "órgãos" é criticável pela maneira apressada e ligeira com que a legislação assim as definiu, já que as Bolsas e os corretores não realizavam uma tarefa inerente ao Estado, não exercendo suas funções por delegação deste, as quais, inclusive, a ele não percentem,40 40 Ver Carvalho de Mendonça, op.cit. v.2, p.298, nota 1, a qual transcreve a discussão ocorrida no Senado federal em 4 de dezembro de 1895, quando falou o Senador João Barbalho: "Torna-se um ofício público, à maneira do tabelião, nomeado pelo presidente da República para o Distrito Federal, este emprego de simples agente do comércio" ao referir-se ao corretor. Muito tempo depois o Tribunal de Justiça de São Paulo manifestou-se no mesmo sentido ao decidir: "Mas, não será por isso que a Bolsa, corporação de corretores, integre uma das secretarias de estado. Deparam-se entidades que, embora exerçam funções públicas, não são departamentos da administração pública nem, sequer, autarquias. Haja vista, verbi gratiu, os tabelionatos de notas, os ofícios de registro público etc." In: Revista dos Tribunais n.(291):220, acórdão do Primeiro Grupo de Câmaras Cíveis, Embargo nº 89.723. mas são pelo Estado fiscalizadas e regradas. As Bolsas de Valores, muito embora criadas por lei, não nasceram como órgãos da administração direta, como se verifica na legislação mencionada; elas foram regradas como os tabeliães de notas.41 41 Ver art. 126, letra a, do Regulamento interno da Bolsa Oficial de Valores de São Paulo, aprovado em 14 de dezembro de 1944.

Pelo mesmo motivo, elas não foram consideradas autarquias, isto é, quer pela falta de lei criadora do vínculo, quer porque os empregados das Bolsas de Valores não eram mantidos direta ou indiretamente pelos estados ou pela União, quer, ainda, porque o representante das Bolsas, que eram os síndicos, eram eleitos só por seus pares, agindo sem subordinação hierárquica diante do Governo e demais autoridades constituídas.42 42 Ver art. 75, letra a, do Regulamento aprovado pelo Decreto estadual nº 454, de 7 de junho de 1897. Ver ainda Agravo nº 44.708. In: Revista dos Tribunais, (331): 419. Assim, por falta de caracterização, as Bolsas de Valores foram consideradas como "entidades particulares",43 43 Ver Embargo nº 89.723. In: Revistados Tribunaise nº 291, p. 220 e 221. ou como "corporações" e "entidades de direito privado".44 44 Ver lei nº 2,146 de 29 de dezembro de 1959, art. 6º.

Dentro do contexto de análise da naturza jurídica das Bolsas de Valores de então deve agregar-se que o ato de intermediação era sempre exercido em nome próprio. O ofício público, bem como sua gestão eram indelegáveis, suscetíveis tão-somente de transferência ao sucessor legal, por morte ou desistência do titular. Tal situação ficou insustentável quando as Bolsas de Valores quiseram adquirir bens imóveis para localizarem seus pregões, facilidade até então provida pelo Governo. Comprar o imóvel em nome de quem? Da "entidade" que não se distingue de seus integrantes? Em nome de todos os corretores que transacionavam em seus pregões? Sem enfrentar o problema quanto à natureza jurídica das Bolsas de Valores, a lei estabeleceu que os corretores poderiam constituir "sociedades financeiras especializadas em negócios imobiliários".45 45 Ver lei nº 2,146 de 29 de dezembro de 1959, art. 6º§. Estas sociedades tinham seus objetos sociais fixados pela própria lei (gestão de negócios imobiliários) proibindo-se, de forma expressa, o exercício de qualquer atividade acometida ao corretor.

O patrimônio, portanto, era privado, porém o ofício era público. Tais dificuldades, à época, parece que não foram consideradas como suficientes, e o Poder Judicário chegou a considerar a Bolsa Oficial de Valores de São Paulo como um órgão da administração pública, pertencente, então, à administração direta do Estado.46 46 Ver Revista dos Tribunais n.248, o acordão n.º 89.723, p. 316 e 317: "A Lei nº 2. 479, que reorganizou a Secretaria de Estado dos Negócios da Fazenda, em seu art. 16 estabeleceu ficar diretamente subordinado à Secretaria da Fazenda a Bolsa Oficial de Valores de São Paulo. Idêntica determinação contém Lei nº 3.703, em seu art. 2:', nº IX, Esta lei, que também reorganizou a Secretaria da Fazenda, dispõe expressamente que a Secretaria da Fazenda, além de ter a seu cargo a execução da política financeira do Governo e a realização da Receita eda Despesa Pública, tem também a incumbência da guarda dos valores e de tudo que disser respeito às finanças estaduais na forma que for fixada em regulamento. Desses dispositivos legais não se infere ser a Bolsa Oficial de Valores de São Paulo uma autarquia administrativa, mas sim ser uni departamento da administração pública, diretamente subordinado à Secretaria de Estado dos Negócios da Fazenda, ser unta instituição que desempenha serviços de interesses públicos. É, por certo, uma repartição integrante da Secretaria da Fazenda..." (o grilo não é do Acórdão). O que resta de concreto é que a evolução confusa da natureza jurídica das Bolsas de Valores deve-se em parte a cópia apenas parcial, a partir do último quarto do século passado, do modelo então vigente da Bolsa de Paris, sem que, entretanto, se chegasse a caracterizar o corretor como servidor público e, o que é mais curioso, sem nunca ter dito como seriam, nem como se caracterizariam, as Bolsas de Valores. Este limbo prevaleceu até 1965, quando, com a promulgação da Lei nº 4.728, as Bolsas de Valores sofreram transformações radicais, passando a seguir de perto o modelo existente nos EUA, apagando um passado de mais de 100 anos de normalização.

3. BOLSA DE VALORES APÓS A LEI N.º 4.728

A Lei nº4.728 surge como complementação e finalização do modelo maior, iniciado pela Lei nº4.595, promulgada um ano antes. Ambas se inserem no contexto de modernização; então proposto, para os mercados financeiros e de capitais. Bem mais tarde estas legislações foram complementadas e parcialmente alteradas por duas outras leis que se inserem no mesmo conjunto ideológico, quais sejam as leis que criaram a CVM, bem como o atual conjunto de normas aplicáveis às sociedades por ações.

O advento da Lei nº4.728 significou não só a definição quanto à natureza jurídica das Bolsas de Valores, mas também foram elas consideradas como o instrumento hábil para dar liquidez e visibilidade ao mercado de valores mobiliários. É importante notar que a partir de tal data deixam elas de ser o locus das operações de títulos governamentais, bem como das operações de câmbio e passam a se dedicar, com exclusividade, às operações com valores mobiliários emitidos por sociedades anônimas. Feita esta rápida digressão histórica, que é relevante para se poder entender o ponto a que chegamos nesta caminhada evolutiva, é de se passar à análise de aspectos específicos e conseqüentes das alterações. Neste contexto é de se discutir:

a) O campo de atuação das Bolsas de Valores - como foi mencionado anteriormente, as Bolsas são, por excelência, o local de junção da oferta e da demanda. Com o passar do tempo elas tendem à especialização por tipo de bem transacionado. A mesma evolução ocorreu com as atuais Bolsas de Valores. Assim, a intermediação que, no primeiro momento, aparece sem qualquer restrição operativa, em seguida é dividida entre corretores gerais e, por oposição a estes, corretores parciais, que foram os primeiros a terem seus campos de atuação delimitados.

Mais tarde, os corretores são novamente redivididos no sentido de se especializarem ainda mais os respectivos campos de atuação. Nesta linha passam a se agrupar, sempre por disposição legal, em corretores de títulos públicos, de navios e de mercadorias. Tempos depois os corretores de títulos ganham não só espaço especial para suas atuações, mas sofrem uma regulamentação bem mais severa que as das demais categorias. O que resta de concreto da transformação do campo de atuação do corretor é que chegamos às vésperas da Resolução nº39 sendo competência exclusiva de atuação dos corretores: a) compra, venda e transferência de qualquer fundo público nacional ou estrangeiro admitido à cotação; b) negociação de letras de câmbio e de empréstimos por meios de obrigações: c) negociação de títulos suscetíveis de cotação em Bolsa, de acordo com o boletim da Câmara Sindical; d) compra e venda de metais amoedados e em barras.47 47 Ver art. 2º. do Decreto nº 2.475, de 13 de março de 1897. Com o advento da Lei nº 4.728, as Bolsas de Valores perdem a denominação de Bolsas Oficiais de Valores e a autonomia de transacionarem em seu recinto os bens e valores que julgassem convenientes. Passa a ser competência do Banco Central estabelecer as espécies de transações que serão admitidas em seus recintos.48 48 Ver art. 7º. inciso III, da Lei, nº 4.728, de 14 de julho de 1965.

A resolução nº 39, ao restringir o objeto social da associação civil Bolsa de Valores, delimitou como competência da mesma a manutenção de local adequado para os encontros de seus membros, a fim de que estes realizassem transações com títulos e valores mobiliários, bem como dotar o local das facilidades necessárias à liquidação de tais operações, propiciando um sistema contínuo de preço e liquidez para os mesmos títulos e valores mobiliários.49 49 Ver art. 1º.' da Resolução nº 39, de 20 de Outubro de 1966. Com o advento da Lei nº 6.385/76, as Bolsas de Valores passaram da condição de órgãos auxiliares do Banco Central do Brasil para a órbita da CVM.50 50 Ver art. 6º da Lei nº 4.728 e art. 17 da Lei nº 6.385.

Após a criação da CVM foi a Resolução nº39 substituída pela de nº922/84, a qual, repetindo quase que integralmente os objetivos sociais anteriormente demarcados, estabelece que, além das atividades relacionadas com títulos e valores mobiliários, as Bolsas de Valores só poderão operar em outras atividades se expressamente autorizadas pela Comissão.51 51 Ver art. 1º da Resolução nº 39/66 e o art. 1º da Resolução nº 922,84, ambas de idêntico teor, estabelecem que: "As Bolsas de Valores são constituídas como associações civis, sem finalidade luerativa tendo por finalidade...".

A diferença fundamental ocorrida é que o campo de competência da nova autarquia é bem mais restrito do que atribuído ao Banco Central do Brasil. Assim, a lei que a criou delimitou o campo de sua competência atribuindo-lhe, para o que nos interessa no presente caso, o poder disciplinador e fiscalizador sobre uma lista taxativa de atividades, a qual abrange: a) emissão e distribuição de valores mobiliários no mercado; b) negociação e intermediação de valores mobiliários; c) organização, funcionamento e operações das Bolsas de Valores.52 52 Ver art. 1º da Lei nº 6.385/76. Ou seja, a CVM, à qual se subordinam as Bolsas de Valores, respeitada sua autonomia administrativa, financeira e patrimonial, não tem competência para autorizar operações fora do campo da sua atribuição legal, criado pela Lei nº 6.385/76.

De outro lado, como as Bolsas de Valores não se subordinam mais ao Banco Central do Brasil, hoje elas têm seu objeto social adstrito somente às transações com valores mobiliários emitidos por sociedades anônimas, ou outros a elas atribuídos pelo CMN, desde que sejam exclusivamente valores mobiliários. É, pois, importante ressaltar, mais uma vez, que as Bolsas de Valores deixaram de ser o locus das operações de títulos governamentais, bem como das operações de câmbio, e passaram a se dedicar, com exclusividade, às operações com valores mobiliários emitidos por sociedades anônimas. As outras transações continuam sendo feitas por sociedades corretoras, mas fora do recinto, não mais sob o poder normativo das Bolsas de Valores. Ocorreu com a Lei nº4.728/65 o início da separação entre os mercados financeiro e de capitais,53 53 Ver art. 1º, da Lei nº 4.728 '65. separação esta que ficou mais patente com a criação da CVM.

Definiram-se, portanto, as duas grandes áreas de atuação, a do mercado financeiro e a do mercado de valores mobiliários.

A primeira teve seu campo demarcado pela Lei nº 4.595/64, tendo como órgãos de normalização e de fiscalização o CMN e o Banco Central do Brasil. A segunda área também se submete ao CMN, porém deixou de ser competência do Banco Central, na medida em que foi criada a autarquia específica para substituí-lo no controle do mercado de valores mobiliários por sociedades por ações, ou outros valores a ela atribuídos pelo CMN. Com esta cisão; as sociedades corretoras passaram a dividir seus vínculos de subordinação: de um lado, com o Banco Central do Brasil no que diz respeito às operações com valores mobiliários de emissão governamental, mercado de dinheiro e mercado de câmbio; de outro lado, subordinam-se ao CMN, bem como à CVM, no que se refere aos valores mobiliários previstos no art. 2º da Lei nº 6.385/76.

Como decorrência da diminuição do campo de atuação das Bolsas de Valores resultou que o campo de sua competência fiscalizadora também se adequou ao mesmo limite. Assim, no exercício de suas funções autoreguladoras, estas se cingem às atividades que tenham lugar e sejam promovidas pela associação civil, dentro do âmbito de sua competência. A importância deste ponto prende-se ao fato de que, anteriormente, os corretores exerciam todas as suas atividades dentro do recinto, ou sob a supervisão do indefinido "entre" Bolsa. Agora, com a limitação de seu objetivo, as sociedades corretoras continuam operando no mercado de dinheiro, câmbio, ouro etc, itens estes que escapam ao campo de competência das Bolsas de Valores. Ou seja, de tal colocação resulta que, de um lado, os emolumentos que as Bolsas de Valores cobram só são devidos pelas atividades que elas legitimamente podem prestar e, de outro, em decorrência da primeira, que o seu poder de polícia, oriundo da condição de órgão auxiliar, bem como de sua autonomia administrativa, está limitado ao campo dos valores mobiliários transacionados em seu recinto. Tal situação foi expressamente reconhecida pela Resolução nº 922/84, quando esta afirmou que nas Bolsas são negociáveis títulos e valores mobiliários de emissão de pessoa jurídica de direito público e de companhia aberta, bem como os índices referentes a títulos e valores mobiliários.54 54 Ver art. 60, da Resolução nº 922/84. Desta forma, por exemplo, não é legítima a cobrança, por parte das Bolsas de Valores, de emolumentos sobre operações de câmbio nem, de outro lado, podem elas exercer qualquer ato fiscalizatório ou punitivo sobre seus membros, quando as sociedades corretoras estejam agindo nos campos de sua competência, os quais, entretanto, são estranhos aos objetivos estabelecidos pela legislação à associação civil.

b) A autonomia das Bolsas de Valores apartir do momento em que as Bolsas de Valores foram consideradas associações civis elas deixaram de ser criadas por lei, ou através de qualquer outro ato administrativo do Poder Executivo, e passaram a ser produto da criação da vontade de seus associados. Entretanto, antes de entrar em funcionamento dependem da aprovação da CVM. Como associações civis elas gozam da autonomia administrativa, financeira e patrimonial; porém, ao mesmo tempo, elas são órgãos auxiliares da CVM, no que diz respeito à fiscalização de seus associados nas operações nelas realizadas, ou a elas subordinadas. Disto resultou uma nova figura, que não pertence ao campo tradicional de nosso direito administrativo, pela qual o ente privado é dotado de poder disciplinador sobre seus membros, comitentes que transacionem valores mobiliários em seus recintos, bem como sobre as sociedades cujos valores mobiliários sejam negociados em seus pregões. Porém, a autarquia governamental tem poderes revisionais sobre uma gama enorme de atos praticados pelas Bolsas de Valores.

A grande dificuldade está em estabelecer o limite do poder reformador, uma vez que a lei garante às Bolsas de Valores a mencionada autonomia administrativa, financeira e patrimonial. No primeiro campo, no qual se localiza o poder da CVM, pode ser desenvolvida a teoria da auto-regulação das Bolsas de Valores. No segundo campo, no qual se encontra autonomia das Bolsas, a lei não outorga o poder corretivo direto, mas, se quiser fazê-lo, deverá a CVM recorrer à decisão final do Poder Judiciário. No que diz respeito à auto-regulação, figura tomada emprestada do direito americano, temos que ela se manifesta como a capacidade de as Bolsas de Valores se auto-regularem validamente, até modificação em contrário do órgão regulador. Ou, conforme a pitoresca imagem desenvolvida pelo Ministro da Suprema Corte William Douglas, quando presidente da Securities and Exchange Commission (SEC), segundo a qual a SEC seria como o pai que fundamentalmente confia nos escrúpulos de sua filha, mas que está pronto para adotar medidas de proteção, caso necessário.

Dentro de tal contexto, e dentro dos limites do presente artigo, pode ser dito que as Bolsas de Valores são soberanas para contratar e demitir seus colaboradores, eleger seus conselheiros, comprar e alienar patrimônio; enfim, atos de gestão interna que produzam efeitos internos. De outro lado, as regras de relacionamento da associação civil com os intermediários, comitentes e sociedades emitentes de valores mobiliários que dela se utilizem, são suscetíveis de revisão pela autoridade governamental competente. Entretanto, não se pode considerar que a delegação auto-reguladora ocorra toda vez que as Bolsas de Valores estejam lidando com o mundo externo ao seu círculo associativo. Isto porque o sistema constitucional brasileiro não adota a regra da delegação de poderes, fonte maior do poder da CVM e, em grande parte exercível pelas Bolsas de Valores, dentro da teoria da auto-regulação.55 55 Sobre auto-regulação, ver Regulação de mercado, da Comissão de Valores Mobiliários, em seus Princípiospara a auto-regulação de mercado de valores mobiliiários.

c)A natureza das atividades-como foi anteriormente apontado, as Bolsas de Valores são associações civis, sem finalidade lucrativa, que só podem operar após a competente autorização concedida pela CVM. Isto implica que, diferentemente do modelo legal anterior, as Bolsas de Valores não são criadas por lei, mas formadas pela livre vontade de seus associados, para cujo funcionamento há prévia autorização. Porém, mesmo na atual sistematização exerceriam as Bolsas de Valores uma função delegada? Prestariam, ao revés, um serviço concedido? Tais indagações se impõem na medida em que se queira extrair da independência outorgada pelas autonomias administrativas, financeira e patrimonial criadas, todas elas, por lei.

De maneira genérica, as atividades ou são exercidas pelo Estado ou de forma privada pelo cidadão. Quando realizadas pelo Estado estamos diante da prestação de um serviço público, sendo este prestado pela administração ou por delegados do Estado. Os serviços quando prestados podem ser divididos em serviços públicos e de utilidade pública; próprios e impróprios. Os serviços públicos, aqueles prestados diretamente ao usuário pela administração pública, são essências à comunidade e, como tal, são considerados como exercício de competência exclusiva do Estado e insuscetíveis de delegação. Já os serviços de utilidade pública são aqueles que, muito embora não-essenciais, cuja prestação pelo Estado é de conveniência, através de sua administração direta ou indireta, ou que sejam prestados por terceiros através da delegação ao exercício do serviço mediante sua concessão, permissão ou autorização. O que resulta claro, porém, em qualquer dos três gêneros da espécie delegação, é que somente pode ser delegada a atividade que originariamente pertença ao poder delegante.

Assim, o Estado só poderá delegar uma atividade que originariamente lhe pertença. Neste contexto temos que, uma vez cessada a delegação, a atividade anteriormente delegada volta a ser exercida pelo detentor do poder originário. Dentro desta mesma ordem de idéias temos que o Estado, ao prestar os serviços não-essenciais à comunidade, está, na realidade, exercendo um serviço impróprio do Estado, por si ou por delegação a terceiro. Entretanto, para o exercício da atividade imprópria é o Estado limitado pela Constituição federal, a qual lhe outorga tal exercício somente em caráter suplementar à iniciativa privada.56 56 Ver art. 170, § 1º da Constituição federal vigente.

Os serviços impróprios do Estado, quando delegados, o são através de uma das três formas apontadas. A concessão e "a delegação contratual da execução do serviço, na forma autorizada por lei e regulamentada pelo Executivo".57 57 Ver Meireiles, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro. São Paulo, Ed. Revista dos Tribunais, p. 343. O serviço permitido é aquele "em que a administração estabelece os requisitos para sua prestação ao público, e, por ato unilateral (termo de permissão) comete a execução aos particulares que demonstrem capacidade para seu desempenho".58 58 Ver Meirclles, Hely Lopes. op. cit. p. 356. Finalmente, os serviços autorizados são "aqueles que o poder público, por ato unilateral, precário e discricionário, consente na sua execução por particular, para atender interesses coletivos instáveis ou de emergência transitória".59 59 ver Meirelles, Hely Lopes. op. cit. p.359.

4. CONCLUSÕES

Será dentro das premissas apontadas que teremos que analisar a natureza do serviço prestado pelas Bolsas de Valores. A competência do Estado ou está discriminada na Constituição federal ou é objeto de lei específica. No caso das Bolsas de Valores, creio que haverá concordância em que a prestação deste serviço não se caracteriza como atividade essencial do Estado. Ao contrário, elas exercem uma atividade funcional dentro da atividade econômica do País.

Seria longa a discussão para que se esgotasse a temática do serviço de utilidade pública para concluirmos se as Bolsas de Valores eventualmente seriam prestadoras dentro de tal categoria. Ela pode ser prescindida na medida em que não é competência do Estado - quer por atribuição constitucional, quer por competência originária de lei - a prestação dos serviços executados pelas Bolsas de Valores. Tanto é assim que, se porventura o Estado não permitisse o funcionamento de determinada Bolsa de Valores, nem por isso poderia exercer diretamente as atividades, mantida a sistemática legal hoje vigente.

Assim, é de se concluir que as Bolsas de Valores não são exercentes de função delegada do Estado, em qualquer das três modalidades, pelo simples motivo que ao Estado não foi dada a competência originária para o exercício da prestação de tal serviço. De outro lado, é impossível a delegação de poder que não se possui. Desta feita, temos que as Bolsas de Valores não são exercentes de serviços delegados pelo Estado, tarefas estas exercíveis através de concessão, permissão ou autorização. Na realidade, elas exercem uma atividade privada, de sua competência originária, a qual, entretanto, é autorizada, fiscalizada e, dentro de determinados limites estabelecidos por lei, regrada pelo CMN e pela CVM. A primeira como órgão definidor das grandes políticas do mercado de valores mobiliários, e a segunda como implementadora e fiscalizadora das decisões emanadas da primeira (além do exercício de sua competência originária prevista na Lei 6.385/76). Temos, portanto, que as Bolsas de Valores se relacionam com o Estado da mesma forma que as instituições financeiras o fazem. Elas são instituições privadas, não-exercentes de função delegada, as quais, entretanto, necessitam de autorização prévia de funcionamento, bem como são regradas em suas grandes linhas pelo Estado.

Este mesmo tipo de comportamento ocorre em outros setores da vida econômica, fato este que não torna o exercente da atividade detentor de uma delegação exercível a título precário. Se as Bolsas de Valores são associações civis exercentes de uma atividade própria e não-delegada, disto decorre que sua autonomia administrativa, financeira e patrimonial tem que ser analisada dentro de tal contexto. Desta forma, as Bolsas de Valores são subordinadas na extensão do poder concedido pela lei às autoridades reguladoras do mercado; sendo que nos demais setores elas se comportam e se regem como associações civis iguais às demais. Elas se distinguem das demais associações civis na medida de sua autonomia perdida em face do poder de controle criado por lei e outorgado ao Estado; porém, tal perda de uma fatia da autonomia não as transforma em exercentes de serviços delegados pelo Estado.

Em conclusão, a nova natureza jurídica das Bolsas de Valores é totalmente desvinculada das várias alternativas existentes até o advento da Lei nº 4.595, bem como da Resolução nº 39. O que resta é que todo um novo posicionamento legal se abre - e dele algumas situações foram discutidas - permanecendo todo um universo a ser interpretado diante de um mercado de valores mobiliários que se torna cada vez mais complexo e importante em face das repercussões positivas ou negativas que poderá ocasionar no mundo econômico.

  • "Seguem o sistema liberal a Inglaterra, os EUA, a República Argentina (Cód. Comercial, art. 76), e a Bélgica (Cód. Comercial arts. 61 e segs.) onde as bolsas são instituídas e conservadas por associações comerciais... Adotam o sistema tutelar do Estado: aFranca(Cód. Comercial, art. 71); Portugal (Cód. Comercial, arts. 82 e 87) e Austria, onde a constituição das Bolsas depende do consentimento dos ministros das Finanças e do Comércio, depois de ouvidas as Câmaras do Comércio e Indústria, ficando sujeitas à fiscalização governamental, embora tenham administração autônoma. " Em 1959 tal divisão é aceita e repetida por Oscar Barreto Filho, ver Revista dos Tribunais, São Paulo,Ed. Revista dos Tribunais, .253 (48): 9e, recentemente, Bulgarelli Waldiro, Enciclopédia do direito. São Paulo, Saraiva, verbete "Bolsa de Valores", p.88, item 3.
  • 4 Ver Rabut, Albert. Le droit de bourses de valeurs et des agents de change. Paris, Litec - Librairies Techniques, p. 9: "En vertu de l'article 71 du Code de Commerce, la Bourse de Valeurs est la réunion des agents de change sans l'authorité des pouvoirs publics" Posteriormente, pelo Decreto de 30 de março de 1967, detalhou-se em seu art. 3? de sorte que: "La création et la supression d'une Bourse de Valeurs sont décidées par arrêté du ministre de l'Économie et des Finances, après avis de la Chambre Syndicale de la Compagnie des agents de change et de la Commission des opérations de Bourse".
  • 5 Ver Berman, H.D. The stock exchange. London, Pitman Publishing, p. 167: "(...)The Royal Commission, set up in 1877, which concluded that the Stock Exchange Rules were capable of affording relief and exercising restraint for more prompt and often more satisfactory than any within reach of the Courts of Law and to the Cohen Commission's opinion that the Stock Exchange Regulations could be made more stringent than the law because, since they lacked statutory authority, they could be waived or relaxed when the merits of individual cases warranted it!'
  • 6 Ver Review ofInvestitor Protection do Prof. L.C.B. Gower, London, Her Majesty's Stationery Office, Jan. 1984, p. 10, "(...)under that approach there would be a comprehensive new Act, self regulatory agencies would be recognized by regulation of the investment industry under the surveillance of any appropriate government Department or Agency(...)" Este trabalho pedido pelo governo inglês ao Prof. Gower e que não foi submetido ao Parlamento propõe-se a reestruturar o mercado de valores mobiliários inglês com a criação de um órgão semelhante à Securities and Exchange Commission americana.
  • 7 Ver Japanese securities regulations, por Luis Loss, Makato Yazawa e Barbara Ann Banof, Boston, Little, Brown, p. 107: "Thecurrent Securities and Exchange Law was enacted in 1948 under the guidance of the United States Occupation Authorities(...)" e p. 109: "Securities Exchange are now required to obtain a licence from the minister of Finance. The minister may refuse to issue a licence if(.
  • 9 Ver Carvalho de Mendonça. Tratado de direito comercial brasileiro. Rio de Janeiro, Freitas Bastos, v. 2, p. 310, nota 4: "Desde 1808 até 1849 (quando foi publicado o Decreto nş 648), o exercício da corretagem na praça do Rio de Janeiro efetuou-se livremente, por um grupo de indivíduos na sua quase-totalidade estrangeiros, que seguiam as praxes e as leis dos países de que eram originários, imprimindo assim a esse mercado uma feição típica, misto de praxes inglesas, francesas e alemãs, entre si antieconômicas e contraditórias (Relatório do presidente da Câmara Sindical dos Corretores de Fundos Públicos da Capital Federal. 1900. p. 27)(.
  • 39 Ver Pontes de Miranda. Tratado de direito privado. São Paulo, Ed. Revista dos Tribunais, §4.745, p. 420: "A intervenção do Estado na criação das Bolsas e na edição de regras jurídicas sobre elas e suas atribuições de modo nenhum torna de direito público as Bolsas, ou as próprias Câmaras Sindicais, ou os corretores oficiais. A ingerência publicistica não chega a publicizar o instituto da Bolsa, ou da Câmara Sindical. A Bolsa e a Câmara Sindical desempenham o papel que o Estado quer e esperava que fosse desempenhado, não as faz seus órgãos. Salvo se admitirmos que haja órgãos heterotópicos, órgãos fora do organismo. A muleta seria órgão. A cadeira de roda seria órgão (.
  • 46 Ver Revista dos Tribunais n.248, o acordão n.ş 89.723, p. 316 e 317: "A Lei nş 2.
  • 57Ver Meireiles, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro. São Paulo, Ed. Revista dos Tribunais, p. 343.
  • 1
    Ver Carvalho de Mendonça J. X.
    Tratado de direito comercial brasileiro. Rio de Janeiro, Livraria Freitas Bastos, v. 6,1. 4, p. 288, n. 1.589, nota 1:
    "Seguem o sistema liberal a Inglaterra, os EUA, a República Argentina (Cód. Comercial, art. 76), e a Bélgica (Cód. Comercial arts. 61 e segs.) onde as bolsas são instituídas e conservadas por associações comerciais... Adotam o sistema tutelar do Estado: aFranca(Cód. Comercial, art. 71); Portugal (Cód. Comercial, arts. 82 e 87) e Austria, onde a constituição das Bolsas depende do consentimento dos ministros das Finanças e do Comércio, depois de ouvidas as Câmaras do Comércio e Indústria, ficando sujeitas à fiscalização governamental, embora tenham administração autônoma. " Em 1959 tal divisão é aceita e repetida por Oscar Barreto Filho, ver
    Revista dos Tribunais, São Paulo,Ed. Revista dos Tribunais, .253 (48): 9e, recentemente, Bulgarelli Waldiro,
    Enciclopédia do direito. São Paulo, Saraiva, verbete "Bolsa de Valores", p.88, item 3.
  • 2
    Ver Barreto Filho Oscar. op. cit. p. 9: "Aprovam-se como seguidores do sistema liberal a Inglaterra, os EUA, a Argentina e a Bélgica, onde as Bolsas são instituídas e mantidas por sociedades privadas. " No mesmo sentido ver Bulgarelli Waldiro. op. cit. p. 88: "O regime da liberdade é basicamente o existente na Inglaterra, EUA e Argentina, em que as Bolsas são constituídas livremente, sem qualquer ingerência estatal."
  • 3
    Ver art. 19, do
    Securities Exchange Act of 1934, que diz: "The Commission shall, upon the filling of an application for registration as a national securities exchange, registered securities association, or registered clearing agency(...) within ninety days of the date of publication of such notice(...). A) by order grant such registration, or B) institute proceedings to determine whether registration should be denied(...)"
  • 4
    Ver Rabut, Albert.
    Le droit de bourses de valeurs et des agents de change. Paris, Litec - Librairies Techniques, p. 9: "En vertu de l'article 71 du Code de Commerce, la Bourse de Valeurs est la réunion des agents de change sans l'authorité des pouvoirs publics" Posteriormente, pelo Decreto de 30 de março de 1967, detalhou-se em seu art. 3? de sorte que: "La création et la supression d'une Bourse de Valeurs sont décidées par arrêté du ministre de l'Économie et des Finances, après avis de la Chambre Syndicale de la Compagnie des agents de change et de la Commission des opérations de Bourse".
  • 5
    Ver Berman, H.D.
    The stock exchange. London, Pitman Publishing, p. 167: "(...)The Royal Commission, set up in 1877, which concluded that the Stock Exchange Rules were capable of affording relief and exercising restraint for more prompt and often more satisfactory than any within reach of the Courts of Law and to the Cohen Commission's opinion that the Stock Exchange Regulations could be made more stringent than the law because, since they lacked statutory authority, they could be waived or relaxed when the merits of individual cases warranted it!'
  • 6
    Ver
    Review ofInvestitor Protection do Prof. L.C.B. Gower, London, Her Majesty's Stationery Office, Jan. 1984, p. 10, "(...)under that approach there would be a comprehensive new Act, self regulatory agencies would be recognized by regulation of the investment industry under the surveillance of any appropriate government Department or Agency(...)" Este trabalho pedido pelo governo inglês ao Prof. Gower e que não foi submetido ao Parlamento propõe-se a reestruturar o mercado de valores mobiliários inglês com a criação de um órgão semelhante à Securities and Exchange Commission americana. Ver também Rabut, Albert, op. cit. p. 104: "Le rôle ainsi attribué à la Commission des opérations de Bourse offre beaucoup d'analogie avec celui de la Securities and Exchange Commission américaine, dont l'autorité est considérable".
  • 7
    Ver
    Japanese securities regulations, por Luis Loss, Makato Yazawa e Barbara Ann Banof, Boston, Little, Brown, p. 107: "Thecurrent Securities and Exchange Law was enacted in 1948 under the guidance of the United States Occupation Authorities(...)" e p. 109: "Securities Exchange are now required to obtain a licence from the minister of Finance. The minister may refuse to issue a licence if(. ..)".
  • 8
    Lei nº 4.728, de 14 de julho de 1965.
  • 9
    Ver Carvalho de Mendonça.
    Tratado de direito comercial brasileiro. Rio de Janeiro, Freitas Bastos, v. 2, p. 310, nota 4: "Desde 1808 até 1849 (quando foi publicado o Decreto nº 648), o exercício
    da corretagem na praça do Rio de Janeiro efetuou-se livremente, por um grupo de indivíduos na sua quase-totalidade estrangeiros, que seguiam as praxes e as leis dos países de que eram originários, imprimindo assim a esse mercado uma feição típica, misto de praxes inglesas, francesas e alemãs, entre si antieconômicas e contraditórias (Relatório do presidente da Câmara Sindical dos Corretores de Fundos Públicos da Capital Federal. 1900. p. 27)(. ..)"
  • 10
    Ver Lei nº 317, de 21 de outubro de 1843 que, em seu art. 13 estabeleceu: "As letras de câmbio(...) notas promissórias, que forem passadas ou emitidas dentro do Império, sem que tenham pago o selo marcado na tabela A, não poderão ser protestados, nem atendidos em juízo" e, em seu § 4º. "(...)se porém o negociador da letra, escrito, ou nota for corretor não só ficará sujeito ao dobro das multas, como na reincidência ficará inábil para servir como corretor".
  • 11
    Ver Decreto nº 417, de 14 de junho de 1845, que versa sobre "(...)a arrecadação do imposto sobre os corretores".
  • 12
    Ver Decreto nº 417, de 14 de junho de 1845: art. 2º "Os corretores... serão nomeados na Corte pelo Tribunal do Tesouro, e nas províncias pelas Tesourarias, ouvido o Corpo do Comércio, por intermédio das Comissões da Praça, ou dos negociantes mais notáveis do lugar, onde as não houver;'; art. 3º "(...)e os corretores uma vez demitidos(...)"; art. 10 "Os corretores que se acharem culpados de contravenção nas disposições deste Regulamento serão, segundo as circunstâncias, suspensos ou demitidos pela autoridade que os nomeou(...)".
  • 13
    Ver Decreto nº 417 de 14 de junho dc 1845 part. 5;' "Os corretores nem por si, nem por interposta pessoa, nem como sócios, nem como comissários, poderão fazer por sua conta transações, não-compreendidas no número daquelas de que o título de sua nomeação, e menos ser fiadores de quaisquer que sejam feitas por seu intermédio."
  • 14
    Ver Lei nº. 479, de 24 de dezembro de 1896, do estado de São Paulo.
  • 15
    Ver Decreto nº 417 de 14 junho de 1845: art. 13 - "Pela existência dos corretores não ficam inibidos os comerciantes, e mesmo os que o não forem, de tratar de todos os seus negócios por si, seus agentes, e caixeiros, e bem assim por qualquer pessoa que nisso intervenha gratuitamente, ou por menos que os ditos corretores."
  • 16
    Ver Decreto nº 648, de 10 de novembro de 1849.
  • 17
    Ver Decreto nº 648, de 10de novembro de 1849:art. 15. "Antes de exercerem quaisquer atos próprios de seus cargos prestarão juramento de bem servir, na Corte, nas mãos do ministro da Fazenda ou do inspetor-geral do Tesouro, e nas províncias, nas mãos dos seus presidentes."
  • 18
    Ver Decreto nº 648, de 10 de novembro de I849:art. 13."O corretor de fundos públicos pagará nesta Corte o imposto anual de (...), o de mercadorias (...) e o de navios (...) (art. 14) (...) O imposto do artigo anterior será pago adiantado, e o Corretor já em exercício que não o satisfizer até o fim do terceiro mês do ano financeiro, será demitido."
  • 19
    Ver Decreto nº 648, de 10 de novembro de 1849, art. 17.
  • 20
    Ver Decreto nº 648, de 10 de novembro de 1849, art. 68. "Os corretores reunir-se-ão na mesma casa que serve agora de Praça de Comércio (...)"
  • 21
    Ver Código Comercial art. 32: "Praça de Comércio é não só o local, mas também a reunião dos comerciantes, capitães e mestres de navios, corretores e mais pessoas empregadas no comércio. Este local e reunião estão sujeitos à polícia e inspeção das autoridades competentes."
  • 22
    Ver Decretou:' 1.359 de 20 de abril de 1893, o qual cria a "Bolsa de Fundos Públicos".
  • 23
    Ver art. 1º do Regimento Interno da Junta dos Corretores da Praça do Rio de Janeiro, de 12 de abril de 1877: "A Bolsa é o lugar no salão da Praça de Comércio ou da Associação Comercial, destinado às operações de compra e venda de títulos públicos, de ações de bancos e companhias, de valores comerciais e finalmente de metais preciosos."
  • 24
    Ver Decreto nº 806, de 26 de julho de 1851.
  • 25
    Ver art. 2º Lei nº 806,de20dejulhode 1851: "(...) não excederá de 10 o número de corretores de fundos públicos, de oito o dos navios, e de 10 o dos de mercadorias".
  • 26
    Ver art. 10, Lei nº 806, de 26 de julho de 1851: "O ofício de corretor é pessoal, e não pode ser substituído; pena de nulidade dos atos de corretagem que forem praticados pelo substituto."
  • 27
    Ver art. 16, Lei nº 806, de 26 de julho de 1851: "São competentes para multar, suspender c destituir os corretores: 1" o Tribunal do Comércio, com recurso para o Conselho d'Estado(...) 2" as justiças ordinárias (...)"
  • 28
    Ver Decreto 2.733, de 23 de janeiro de 1861, art. 1º: "As transações sobre ações (...), fundos públicos... câmbios, empréstimos comerciais (...) só terão lugar por intermédio de corretores de fundos públicos competentemente nomeados, sob pena de nulidade (...)"
  • 29
    Ver Decreto nº 6.132, de4demarçode 1876, art. 1º: "Nos edifícios destinados para praças de comércio, haverá um lugar especial, separado e elevado, onde, à vista do público, se reunirão os corretores de fundos quando tiverem de propor e efectuar transações sobre: I. Fundos públicos, nacionais ou estrangeiros; II. Letras de câmbio, III Empréstimos comerciais; IV. Ações de companhias autorizadas e admitidas pelo Estado."
  • 30
    Ver Decreto nº 1.359, de 20 de abril de 1893.
  • 31
    Ver Decreto nº 1.359 de 20 de abril de 1893, art. 1º: "O cargo de corretor de fundos constitui um ofício público."
  • 32
    Ver Decreto nº 1.359, de 20 de abril de 1893, art. 11: "O corretor pode ser suspenso: a) pela Câmara Sindical, com recurso para o ministrada Fazenda..., b) pelo ministro da Fazenda, sem recurso...".
  • 33
    Ver Decreto nº 1.359, de 20 de abril de 1893, art. 98: "A Bolsa é o lugar, no salão da Praça de Comércio...", art. 99: "Só aos corretores de fundos é permitido o acesso dentro da balaustrada da Bolsa...".
  • 34
    Ver Lei (do estado de São Paulo) nº 479, de 24 de dezembro de 1896, a qual foi regulamentada pelo Decreto estadual nº 454, de 7 de junho de 1897.
  • 35
    Ver Decreto nº 2.475, de 13 'de março de 1897.
  • 36
    Ver art. 19: "Continua em vigor, no que não colidir com a presente lei, toda a legislação federal e estadual referente à matéria."
  • 37
    Ver parágrafo unido do art. 17, da Lei nº 6.385/76: "Às Bolsas de Valores incumbe, como órgãos auxiliares da Comissão de Valores Mobiliários, fiscalizar os respectivos membros e as operações nelas realizadas."
  • 38
    ver Barreto Filho, Oscar. op. cit. p. 13: "Impõe-se, portanto, como ponto de partida, a análise de natureza jurídica da Bolsa de Valores de São Paulo, para defini-la como pessoa jurídica ou não, e, no caso afirmativo, se trata de pessoa jurídica de direito público ou de direito privado, e ainda na primeira das hipóteses, se reveste as características de autarquia ou de entidade paraestatal típica. Como problemas paralelos dever-se-á, também, indagar se a Bolsa de Valores constitui repartição pública
    lato sensu, ou estabelecimento de utilidade pública."
  • 39
    Ver Pontes de Miranda.
    Tratado de direito privado. São Paulo, Ed. Revista dos Tribunais, §4.745, p. 420: "A intervenção do Estado na criação das Bolsas e na edição de regras jurídicas sobre elas e suas atribuições de modo nenhum torna de direito público as Bolsas, ou as próprias Câmaras Sindicais, ou os corretores oficiais. A ingerência publicistica não chega a publicizar o instituto da Bolsa, ou da Câmara Sindical. A Bolsa e a Câmara Sindical desempenham o papel que o Estado quer e esperava que fosse desempenhado, não as faz seus
    órgãos. Salvo se admitirmos que haja órgãos heterotópicos,
    órgãos fora do organismo. A muleta seria órgão. A cadeira de roda seria órgão (. ..)".
  • 40
    Ver Carvalho de Mendonça, op.cit. v.2, p.298, nota 1, a qual transcreve a discussão ocorrida no Senado federal em 4 de dezembro de 1895, quando falou o Senador João Barbalho: "Torna-se um ofício público, à maneira do tabelião, nomeado pelo presidente da República para o Distrito Federal, este emprego de simples agente do comércio" ao referir-se ao corretor. Muito tempo depois o Tribunal de Justiça de São Paulo manifestou-se no mesmo sentido ao decidir: "Mas, não será por isso que a Bolsa, corporação de corretores, integre uma das secretarias de estado. Deparam-se entidades que, embora exerçam funções públicas, não são departamentos da administração pública nem, sequer, autarquias. Haja vista,
    verbi gratiu, os tabelionatos de notas, os ofícios de registro público etc." In:
    Revista dos Tribunais n.(291):220, acórdão do Primeiro Grupo de Câmaras Cíveis, Embargo nº 89.723.
  • 41
    Ver art. 126, letra
    a, do Regulamento interno da Bolsa Oficial de Valores de São Paulo, aprovado em 14 de dezembro de 1944.
  • 42
    Ver art. 75, letra
    a, do Regulamento aprovado pelo Decreto estadual nº 454, de 7 de junho de 1897. Ver ainda Agravo nº 44.708. In:
    Revista dos Tribunais, (331): 419.
  • 43
    Ver Embargo nº 89.723. In:
    Revistados Tribunaise nº 291, p. 220 e 221.
  • 44
    Ver lei nº 2,146 de 29 de dezembro de 1959, art. 6º.
  • 45
    Ver lei nº 2,146 de 29 de dezembro de 1959, art. 6º§.
  • 46
    Ver
    Revista dos Tribunais n.248, o acordão n.º 89.723, p. 316 e 317: "A Lei nº 2. 479, que reorganizou a Secretaria de Estado dos Negócios da Fazenda, em seu art. 16 estabeleceu ficar diretamente subordinado à Secretaria da Fazenda a Bolsa Oficial de Valores de São Paulo. Idêntica determinação contém Lei nº 3.703, em seu art. 2:', nº IX, Esta lei, que também reorganizou a Secretaria da Fazenda, dispõe expressamente que a Secretaria da Fazenda, além de ter a seu cargo a execução da política financeira do Governo e a realização da Receita eda Despesa Pública, tem também a incumbência da guarda dos valores e de tudo que disser respeito às finanças estaduais na forma que for fixada em regulamento. Desses dispositivos legais não se infere ser a Bolsa Oficial de Valores de São Paulo uma autarquia administrativa,
    mas sim ser uni departamento da administração pública, diretamente subordinado à Secretaria de Estado dos Negócios da Fazenda, ser unta instituição que desempenha serviços de interesses públicos. É, por certo, uma repartição integrante da Secretaria da Fazenda..." (o grilo não é do Acórdão).
  • 47
    Ver art. 2º. do Decreto nº 2.475, de 13 de março de 1897.
  • 48
    Ver art. 7º. inciso III, da Lei, nº 4.728, de 14 de julho de 1965.
  • 49
    Ver art. 1º.' da Resolução nº 39, de 20 de Outubro de 1966.
  • 50
    Ver art. 6º da Lei nº 4.728 e art. 17 da Lei nº 6.385.
  • 51
    Ver art. 1º da Resolução nº 39/66 e o art. 1º da Resolução nº 922,84, ambas de idêntico teor, estabelecem que: "As Bolsas de Valores são constituídas como associações civis, sem finalidade luerativa tendo por finalidade...".
  • 52
    Ver art. 1º da Lei nº 6.385/76.
  • 53
    Ver art. 1º, da Lei nº 4.728 '65.
  • 54
    Ver art. 60, da Resolução nº 922/84.
  • 55
    Sobre auto-regulação, ver Regulação de mercado, da Comissão de Valores Mobiliários, em seus
    Princípiospara a auto-regulação de mercado de valores mobiliiários.
  • 56
    Ver art. 170, § 1º da Constituição federal vigente.
  • 57
    Ver Meireiles, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro. São Paulo, Ed. Revista dos Tribunais, p. 343.
  • 58
    Ver Meirclles, Hely Lopes. op. cit. p. 356.
  • 59
    ver Meirelles, Hely Lopes. op. cit. p.359.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      21 Jun 2013
    • Data do Fascículo
      Mar 1986
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