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O critério da taxa interna de retorno e o caso dos projetos do tipo investimento puro

COMENTÁRIOS

O critério da taxa interna de retorno e o caso dos projetos do tipo investimento puro

Clóvis de Faro

Instituto de Planejamento Econômico e Social (IPEA/INPES) - Rio de Janeiro

1. INTRODUÇÃO

Uma das questões que mais importam a administradores financeiros, engenheiros, economistas e planejadores de projetos, enfim, a todos aqueles que tomam decisões relativas a inversões de capital, é a de aferir a economicidade das mesmas. Na avaliação econômica de propostas, ou projetos, de investimento, um procedimento freqüentemente utilizado é o denominado critério da taxa interna de retorno. Entretanto, embora este aspecto nem sempre seja observado, nem todo projeto de investimento é passível de ser corretamente avaliado via o critério da taxa interna de retorno. Para que esse critério faça sentido, é necessário que sejam satisfeitas certas condições, não s6 de natureza matemática como ainda de caráter econômico.

O fato de precisarmos assegurar a validade do emprego do critério da taxa interna de retorno para o tipo particular de projeto de investimento que se esteja avaliando tem dado margem a que o assunto venha sendo exaustivamente investigado. Assim, na literatura contemporânea, de que são exemplos típicos as referências (3), (11), (13), (14), (16) e (20), são apresentadas condições de suficiência que, uma vez obedecidas, garantem a correta implementação do critério.

Tendo como motivação proporcionar uma justificativa formal para uma afirmativa feita em um trabalho desenvolvido por Faro e Soares (6), o propósito deste comentário é o de examinar a aplicação do critério da taxa interna de retorno para o caso de profetas ditos do tipo investimento puro. Para tanto, após a conceituação do problema, proceder-se-á a uma integração de certos resultados que foram anteriormente apresentados por Teichroew et alli (21) e por Faro (2), resultados esses que garantem determ inadas propriedades básicas para a chamada função valor futuro. A seguir, ilustrando-se com a análise de um exemplo concreto, abordar-se-á o problema da determinação do valor numérico da taxa interna de retorno. Será então evidenciado que, sem ser alcançado pelas objeções levantadas por Kaplan (15), pode ser feito uso do algoritmo sugerido por Fisher (9), que nada mais é do que uma versão do celebrado método de Newton-Raphson, para o cálculo de raízes de polinômios. Flnalizando-se, será investigada a relação que existe entre o que foi aqui apresentado e a condição de suficiência deduzida por Norstrom (16).

2. CONCEITOS E DEFINIÇÕES

Representando-se por Qi, para i = 1, 2, ..., n, a receita líquida associada ao i-ésimo penedo da vida econômica do empreendimento, um projeto de investimento será caracterizado, para fins de análise, pela seguinte seqüência de fluxos de caixa líquidos:

onde S>O é o chamado investimento inicial e é suposto que QnO.

Sendo i > O uma taxa de juros, sob forma unitária, cujo período a que se refere coincide com o intervalo de tempo entre fluxos de caixa consecutivos, a função valor atual, V(i), associada a um projeto de investimento, é definida através da relação:

Por outro lado, ainda por definição, a chamada função valor futuro, P(i), é tomada como sendo dada por:

Face às expressões (2) e (3), é fácil verificar que as funções valor atual e valor futuro estão relacionadas de tal forma que:

Tomando-se i como incógnita, a taxa interna de retorno, que designaremos por i*, associada a um projeto de investimento é definida como a taxa de juros que anula a função valor atual. Ou seja, tendo em vista as relações (2) e (4), i* é tal que:

Sendo r usualmente denominada de mínima de atratividade e uma taxa de juros tomada como termo de comparação, o critério da taxa interna de retorno prescreve que um projeto de investimento será considerado como economicamente interessante se i*>r.

Para que a prescrição acima faça sentido, não só é necessário que, no intervalo considerado, exista uma solução para a equação (5), mas que tal solução seja única. Ora, a resolução desta equação, determinada a partir da função valor atual ou a partir da função valor futuro, consiste tão-somente na determinação das raízes de um polinômio do grau n. Por outro lado, como é sabido do estudo da álgebra (23, p. 55-6), incluindo-se as que forem complexas e contando-se cada raiz múltipla tantas vezes quanto a sua respectiva multiplicidade, todo polinômio do grau n apresenta exatamente n raízes. Conseqüentemente, o problema passa a ser o de determinar a existência e unicidade de uma raiz que corresponda a uma taxa de juros no intervalo considerado.1 1 Como discutido no item 5, os requisitos matemáticos de existência e unicidade não são exaustivos, pois que, por motivo de caráter econômico, é preciso ainda que se garanta uma avaliação que seja consistente com a resultante da aplicação do chamado método do valor atual, à taxa r. Para evitar a possibilidade de tal inconsistência, e resolvendo-se simultaneamente a questão de existência, é necessário que a soma algébrica dos fluxos de caixa seja positiva; para a relevância desta imposição veja as referências (4) e (7). é exatamente neste ponto que se fazem valiosas as condições de suficiência aludidas no item anterior.

A título de ilustração, considere-se o caso do projeto de investimento que chamaremos de A, e que é identificado pela seguinte seqüência de fluxos de caixa líquidos:

A: {-100, 860, -2925, 4910, -4060, 1320}

Fazendo-se x= 1+i, e partindo-se da função valor futuro, a aplicação do critério da taxa interna de retorno só será possível se for determinada a existência de uma única raiz distinta, que não seja inferior à unidade, para o seguinte polinômio do 5.º grau em x:

P(x) = -100x5 + 860x4 -2925x3 + 4910x2 -

-4060x + 1320.

Ora, no caso, é fácil verificar que o polinômio acima pode ser escrito como:

P(x)=-100(x-1, 1) (x-1,5) (x-2)3

Logo, lembrando-se do teorema da fatoração (23, p. 56), é de conclusão imediata que o polinômio considerado apresenta três raízes distintas (1,1; 1,5 e 2), e que são maiores do que a unidade. Conseqüentemente, a função valor futuro anula-se para três distintas taxas de juros positivas (10%, 50% e 100%), o que implica que o projeto A não pode ser avaliado pela aplicação estrita do critério da taxa interna de retorno.

Por outro lado, considere-se agora o caso do projeto de investimento que chamaremos de B, e ao qual se associa a seqüência de fluxos de caixa líquidos:

B: {-100, 50, -50, 100, -50, 150}

Embora o polinômio em x correspondente ao novo projeto seja do mesmo nível de complexidade que o do caso anterior, podemos afirmar que, mediante um simples exame dos fluxos de caixa, existe apenas uma raiz distinta superior à unidade. Isto é, face a propriedades que iremos identificar, fica garantida a aplicabilidade do critério da taxa interna de retorno para o caso do projeto B.

3. PROJETOS DO TIPO INVESTIMENTO PURO

3.1. Caracterização

Para nossos propósitos, é fundamental o conceito da denominada função balanço do projeto em urna certa época k, para uma dada taxa i, que representaremos por Mk (i). Por definição, tem-se:

Tendo em vista a expressão (3), é fácil verificar que a função balanço na época n coincide com a função valor futuro; isto é:

Lançando mão da terminologia adotada em (21), um projeto será dito do tipo investimento puro a uma certa taxa / se tivermos Mk(i)<O para k= O, 1, ..., n-1. Assim, por exemplo, considerando-se o projeto que chamamos de A, e a taxa de juros de 760% por período, visto que:

M0

M1

M 2

M3

M4

(7,6)
(7,6)
(7,6)
(7,6)
(7,6) =
=
=
=
= -100
-100(1+7,6) + 860 = 0
0(1+7,6) - 2.925 = - 2.925
-2.925(1+7,6) + 4.910 = -20.245
-20.245(1+7,6) -4.060 = - 178.167

diremos que o projeto A é do tipo investimento puro à taxa de 760% por período.

Por outro lado, em particular, um projeto será simplesmente denominado do tipo investimento puro se, para qualquer taxa i >0, os n primeiros elementos da seqüência de balanços, como definida por (7), forem não-positivos. Face ao teorema adiante demonstrado, é fácil verificar que o projeto B é do tipo investimento puro.

3.2 Propriedades

Teorema

Se um projeto for do tipo investimento puro à taxa nula, então também o será para qualquer taxa de juros positiva.

Demonstração

Observemos inicialmente que, para qualquer período k, a função balanço é contínua, pois é um polinômio em i e, conseqüentemente, sua derivada é definida. Por outro lado, para k = 0 e independentemente de i, tem-se que:

M0(i) = -S

dM0(i)/d¡= 0

Procedendo-se por indução, note-se que, para k= 1, tem-se:

M1(i) = (1+i)M0(i) + Q1 = -(1+i)S + Q1 = M1(0) - ¡S < 0, i > 0

já que S>0 e, por hipótese, M (0)< 0.

dM1(i)/di = M0(i) + (1+i)dM0 (i)/di = -S + 0<0, i>0

Suponha-se agora que Mk(i)< 0-, i > 0, com dMk(i)/di<0, i>0; então: dMk+1(i)/di=Mk(i) + + (1 +i)dMk(i)/di < 0, i > 0 o que implica que se tenha Mk+1(i) < 0 já que, por hipótese, Mk+1(0) < 0.

O teorema acima provê um meio rápido de verificar se um dado projeto é, ou não, do tipo investimento puro. Para tanto, considerando-se a taxa nula, basta verificar se os n primeiros elementos da seqüência de balanços são, ou não, não-positivos. Assim, para o projeto B, dado que n=5 e que M0(0) = -100, M1(0) = -50; M2(0) = = -100, M3(0) = 0 e M4(0) = -50, conclui-se que se trata de um projeto do tipo investimento puro.

Como corolários do teorema apresentado, podem ser deduzidas as seguintes importantes propriedades para a função valor futuro associada a um projeto do tipo investimento puro.

Corolário 1

Para projetos do tipo investimento puro, a função valor futuro é estritamente decrescente para i>0.

Demonstração

Fazendo-se k = n-1 e tendo em vista (6), segue-se que:

dMn(i)/di = dP(i)/di = Mn-1(i) +

+ (1 + i)dMn-1(i)/di < 0, i > 0

Corolário 2

Se, para um projeto do tipo investimento puro, a soma algébrica dos fluxos de caixa líquidos for positiva, isto é, se

-S + Qj > 0, então a função valor futuro anular-se-á uma e somente uma vez no campo das taxas não-negativas.2 2 Observe-se que as hipóteses só serão satisfeitas se QN > 0.

Demonstração

Dado que P(0) = -S + Qj > 0 e como

lim P(i) = - segue que, da continuidade

de P(i) e do corolário 1, a função valor futuro será nula para somente uma certa taxa i*>0

Corolário 3

Para projetos do tipo investimento puro, a função valor futuro é estritamente côncava para i>0.

Demonstração

Tendo em vista a definição de balanço, é imediato que:

= 2dMk-1(i)/di + (1 + i)d2 Mk-1(i)/di2, k=1, ..., n

com

d2M0(i)/di2 = 0, i>0

Logo

d2M1(i)/di2 = 2dM0(i)/di + (1+i)d2M0(i)/di2 =

= 0. i > 0

e

d2M2(i)/di2 = 2dM1(i)/di + (1+i)d2M1(i)/di2

= -2S + 0<0, i > 0

Procedendo-se por indução, suponha-se agora que se tenha d2Mk(i)/di2 < 0, i> 0; então:

d2Mk=1(i)/di2 = 2dMK(i)/di +

+ (1+i)d2MK(i)/di2 <0, i > 0

pois que, de acordo com o visto na demonstração do teorema, a primeira parcela é negativa, e a segunda também o é, por hipótese.

Conseqüentemente, em particular, para k = n - 1, teremos:

d2Mn(i)/di2 = d2P(i)/di2

= 2dMn-1(i)/di +

+ (1+i)d2Mn-1(i)/di2 <0, i > 0.

4. DETERMINAÇÃO DA TAXA INTERNA DE RETORNO

Os resultados apresentados no item anterior permitem concluir-se que, desde que a soma algébrica dos fluxos de caixa seja positiva,3 3 Observe-se que, caso contrário, o projeto será, a priori, economicamente injustificável, já que a função valor futuro e, portanto, também a função valor atual será negativa para qualquer taxa de juros positiva. fica assegurada a correta aplicação do critério da taxa interna de retorno para o caso de projetos do tipo investimento puro. Entretanto, regra geral, qualquer que seja o tipo particular de projeto sob exame, não é suficiente que se tenha estabelecido a existência e unicidade de uma taxa interna positiva, pois cabe ainda ao analista a tarefa de calcular o seu respectivo valor numérico. Ora, como vimos, partindo-se da função valor futuro, o problema passa a ser, então, o de determinar a raiz, real e maior do que a unidade, de um polinômio do grau n em x= 1+i.

Como é sabido do estudo da teoria das equações,4 4 Veja, por exemplo, Uspensky (23, p. 83-4). não existem métodos algébricos gerais para a extração de raízes de polinômios de grau superior a quatro. Logo, como usualmente recomendado nos livros-textos,5 5 Tais como Faro (1, p. 30-1), Fleischer (10, p. 38), Smith (19, p. 128-30) e Thuesen et alii (22, p. 115-6). o analista de projetos é obrigado a lançar mão de um processo de tentativas. Entretanto, muito embora nas condições assumidas tal procedimento sempre conduza à solução procurada, sua implementação é trabalhosa e não eficiente, já que pode exigir um número razoável de iterações (tentativas).

4.1 O algoritmo de Newton-Raphson

Um processo bem mais eficiente, e que, ao menos na literatura pertinente, parece ter sido originalmente sugerido por Fisher (9), é o que se fundamenta na aplicação do celebrado algoritmo de Newton-Raphson. Todavia, como corretamente evidenciado por Kaplan (15), mesmo estando asseguradas a existência e a unicidade de uma taxa interna de retorno, tal método não pode ser aplicado a qualquer tipo de projeto. Isto porque, como detalhadamente discutido por Henrici (12, p. 77-86), o processo iterativo de Newton-Raphson só tem sua aplicação garantida se a função que está sendo tratada apresentar certas propriedades básicas.6 6 Propriedades essas que são relativas à monotonicidade e concavidade da função no intervalo de pesquisa da raiz. Veja Uspensky (23, p. 174-7) para uma interpretação geométrica.

No caso específico sob exame, o dos projetos do tipo investimento puro, vimos que a função valor futuro é estritamente decrescente e côncava no intervalo definido por taxas de juros não-negativas. Tais propriedades asseguram que, tal como adiante descrito, possa ser aplicado o método iterativo de Newton-Raphson na determinação do valor numérico da taxa interna de retorno.7 7 Note-se que, como na realidade o método estará sendo iniciado no ponto associado à taxa nula, no qual P(0) P"(0) < 0, não são integralmente satisfeitas as condições ditas de Fourier (veja Sadosky, 18, p. 164-6). Para evitar o problema que poderá ocorrer caso o valor de P"(0) seja excessivamente pequeno (quando, então, o valor de i 1 dado por (8') poderia ser demasiadamente grande), basta tomar para i 1 o menor entre os valores dados por (8') e pelo quociente /S (onde é o maior dos fluxos de caixa Qj, i = 1, ...,n). Isto porque, como mostrado em (6), para i = /S tem-se P( i) < 0 e portanto, nesse ponto, P( i) P"( i) > 0.

Para a aplicação do método, como esquematicamente indicado na figura 1, será tomada, como primeira aproximação, o seguinte valor para a taxa de juros:


ou, observando-se que

dP(i)/di = i (1+i)

vem

A seguir, sucessivamente, até que seja atingida a precisão desejada, far-se-á:8 8 Observe-se que i 1> i 2>...> i*. Para implementação em computador, como tanto P( i) P"( i) são polinômios em x = 1+ i, é conveniente a aplicação do chamado método de Birge-Vieta, que consiste no emprego conjunto do processo de Horner para a determinação de valores numéricos de polinômios e do algoritmo de Newton-Raphson. Para descrições do método de Birge-Vieta, veja, por exemplo, Dorn e McCracken (8, p. 32-5) e Pacitti e Atkinson (17, p. 369-81).

4.2 Exemplos de aplicação

A título de ilustração, considere-se o caso do seguinte projeto de investimento, que chamaremos de C:9 9 Adaptado de Faro (1, p. 69).

[-10, -15, 20, -10, 20]

Como n = 4 e M0(0) = -10, M1(0) = -25, M2(0) = -5, M3(0) = -15, segue-se que este projeto é do tipo investimento puro. Conseqüentemente, observando-se que M4(0) = P(0) = 5, podemos aplicar o método de Newton-Raphson, obtendo-se para a primeira aproximação:

i1= 0,0909, ou 9,09%

Portanto, visto que:

P(i)= -10(1+i)4-15(1+i)3 + 20(1+i)2-10(1+i) + 20

e

P'(i)=dP(i)/di = -40(1+i)3 -45(1+i)2 + 40(1+i)-10

teremos a seguinte seqüência de aproximações:

¡2 = 0,0909 - P(0,0909)/P'(0,0909) 0,0805

¡3 = 0,0805 - P(0,0805)/P'(0,0805) 0,0804

¡4 = 0,0804 - P(0,0804)/P'(0,0804) 0,080393

Como P(0,080393) 0,000032 podemos concluir que, com razoável precisão, a taxa interna de retorno associada ao projeto em apreço é 1* 8,04%.10 10 Procedendo-se de maneira análoga, o leitor poderá verificar que serão necessárias também quatro iterações para determinar que a taxa Interna de retorno associada ao projeto B seja de aproximadamente 20,34% por período.

5. RELAÇÃO COM A CONDIÇÃO DE SUFICIÊNCIA DE NORSTROM

Considerando-se a sucessão de balanços, à taxa nula, de um dado projeto de investimento, forma-se a seguinte seqüência, que é denominada de seqüência de fluxos de caixa cumulativos:11 11 Isso porque, sendo M 0(0) = -5, decorre diretamente de (6) que MK(0) = -S + Qj para k = 1, 2, ..., n.

Contando-se termos nulos como representando continuações de sinal, Norstrom (16) provou que, se houver não mais do que uma variação de sinal na seqüência de fluxos de caixa cumulativos, com o último termo sendo positivo, então ao projeto considerado associar-se-á exatamente uma taxa interna de retorno (positiva). Isto é, o simples exame do número de variações de sinal em (10) provê uma condição de suficiência para a aplicabilidade do critério da taxa interna de retorno.

Com respeito ao caso de interesse específico em nosso estudo, é de conclusão imediata que todo projeto do tipo investimento puro, tal que a soma algébrica de seus fluxos de caixa líquidos seja positiva, satisfaz a condição de suficiência de Norstrom. Entretanto, é fácil verificar, a recíproca não é sempre verdadeira; isto é, o fato de que um projeto qualquer satisfaça a condição de Norstrom não implica, necessariamente, que este seja caracterizado como do tipo investimento puro. Conseqüentemente, quanto à implementação prática do critério da taxa interna de retorno, visto que a condição de suficiência de Norstrom é mais geral do que a relativa à caracterização do projeto como sendo do tipo investimento puro, cabe indagar se o fato de que a primeira tenha sido satisfeita assegura e aplicabilidade do método de Newton-Raphson para a determinação do valor numérico da taxa interna.

Para responder a questão levantada, consideremos o caso do projeto de investimento que chamaremos de D, e cuja seqüência de fluxos de caixa líquidos é:

{-220, 550, -320, 10}

Formando-se a seqüência de fluxos de caixa cumulativos, temos que esta é:

{-220, 330, 10, 20}

Logo, como temos uma só variação de sinal, segue-se que, embora o projeto D não seja do tipo investimento puro, a condição de suficiência de Norstrom é satisfeita. Entretanto, apesar de estar assegurada a existência e unicidade de uma taxa interna de retorno positiva (que é de aproximadamente 61,88% por período), não se pode garantir a aplicação estrita do método de Newton-Raphson para a determinação de seu valor numérico. Isto porque, como esquematicamente ilustrado na figura 2, tanto a função valor atual como a função valor futuro são não monótonas no intervalo de interesse.12 12 Observe-se que, no caso, como a função valor futuro não muda de concavidade, o método poderá ser aplicado tomando-se como ponto de partida a taxa i 1 = /S = 2,5. Todavia, exemplos podem ser construídos tais que a função valor futuro também mude de concavidade na região de interesse.


6. CONCLUSÃO

Para proceder à avaliação econômica de um projeto de investimento segundo o critério da taxa interna de retorno, a primeira providência que deve ser tomada pelo analista é a de assegurar-se da aplicabilidade de tal critério. Na eventualidade em que o projeto considerado seja caracterizado por uma seqüência de fluxos de caixa líquidos com uma ou duas variações de sinal, resultados estabelecidos na literatura garantem,13 13 Veja, por exemplo, a referência (5) para uma descrição dos resultados associados a esses dois casos. a priori, a correta implementação do critério. Para os demais casos, restando ainda o recurso a certos outros resultados,14 14 Em Faro e Soares, referência (6), é efetuado um estudo comparativo entre as diversas condições de suficiência, sendo sugerido um algoritmo conceituai para a implementação do critério. é conveniente que se proceda ao teste da condição de suficiência ne Norstrom; sendo que, se no processo de identificar o número de variações de sinal na seqüência de fluxos de caixa cumulativos, for caracterizado que se trata de um projeto do tipo investimento puro, fica também assegurada a validade da adoção do método de Newton-Raphson na determinação do valor numérico da taxa interna de retorno.

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  • 14. Kaplan, Seymour. A note on a method for precisely determining the uniqueness or non-uniqueness of the internal rate of return for a proposed project. The Journal of Industrial Engineering, v. 16, n. 1, p. 70-1, Jan./Feb. 1965.
  • 15. Computer algorithms for finding exact rates of return. The Journal of Business of the University of Chicago, v. 40, n. 4, p. 389-92, Oct. 1967.
  • 16. Norstrom, Carl J. A sufficient condition fora unique non-negative internal rate of return. Journal of Financial and Quantitative Analysis, v. 7, n. 3, p. 1835-9, June 1972.
  • 18. Sadosky, Manuel. Cálculo numérico y gráfico. 4. ed. Buenos Aires, Librería del Colegio, 1962.
  • 19. Smith, Gerald W. Engineering economy: analysis of capital expenditures. 2 ed. Ames, The Iowa State University Press, 1973.
  • 20. Soper, C. S. The marginal efficiency of capital: a further note. The Economic Journal, v. 69, n. 273 p. 174-7 Mar. 1959.
  • 21. Teichroew, Daniel et alii. Mathematical analysis of rates of return under certainty. Management Science, v. 11, n. 3, p. 395-403, Jan. 1965.
  • 22. Thuesen, H. G. et alii. Engineering economy. 4. ed. Englewood Cliffs, Prentice-Hall, 1971.
  • 23. Uspensky, J. W. Theory of equations. New York, McGraw-Hill, 1948.
  • 1
    Como discutido no item 5, os requisitos matemáticos de existência e unicidade não são exaustivos, pois que, por motivo de caráter econômico, é preciso ainda que se garanta uma avaliação que seja consistente com a resultante da aplicação do chamado método do valor atual, à taxa
    r. Para evitar a possibilidade de tal inconsistência, e resolvendo-se simultaneamente a questão de existência, é necessário que a soma algébrica dos fluxos de caixa seja positiva; para a relevância desta imposição veja as referências (4) e (7).
  • 2
    Observe-se que as hipóteses só serão satisfeitas se
    QN > 0.
  • 3
    Observe-se que, caso contrário, o projeto será, a
    priori, economicamente injustificável, já que a função valor futuro e, portanto, também a função valor atual será negativa para qualquer taxa de juros positiva.
  • 4
    Veja, por exemplo, Uspensky (23, p. 83-4).
  • 5
    Tais como Faro (1, p. 30-1), Fleischer (10, p. 38), Smith (19, p. 128-30) e Thuesen et alii (22, p. 115-6).
  • 6
    Propriedades essas que são relativas à monotonicidade e concavidade da função no intervalo de pesquisa da raiz. Veja Uspensky (23, p. 174-7) para uma interpretação geométrica.
  • 7
    Note-se que, como na realidade o método estará sendo iniciado no ponto associado à taxa nula, no qual
    P(0)
    P"(0) < 0, não são integralmente satisfeitas as condições ditas de Fourier (veja Sadosky, 18, p. 164-6). Para evitar o problema que poderá ocorrer caso o valor de
    P"(0) seja excessivamente pequeno (quando, então, o valor de
    i
    1 dado por (8') poderia ser demasiadamente grande), basta tomar para
    i
    1 o menor entre os valores dados por (8') e pelo quociente
    /S (onde
    é o maior dos fluxos de caixa
    Qj, i = 1, ...,n). Isto porque, como mostrado em (6), para
    i =
    /S tem-se
    P(
    i) < 0 e portanto, nesse ponto,
    P(
    i)
    P"(
    i) > 0.
  • 8
    Observe-se que
    i
    1>
    i
    2>...>
    i*. Para implementação em computador, como tanto
    P(
    i)
    P"(
    i) são polinômios em
    x = 1+
    i, é conveniente a aplicação do chamado método de Birge-Vieta, que consiste no emprego conjunto do processo de Horner para a determinação de valores numéricos de polinômios e do algoritmo de Newton-Raphson. Para descrições do método de Birge-Vieta, veja, por exemplo, Dorn e McCracken (8, p. 32-5) e Pacitti e Atkinson (17, p. 369-81).
  • 9
    Adaptado de Faro (1, p. 69).
  • 10
    Procedendo-se de maneira análoga, o leitor poderá verificar que serão necessárias também quatro iterações para determinar que a taxa Interna de retorno associada ao projeto
    B seja de aproximadamente 20,34% por período.
  • 11
    Isso porque, sendo M
    0(0) = -5, decorre diretamente de (6) que
    MK(0) = -S +
    Qj para
    k = 1, 2, ...,
    n.
  • 12
    Observe-se que, no caso, como a função valor futuro não muda de concavidade, o método poderá ser aplicado tomando-se como ponto de partida a taxa
    i
    1 =
    /S = 2,5. Todavia, exemplos podem ser construídos tais que a função valor futuro também mude de concavidade na região de interesse.
  • 13
    Veja, por exemplo, a referência (5) para uma descrição dos resultados associados a esses dois casos.
  • 14
    Em Faro e Soares, referência (6), é efetuado um estudo comparativo entre as diversas condições de suficiência, sendo sugerido um algoritmo conceituai para a implementação do critério.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      09 Ago 2013
    • Data do Fascículo
      Out 1976
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