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Organização e métodos: uma opção a mais para o desenvolvimento de recursos humanos

COMENTÁRIOS

Organização e métodos: uma opção a mais para o desenvolvimento de recursos humanos* * Baseado em pesquisa realizada em 50 organizações no Estado de São Paulo.

Luis Cesar Gonçalves de Araujo

Professor do Departamento de Administração Geral e Recursos Humanos da Escola de Administração de Empresas de São Paulo da Fundação Getúlio Vargas

A finalidade do comentário é apresentar a função de organização e métodos sob um novo ângulo, i.e., procurar demonstrar que esta função pode contribuir decisivamente para o desenvolvimento da estrutura social das organizações. E o que é mais importante, sem alterar o quadro típico de suas atribuições.

Preliminarmente, o leitor conhecerá a origem do termo O&M e também a sua evolução conceitual que culmina com a indiscutível compatibilização entre organização e métodos e recursos humanos.

1. A ORIGEM

Qual a origem do termo organização e métodos? Essa é uma pergunta que a maioria dos textos específicos não responde. Os estudiosos definem e dão conceitos, estabelecem as técnicas e suas formas de adoção, propõem novas técnicas e as cotejam com as técnicas tradicionais, mas quanto ao traço histórico ou evolutivo pouco se tem falado e escrito. É provável que o caráter de praticidade que envolve O&M seja o maior impedimento para uma análise histórica e compreensiva da função.

A primeira referência a respeito da utilização do termo organização e métodos vem do trabalho desenvolvido por Woodrow Wilson, conforme menciona Benedicto Silva.1 1 Wilson, Woodrow. O estudo da administração. Caderno de Administração Pública, Rio de Janeiro, FGV, 1954. Em 1887, Wilson advogava a idéia de que a administração é o próprio governo em ação, é o ramo executivo aquele que realiza a parte mais visível do governo. Advogou a tradicional separação entre política e administração. Portanto é fácil concluir que Wilson era um entusiasta do estudo da administração. A referência sobre organização e métodos aparece logo no início de seu estudo. Diz Wilson: "... que o chamado movimento de reforma do serviço civil, ora em manobra, uma vez atingido o seu principal objetivo, deverá voltar-se para o aperfeiçoamento não só do pessoal, mas também de organização e métodos de nossas repartições". E, mais à frente, repete: "com efeito, o pessoal, de um lado, e a organização e os métodos, de outro, são por ordem de importância os dois pontos mais carecentes". E, é na Inglaterra que o termo é corporificado em forma de unidade organizacional, conforme o texto de John R. Simpson.2 2 Simpson, John, R. O&M na administração inglesa. Caderno de Administração Pública, Rio de Janeiro, FGV, 1959.

No Brasil, a introdução do termo, baseado na mesma origem, ficou por conta da Escola Brasileira de Administração Pública, da Fundação Getúlio Vargas (EBAP). E isto aconteceu pelas mãos de Harry Miller, em 1951, quando a administração, como ensino e pesquisa era praticamente inexistente. Miller, na época, prestava sua colaboração à EBAP e escreveu, então, o livro que consagrou a si e o rótulo que hoje é largamente adotado.

Embora no Brasil o termo já encontre opositores - e esteja praticamente esquecido nos Estados Unidos - ele permanece na Europa, principalmente na Inglaterra, onde o Bulletin of O&M (encarte do periódico Management Services in Government) permanece como publicação de grande aceitação.

2. EVOLUÇÃO CONCEITUAL

A maioria dos autores não difere muito quando trata de definir e conceituar organização e métodos. Entretanto pode-se sentir alguma diferença, principalmente se for considerada a última conceituação encontrada nos textos e que data de 1971, o que será visto mais adiante. Uma publicação oficial britânica define assim: "O&M é um termo geralmente usado para descrever as atividades de grupos de pessoas no governo e outros corpos públicos... de quem se lhes pede aconselhar a administradores ou gerentes de organização e métodos, com o fim de incrementar a eficiência do trabalho do qual o gerente é responsável, procurando dar um serviço melhor e mais barato".3 3 Her Majesty's Stationery Office. The practice of O&M. London, 1965. Esta definição pode não ser plenamente aceita, pois peca pela generalização e também porque em seu bojo definidor aloca o termo O&M, o que, convenhamos, dificulta o entendimento. Contudo, fornece um dado que é comum a praticamente todas as definições: considera a função ligada à eficiência do trabalho. Por exemplo, a definição dada pelo British Select Committee on Estimates guarda uma relação íntima com a definição dada, sendo, todavia, mais precisa ao fornecer o quadro de referência para a atuação de O&M: "Assegurar a máxima eficiência na ação da maquinaria executiva do governo e, por meio de uma aplicação especializada de métodos científicos à organização, conseguir economia nas despesas e no trabalho." Já Harry Miller mostra uma grande dificuldade ao tentar caracterizar a função.4 4 Miller, Harry. Organização e métodos. 4. ed., Rio de Janeiro, FGV. A dificuldade, diz ele, vem da própria forma pela qual os administradores solicitam a presença do pessoal responsável pela eficiência seja qual for a natureza do problema. A dificuldade de Miller está certamente relacionada com a própria indefinição da definição, i.e., há autores que ao definirem a função provocam um raciocínio segundo o qual organização e métodos pode fazer de tudo e resolver qualquer problema organizacional.

Uma anotação mais recente5 5 Addison, Michael E. Fundamentos de organização e métodos. Rio de Janeiro, Zahar Editores, 1973. (1971) localiza melhor, e dá uma nova roupagem á função, ao dizer que O&M "é uma função especializada que se estabeleceu para aconselhar na introdução de novos métodos de administração e estruturas de organização que reduzam os custos sem impor um esforço insuportável, ou causar danos reais à estrutura social da empresa." A inclusão da estrutura social é, sem dúvida, o marco da identificação da função de O&M com a de recursos humanos.

Considerando as definições postas e principalmente a última, chegamos à conceituação que vincula O&M a recursos humanos: organização e métodos é uma função derivada da administração que em conjunto com a estrutura social da organização dissemina os recursos metodológicos e humanos de que dispõe, no sentido de promover ao racionalizar, organizar e/ou reorganizar, uma mentalidade positiva nos processos de mudanças organizacionais.

A rigor, a definição não foge à linha evolutiva dos estudos da teoria administrativa e das organizações (e nem poderia ser de outra forma). Antes O&M pressupunha o uso da metodologia voltada à racionalização (simplificação) do trabalho, não importando muito o grau de motivação e interesse das pessoas envolvidas. Hoje o comportamento da função não pode ser entendido como conjunto exclusivo de técnicas que são aplicadas pelos analistas com o objetivo de solucionar os problemas indicados por esta ou aquela unidade de trabalho e sim em conjunto com as unidades envolvidas no estudo. Daí a consideração, título deste comentário.

3. O&M E RECURSOS HUMANOS

Os estudiosos da organização foram ao longo de quase um século formulando modelos compreensivos das atividades organizacionais. Da escola clássica partiram para a problemática do relacionamento humano. Agora, estamos frente a integração indivíduo-organização. A necessidade não preenchida, a frustração e o conflito, por exemplo, são ingredientes de um composto maior: o reconhecimento pela organização da necessidade de desenvolver a sua estrutura social, buscando reduzir o grau de incompatibilidade entre o que ela exige e o que o indivíduo pode fornecer (ou vice-versa).

Organização e métodos é uma opção para recursos humanos porque o posicionamento do analista não mais pode ser o de mero elaborador de rotinas, procedimentos, normas e manuais de toda sorte. Isto porque o conjunto de técnicas que o analista de O&M utiliza nos seus estudos deve ser do conhecimento dos envolvidos nos processos de mudança. Como na definição: "... dissemina os recursos metodológicos de que dispõe...".

Uma exemplificação clarifica melhor: o chefe da unidade X responsabiliza o funcionário pela omissão de alguns passos numa determinada rotina que está sendo objeto de estudo do analista de O&M. A tarefa do funcionário foi seguir a solicitação: anotar os passos da rotina e depois enviá-los à unidade de organização e métodos. Por falha, a informação seguiu incompleta. Esta situação é muito comum. As unidades responsáveis pelos processos de racionalização encaminham solicitações, recebem a informação de volta e, finalmente, estabelecermos novos procedimentos. O mesmo acontece quando a análise é estrutural, aumentando, por evidência, o grau de complexidade do estudo.

O que houve neste caso? Simplesmente o analista de O&M utilizou a sua metodologia e só. Se for perguntado ao funcionário o que é uma análise de rotina, um fluxograma ou mesmo o que deve ter originado a sua falha, é possível imaginar-se o grau de incerteza e dificuldade na resposta.

A difusão do conhecimento especializado à estrutura social, sob a forma de esclarecimentos (e ensino) da metodologia adotada, eleva indiscutivelmente a performance da organização (estrutura - recursos humanos - funcionamento).

No exemplo mencionado, comum em grande parte de nossas organizações, a falha do funcionário poderia ter sido evitada se tivesse havido por parte do responsável pelo estudo um comportamento diferente.

No início deste trabalho foi dito que, para que houvesse a compatibilização entre a função de O&M e de recursos humanos, não era necessária a alteração do seu quadro típico de atribuições. Entretanto, é imprescindível que haja um comportamento administrativo orientado no seguinte sentido: a) que O&M atue sempre a nível de assessora mento e, por conseqüência b) seja uma unidade de aconselhamento e c) não tenha autoridade hierárquica; d) que deva prevalecer a autoridade do saber e, portanto, d) a seleção de seu pessoal deve ser feita com base em conhecimentos específicos de análise organizacional.

O atendimento desses requisitos proporcionará à organização e métodos sua melhor integração na organização, ao mesmo tempo em que aumentará o grau de contribuição na formação e adequação dos recursos humanos da organização como um todo.

  • 1 Wilson, Woodrow. O estudo da administração. Caderno de Administração Pública, Rio de Janeiro, FGV, 1954.
  • 2 Simpson, John, R. O&M na administração inglesa. Caderno de Administração Pública, Rio de Janeiro, FGV, 1959.
  • 3 Her Majesty's Stationery Office. The practice of O&M. London, 1965.
  • 4 Miller, Harry. Organização e métodos. 4. ed., Rio de Janeiro, FGV.
  • 5 Addison, Michael E. Fundamentos de organização e métodos. Rio de Janeiro, Zahar Editores, 1973.
  • *
    Baseado em pesquisa realizada em 50 organizações no Estado de São Paulo.
  • 1
    Wilson, Woodrow. O estudo da administração. Caderno de Administração Pública, Rio de Janeiro, FGV, 1954.
  • 2
    Simpson, John, R. O&M na administração inglesa. Caderno de Administração Pública, Rio de Janeiro, FGV, 1959.
  • 3
    Her Majesty's Stationery Office. The practice of O&M. London, 1965.
  • 4
    Miller, Harry. Organização e métodos. 4. ed., Rio de Janeiro, FGV.
  • 5
    Addison, Michael E. Fundamentos de organização e métodos. Rio de Janeiro, Zahar Editores, 1973.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      08 Ago 2013
    • Data do Fascículo
      Ago 1977
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