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Intervention and revolution

RESENHA BIBLIOGRÁFICA

Intervention and revolution

Por Richard J. Barnet. Nova Iorque, The World Publishing Company, 1968.

De acôrdo com o autor, revolução é uma palavra gasta, usada tanto para exaltar o caráter revolucionário dos novos cremes para cabelo, quanto para discutir a violência revolucionária que se alastra no Terceiro Mundo. Para Barnet, esta violência não tem sido adequadamente interpretada e entendida pelos Estados Unidos. Muitas revoluções do Terceiro Mundo têm sido traídas, corrompidas e distorcidas nos seus objetivos. A ambigüidade moral dos movimentos revolucionários tem sido usada pelos Estados. Unidos para justificar uma campanha global para contê-los e esmagá-los. Por este motivo, também a palavra comunista tem sido desgastada pelo seu uso demasiado freqüente e inadequado: tudo o que pode desagradar ao Departamento de Estado é considerado como tal. Existem três tipos de teorias que visam a explicar porque razão os Estados Unidos assumiram a responsabilidade de se opor às revoluções do Terceiro Mundo: a) ideologia oficial da Responsabilidade Americana, da missão civilizadora da América no mundo contemporâneo, da preservação da liberdade e do papel pacificador dos Estados Unidos, b) Teorias que criticam o envolvimento americano no mundo, mas acatam as justificativas desse envolvimento. O idealismo levou a exageros que devem ser contidos e corrigidos, c) Teorias que criticam o envolvimento e os motivos alegados pela ideologia oficial. Ao invés do idealismo excepcional, o principal motivo apontado é o imperialismo econômico.

Embora a argumentação do autor deixe transparecer uma certa preferência pela terceira abordagem, êle procura mostrar que a versão atualizada do modelo tradicional de imperialismo econômico não é suficiente para explicar todos os aspectos de uma política extremamente consistente, regular e sistemática de contenção e oposição a revoluções. Para o autor, torna-se extremamente importante entender como é que funciona a burocracia da segurança nacional Em grande parte, afirma Barnet, a política intervencionista é o resultado direto do desenvolvimento da tecnologia da intervenção.

Uma vez que navios-espiões ou forças de contra-insurreição se encontrem disponíveis, a burocracia daí conclui que o seu uso se torna vital. O comportamento intervencionista do Estado moderno está ligado a uma compulsão burocrática e, tanto quanto possível ao ambiente político do mundo atual, não podendo ser explicado exclusivamente a partir de relações econômicas.

Isto posto, o autor procura mostrar de que forma e, em que medida, ideologia e estratégia política estão relacionadas. O autor não visa a explicar o processo de formação das distintas ideologias anteriormente citadas, mas sim mostrar a importância da ideologia oficial na emergência do comportamento político.

No confronto dos dois mundos - o dos gerentes da segurança nacional e o mundo do revolucionário - existe um elemento comum: a ilusão de que a violência que eles desencadeiam é controlável e que se os objetivos da matança forem alcançados a violência cessará. A violência institucionalizada e disfarçada, vigente tanto nas sociedades subdesenvolvidas quanto na própria sociedade americana, não tem sido reconhecida como tal a não ser pelos revolucionários que desencadeiam violência ativa contra a violência estrutural. O não reconhecimento da violência estrutural impede o gerente da segurança nacional de enfrentar o problema da violência ativa de forma conveniente e adequada.

Por causa disto os Estados Unidos estão forçando a realização da sua própria profecia: os Estados Unidos são vistos como o inimigo comum do Terceiro Mundo e a presença militar dos americanos em tôda parte tem estimulado a solidariedade revolucionária. Esta solidariedade, todavia, não significa, como se entende nos Estados Unidos, a penetração e expansão do comunismo internacional, mas sim a difusão de ideais revolucionários no Terceiro Mundo. O líder guerrilheiro sabe melhor do que ninguém que revoluções propriamente ditas não podem ser exportadas, que elas não têm condições de sucesso, a não ser que recebam o apoio da população local e que as condições socioeconómicas em vigor sejam intoleráveis, sem que exista a possibilidade de lutar pela mudança através de meios pacíficos. A idéia dos Estados Unidos como a polícia do mundo consolidouse durante a Segunda Guerra Mundial e foi posta em prática com a Doutrina Truman e a guerra civil grega, com a Doutrina Eisenhower e a guerra civil libanesa, com a Doutrina Johnson e a intervenção na República Dominicana, e com todas as quatro intervenções dos Estados Unidos no Vietnã, entre muitos outros casos. Todas as situações acima foram brilhantemente analisadas por Richard Barnet, que conclui o livro procurando mostrar que existem regularidades extremamente expressivas nos processos utilizados pelos Estados Unidos com o objetivo de subverter governos tidos como indesejáveis e nos padrões americanos de intervenção direta.

Conclui o autor afirmando que as alegações de uma nação poderosa no sentido de justificar o uso de força e coerção em outros territórios, mesmo sem o consentimento dos seus governantes, não se constitui em uma novidade e uma exceção do ponto de vista histórico. A história dos grandes impérios indica uma grande semelhança e recorrência de mecanismos e comportamentos que objetivem provar as condições especiais de missão e responsabilidade que justificam o uso da força por parte dos poderosos.

Os Estados Unidos vêem como as únicas alternativas à Pax Americana, a Pax Soviética ou a Pax de Pequim. Isto justifica intervenções unilaterais sob a capa do prestígio de um internacionalismo e multilateralismo falso e artificial. Em termos concretos, a comunidade mundial não existe ou é ignorada para efeitos decisorios, a não ser quando chamada, a posteriori, para legitimar decisões irreversíveis. Os argumentos idealistas da defesa da liberdade contra o totalitarismo dificilmente se sustentam, quando se nota que entre os governos livres que recebem generosa ajuda americana, militar ou não, encontram-se os governos de Formosa, Coréia do Sul, Vietnã do Sul, Irã, Paraguai, e muitas ditaduras totalitárias localizadas na periferia da União Soviética e da China Comunista.

A defesa da liberdade não tem levado os Estados Unidos a interferir na área que, de comum acordo com os russos, foi definida como zona de influência da União Soviética. A estratégia da intervenção tem sido modernizada mas o seu caráter básico permanece o mesmo: o apoio de ditaduras de direita em todo o mundo.

A contribuição dos Estados Unidos para a comunidade internacional, ao adotar a estratégia intervencionista, consiste em aumentar grandemente o perigo de uma guerra mundial, quando se dispõe a pagar qualquer preço para resistir, pela força, à revolução.

E não é suprimindo revoluções que o problema do desenvolvimento será resolvido. A ausência de desenvolvimento tem sido preferida em relação a qualquer risco de comunização, por menor que seja este risco. E desenvolvimento implica em mobilização das forças sociais, o que sempre acarreta algum tipo de risco e instabilidade.

Os meios não revolucionários para mudança e desenvolvimento têm sido suprimidos a partir da própria política externa americana e a partir da conduta dos seus clientes.

Por causa disto, seria muito difícil a supressão da política intervencionista a esta altura dos acontecimentos. A supressão da assistência militar é a primeira condição para a mudança da política externa americana. No próprio interesse americano, esta mudança precisa ocorrer, pois, entre outros aspectos, a política intervencionista é autodestrutiva. O atual erro de perspectiva da política americana torna os Estados Unidos uma ameaça aos outros países e a si próprio.

Revolução é uma forma destrutiva e desumana de mudança política, que se torna necessária quando outras alternativas não existem. O custo econômico e humano da guerra civil no Terceiro Mundo é muito grande, mas talvez seja maior ainda o custo econômico e humano quando se evita a revolução, a qualquer preço.

Em suma, uma análise brilhante onde o autor busca, em todos os momentos, superar o bias cultural e o etnocentrismo que informa a maioria dos estudos do mesmo gênero.

JOSÉ PAULO CARNEIRO VIEIRA

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    28 Maio 2015
  • Data do Fascículo
    Dez 1970
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