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CARTOGRAFIA ESTRUTURAL PARA REVISÃO DE LITERATURA: REVELANDO A ESTRUTURA SUBJACENTE DE UMA LITERATURA POR MEIO DE UM ATLAS BIBLIOGRÁFICO

Cartografía estructural para la revisión de literatura: Revelando la estructura subyacente de una literatura por medio de un atlas bibliográfico

RESUMO

Este artigo apresenta os resultados de um estudo em metodologia que determinou um método específico de análise histórica bibliográfica, descrito como cartografia estrutural para revisão de literatura. O método de cartografia estrutural é rigoroso, interdisciplinar e revela a estrutura de uma bibliografia em estudo por meio dos conceitos metodológicos encontrados em pesquisa histórica, pesquisa bibliográfica, teoria dos grafos, análise de índices e redes de citações e cartografia. Pretende-se que o leitor tenha uma ampla compreensão sobre o que é e como se aplica o método de cartografia estrutural. Por fim, serão apresentadas 12 maneiras de se abordar a estrutura de uma literatura utilizando o atlas bibliográfico elaborado por meio da cartografia estrutural para revisão de literatura.

PALAVRAS-CHAVE
Cartografia estrutural; mapeamento da literatura; índice de citações; atlas bibliográfico; revisão de literatura

RESUMEN

Este artículo presenta los resultados de un estudio en metodología que determinó un método específico de análisis histórico bibliográfico, descrito como cartografía estructural para revisión de literatura. El método de cartografía estructural es riguroso e interdisciplinario y permite revelar la estructura de una literatura en estudio a través de los conceptos metodológicos encontrados en investigación histórica, investigación bibliográfica, teoría de los grafos, análisis de índices y redes de citas y cartografía. Se pretende que el lector tenga una amplia comprensión sobre qué es y cómo se aplica el método de cartografía estructural para la revisión de la literatura. Por último, se presentan las doce maneras de abordar la estructura de una literatura utilizando el atlas bibliográfico elaborado a través de la cartografía estructural para revisión de literatura.

PALABRAS CLAVE
Cartografia estrutural; mapas de literatura; índice de citas; atlas bibliográfico; estudio bibliográfico

ABSTRACT

This paper presents the results of a methodological study that established a specific method for historical and bibliographic analysis known as structural cartography for literature review. Structural cartography is a rigorous and interdisciplinary method that reveals the structure of a literature knowledge domain through the methodological notions found in historical research, bibliographic investigation, citation network analysis and cartography. This paper intends to provide readers with a broad understanding of the method of structural cartography for literature review and how to apply it. Finally, this article presents twelve ways of approaching a literature structure by using the bibliographic atlas elaborated by means of structural cartography for literature review.

KEYWORDS
Structural cartography; mapping literature; citation index; bibliographic atlas; literature review

INTRODUÇÃO

Este artigo apresenta um novo método específico e original de análise histórica bibliográfica, descrito como cartografia estrutural para a revisão de literatura. Esse método permite compreender a estrutura histórica temática de um assunto por meio de um modelo visual e figurativo, familiarizando o pesquisador acadêmico com o arcabouço teórico de sua literatura.

Muitos trabalhos acadêmicos na área de Administração dependem de estudos bibliométricos que apresentam, pela revisão de literatura, uma análise descritiva dos referenciais teóricos de um campo do conhecimento em um certo recorte histórico e intentam mapear sua bibliografia (Zhao & Strotmann, 2015Zhao, D., & Strotmann, A. (2015). Analysis and visualization of citation networks. Chapel Hill, NC: Morgan & Claypool Publishers.). Contudo, muitos desses estudos não revelam necessariamente os mapas visuais das relações de referimento, mas apenas expõem uma listagem categorizada numa taxonomia conceitual ou ordenada por indicadores quantitativos (Caldas & Tinoco, 2004Caldas, M., & Tinoco, T. (2004). Pesquisa em gestão de recursos humanos nos anos 1990: Um estudo bibliométrico. RAE-Revista de Administração de Empresas, 44(3), 100-114. doi:10.1590/S0034-75902004000300008
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; Mascena, Figueiredo, & Boaventura, 2013Mascena, K. M. C., Figueiredo, F. C., & Boaventura, J. M. G. (2013). Clusters e APL's: Análise bibliométrica das publicações nacionais no período de 2000 a 2011. RAE-Revista de Administração de Empresas, 53(5), 454-468. doi:10.1590/S0034-75902013000500004
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; Siegler, Biazzin, & Fernandes, 2014Siegler, J., Biazzin, C., & Fernandes, A. R. (2014). Fragmentação do conhecimento científico em administração: Uma análise crítica. RAE-Revista de Administração de Empresas, 54(3), 254-267. doi:10.1590/S0034-759020140302
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). Quando apresentam uma rede mapeando o seu campo do conhecimento, não tratam diretamente das relações entre as referências de sua literatura. Atêm-se, tão somente, a ilustrar redes de associação entre autores, instituições de ensino ou de palavras-chave pesquisadas (Favaretto & Francisco, 2017Favaretto, J. E. R., & Francisco, E. R. (2017). Exploração do acervo da RAE-Revista de Administração de Empresas (de 1961 a 2016) à luz da bibliometria, text mining, rede social e geoanálise. RAE-Revista de Administração de Empresas, 57(4), 365-390. doi:10.1590/s0034-759020170407
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; Oliveira, Shibao, & Godinho, 2016Oliveira, G. C., Neto, Shibao, F. Y., & Godinho, M., Filho. (2016). The state of research on cleaner production in Brazil. RAE-Revista de Administração de Empresas, 56(5), 547-577. doi:10.1590/s0034-759020160508
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).

Além do mais, a realização de estudos de revisão bibliográfica para prover conteúdo teórico para as pesquisas acadêmicas encontra-se prejudicada pelo fato de a natureza da literatura acadêmica ser cada vez mais fragmentada, sobretudo em Administração, como discutido por Siegler et al, 2014Siegler, J., Biazzin, C., & Fernandes, A. R. (2014). Fragmentação do conhecimento científico em administração: Uma análise crítica. RAE-Revista de Administração de Empresas, 54(3), 254-267. doi:10.1590/S0034-759020140302
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. Não surpreende que Ziman, em 1969Ziman, J. M. (1969). Information, communication, knowledge. Nature, 224(25), 318-324., anunciara o prenúncio desse tempo quando clamava "no glory for reviewers", em sua crítica à prática da publicação fragmentada em ciência, à indexação das revistas científicas e ao desprezo aos estudos de revisão. Sabe-se que uma revisão de literatura sofisticada é essencial para fundamentar pesquisas produtivas. Com esse intuito, o método de cartografia estrutural propicia aos pesquisadores a familiarização com o desenvolvimento histórico da literatura de seu interesse, permitindo transformá-la contextualmente em uma linha de pensamento inteligível para arguir, criticar e sintetizar essas informações em um conhecimento público confiável, relevante e rigoroso (Ziman, 1969Ziman, J. M. (1969). Information, communication, knowledge. Nature, 224(25), 318-324.).

Com a aplicação da cartografia estrutural, é possível estabelecer uma cronologia entre obras literárias e revelar objetivamente as principais correspondências entre elas por meio de um índice de citações e de um atlas bibliográfico, composto por mapas e diagramas. Esse método para revisão de literatura distingue-se dos estudos bibliométricos habituais, essencialmente focados na quantificação de dados sobre publicações (Favaretto & Francisco, 2017Favaretto, J. E. R., & Francisco, E. R. (2017). Exploração do acervo da RAE-Revista de Administração de Empresas (de 1961 a 2016) à luz da bibliometria, text mining, rede social e geoanálise. RAE-Revista de Administração de Empresas, 57(4), 365-390. doi:10.1590/s0034-759020170407
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; Siegler et al., 2014Siegler, J., Biazzin, C., & Fernandes, A. R. (2014). Fragmentação do conhecimento científico em administração: Uma análise crítica. RAE-Revista de Administração de Empresas, 54(3), 254-267. doi:10.1590/S0034-759020140302
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), e oferece literalmente mapas sobre a estrutura de uma literatura.

O objetivo deste artigo é apresentar o estudo metodológico interdisciplinar sobre o método de cartografia estrutural, expondo ao leitor as noções preliminares encontradas nas áreas de: (i) pesquisa bibliográfica, (ii) pesquisa histórica e (iii) análise dos índices de citações e de suas respectivas redes. As definições dos novos princípios e noções aplicados ao método de cartografia estrutural para revisão de literatura são estabelecidas com base na análise "Mutual Methodological Critique" proposto por Abbott (2004, pp. 75-79)Abbott, A. (2004). Methods of discovery: Heuristics for social sciences. New York, NY: W.W.Norton & Company..

Assim, na primeira parte do artigo, discute-se o referencial teórico do método de cartografia estrutural. Na segunda, são apresentados os mapas que compõem o atlas bibliográfico, bem como as diretrizes para a elaboração de um índice de citações a partir do estudo sobre a emergência dos "Problem Structuring Methods" de 1950 a 1989, na literatura da área de Pesquisa Operacional (Georgiou & Heck, 2017Georgiou, I., & Heck, J. (2017). Problem structuring methods, 1950s-1989: An atlas of the journal literature. Recuperado de https://dx.doi.org/10.2139/ssrn.3077648
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). O leitor terá, portanto, ampla compreensão do significado e da aplicação desse novo método.

ESTUDO METODOLÓGICO SOBRE O MÉTODO DE CARTOGRAFIA ESTRUTURAL

O método de cartografia estrutural para revisão de literatura foi elaborado para o mapeamento exploratório de redes de citações com o objetivo de desvendar a estrutura subjacente de uma bibliografia ideal, composta de textos e documentos considerados clássicos e de todas as principais contribuições que fundamentam um campo do conhecimento. A estrutura subjacente de uma literatura é aquela definida na representação de redes de citações, elaboradas a partir das referências bibliográficas que expõem as conexões entre elas, revelando conceitos cedidos, referências cruzadas ou formulações paralelas, próprios da coesão de um campo do conhecimento.

O estudo metodológico proposto foi definido para compreender a estrutura da história temática de um assunto específico de uma literatura, por meio da elaboração de um atlas bibliográfico, com base na análise de redes de citações. Dessa forma, a definição dos elementos constituintes da rede de citações deve atender a certas noções preliminares, pertencentes: (i) à natureza da pesquisa bibliográfica, (ii) às proposições para uma abordagem histórica e (iii) à representação visual das partes estruturais dos mapas constituintes de um atlas bibliográfico. Isso posto, os procedimentos metodológicos do método de cartografia estrutural foram definidos em três vertentes.

A primeira trata da análise bibliográfica proposta na área de Pesquisa Educacional (Boote & Beile, 2005Boote, D., & Beile, P. (2005). Scholars before researchers: On the centrality of the dissertation literature review in research preparation. Educational Researcher, 34(6), 3-15. doi:10.3102/0013189X034006003
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; Hart, 1998Hart, C. (1998). Doing a literature review: Releasing the social science research imagination. London, UK: Sage.) como instrumento complementar para o uso das informações contidas nos textos. A segunda vertente é a utilização de uma abordagem histórica baseada no conceito de história temática proposto por Holton (1996aHolton, G. (1996a). The role of themata in science. Foundation of Physics, 26(4), 453-465. doi:10.1007/BF02071215
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, 1996b)Holton, G. (1996b). Understanding the history of science. In G. Holton (Ed.), Einstein, history and other passions: The rebellion against science at the end of the twentieth century (pp. 103-121). Woodbury, NY: AIP Press.. Finalmente, a terceira é o mapeamento exploratório longitudinal de redes de citações, com fundamento na área da Matemática, conhecida como Teoria dos Grafos (Harary, 1969Harary, F. (1969). Graph theory. Boston, MA: Addison-Wesley.), e na da Organização da Informação, denominada análise de índices de citações, conforme sugerido por Garfield (1979)Garfield, E. (1979). Citation indexing: Its theory and application in science, technology, and humanities. Chichester, UK: Wiley..

Primeira vertente: o contexto da pesquisa bibliográfica no ambiente acadêmico

A pesquisa bibliográfica é uma das formas mais antigas de pesquisa, especialmente no que diz respeito à revisão de literatura. Vale lembrar que o filósofo grego Aristóteles expôs que é necessário o exame histórico-crítico do pensamento dos filósofos que o precederam para fundamentar a base teórica de sua sophis, "ciência das causas primeiras". Em outras palavras, a revisão de literatura é essencial para estabelecer as bases teóricas de uma área do conhecimento.

Logo, a revisão de literatura representa o trabalho mais importante do processo de pesquisa teórica e empírica do pesquisador acadêmico (Boote & Beile, 2005Boote, D., & Beile, P. (2005). Scholars before researchers: On the centrality of the dissertation literature review in research preparation. Educational Researcher, 34(6), 3-15. doi:10.3102/0013189X034006003
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; Combs, Bustamante, & Onwuegbuzie, 2010Combs, J., Bustamante, R., & Onwuegbuzie, A. (2010). An interactive model for facilitating development of literature reviews. International Journal of Multiple Research Approaches, 4(2), 159-182. doi:10.5172/mra.2010.4.2.159
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; Onwuegbuzie, Leech, & Collins, 2012Onwuegbuzie, A., Leech, N., & Collins, K. (2012). Qualitative analysis techniques for the review of the literature. The Qualitative Report, 17(28), 1-28.). Como observado por Boote e Beile (2005)Boote, D., & Beile, P. (2005). Scholars before researchers: On the centrality of the dissertation literature review in research preparation. Educational Researcher, 34(6), 3-15. doi:10.3102/0013189X034006003
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, "uma revisão de literatura completa e sofisticada é a fundamentação e a inspiração para uma pesquisa substancial e útil" (p. 3). Tal revisão de literatura é frequentemente compreendida como uma etapa central da pesquisa sobre o tema em estudo.

Contudo, desde o final da década de 1990, estudiosos da área de Pesquisa Educacional vêm percebendo que há um desequilíbrio no conteúdo das teses de doutorado em Ciências Sociais, nas quais a ênfase dada às pesquisas empíricas se sobrepõe à dos estudos teóricos acadêmicos (Boote & Beile, 2005Boote, D., & Beile, P. (2005). Scholars before researchers: On the centrality of the dissertation literature review in research preparation. Educational Researcher, 34(6), 3-15. doi:10.3102/0013189X034006003
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). Em particular, estudos mostram que as pesquisas de pós-graduação são fortemente concentradas em coleta de dados e subsequente análise dessas informações relativas aos problemas de pesquisa, negligenciando os estudos teóricos do campo de conhecimento em análise (Alton-Lee, 1998Alton-Lee, A. (1998). A troubleshooter's checklist for prospective authors derived from reviewers' critical feedback. Teaching and Teacher Education, 14(8), 887-890. doi:10.1016/S0742-051X(98)90000-2
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; Grant & Graue, 1999Grant, C., & Graue, E. (1999). (Re)viewing a review: A case history of the Review of Educational Research. Review of Educational Research, 69(4), 384-396.).

Isso posto, por que os estudos teóricos, como pesquisa de pós-graduação, estão sendo preteridos em favor das pesquisas empíricas? Grande parte desses estudos é exclusivamente baseada em pesquisa bibliográfica e análise dos documentos coletados, como a revisão de literatura, e exige, segundo Ziman (1969)Ziman, J. M. (1969). Information, communication, knowledge. Nature, 224(25), 318-324., muito tempo, alto grau de rigor e devoção para revisar e sintetizar criticamente um campo de conhecimento. Ora, caso falte isso, a definição do problema de pesquisa, a exploração dos argumentos para análise e a organização das ideias a serem discutidas ficam pouco claras e sem refinamento (Hart, 1998Hart, C. (1998). Doing a literature review: Releasing the social science research imagination. London, UK: Sage.; Hjorland, 1988Hjorland, B. (1988). Information retrieval in psychology: Implications of a case study. Behavioral & Social Sciences Librarian, 6(3-4), 39-64. doi:10.1300/J103v06n03_03
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; Holbrook, Brouke, Faibairn, & Lovat, 2007Holbrook, A., Bourke, S., Fairbairn, H., & Lovat, T. (2007). Examiner comment on the literature review in Ph.D. theses. Studies in Higher Education, 32(3), 337-356. doi:10.1080/03075070701346899
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).

Esse fenômeno não se limita às pesquisas de pós-graduação; abrange também as publicações de artigos acadêmicos, em que a literatura que suporta a fundamentação teórica é insuficiente, cronologicamente limitada ou até mesmo anacrônica e dissociada do estudo empírico (Alton-Lee, 1998Alton-Lee, A. (1998). A troubleshooter's checklist for prospective authors derived from reviewers' critical feedback. Teaching and Teacher Education, 14(8), 887-890. doi:10.1016/S0742-051X(98)90000-2
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). Assim, a concepção de pesquisas empíricas como a solução para utilizar uma rasa e deficiente bibliografia tornou-se um dos formatos mais comuns em estudos acadêmicos. Os dados e as hipóteses estabelecidas a priori passaram a ser a base da definição da pergunta teórica de pesquisa. Em vez de o pesquisador acadêmico estudar profundamente a área de interesse para estabelecer uma pergunta de pesquisa relevante, ele vislumbra, em um conjunto de dados disponível, a possibilidade de definir hipóteses a serem testadas, com a aplicação de algum método quantitativo ou qualitativo para comprovar essas hipóteses definidas previamente. Entende-se isso como a colocação de alguma teoria em cima dos dados coletados, devido à falta de discussão mais aprofundada das perspectivas teóricas (Alton-Lee, 1998Alton-Lee, A. (1998). A troubleshooter's checklist for prospective authors derived from reviewers' critical feedback. Teaching and Teacher Education, 14(8), 887-890. doi:10.1016/S0742-051X(98)90000-2
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).

Nesse contexto, Boote e Beile (2005)Boote, D., & Beile, P. (2005). Scholars before researchers: On the centrality of the dissertation literature review in research preparation. Educational Researcher, 34(6), 3-15. doi:10.3102/0013189X034006003
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argumentam que "estudantes de doutorado devem ser acadêmicos antes de serem pesquisadores" (p. 11), uma vez que "pesquisadores 'não tão bem-sucedidos' talvez nunca tenham aprendido a desenvolver questões produtivas para suas pesquisas por terem uma compreensão superficial dos problemas inerentes aos seus campos de conhecimento" (p. 11). Com poucas exceções, o ensino dos métodos bibliográficos, que presumidamente explicitam um problema de pesquisa emanado dessa literatura, limita-se a, no máximo, um capítulo nos livros de referência em estudos metodológicos (Boote & Beile, 2005Boote, D., & Beile, P. (2005). Scholars before researchers: On the centrality of the dissertation literature review in research preparation. Educational Researcher, 34(6), 3-15. doi:10.3102/0013189X034006003
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; Onwuegbuzie et al., 2012Onwuegbuzie, A., Leech, N., & Collins, K. (2012). Qualitative analysis techniques for the review of the literature. The Qualitative Report, 17(28), 1-28.). Nesse sentido, a área de Pesquisa Educacional vem constantemente alertando que revisões aprofundadas e mais sofisticadas de literatura representam a fundamentação e a inspiração para pesquisas substanciais (Alton-Lee, 1998Alton-Lee, A. (1998). A troubleshooter's checklist for prospective authors derived from reviewers' critical feedback. Teaching and Teacher Education, 14(8), 887-890. doi:10.1016/S0742-051X(98)90000-2
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; Boote & Beile, 2005Boote, D., & Beile, P. (2005). Scholars before researchers: On the centrality of the dissertation literature review in research preparation. Educational Researcher, 34(6), 3-15. doi:10.3102/0013189X034006003
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; Hart, 1998Hart, C. (1998). Doing a literature review: Releasing the social science research imagination. London, UK: Sage.).

Mas o que é uma revisão de literatura mais sofisticada? Segundo Alton-Lee (1998)Alton-Lee, A. (1998). A troubleshooter's checklist for prospective authors derived from reviewers' critical feedback. Teaching and Teacher Education, 14(8), 887-890. doi:10.1016/S0742-051X(98)90000-2
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, os autores acadêmicos devem, sobretudo, questionar e criticar os documentos bibliográficos que compõem sua revisão de literatura e sempre esclarecer possíveis confusões conceituais que possam existir em seu arcabouço teórico. Para Boote e Beile (2005)Boote, D., & Beile, P. (2005). Scholars before researchers: On the centrality of the dissertation literature review in research preparation. Educational Researcher, 34(6), 3-15. doi:10.3102/0013189X034006003
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, desenvolver "revisões de literatura mais sofisticadas", apesar das dificuldades, é compartilhar metodologias de geração de conhecimento com outros campos do conhecimento, como a utilização de métodos de pesquisa em História, para abranger, de maneira rigorosa, o contexto histórico de uma literatura em estudo, ou utilizar-se das análises de redes de citações para poder aprofundar o entendimento entre as relações estruturais dessa literatura. Vale enfatizar que uma das dificuldades existentes em pesquisa bibliográfica, e principalmente na revisão de literatura, é a de mapeamento (Hart, 1998Hart, C. (1998). Doing a literature review: Releasing the social science research imagination. London, UK: Sage.). Avaliando-se as práticas de revisão de literatura, é possível definir o mapeamento estrutural dessa revisão como uma das 11 atividades listadas por Hart (1998)Hart, C. (1998). Doing a literature review: Releasing the social science research imagination. London, UK: Sage., denominada "compreender a estrutura do assunto" (p. 27). Contudo, passados quase 20 anos da elaboração dessa listagem, Boote e Beile (2005)Boote, D., & Beile, P. (2005). Scholars before researchers: On the centrality of the dissertation literature review in research preparation. Educational Researcher, 34(6), 3-15. doi:10.3102/0013189X034006003
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observam que essa atividade é a única "ambígua para se operacionalizar e avaliar" (p. 13).

Há dois motivos para essa ambiguidade: o primeiro é de ordem semântica, pois a própria literatura sobre pesquisa bibliográfica utiliza os termos "mapa" e "mapeamento" com significados metafóricos, que normalmente não se referem à definição cartográfica da representação física e visual do objeto "mapa"; e o segundo, de ordem prática, versando sobre a escolha de qual mapa ou quais mapas representariam a estrutura de uma bibliografia. Assim, o entendimento sobre a atividade de "compreender a estrutura do assunto" não conseguiu ser operacionalizado, e ainda falta consenso no meio acadêmico para definir seus critérios. Isso posto, a aplicação do método de cartografia estrutural para revisão de literatura tem como objetivo operacionalizar tal atividade.

Segunda vertente: sobre a perspectiva da pesquisa histórica

As pesquisas históricas são frequentemente realizadas para explicar características específicas de algumas áreas do conhecimento, descrever como elas se desenvolveram e, ainda, determinar quais foram as suas origens. Dessa maneira, é importante compreender como seria o uso da pesquisa histórica na determinação de um método de cartografia estrutural. Normalmente, a narrativa histórica é caracterizada como simples encadeamento de ideias ou de fatos. Contudo, a análise histórica da construção do arcabouço teórico exige métodos rigorosos. Apesar de existirem inúmeras abordagens metodológicas em História, Higham, (1989)Higham, J. (1989). History: Professional Scholarship in America. Baltimore, MD: Johns Hopkins University Press. em seu livro seminal "History: Professional Scholarship in America", sugere que "aquele que quer aprender a estudar história, precisa acompanhar os trabalhos de um historiador e conhecer as dificuldades desse em realizar seus estudos" (p. 5). Por isso, optou-se por adotar como perspectiva de pesquisa histórica para sustentar esse estudo metodológico a do historiador Holton, baseada na história temática, ou "Themata" (Holton, 1996aHolton, G. (1996a). The role of themata in science. Foundation of Physics, 26(4), 453-465. doi:10.1007/BF02071215
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, 1996b)Holton, G. (1996b). Understanding the history of science. In G. Holton (Ed.), Einstein, history and other passions: The rebellion against science at the end of the twentieth century (pp. 103-121). Woodbury, NY: AIP Press..

Na década de 1960, a análise temática foi introduzida como método de pesquisa histórica em ciência para entender o sucesso ou fracasso de projetos de pesquisas científicas (Holton, 1996aHolton, G. (1996a). The role of themata in science. Foundation of Physics, 26(4), 453-465. doi:10.1007/BF02071215
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, 1996b)Holton, G. (1996b). Understanding the history of science. In G. Holton (Ed.), Einstein, history and other passions: The rebellion against science at the end of the twentieth century (pp. 103-121). Woodbury, NY: AIP Press.. Segundo o professor Gerald Holton (1996a)Holton, G. (1996a). The role of themata in science. Foundation of Physics, 26(4), 453-465. doi:10.1007/BF02071215
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, o desenvolvimento da ciência tem como motivador o papel temático básico de pressuposições na definição das pesquisas científicas.

Para compreender as motivações que levaram um cientista a desenvolver suas pesquisas, é necessário estudar os eventos do período nascente de seu trabalho ou de sua obra. Assim, a análise temática identifica o mapa particular de vários temas e/ou eventos, que, "como impressões digitais, podem caracterizar um cientista individual ou parte de uma comunidade científica em um dado momento no tempo" (Holton, 1996aHolton, G. (1996a). The role of themata in science. Foundation of Physics, 26(4), 453-465. doi:10.1007/BF02071215
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, p. 457). Portanto, a abordagem temática como método histórico vai ao encontro da primeira vertente do método, que é "compreender a estrutura" da literatura. Segundo Holton (1996b)Holton, G. (1996b). Understanding the history of science. In G. Holton (Ed.), Einstein, history and other passions: The rebellion against science at the end of the twentieth century (pp. 103-121). Woodbury, NY: AIP Press., para entender a história da Ciência, é necessário: (a) compreender completamente os principais eventos individuais na história de uma ciência; e (b) ver as interligações/conexões entre esses principais eventos.

Entende-se por eventos não construtos ou construções especulativas, mas sim uma publicação científica ou uma declaração seminal, como o pronunciamento de Niels Bohr sobre o Princípio da Complementaridade, no Seminário de Como, na Itália, em 1927, sendo o evento que influenciou toda a área da Mecânica Quântica (Beller, 1999Beller, M. (1999). Quantum dialogue: The making of a revolution. Chicago, IL: The University of Chicago Press.). Por isso, é importante ater-se ao conteúdo dessas publicações científicas (ou seja, desses eventos) para evitar o erro de conceber conceitos ou ideias que não representam a base teórica de um campo do conhecimento.

E como seria possível o mapeamento de um campo de conhecimento definir os eventos constituintes de sua história? Alguns trabalhos bibliográficos, como o de Price (1965)Price, D. S. (1965). Networks of scientific papers. Science, 149(3683), 510-515. doi:10.1126/science.149.3683.510
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e o de Goodman (1971)Goodman, E. (1971). Citation analysis as a tool in historical study: A case study based on F.C. Donders and mental reaction times. Behavioral Sciences, 7(2), 187-191. doi:10.1002/1520-6696(197104)7:2<187::AID-JHBS2300070209>3.0.CO;2-G
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, com certas diferenças técnicas, utilizaram-se da análise de citações como ferramenta para estabelecer uma abordagem metodológica para estudos históricos. No método de cartografia estrutural, os principais "eventos" são documentos como artigos científicos, e as "conexões" são as citações. Dessa maneira, é possível utilizar a análise de índices de citações e suas redes bibliográficas como ferramentas para o estudo histórico do método.

Terceira vertente: as características gerais dos índices e redes de citações

Os conceitos e as características da teoria dos índices de citações e suas aplicações em redes bibliográficas foram elaborados por meio da teoria sobre a Organização da Informação, do cientista e linguista americano Eugene Garfield, nas décadas de 1960 e 1970. Garfield vislumbrou a utilidade dos índices de citações como nova abordagem para classificar a literatura científica (Garfield, 1973Garfield, E. (1973). Historiographs, librarianship, and the history of science. In C. Rawski (Ed.), Toward a theory of librarianship: Papers in honor of Jesse Hauk Shere (pp. 380-402). Metuchen, NJ: Scarecrow Press., 1979Garfield, E. (1979). Citation indexing: Its theory and application in science, technology, and humanities. Chichester, UK: Wiley.). Com essa visão, ele expôs os diversos aspectos da análise de citações em sua obra "Citation indexing: Its theory and application in science, technology, and humanities" (Garfield, 1979Garfield, E. (1979). Citation indexing: Its theory and application in science, technology, and humanities. Chichester, UK: Wiley.), demonstrando que as redes bibliográficas são ferramentas apropriadas para realizar pesquisas bibliográfica em um campo de estudo científico, além de servirem de modelo para estudar a estrutura da ciência.

Os índices de citações estabelecem uma conexão entre eventos individuais importantes, ocorridos em certo campo de estudo, em diferentes épocas. Assim, a análise das relações entre as referências e as citações apresenta uma característica cronológica intrínseca ao índice, que revela os acontecimentos relativos a uma ideia dentro de uma perspectiva histórica caracterizados por uma rede bibliográfica (Garfield, 1973Garfield, E. (1973). Historiographs, librarianship, and the history of science. In C. Rawski (Ed.), Toward a theory of librarianship: Papers in honor of Jesse Hauk Shere (pp. 380-402). Metuchen, NJ: Scarecrow Press.). Estudos sobre as relações entre citações por meio de redes bibliográficas revelam visões diferentes sobre a ciência, apresentando de forma gráfica um desenho histórico de determinado desenvolvimento científico (Garfield, 1973Garfield, E. (1973). Historiographs, librarianship, and the history of science. In C. Rawski (Ed.), Toward a theory of librarianship: Papers in honor of Jesse Hauk Shere (pp. 380-402). Metuchen, NJ: Scarecrow Press.). Assim, a rede bibliográfica é um modelo conciso, figurativo e de fácil análise. A compreensão da estrutura dos eventos históricos faz-se de maneira completa e rigorosa, em virtude da objetividade exigida pelas técnicas da Teoria dos Grafos e das análises de redes. O mapeamento de redes representa uma tentativa mais sofisticada do uso da análise de citações para definir a estrutura da ciência em uma escala importante e em um nível de detalhamento necessários para a determinação de políticas na área de pesquisa e desenvolvimento científico (Garfield, 1979Garfield, E. (1979). Citation indexing: Its theory and application in science, technology, and humanities. Chichester, UK: Wiley.), como o estudo de Small e Griffith (1974)Small, H., & Griffith, B. (1974). The structure of scientific literature I: Identifying and graphing specialties. Science Studies, 4(1), 17-40..

Esse estudo foi definido para testar duas hipóteses. A primeira é a de que a ciência é feita de estruturas de especialidades. A segunda é a de que uma citação particular mede o interesse intelectual comum entre dois documentos (fonte de referência e referência citada). A medida utilizada para verificar as duas hipóteses foi a cocitação, uma reversão do conceito de pareamento bibliográfico (ou "coupling") de Kessler (1963)Kessler, M. (1963). Bibliographic coupling between scientific papers. American Documentation, 14(1), 10-25. doi:10.1002/asi.5090140103
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. Outra análise usual para apresentar estudos sobre mapeamento da estrutura científica é a análise do caminho principal (ou "main path analysis"), definida inicialmente por Hummon e Doreian (1989)Hummon, N. P., & Doreian, P. (1989). Connectivity in a citation network: The development of DNA theory. Social Networks, 11(1), 39-63. doi:10.1016/0378-8733(89)90017-8
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. A ideia dessa análise é encontrar, dentro da rede bibliográfica, uma lista concisa de documentos, entre todas as referências, que formaria um núcleo de conhecimento da área em estudo e que percorreria toda a extensão da rede.

Por fim, outro aspecto básico sobre a característica dos índices e redes de citações é que ambos não dizem nada sobre o conteúdo das referências citadas. Por isso, é imprescindível que o pesquisador acadêmico considere como critério de seletividade no referimento o conteúdo do documento que será referenciado como base para seus argumentos. Na conjuntura atual, nota-se a disseminação do uso de algoritmos de elaboração de índices de citações (e, como resultado, a construção de redes bibliográficas), que se utilizam de pesquisa em base de dados apenas por palavras-chave, sem assumir nenhum critério de seleção para extrair as fontes de referência básicas pelo seu conteúdo. As consequências são graves, os erros de interpretação são comuns e os abusos, ainda maiores, sobretudo em subáreas das Ciências Sociais ou Ciências Humanas (Cronin & Sugimoto, 2014Cronin, B., & Sugimoto, C. (2014). Beyond bibliometrics: Harnessing multidimensional indicators of scholarly impact. Cambridge, USA: MIT Press.). Nesse contexto, o método de cartografia estrutural pressupõe que a análise das fontes de referência e referências citadas na elaboração de seu respectivo índice seja realizada manualmente, sem o auxílio de algoritmos computacionais, mas pela leitura do conteúdo de cada artigo, familiarizando o acadêmico com a bibliografia de sua área de conhecimento.

CARTOGRAFIA ESTRUTURAL PARA REVISÃO DE LITERATURA

As três vertentes caracterizadas pelo estudo metodológico (a pesquisa bibliográfica, a abordagem histórica e a análise dos índices e redes de citações) não definem somente o método de cartografia estrutural como um conjunto de mapas, mas também lhe dão amplitude, provendo:

  • uma carta da literatura de acordo com uma estrutura esquemática;

  • um meio pelo qual podem ser explicados não apenas os eventos, mas suas relações; não apenas os fatos, mas a natureza de sua evolução por meio de conceitos cedidos, referências cruzadas e formulações paralelas;

  • uma unidade de mapas visuais para interpretar e dar significado a uma literatura;

  • ou seja, um atlas bibliográfico.

Um atlas organiza os documentos constitutivos de uma área do conhecimento com o intuito de esclarecer os seus princípios, pensamentos, conceitos gerais ou novas ideias. Ele junta duas noções, de enciclopédia e de exposição, conforme o esquema estrutural no qual os mapas são criados, desenhados e ordenados. Portanto, entende-se que o atlas é mais que uma mera coleção de mapas. Trata-se de uma forma organizada de interpretar e dar sentido a uma área do conhecimento, registrando o seu acervo documental e incorporando as atividades de criação, tanto artística da exposição visual quanto intelectual do arranjo documental (Akerman, 1991Akerman, J. R. (1991). On the shoulders of a titan: Viewing the world of the past in atlas structure (Doctoral thesis, Department of Geography, Graduate School, Pennsylvania State University, Pennsylvania, USA).).

Nesse sentido, o método de cartografia estrutural para revisão de literatura não produz apenas mapas. O resultado da aplicação desse método é um atlas bibliográfico organizado por meio de várias cartas e constituído de três partes que são acompanhadas de tabelas e diagramas. Logo, esse método mapeia, de fato, a estrutura da literatura da mesma forma que um atlas mapeia a cartografia mundial.

Na sua primeira parte, o atlas bibliográfico apresenta uma visão panorâmica abrangente do que seria o mapa-múndi da literatura, na qual se vê a macroestrutura da literatura de maneira histórica e temática. Nessa parte, ele traz também as estatísticas descritivas com tabelas matriciais. Em uma segunda parte, o atlas bibliográfico expõe os mapas particulares sobre as fontes de referência e as referências citadas. Por último, na terceira parte, ele apresenta os mapas dos periódicos científicos e as respectivas autorias. Desse modo, as análises exploratórias da rede das relações entre autor e periódico permitem visualizar a disseminação de conceitos e ideias de uma literatura e quais autores influenciaram essa divulgação.

Do mapeamento exploratório longitudinal das redes de citações

O mapeamento exploratório de redes de citações é realizado pela construção de redes, que são estruturas matemáticas de grafos direcionados, ou digrafos, nos quais a relação entre dois vértices tem uma direção representada por um arco (Harary, 1969Harary, F. (1969). Graph theory. Boston, MA: Addison-Wesley.). Além de essas redes serem grafos direcionados, elas são acíclicas, o que significa que não têm ciclos direcionados, pois um artigo científico publicado posteriormente a outro não pode ser citado por esse último.

A primeira etapa para a construção dessas redes é a elaboração do índice de citações a partir das fontes de referência e referências citadas. A segunda etapa é a estruturação das informações obtidas no índice, em planilhas do Microsoft Excel, de modo a poder manuseá-las em "software" de construção de redes, como o Pajek, um programa gratuito especializado na construção de redes (De Nooy, Mrvar, & Batagelj, 2011De Nooy, W., Mrvar, A., & Batagelj, V. (2011). Exploratory social network analysis with Pajek. 2nd ed. Cambridge: Cambridge University Press.). A estruturação dos dados visa codificar os vértices (documentos/artigos), os arcos (citações), os autores e os periódicos científicos. Além disso, codificam-se, também, indicadores temporais. Em seguida, realiza-se a construção em si da rede principal e da rede bipartida autor/periódico. Dessas duas redes, é possível extrair sub-redes para análises longitudinais (Georgiou & Heck, 2015Georgiou, I., & Heck, J. (2015). Longitudinal exploratory citation network analysis: An atlas-based methodology. Recuperado de https://dx.doi.org/10.2139/ssrn.2755389
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). Por último, em uma terceira etapa, realizam-se as análises exploratórias a partir dos mapas e diagramas obtidos nesse mapeamento.

Os procedimentos operacionais e cartográficos serão apresentados e ilustrados para fins didáticos com o exemplo da elaboração do índice de citações e do atlas bibliográfico do estudo sobre a unidade conceitual dos "Problem Structuring Methods" (PSMs) de 1950 a 1989, na literatura da área de Pesquisa Operacional (Georgiou & Heck, 2017Georgiou, I., & Heck, J. (2017). Problem structuring methods, 1950s-1989: An atlas of the journal literature. Recuperado de https://dx.doi.org/10.2139/ssrn.3077648
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).

Primeira etapa: elaboração de um índice de citações

A elaboração de um índice de citações é constituída de duas fases: (i) levantamento das fontes de referência para compor o índice de fontes de referência e (ii) vinculação das fontes de referência com as suas respectivas referências citadas para formar o índice de referência citadas.

Na primeira fase, sugere-se que o levantamento preliminar utilizado para obter as fontes de referência básicas não seja apenas definido por assunto, mas também, por exemplo, por meio de uma lista de autores conhecidos na área em estudo (Garfield, 1979Garfield, E. (1979). Citation indexing: Its theory and application in science, technology, and humanities. Chichester, UK: Wiley.). O escopo do levantamento preliminar das fontes de referência básicas no estudo dos PSMs foi definido a partir dos seguintes critérios:

  • A seleção dos documentos abrange apenas artigos científicos que foram avaliados por meio da revisão pelos pares.

  • Os termos considerados para o levantamento dos documentos foram definidos: (i) por assuntos como "Problem Structuring Methods" (PSMs), "Soft Systems Methodology" (SSM), "Strategic Options Development and Analysis" (SODA), "Strategic Choice Approach" (SCA) e "Robustness Analysis" (RA) e (ii) pelos principais autores da área de PSMs, sendo esses Checkland, Eden, Friend, Rosenhead e Mingers.

  • As bases de dados digitais externas utilizadas no levantamento foram EBSCO, Scopus-Elsevier, Thomson Reuters e a ferramenta de busca especializada em documentos científicos Google Scholar.

  • O horizonte temporal definido nesse levantamento foi de 1950 até 1989, período nascente dos PSMs que culminou com a publicação da obra sobre o tema, "Rational Analysis for a Problematic World" (Rosenhead, 1989Rosenhead, J. (1989). Rational analysis for a problematic world: Problem structuring methods for complexity, uncertainty and conflict. Chichester, UK: Wiley.).

O resultado dessa fase é uma lista de artigos que formam o índice de fontes de referência. Nesse momento, esse índice deverá ser codificado, para fins de identificação (Id e denominação), e segmentado em categorias, como autor, ano de publicação, título, periódico e atributo complementar (Tabela 1). A categoria atributo complementar tem por objetivo enriquecer qualitativamente as informações sobre esses documentos. Nesse sentido, esses atributos complementares conceituais foram categorizados como: TP (ou "theoretical precedent") para artigos de precedente teórico para a formação dos PSMs, PSMG para aqueles nos quais os PSMs são apresentados de modo geral, SSM para artigo específico sobre "Soft System Methodology", SODA para artigos sobre "Strategic Options Development and Analysis", SCA para artigos sobre "Strategic Choice Approach", RA para artigos sobre "Robustness Analysis" e NA para artigos "não apropriados", que não atendem ao escopo do levantamento das referências (Tabela 1).

Tabela 1
Exemplo de codificação para um índice de fontes de referência

Na segunda fase, elabora-se o vínculo entre a fonte de referência e suas citações. É a partir dessa vinculação que se estabelece o índice de referências citadas, possibilitando determinar a estrutura de uma rede bibliográfica (ou seja, a relação entre dois vértices por meio de um arco) (Tabela 2).

Tabela 2
Exemplo de codificação para um índice de referências citadas

O índice de citações é composto pelo índice de fontes de referência e pelo índice de referências citadas. No momento em que se tem definido o índice de citações, fontes de referência podem ser encontradas como citações de referências citadas. Por isso, as nomenclaturas mais apropriadas para definir um documento em uma rede de citações são os termos em inglês "citee", para um documento/autor que foi citado por outro, e "citer", para um documento/autor que cita outro (Georgiou, 2014Georgiou, I. (2014). Seeing the forest for the trees: An atlas of the politics-administration dichotomy. Public Administration Review, 74(2), 156-175. doi:10.1111/puar.12163
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). Com base no índice de citações, define-se a lista de vértices (i.e., a lista de todos os documentos presentes no índice), a lista de arcos (i.e., a lista de todas as relações "citee" → "citer"), assim como a lista de todos os periódicos científicos nos quais os documentos foram publicados.

Dos 381 artigos obtidos na busca das bases de dados publicados no período em análise do estudo sobre os PSMs, apenas 126 atendiam ao escopo para a construção da rede. Os 126 artigos da primeira fase referente à definição do índice de fontes de referência permitiram determinar 1.690 referências citadas na segunda fase, das quais 542 foram consideradas para análise de conteúdo. Nesse conjunto de referências citadas, encontram-se também artigos repetidos já cadastrados na primeira e na segunda etapa. Após análise desses documentos, chegou-se ao total de 155 artigos científicos distintos e 406 vínculos de citação entre eles para a inclusão na rede de citações.

Segunda etapa: elaboração dos mapas exploratórios

Para elaborar o atlas bibliográfico, é necessário construir a rede principal de citações e a rede bipartida autor/periódico. A construção dessas redes inicia-se com a enumeração dos vértices e dos arcos. Com a lista codificada dos vértices e dos arcos, elabora-se uma planilha de dados de entrada para poder usar o "software" de construção de redes Pajek (De Nooy et al., 2011De Nooy, W., Mrvar, A., & Batagelj, V. (2011). Exploratory social network analysis with Pajek. 2nd ed. Cambridge: Cambridge University Press.). A estruturação dos dados de entrada é composta por três seções: (i) Dados da rede, (ii) Índices e (iii) Arcos autor/periódico. Cada seção é composta de vários conjuntos de dados codificados, num total de oito subseções (Georgiou & Heck, 2015Georgiou, I., & Heck, J. (2015). Longitudinal exploratory citation network analysis: An atlas-based methodology. Recuperado de https://dx.doi.org/10.2139/ssrn.2755389
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) (Tabela 3).

Tabela 3
Exemplo da estrutura dos dados de entrada para a construção de uma rede principal

Na seção "Dados da rede", para cada vértice, é atribuído um número sequencial de identificação e uma denominação definida no índice de citações. Os arcos são definidos pelos números de identificação dos vértices, referindo-se o primeiro número do arco ao artigo citado ("citee") e o segundo número, ao artigo que cita ("citer"). Os códigos para os nomes dos autores e para os periódicos são definidos com base nos índices de autor e de periódicos na seção "Índices" e transcritos para seus respectivos autores e periódicos na subseção "Autor" e "Periódico".

A segunda seção intitula-se "Índices". Ela definirá o índice de autor, o índice de periódico, o índice dos códigos de intervalos de tempo (ou "Time period code" - TPC) e o índice dos códigos de indicador temporal (ou "Time indicator code" - TIC). A subseção "Índice temporal" define os intervalos de tempo para cada período longitudinal. Nesse exemplo, há seis períodos de interesse, portanto o TPC é codificado de 1 a 6 em uma ordem cronológica, e poderão ser usados também como atributos. O código de indicador de tempo (TIC) serve para atribuir um indicador de tempo aos vértices da rede principal a fim de realizar a extração das sub-redes longitudinais. A codificação do TIC seguirá uma sequência numérica que começa com o número subsequente ao código dos vértices. Nesse exemplo, o último vértice da rede principal é 155, então o primeiro código TIC será 156.

Por fim, a seção "Arcos autor/periódico" visa estruturar os dados para determinar os arcos da rede bipartida autor/periódico pelo pareamento dos códigos dos nomes de autores com os códigos dos periódicos definidos na subseção "Autor", da seção "Dados da rede". Cada par autor/periódico é ordenado de modo crescente numericamente, e dele são expurgadas as duplicações. Nesse exemplo, o número total de vértices é 165, e o número que separa o grupo dos vértices dos autores dos de periódicos é 114 (Tabela 4).

Tabela 4
Exemplo da estrutura dos dados de entrada para a construção de uma rede bipartida autor/periódico

A partir dessas planilhas de dados de entrada, procede-se à construção dos mapas e diagramas do atlas bibliográfico. Os procedimentos para a construção das redes de citações com o "software" Pajek são apresentados passo a passo por meio dos fluxogramas do documento "Longitudinal Exploratory Citation Network Analysis: An Atlas-Based Methodology", sugerido por Georgiou e Heck (2015)Georgiou, I., & Heck, J. (2015). Longitudinal exploratory citation network analysis: An atlas-based methodology. Recuperado de https://dx.doi.org/10.2139/ssrn.2755389
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.

Terceira etapa: as análises exploratórias do atlas bibliográfico

Conforme mencionado anteriormente, o atlas bibliográfico é composto por três partes, determinadas, basicamente, por três análises exploratórias: (i) da abrangência panorâmica, (ii) das referências e (iii) dos periódicos (Quadro 1).

Quadro 1
Elementos constitutivos do atlas bibliográfico

A análise exploratória panorâmica é a mais abrangente e cobre a análise longitudinal da rede principal, pela visualização da sincronologia, da sua matriz adjacente, das sub-redes longitudinais e das sub-redes agregadas por atributos. A sincronologia é o mapa da rede principal organizado por períodos, como décadas, e apresentado visualmente na horizontal, do período mais antigo, colocado à esquerda, para o período mais recente, à direita (Figura 1).

Figura 1
Sincronologia de uma rede principal definida por atributos

Assim, a sincronologia é essencialmente uma carta que contempla a dinâmica cronológica das publicações dos documentos em estudo. Apesar de não fornecer informações visuais precisas sobre as conexões entre eventos, essa análise permite observar períodos mais intensos de produção acadêmica.

Com base na sincronologia, é possível determinar a matriz adjacente longitudinal da rede principal e apresentar as medidas relativas de graus de entrada, ou "indegree", e graus de saída, ou "outdegree", da rede, que, também, permite verificar a dinâmica da atividade de pesquisa e sua produção (Tabela 5) (Harary, 1969Harary, F. (1969). Graph theory. Boston, MA: Addison-Wesley.).

Tabela 5
Matriz adjacente longitudinal de uma rede principal

Essa matriz é triangular e apresenta informações sobre a quantidade de artigos publicados por períodos, assim como a quantidade de artigos que são citados ("outdegrees" dados por linha) e a quantidade de artigos que citam outros artigos ("indegrees" dados por coluna). Por exemplo, na Tabela 5, na década de 1960, nota-se que 16 artigos foram publicados. Na respectiva linha, vê-se que esses 16 artigos foram citados 47 vezes de 1960 a 1989. Por outro lado, na respectiva coluna, percebe-se que esses mesmos 16 artigos citaram nove vezes artigos de períodos anteriores. Ademais, o período de 1975 a 1979 é o período no qual os artigos publicados foram os mais citados, 153 vezes, enquanto, no período de 1980 a 1984, os artigos publicados citaram mais vezes artigos anteriores, ou seja, 207 vezes. Isso demonstra a dinâmica de publicação da literatura dos PSMs.

A rede principal longitudinal, por sua vez, é visualmente similar à rede principal, com a diferença de que, para cada vértice, define-se um indicador temporal codificado (TIC), a fim de permitir a extração longitudinal de sub-redes em um certo período. Essas sub-redes também expõem o que foi publicado anteriormente somente se tiver sido citado pelo artigo publicado no intervalo da extração. Essa análise nos remete aos atlas históricos de Geografia (Figura 2). Nesse exemplo, pode-se observar que essa sub-rede apresenta uma estrutura em dois componentes separados: um com os PSMs e outro apenas com o artigo de Dunn (1988)Dunn, W. N. (1988). Methods of the second type: Coping with the wilderness of conventional policy analysis. Policy Studies Review, 7(4), 720-737. doi:10.1111/j.1541-1338.1988.tb00891.x
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e seus "citees". Essa observação sugere que há uma aparente falta de coesão nessa literatura.

Figura 2
Sub-rede longitudinal extraída para o intervalo de 1985 a 1989

Por fim, a partir da rede principal ou de uma sub-rede longitudinal, é possível extrair uma sub-rede agregada por atributos, reduzindo os artigos de um atributo a apenas um vértice (Figura 3). Tal sub-rede permite identificar, por exemplo, as referências cruzadas, os conceitos cedidos ou as formulações paralelas em comum a cada uma das categorias de PSMs. Nesse exemplo, dos 81 artigos categorizados como precedentes teóricos (TP), apenas cinco são comuns dois a dois com outros PSMs. É interessante perceber que, para os quatros PSMs tidos como complementares pela literatura (Rosenhead, 1989Rosenhead, J. (1989). Rational analysis for a problematic world: Problem structuring methods for complexity, uncertainty and conflict. Chichester, UK: Wiley.), há somente cinco artigos que os associam. Isso permite inferir que a associação de suas bases teóricas, a partir dessas referências cruzadas, é fraca e limitada.

Figura 3
Sub-rede dos precedentes teóricos TP citados pelos PSMs

Isso posto, para a abrangência panorâmica, o atlas bibliográfico em cartografia estrutural oferece quatro análises: (i) sincronologia (um mapa panorâmico), (ii) matriz adjacente longitudinal, (iii) sub-redes longitudinais e (iv) sub-redes agregadas por atributos.

A segunda análise exploratória contida no atlas bibliográfico é a dos documentos. Nesta são examinadas as sub-redes dos artigos mais referenciados na rede, ditos principais "citees", ou "top citees" (Figura 4), e dos artigos que mais citam outros artigos na rede, ditos principais "citers", ou "top citers" (Figura 5). Analisar os principais "citees" revela quais são os autores que descobriram ideias novas e quais são os documentos úteis para compreender o assunto em estudo, enquanto examinar os principais "citers" revela quais são os artigos que mais integraram conhecimento anterior dentro de um campo de estudo e que podem ser considerados sínteses de uma literatura.

Figura 4
Sub-rede dos principais citees com mais de nove referências

Figura 5
Sub-rede dos principais citers que citam mais de nove referências

Há dois fatos curiosos revelados nessa sub-rede. Primeiro, é que apenas artigos de SODA são representados como principais "citers", junto com os precedentes teórico (TP) e artigos gerais de PSMs (PSMG). Os outros PSMs, como SSM, SCA e RA, estão ausentes. Segundo, que o artigo de Dunn (1988)Dunn, W. N. (1988). Methods of the second type: Coping with the wilderness of conventional policy analysis. Policy Studies Review, 7(4), 720-737. doi:10.1111/j.1541-1338.1988.tb00891.x
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, que não foi citado diretamente por nenhum outro artigo PSMs (Figura 2), é um dos principais "citers" (Figura 5). Essa evidência demonstra que é necessário esclarecer o contexto da existência de um artigo como esse, que foi completamente ignorado pela literatura dos PSMs.

Outra análise da exploração de referências a ser considerada é a sub-rede denominada "radar", que apresenta, de maneira concisa, a estrutura fundamental com base nos principais "citees", integrando os "citers" desses principais "citees", assim como os seus "citees". Dessa forma, a sub-rede "radar" representa um microcosmo dentro de um campo do conhecimento (Figura 6). Essa sub-rede "radar" é um dos mapas mais relevantes e inovadores que compõem o atlas bibliográfico do método de cartografia estrutural, e foi definida originalmente por Georgiou (2014)Georgiou, I. (2014). Seeing the forest for the trees: An atlas of the politics-administration dichotomy. Public Administration Review, 74(2), 156-175. doi:10.1111/puar.12163
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.

Figura 6
Sub-rede "radar"

Ademais, é possível explorar a rede por meio de análise de grupos coesos em redes de citações com dois tipos de medidas complementares: (i) o pareamento bibliográfico, conhecido também como "coupling", e (ii) a cocitação (Figuras 7 e 8). A diferença entre essas duas medidas é que, no pareamento bibliográfico, o conteúdo do par de artigos é caracterizado pelo conhecimento passado, e, na cocitação, é influenciado pelo conhecimento de períodos futuros. Portanto, a possibilidade de realizar extrações longitudinais de pareamentos bibliográficos e de cocitações permite que o método de cartografia estrutural disponha de uma análise diacrônica adicional à análise longitudinal.

Figura 7
Sub-rede de pareamento bibliográfico (citers com três ou mais citees em comum)

Figura 8
Sub-rede de cocitação (citees com três ou mais citers em comum)

Por fim, outra análise na exploração de referências é a do caminho principal, ou "main path analysis". A ideia dessa análise é formar uma espinha dorsal do mapeamento da rede de citações, fornecendo uma relação de artigos que formam um núcleo de conhecimento da área em estudo (Georgiou, 2014Georgiou, I. (2014). Seeing the forest for the trees: An atlas of the politics-administration dichotomy. Public Administration Review, 74(2), 156-175. doi:10.1111/puar.12163
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) (Figura 9). No caso do estudo sobre os PSMs, essa análise mostra a presença apenas de precedentes teóricos (TP) e artigos de SSM. Esse fato levanta um questionamento sobre a unidade conceitual dessa literatura.

Figura 9
Sub-rede da análise do caminho principal

Assim, para a exploração das referências, o atlas bibliográfico em cartografia estrutural oferece seis análises: (i) sub-rede dos principais "citees", (ii) sub-rede dos principais "citers", (iii) sub-rede "radar", (iv) sub-redes de pareamento bibliográfico, (v) sub-redes de cocitação e (vi) análise do caminho principal.

A terceira e última análise exploratória do método de cartografia estrutural é inteiramente realizada por meio da rede bipartida autor/periódico, que mapeia os autores de cada artigo com as respectivas revistas científicas nas quais publicaram (Figura 10). Essa rede mostra se há concentração entre os periódicos científicos e quais autores disseminam o conhecimento do campo em estudo. Nota-se que os elementos unitários dessa rede bipartida são os autores e as revistas científicas nas quais eles publicaram, e não mais os artigos.

Figura 10
Rede bipartida de autores/periódicos

Tem-se, ainda, a análise da sub-rede de periódicos, que é determinada apenas pelas revistas científicas, na qual a relação entre essas revistas é definida pelo critério de compartilhamento dos mesmos autores (Figura 11). No estudo sobre os PSMs, observa-se a preferência pelo periódico "Journal of the Operational Research Society" (JORS/ORQ/OR). Nele tem-se artigos de 32 autores, ou seja, 28% de todos autores da rede, demonstrando a hegemonia desse periódico para essa literatura.

Figura 11
Rede de periódicos

Desse modo, para a exploração dos periódicos, o atlas bibliográfico em cartografia estrutural oferece duas abordagens: (i) rede bipartida autor/periódico e (ii) rede de periódicos.

Os resultados da aplicação do método de cartografia estrutural são representados pelos 11 mapas que compõem o atlas bibliográfico, expondo a estrutura subjacente de uma literatura.

CONCLUSÃO

O método de cartografia estrutural para a revisão de literatura oferece um procedimento de investigação organizado, repetível e autocorrigível, que garante a obtenção de resultados válidos. Esse método estabelece regras básicas rigorosas para construir um atlas bibliográfico de uma literatura. Os resultados da aplicação do método de cartografia estrutural representam 12 maneiras de se abordar uma literatura (vide Quadro 1).

Por meio desse modelo visual e figurativo, pode-se estabelecer uma cronologia entre obras, revelar objetivamente as principais correspondências entre elas e analisar a história temática de uma área do conhecimento. O atlas bibliográfico mapeia, organiza e registra o acervo bibliográfico de uma literatura, revelando a coerência estrutural dessa bibliografia que é utilizada para fundamentar uma tese ou pesquisa.

No caso da literatura sobre os "Problem Structuring Methods", conhecida por sua unidade conceitual (Rosenhead, 1989Rosenhead, J. (1989). Rational analysis for a problematic world: Problem structuring methods for complexity, uncertainty and conflict. Chichester, UK: Wiley.), a estrutura subjacente revelada pelo método de cartografia estrutural não oferece evidências de coesão, há poucas referências cruzadas, conceitos cedidos e formulações paralelas. Portanto, essa aplicação do método indica que a ideia de unidade na área dos PSMs não é suportada pela estrutura de referimento encontrada nas análises exploratórias do atlas bibliográfico, além de revelar referência como a de Dunn (1988)Dunn, W. N. (1988). Methods of the second type: Coping with the wilderness of conventional policy analysis. Policy Studies Review, 7(4), 720-737. doi:10.1111/j.1541-1338.1988.tb00891.x
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, ignorado pelos acadêmicos da área. Dessa forma, a aplicação do método de cartografia estrutural para a revisão de literatura comprova a possibilidade de realizar pesquisas teóricas sofisticadas em Administração (Georgiou & Heck, 2017Georgiou, I., & Heck, J. (2017). Problem structuring methods, 1950s-1989: An atlas of the journal literature. Recuperado de https://dx.doi.org/10.2139/ssrn.3077648
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).

Contudo, a aplicação desse método exige que os pesquisadores acadêmicos elaborem manualmente o índice de citação e se aprofundem no conteúdo de cada documento pertencente ao atlas bibliográfico para perceber a existência de lacunas no tema em estudo e avançar no conhecimento.

Por fim, a cartografia estrutural é um método interdisciplinar inédito para realizar uma revisão de literatura aprofundada e sofisticada, com base teórica na pesquisa bibliográfica, na pesquisa histórica, na teoria dos índices de citações, no mapeamento de redes bibliográficas e na cartografia. Esse método permite literalmente mapear a estrutura subjacente de um assunto, conforme sugerido por Hart (1998)Hart, C. (1998). Doing a literature review: Releasing the social science research imagination. London, UK: Sage., e operacionalizar essa atividade, julgada muito ambígua e que até hoje permaneceu pendente de resolução.

  • Versão original

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Editado por

Avaliado pelo sistema double blind review. Editora Científica: Glícia Vieira

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    09 Maio 2019
  • Data do Fascículo
    Mar-Apr 2019

Histórico

  • Recebido
    03 Jul 2018
  • Aceito
    02 Jan 2019
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