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VIRALIDADE INTERTEXTUAL E REPERTÓRIOS VERNACULARES: MEMES DA INTERNET COMO OBJETOS CONECTANDO DIFERENTES MUNDOS ON-LINE

RESUMO

Este trabalho descreve a trajetória dos memes da internet, suas principais características e suas conexões com os conceitos de viralidade e pesquisa em produção cultural. Nós exploramos a trajetória histórica dos memes e identificamos seus elementos principais (vernacularismo, viralidade e intertextualidade). Também propomos que os memes representam objetos que atuam como provocadores, pois são portadores de significado que refletem repertórios de comunidades fechadas, mas que adquirem novos repertórios refletidos à medida que são transmitidos entre consumidores de modo intertextual. Assim, este trabalho tanto esclarece as interdependências intertemporais e lógicas entre produção cultural e viralidade quanto revela o poder conector de cenários vernaculares e práticas expressivas compartilhadas para coletividades de consumidores on-line.

PALAVRAS-CHAVE
Memes da internet; coletividades de consumidores; viralidade; intertextualidade; repertórios

ABSTRACT

This work describes the trajectory of Internet memes, their main characteristics, and their relationship with the fields of virality literature and cultural production research. We explore the historical trajectory of internet memes and identify their constitutional features (vernacularism, virality, and intertextuality). We also propose that memes are objects that act as provocateurs; this is because they are carriers of meaning that reflect the repertoires of closed communities. However, they acquire new reflected repertoires in the process of being transmitted intertextually among consumers. As such, this work both clarifies the intertemporal and logical interdependencies between online cultural production and virality, as well as unveil the linking power of vernacular backgrounds and shared expressive practices (in our context, elaboration of common memes) for online consumer collectivities.

KEYWORDS
Internet memes; consumer collectivities; virality; intertextuality; repertoires

RESUMEN

Este trabajo describe la trayectoria de los memes de Internet, sus principales características y sus conexiones con los conceptos de viralidad y colectividades de consumidores, bien establecidos en marketing e investigación del consumidor. Nosotros proponemos que los memes representan objetos que actúan como provocadores, pues son portadores de significado que reflejan repertorios de comunidades cerradas, pero que adquieren nuevos repertorios reflejados a medida que se transmiten entre consumidores de forma intertextual. Finalmente, discutimos las implicaciones de las características de este fenómeno.

PALABRAS CLAVE
Memes de internet; colectividades de consumidores; viralidad; intertextualidad; repertorios

INTRODUÇÃO

Os memes da internet são um fenômeno recente criado pelo consumidor que penetrou no mundo "real" nos últimos anos. Os debates tradicionalmente promovidos pela mídia e nas mídias sociais costumam enfatizar o papel dos memes nas eleições norte-americanas (Beran, 2017Beran, D. (2017). 4chan: The skeleton key to the rise of Trump. Retrieved from https://medium.com/@DaleBeran/4chan-the-skeleton-key-to-the-rise-of-trump-624e7cb798cb
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) como tendo sido uma das forças comunicativas responsáveis pela vitória de Donald Trump. O debate sobre os memes da internet como ferramentas de apoio e objetos provocadores (Mina, 2017Mina, A. X. (2017). When Internet memes infiltrate the physical world. Retrieved from https://www.theatlantic.com/technology/archive/2017/05/when-internet-memes-infiltrate-the-physical-world/523887/
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) tem feito com que o uso desses artefatos digitais, bem como a sua criação e disseminação pelos consumidores, receba maior atenção.

Meme é um conceito proposto por Richard Dawkins e mais tarde abordado no livro de Susan Blackmore, The Meme Machine (Blackmore, 2000Blackmore, S. (2000). The meme machine. Oxford, UK: Oxford Paperbacks.). Segundo esses autores, os memes são a versão cultural dos genes biológicos, porque são transferidos de pessoa para pessoa; no entanto, eles podem ser modificados durante esse processo de transmissão. O termo "meme" apareceu pela primeira vez no contexto on-line quando o jornalista da revista Wired Mark Godwin (Godwin, 1994Godwin, M. (1994). Meme, counter meme. Wired. Retrieved from https://www.wired.com/1994/10/godwin-if-2/
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) conduziu um "experimento on-line" focado em fóruns de discussão para descrever a proliferação de argumentos parecidos com os de Hitler.

De uma ideia que pode ser disseminada, os memes evoluíram para se tornarem artefatos complexos ricos em significados culturais e referências populares. Os consumidores começaram a disseminar essas ideias por meio de imagens ou vídeos. Além disso, comunidades específicas da internet tornaram-se geradoras de memes por meio de ambientes de consumo cocriativos (Kozinets, Hemetsberger, & Schau, 2008Kozinets, R. V., Hemetsberger, A., & Schau, H. J. (2008). The wisdom of consumer crowds: Collective innovation in the age of networked marketing. Journal of Macromarketing, 28(4), 339-354. https://doi.org/10.1177/0276146708325382
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). Os memes da internet evoluíram em paralelo com a própria web (Börzsei, 2013Börzsei, L. K. (2013). Makes a meme instead: A concise history of internet memes. New Media Studies Magazine, 7(March), 1-29.).

Dada a importância desse fenômeno, é interessante notar que o tema só foi abordado em estudos sobre consumidores e Marketing (Rosenthal, 2014Rosenthal, B. (2014). Brand image co-creation and individual identity extension in online environments: A Facebook investigation. Escola de Administração de Empresas de São Paulo. Fundação Getulio Vargas. Retrieved from http://bibliotecadigital.fgv.br/dspace/handle/10438/11581
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; Wu & Ardley, 2007Wu, Y., & Ardley, B. (2007). . The Marketing Review, 7(3), 301-310. doi:10.1362/146934707X230112
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). Essa falta de trabalhos é surpreendente quando consideramos que os memes estão presentes nas literatura de duas das áreas teóricas mais exploradas nos estudos sobre consumidores: (1) coletividades de consumidores, um termo que aqui usamos para designar uma variedade de grupos sociais on-line que geralmente compartilham repertórios culturais, abrangendo desde fóruns a comunidades, desde fóruns públicos de marcas a grupos de interesse (Arvidsson & Caliandro, 2015Arvidsson, A., & Caliandro, A. (2015). Brand public. Journal of Consumer Research, 42(5), 727-748. doi:10.1093/jcr/ucv053
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; Muñiz & Schau, 2011Muñiz, A. M., & Schau, H. J. (2011). How to inspire value-laden collaborative consumer-generated content. Business Horizons, 54(3), 209-217. doi:10.1016/j.bushor.2011.01.002
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; Schau, Muñiz, & Arnould, 2009Schau, H. J., Muñiz, A. M., & Arnould, E. J. (2009). How brand community practices create value. Journal of Marketing, 73(5), 30-51. doi:10.1509/jmkg.73.5.30
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; Schouten, & McAlexander, 1995Schouten, J. W., & McAlexander, J. H. (1995). Subcultures of consumption: An ethnography of the New Bikers. Journal of Consumer Research, 22(1), 43-61.; Thomas, Price, & Schau, 2012Thomas, T., Price, L. L., & Schau, H. J. (2012). When differences unite: Resource dependence in heterogeneous consumption communities. Journal of Consumer Research, 39(5), 1010-1033. doi:10.1086/666616
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); e (2) a área que estuda o fenômeno do marketing viral e da divulgação boca a boca (Brown, Broderick, & Lee, 2007Brown, J. J., Broderick, A., & Lee, N. (2007). Word of mouth communication within online communities: Conceptualizing the online social network. Journal of Interactive Marketing, 21(3), 2-20. doi:10.1002/dir
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; Dellarocas, 2006Dellarocas, C. (2006). Strategic manipulation of Internet opinion forums: Implications for consumers and firms. Management Science, 52(10), 1577-1593. doi:10.1287/mnsc.1060.0567
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; Godes & Mayzlin, 2004Godes, D., & Mayzlin, D. (2004). Using online conversations to study word-of-mouth communication. Marketing Science, 23(4), 545-560. doi:10.1287/mksc.1040.0071
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; Groeger & Buttle, 2014Groeger, L., & Buttle, F. (2014). Word-of-mouth marketing: Towards an improved understanding of multi-generational campaign reach. European Journal of Marketing, 48(7/8), 1186-1208. doi:10.1108/EJM-02-2012-0086
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; Kozinets, Valck, Wojnicki, & Wilner, 2010Kozinets, R. V., Valck, K. De, Wojnicki, A. C., & Wilner, S. J. S. (2010). Networked narratives: Understanding word-of-mouth marketing in online communities. Journal of Marketing, 74(2), 71-89. doi:10.1509/jmkg.74.2.71
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; Miles, 2014Miles, C. (2014). The rhetoric of managed contagion: Metaphor and agency in the discourse of viral marketing. Marketing Theory, 14(1), 3-18. doi:10.1177/1470593113506433
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; Phelps, Lewis, Mobilio, Perry, & Raman, 2004Phelps, J. E., Lewis, R., Mobilio, L., Perry, D., & Raman, N. (2004). Viral marketing or electronic word-of-mouth advertising: Examining consumer responses and motivations to pass along email. Journal of Advertising Research, 44(4), 333-348. doi:10.1017/S0021849904040371
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).

Uma das possíveis razões para que o fenômeno tenha sido ignorado é que só recentemente estudos sobre consumidores e Marketing demonstraram interesse em investigar fenômenos relacionados a linguagem e suas complexidades, ou a virada linguística em geral (Thompson, Arnould, & Giesler, 2013Thompson, C. J., Arnould, E. J., & Giesler, M. (2013). Discursivity, difference, and disruption: Genealogical reflections on the consumer culture theory heteroglossia. Marketing Theory, 13(2), 149-174. doi:10.1177/1470593113477889
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). Este artigo está localizado na interseção da literatura sobre memes da internet, fortemente embasada em estudos de mídia e cultura visual, com os estudos sobre consumidores e Marketing. Assim, seu objetivo mais amplo é promover a literatura sobre consumidores e Marketing que aborda os memes da internet, que atualmente não é apenas escassa, mas também relativamente dispersa. Identificamos duas principais linhas de estudos usando memes da internet para investigar tópicos relevantes e distintos de Marketing. A primeira trata-se de pesquisadores interessados em memes da internet para melhorar a compreensão sobre os mecanismos subjacentes da viralidade on-line, um efeito de grande relevância para a área de Marketing. Esses pesquisadores consideram os memes um terreno fértil para investigar o desdobramento do contágio emocional (Guadagno, Rempala, Murphy, & Okdie, 2013Guadagno, R. E., Rempala, D. M., Murphy, S. & Okdie, B. M. (2013). What makes a video go viral? An analysis of emotional contagion and Internet memes. Computers in Human Behavior, 29(6), 2312-2319.) em ambientes on-line e adaptam modelos epistemológicos médicos para explicar o comportamento do consumidor (Bauckhage, 2011Bauckhage, C. (2011). Insights into internet memes. Fifth International AAAI Conference on Weblogs and Social Media. Retrieved from https://www.aaai.org/ocs/index.php/ICWSM/ICWSM11/paper/viewPaper/2757
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). Já a segunda linha é formada por estudiosos de consumidores e Marketing interessados no uso de memes da internet para ajudar a esclarecer as lógicas da produção cultural on-line (Knobel & Lankshear, 2007Knobel, M. & Lankshear, C. (2007). Online memes, affinities, and cultural production. In C. Lankshear, M: Knobel, C. Bigum & M. Pters (Eds.), A new literacies sampler (pp. 199-228). New York, NY: Peter Lang Publishing.; Nissenbaum & Shifman, 2017Nissenbaum, A. & Shifman, L. (2017). Internet memes as contested cultural capital: The case of 4chain's/b/board. New Media & Society 19(4), 483-501.). Um objetivo adicional e mais específico deste artigo é promover uma discussão inicial sobre as conexões entre coletividades de consumidores on-line e suas práticas expressivas compartilhadas (memes da internet é uma delas), promovendo assim a virada linguística nos estudos sobre consumidores e Marketing (Thompson et al., 2013Thompson, C. J., Arnould, E. J., & Giesler, M. (2013). Discursivity, difference, and disruption: Genealogical reflections on the consumer culture theory heteroglossia. Marketing Theory, 13(2), 149-174. doi:10.1177/1470593113477889
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).

Para alcançar esses objetivos, contamos com duas fontes de informação. A primeira foi uma extensa revisão bibliográfica das três linhas de estudo consideradas relevantes para os fins declarados: (1) memes da internet; (2) literatura sobre viralidade; e (3) estudos sobre produção cultural (por exemplo, contribuições relacionadas com repertórios culturais e vernaculismo). A segunda foram dois casos empíricos de memes da internet, Inbonha e Chola Mais, ambos pertencendo ao contexto brasileiro. Baseando-se nessas fontes, o artigo traça a trajetória histórica dos memes da internet e identifica suas características constitucionais (vernacularismo, viralidade e intertextualidade). Na seção de conclusão e discussão, apresentamos duas principais contribuições teóricas do trabalho. Uma primeira contribuição teórica é a capacidade do artigo de conectar pesquisas sobre memes da internet com foco na produção cultural e pesquisas com foco na viralidade. Nosso modelo interpretativo explica como a produção cultural precede (por meio do vernacularismo) e segue (por meio da intertextualidade) a viralidade. Dessa forma, este trabalho costura contribuições para o consumidor e Marketing a partir da análise de memes da internet, esclarecendo as interdependências intertemporais e lógicas entre a produção cultural on-line e a viralidade. Uma segunda contribuição teórica deriva da revelação preliminar do poder associativo dos cenários vernaculares com as práticas expressivas compartilhadas (em nosso contexto, por meio da elaboração de memes comuns) para a coletividades de consumidores on-line. A organização do conteúdo do artigo reflete a sequência relatada, guiando o leitor através das três linhas de estudo relevantes, para, então, introduzir os casos empíricos e apresentar contribuições e implicações para a teoria e prática dos estudos sobre consumidores e Marketing.

MEMES DA INTERNET: DESENVOLVIMENTO E PRINCIPAIS CARACTERÍSTICAS

O primeiro meme registrado na internet foi o rosto sorridente (Davison, 2012Davison, P. (2012). The language of Internet memes. In M. Mandiberg (Ed.), The Social Media Reader (pp. 120-134). New York, NY: NYU press.). Foi utilizado como forma de resolver problemas decorrentes da ambiguidade em fóruns on-line; sua pista visual, composta por dois-pontos e um parêntese, indicava que uma publicação em particular era irônica ou engraçada.

À medida que a tecnologia evoluiu e o acesso à internet se disseminou para usuários comuns, outros memes surgiram. Dois exemplos da década de 1990 e início dos anos 2000 são Bert is Evil e The Tourist Guy. Bert is Evil refere-se à imagem de um personagem de desenho animado justaposto com trágicos eventos históricos. Foi disseminado on-line por volta de 1997 por meio da criação de sites que replicaram o meme (Börzsei, 2013Börzsei, L. K. (2013). Makes a meme instead: A concise history of internet memes. New Media Studies Magazine, 7(March), 1-29.). The Tourist Guy, por outro lado, consiste em uma montagem com uma foto de um turista em frente ao World Trade Center, logo antes do acidente do avião em 2001. Depois que a imagem se tornou viral, os consumidores começaram a colocar o mesmo homem na frente de outros eventos políticos relevantes e trágicos e enviá-los por e-mail, em uma típica corrente (Börzsei, 2013Börzsei, L. K. (2013). Makes a meme instead: A concise history of internet memes. New Media Studies Magazine, 7(March), 1-29.).

No início dos anos 2000, as mudanças tecnológicas aumentaram o acesso à web. Essas mudanças também alteraram a sua configuração, criando um ambiente propício ao surgimento de uma cultura participativa (Jenkins, 2006Jenkins, H. (2006). Convergence culture: Where old and new media collide. New York, NY: NYU press.). As mídias sociais emergiram como ponto essencial de convergência para os consumidores que participavam de coletividades e compartilhavam os mesmos interesses, incluindo marcas e comunidades de consumo (Fournier & Lee, 2009Fournier, S., & Lee, L. (2009). Getting brand communities right. Harvard Business Review, (April), 105-111. Retrieved from https://hbr.org/
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; Stratton & Northcote, 2014Stratton, G., & Northcote, J. (2014). When totems beget clans: The brand symbol as the defining marker of brand communities. Journal of Consumer Culture, 16(2), 493-509. doi:10.1177/1469540514528194
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). Esses grupos on-line são os espaços para a criação de artefatos digitais comuns, rituais compartilhados e práticas cotidianas (Muñiz & Schau, 2011Muñiz, A. M., & Schau, H. J. (2011). How to inspire value-laden collaborative consumer-generated content. Business Horizons, 54(3), 209-217. doi:10.1016/j.bushor.2011.01.002
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; Schau et al., 2009Schau, H. J., Muñiz, A. M., & Arnould, E. J. (2009). How brand community practices create value. Journal of Marketing, 73(5), 30-51. doi:10.1509/jmkg.73.5.30
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). Memes são um tipo de objeto criado pela comunidade que é disseminado para diferentes comunidades.

A maioria dos memes segue o padrão típico de uma imagem justaposta com uma legenda escrita (tanto a imagem quanto o texto podem ser modificados durante a transmissão), que carrega uma mensagem irônica, politicamente incorreta e às vezes grotesca (Horta, 2015Horta, N. B. (2015). O meme como linguagem da internet: Uma perspectiva semiótica (Master's thesis). Universidade de Brasília. Retrieved from http://repositorio.unb.br/handle/10482/18420
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). Nesse sentido, memes são objetos provocadores. Os elementos que compõem o objeto têm um impacto nos receptores (Benveniste, 1974Benveniste, É. (1974). Problèmes de linguistique générale. Paris, France: Gallimard.). Essa função provocativa torna o meme disruptivo; contém um elemento inesperado e subversivo que não se adequa aos estereótipos que regem a percepção da comunidade de receptores.

Em casos extremos, a natureza provocativa e de subversão de significados dos memes resulta em práticas de trollagem na internet. Trollagem é o ato de interromper conversas on-line apenas por interromper, sem nenhum outro propósito (apenas pela "zoeira"), mesmo que isso inclua assediar pessoas ou perpetuar discursos controversos (Phillips, 2015Phillips, W. (2015). This is why we can't have nice things: Mapping the relationship between online trolling and mainstream culture. Cambridge, MA: MIT Press.). De acordo com o estudo de Phillips (2015)Phillips, W. (2015). This is why we can't have nice things: Mapping the relationship between online trolling and mainstream culture. Cambridge, MA: MIT Press. sobre trolls da internet, esses indivíduos se organizam em grupos em diferentes redes sociais - de fóruns de discussão obscuros ao Facebook - e planejam ações controversas em comunidades on-line e em suas interações com outros consumidores. Dessa forma, a trollagem representa uma expressão desviante dos memes. Além disso, Phillips (2015)Phillips, W. (2015). This is why we can't have nice things: Mapping the relationship between online trolling and mainstream culture. Cambridge, MA: MIT Press. afirma que a cultura da trollagem foi promovida em um ambiente subcultural particular chamado 4chan.

4chan foi um fórum criado por uma pessoa chamada moot quando ainda era adolescente. Era destinado a ser um espaço para discutir animes (uma categoria de desenhos animados ou quadrinhos geralmente relacionados à cultura japonesa), mas, pouco tempo depois de sua criação, os usuários abriram vários fóruns de discussão (fóruns comandados pelo próprio consumidor) para discutir diferentes assuntos. De todos os fóruns que compuseram o 4chan, o fórum /b/ tornou-se o mais popular. O principal assunto discutido lá era descrito como "aleatório", ou seja, os consumidores poderiam postar sobre qualquer tópico.

Vários "memes clássicos", como a famosa série LOLcats e Advise Animals, foram criados entre 2003 e 2011 (Börzsei, 2013Börzsei, L. K. (2013). Makes a meme instead: A concise history of internet memes. New Media Studies Magazine, 7(March), 1-29.; Phillips, 2015Phillips, W. (2015). This is why we can't have nice things: Mapping the relationship between online trolling and mainstream culture. Cambridge, MA: MIT Press.; Shifman, 2014Shifman, L. (2014). Memes in digital culture. Cambridge, MA: MIT Press.). Esses memes refletiam o etos cultural, ou repertório (Blikstein, 2016Blikstein, I. (2016). Técnicas de Comunicação Escrita. São Paulo, SP: Contexto.), dos 4channers, porque muitos deles foram criados ou popularizados no fórum /b/; esses consumidores criaram, apenas pela "zoeira", conteúdo disruptivo e politicamente incorreto que logo se tornaria viral. Para Phillips (2015)Phillips, W. (2015). This is why we can't have nice things: Mapping the relationship between online trolling and mainstream culture. Cambridge, MA: MIT Press., esses memes e ações on-line que resultaram em trollagem consistiram em justapor morte e destruição com iconografia cultural pop.

De 2012 a 2015, a subcultura 4channers foi praticamente dissolvida, à medida que memes da internet se tornaram tradicionais (a maioria dos consumidores aprendeu a usar o objeto). Dois eventos tornaram isso possível. Primeiro, a plataforma Know Your Meme foi criada; essa era uma comunidade onde os entusiastas ajudaram a institucionalizar memes, esclarecendo os traços fundamentais desses artefatos e explicando seu significado e histórias. Em segundo lugar, essa plataforma foi adquirida pela "Cheezburger", um site comercial que promovia a interface entre subculturas e empresas on-line (Phillips, 2015Phillips, W. (2015). This is why we can't have nice things: Mapping the relationship between online trolling and mainstream culture. Cambridge, MA: MIT Press.). Além disso, as habilidades tecnológicas necessárias para criar memes foram substancialmente reduzidas com a criação de plataformas, como o Meme Generator, em 2009, o que permitiu que usuários da internet sem muito conhecimento e habilidades de edição de imagem criassem seus memes baseados em macros de imagem prontos que já eram populares. A Figura 1 mostra os memes da internet mencionados até agora.

Figura 1
Exemplos de memes da internet

Como descrito anteriormente, os memes foram historicamente criados informalmente e em um "local" específico (coletividades fechadas de consumidores); a partir daí, eles foram disseminados e modificados pelos consumidores. Assim, dois elementos teóricos a respeito da natureza dos memes da internet e suas interações com a prática de Marketing e a pesquisa sobre consumidores devem ser analisados: a viralidade intertextual e os repertórios vernaculares. Vamos discutir esses dois conceitos em detalhes nas próximas seções.

VIRALIDADE INTERTEXTUAL: REPRODUÇÃO DE MEMES NA INTERNET E SUA RELAÇÃO COM OS ESTUDOS SOBRE CONSUMIDORES E MARKETING

"Marketing viral" tornou-se um modelo particular na gestão de Marketing contemporânea. De acordo com Douglas Holt (2004)Holt, D. B. (2004). How brands become icons: the principles of cultural branding. Boston, MA: Harvard Business School Press., o marketing viral é uma tentativa de conectar a estratégia da marca ao que está na moda (em termos da internet, algo que é tendência) em um momento específico; por exemplo, pode ser algo que está sendo discutido nas mídias sociais em dado momento. Viralidade é um termo usado pela indústria para se referir a essas partes de conteúdo, como anúncios ou conteúdo criado pelo consumidor, que são compartilhados por meio de mídias sociais pelos próprios consumidores, e se tornam tendências ou passam a figurar entre os tópicos mais discutidos em um determinado momento em plataformas como Facebook ou Twitter.

Dada a considerável atenção que esse termo tem recebido na área de Marketing, vários estudos sobre comportamento do consumidor e sobre consumidores no geral têm sido conduzidos desde a década de 1980 para entender como ocorre a transmissão de conteúdo. No entanto, mesmo antes de a área de Marketing tomar conhecimento desse fenômeno, outras ciências sociais o investigaram. Estudos como o conduzido por Katz e Lazarsfeld (1955)Katz, E., & Lazarsfeld, P. F. (1955). Personal influence: The part played by people in the flow of mass communications. New York, NY: Transaction publishers. na década de 1950 tentaram compreender a transmissão de informações por meio do conceito de influência pessoal. Os autores desenvolveram uma teoria sobre o fluxo de comunicação em dois passos, em que pessoas influentes - indivíduos, com muitas conexões soltas, que são centrais em uma rede - têm um papel proeminente como guardiões do tipo de informação que será difundida.

A pesquisa em Marketing tem procurado primordialmente entender como esse comportamento boca a boca afeta as empresas. As recomendações, informações que são transmitidas entre os consumidores (influentes ou não), surgem das e são limitadas pelas relações sociais entre consumidores (Brown & Reingen, 1987Brown, J. J., & Reingen, P. H. (1987). Social ties and word-of-mouth referral behavior. Journal of Consumer Research, 14(3), 350-362. doi:10.1086/209118
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; Reingen, Foster, Brown, & Seidman, 1984Reingen, P. H., Foster, B. L., Brown, J. J., & Seidman, S. B. (1984). Brand congruence in interpersonal relations: A social network analysis. Journal of Consumer Research, 11(3), 771-783.). As informações divulgadas pelos consumidores (recomendações) parecem passar mais credibilidade do que a comunicação tradicional, ou seja, informações que partem da empresa e são enviadas ao cliente (Allsop, Bassett, & Hoskins, 2007Allsop, D. T., Bassett, B. R., & Hoskins, J. A. (2007). Word-of-mouth research: Principles and applications. Journal of Advertising Research, 47(4), 398. doi:10.2501/S0021849907070419
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). Além disso, o efeito dessas informações é mais duradouro do que o efeito das informações provenientes de conteúdo de mídia ou relatórios de informações de negócios (Trusov, Bucklin, & Pauwels, 2009Trusov, M., Bucklin, R. E., & Pauwels, K. (2009). Effects of word-of-mouth versus traditional marketing: Findings from an Internet social networking site. Journal of Marketing, 73(5), 90-102. doi:10.1509/jmkg.73.5.90
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). O peso que os consumidores dão às recomendações tem feito com que o boca a boca seja estudado na literatura como um motor do comportamento de compra; é visto como um elemento que emerge da estrutura dos laços sociais, e é o resultado do comportamento anterior do consumidor (Godes & Mayzlin, 2004Godes, D., & Mayzlin, D. (2004). Using online conversations to study word-of-mouth communication. Marketing Science, 23(4), 545-560. doi:10.1287/mksc.1040.0071
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). Com o surgimento das mídias sociais e a notável influência delas na disseminação do conteúdo, o marketing boca a boca recebeu ainda mais atenção tanto por parte da literatura como da prática (Allsop et al., 2007Allsop, D. T., Bassett, B. R., & Hoskins, J. A. (2007). Word-of-mouth research: Principles and applications. Journal of Advertising Research, 47(4), 398. doi:10.2501/S0021849907070419
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; Watts & Dodds, 2007Watts, D., & Dodds, P. S. (2007). Influentials, networks, and public opinion formation. Journal of Consumer Research, 34(4), 441-458. doi:10.1086/518527
https://doi.org/10.1086/518527...
). Até o momento atual, a pesquisa sobre marketing viral tem focado mais os efeitos da viralidade (por exemplo, seu impacto em termos de engajamento, lealdade ou vendas) do que seus determinantes. Isso resultou na imprevisibilidade desse campo de pesquisa; os profissionais de Marketing entendem a transmissão de informações, mas não têm certeza sobre o tipo de conteúdo que torna algo viral (Miles, 2014Miles, C. (2014). The rhetoric of managed contagion: Metaphor and agency in the discourse of viral marketing. Marketing Theory, 14(1), 3-18. doi:10.1177/1470593113506433
https://doi.org/10.1177/1470593113506433...
). O contágio nos discursos de Marketing é uma atividade baseada no consumo, sendo caracterizada tanto como um desafio quanto como uma oportunidade para os profissionais de Marketing.

Essas teorias de reprodução, contágio, recomendações ou comportamento boca a boca aplicam-se aos memes da internet, uma vez que uma de suas principais características é a reprodução. Wiggins e Bowers (2014)Wiggins, B. E., & Bowers, G. B. (2014). Memes as genre: A structurational analysis of the memescape. New Media & Society, 17(11), 1886-1906. doi:10.1177/1461444814535194
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afirmam que, antes de um meme da internet começa a ser reproduzido com modificações (o que o torna um meme), ele se torna um viral, ou, usando seus termos, um meme emergente. Isso significa que a viralidade é condição prévia para a reprodução. Por meio da reprodução, o meme original torna-se um texto de referência a ser citado e alterado ao longo de sua circulação, um processo conhecido como intertextualidade (a citação implícita de um texto em outro texto, cujo significado se torna mais rico ao referenciar o texto implícito).

A intertextualidade consiste em um processo linguístico-semiótico pelo qual o significado de um texto (imagem, palavras) é modificado, ampliado ou reduzido, combinando-o com outros textos (Blikstein, 2016Blikstein, I. (2016). Técnicas de Comunicação Escrita. São Paulo, SP: Contexto.). Assim, na criação de um meme da internet, o significado da imagem ou texto original é modificado por outros textos ou imagens, adquirindo assim novas conotações que podem ser marcadas pela ironia, sarcasmo, crítica contundente etc. Como mencionamos anteriormente, o meme, visto como objeto, não informa; em vez disso, ele age provocativamente, subvertendo uma resposta esperada ou um texto previsto. É necessário, no entanto, apontar um problema: para que o meme da internet tenha o impacto esperado pelo consumidor que o compartilha ou utiliza, ele deve dialogar com os repertórios de diferentes coletividades de consumidores.

REPERTÓRIOS VERNÁCULOS

Nesta seção, defendemos que esses conteúdos são particularmente proeminentes nos memes da internet. Além da viralidade, as comunidades de consumidores que deram origem aos memes mais populares do período tinham repertórios específicos (Blikstein, 2016Blikstein, I. (2016). Técnicas de Comunicação Escrita. São Paulo, SP: Contexto.), os quais os memes da internet carregaram enquanto eram disseminados on-line por meio de reproduções modificadas. Segundo Blikstein (2016)Blikstein, I. (2016). Técnicas de Comunicação Escrita. São Paulo, SP: Contexto., um repertório é uma peça crucial do processo comunicativo. Os repertórios referem-se ao conhecimento e às referências históricas, geográficas, afetivas, profissionais, artísticas, científicas, místicas e religiosas, entre outras, que são vividas pelos indivíduos ao longo de suas vidas. Essa rede de referências e conhecimentos constitui a bagagem cultural dos indivíduos, também referida como seu repertório. No entanto, essa rede varia de comunidade para comunidade. É possível dizer que diferentes comunidades criam repertórios diferentes.

Dessa forma, qualquer tipo de comunicação, quer consideremos como a mensagem é enviada ou como é decodificada, será influenciado por tais repertórios. Diferentes repertórios levam a diferentes maneiras de perceber o mundo, pessoas e eventos. A partir dessas diferenças de compreensão, muitos ruídos começam a se infiltrar na comunicação, atrapalhando seu mecanismo. A mesma mensagem é, então, decodificada de modo diferente por diversos repertórios - o que significa que indivíduos dentro de comunidades ricas em repertórios decodificarão uma mesma mensagem de modo diferente. A decodificação, portanto, depende não apenas do conhecimento do código, mas também do repertório do indivíduo que recebe a mensagem.

Linguisticamente falando, os repertórios manifestam-se em linguagem vernacular. Resumidamente, a vernacularidade refere-se a uma produção informal (produzida por fontes não institucionais) de discurso (Howard, 2005Howard, R. G. (2005). A theory of vernacular rhetoric: The case of the "sinner's prayer" online. Folklore, 116(2), 172-188. doi:10.1080/00155870500140214
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, 2009Howard, R. G. (2009). Crusading on the vernacular web: The folk beliefs and practices of online spiritual warfare. In T. Blank (Ed.), Folklore and the Internet: Vernacular expression in a digital world (pp. 159-174). Logan, Utah: Utah State University Press.; Milner, 2013Milner, R. M. (2013). Media lingua franca: Fixity, novelty, and vernacular creativity in Internet memes. AoIR Selected Papers of Internet Research, 3, 1-5.); pode ainda ser entendida como tradições orais de comunidades particulares. A forma como usamos a expressão aqui coincide com seu uso em estudos de folclore, um campo tradicional que se concentra nas manifestações vernaculares (Sims & Stephens, 2011Sims, M. C., & Stephens, M. (2011). Living folklore: An introduction to the study of people and their traditions. Logan, UT: Utah State University Press.). Quando vista através dessa ótica, a vernacularidade tende a referir-se àquilo que é produzido localmente: repertórios locais que se manifestam em tropos linguísticos e discursivos ou outras manifestações que refletem esses repertórios. Em suma, os repertórios refletem características culturais manifestadas e compreendidas em um vernáculo específico dessas comunidades locais.

No entanto, no mundo digital, a importância da geografia na definição de fronteiras comunitárias foi substituída por outros tipos de "localidades". À medida que as localizações geográficas perderam significância na criação de repertórios e o consumo ganhou influência como um dos pilares simbólicos mais importantes da vida pós-moderna (Stratton & Northcote, 2014Stratton, G., & Northcote, J. (2014). When totems beget clans: The brand symbol as the defining marker of brand communities. Journal of Consumer Culture, 16(2), 493-509. doi:10.1177/1469540514528194
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), indivíduos e consumidores começaram a se organizar em coletividades on-line, onde, por meio de diferentes práticas (Schau et al., 2009Schau, H. J., Muñiz, A. M., & Arnould, E. J. (2009). How brand community practices create value. Journal of Marketing, 73(5), 30-51. doi:10.1509/jmkg.73.5.30
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), criam repertórios históricos, profissionais, artísticos, científicos, místicos e até religiosos de modo vernacular (Muñiz & Schau, 2005Muñiz, A. M., & Schau, H. J. (2005). Religiosity in the abandoned Apple Newton brand community. Journal of Consumer Research, 31(4), 737-747. doi:10.1086/426607
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).

Muitas das coletividades de consumidores analisadas em estudos anteriores compartilham características em comum, como a definição da identidade de um consumidor como desviante porque as práticas culturais na coletividade do consumidor são subculturais, a adoração de objetos ou marcas específicas de consumo e os etos e rituais compartilhados que ocorrem nesse lócus que não necessariamente é físico (Fournier & Lee, 2009Fournier, S., & Lee, L. (2009). Getting brand communities right. Harvard Business Review, (April), 105-111. Retrieved from https://hbr.org/
https://hbr.org/...
; Stratton & Northcote, 2014Stratton, G., & Northcote, J. (2014). When totems beget clans: The brand symbol as the defining marker of brand communities. Journal of Consumer Culture, 16(2), 493-509. doi:10.1177/1469540514528194
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; Thomas et al., 2012Thomas, T., Price, L. L., & Schau, H. J. (2012). When differences unite: Resource dependence in heterogeneous consumption communities. Journal of Consumer Research, 39(5), 1010-1033. doi:10.1086/666616
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). Essas características são típicas das coletividades de consumidores denominadas subculturas.

Schouten e McAlexander (1995)Schouten, J. W., & McAlexander, J. H. (1995). Subcultures of consumption: An ethnography of the New Bikers. Journal of Consumer Research, 22(1), 43-61. afirmam que as subculturas representam um subconjunto distinto da sociedade que se autosseleciona, com base em um compromisso mútuo com uma determinada classe de produtos, marcas ou atividades do consumidor. Kates (2004)Kates, S. M. (2004). The dynamics of brand legitimacy: An interpretive study in the gay men's community. Journal of Consumer Research, 31(2), 455-464. doi:10.1086/422122
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afirma que uma subcultura é um modo de vida que expressa significados e práticas compartilhadas, mas que também abrange mudanças, desafios e oposição interna para que os participantes definam suas identidades negociando-as com os aspectos subculturais, os quais são "desviantes" quando comparados com o discurso social dominante (Kozinets, 2001Kozinets, R. V. (2001). Utopian enterprise: Articulating the meanings of Star Trek's culture of consumption. Journal of Consumer Research, 28(1), 67-88. doi:10.1086/321948
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).

Como mencionamos durante a nossa breve exposição da história dos memes, "a idade de ouro" dos memes da internet ocorreu durante o ano em que o 4chan, um fórum de discussão on-line permeado pela cultura da trollagem, era mais popular (Phillips, 2015Phillips, W. (2015). This is why we can't have nice things: Mapping the relationship between online trolling and mainstream culture. Cambridge, MA: MIT Press.). As características do 4chan, como um coletivo de consumidores on-line, fazem dele uma subcultura (caráter desviante, além de etos e rituais compartilhados). Dessa forma, ambos os repertórios e o vernáculo ligado a eles surgiram nesse ambiente.

Portanto, uma vez que consideramos a breve história dos memes e as teorias que ajudam a explicar seu funcionamento, é possível afirmar que esses repertórios vernáculos, criados em ambientes digitais fechados, são retrabalhados e reutilizados pelos consumidores à medida que os memes se tornam virais, juntamente com as modificações que são feitas. O meme carrega repertórios diferentes, os quais são modificados pela intertextualidade e se tornam objetos provocadores quando esses repertórios são usados em vários contextos vernaculares. Dois exemplos são apresentados na próxima seção para ilustrar nosso argumento.

DESCREVENDO MEMES DA INTERNET COMO PORTADORES DE REPERTÓRIOS VERNÁCULOS PROVOCADORES

Procedimento para selecionar os memes

Para ilustrar nossos argumentos sobre memes da internet, descreveremos dois exemplos proeminentes que surgiram recentemente nas mídias sociais brasileiras entre coletividades de consumidores com diferentes repertórios. Seguimos o procedimento realizado por estudos semelhantes, como os de Schroeder e Zwick (2004)Schroeder, J. E., & Zwick, D. (2004). Mirrors of masculinity: Representation and identity in advertising images. Consumption Markets & Culture, 7(1), 21-52. doi:10.1080/1025386042000212383
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e Scott e Vargas (2007)Scott, L. M., & Vargas, P. (2007). Writing with pictures: Toward a unifying theory of consumer response to images. Journal of Consumer Research, 34(3), 341-356. doi:10.1086/519145
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, que analisam textualmente figuras representativas (Scott, 1994Scott, L. M. (1994). Images in advertising: The need for a theory of visual rhetoric. Journal of Consumer Research, 21(2), 252-273., 2009Scott, L. M. (2009). Theoretical realism: Culture and politics in commercial imagery. In J. F. Sherry & E. Fischer (Eds.), Explorations in consumer culture theory (pp. 34-54). New York, NY: Routledge.), para derivar significados representativos da teoria.

Para selecionar memes capazes de ilustrar de modo convincente nosso argumento, usamos duas fontes primárias. Dois dos autores deste artigo estiveram imersos em um projeto de longo prazo sobre memes da internet e reconhecem as principais coletividades populares de consumo em que emergem os memes mais populares. No contexto brasileiro, um grupo do Facebook chamado LDRV (abreviatura de Lana del Ray Vevo, grupo inicialmente criado como um espaço para celebrar a cantora Lana del Rey) é considerado como a "máquina de virais brasileira" (Declercq, 2017Declercq, M. (2017). Como o LDRV se tornou a espinha dorsal do Brasil memético. Retrieved from https://www.vice.com/pt_br/article/kz3dz9/como-o-ldrv-se-tornou-a-espinha-dorsal-do-brasil-memetico
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). O LDRV é um grupo fechado no Facebook com mais de 200 mil membros no qual os consumidores publicam dúvidas, situações e acontecimentos diários. Como a reportagem da revista Vice aponta, o primeiro meme da internet analisado aqui surgiu nesse grupo específico. Esse meme usa imagens dos personagens populares do quadrinho brasileiro Turma da Mônica. Considerando a popularidade desse primeiro meme usando os personagens da Turma da Mônica, foi realizada uma busca na plataforma Know Your Meme, procurando memes emergentes baseados nos mesmos personagens populares, resultando na escolha do segundo meme analisado. Para escolher as imagens específicas a serem analisadas, foi realizada uma busca de imagens no Twitter usando os nomes dos memes emergentes (Inbonha e Chola Mais).

Repertórios intertextuais em Inbonha e Chola Mais

O primeiro meme escolhido foi "Inbonha". De acordo com Declercq (2017)Declercq, M. (2017). Como o LDRV se tornou a espinha dorsal do Brasil memético. Retrieved from https://www.vice.com/pt_br/article/kz3dz9/como-o-ldrv-se-tornou-a-espinha-dorsal-do-brasil-memetico
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, o meme "Inbonha" surgiu no LDRV quando um membro do grupo postou a imagem mostrada na Figura 2. A imagem representa a tentativa de uma criança escrever os nomes dos personagens principais da Turma da Mônica. No entanto, todos eles foram nomeados incorretamente. Mônica, o personagem mais icônico, por exemplo, é chamado de "Inbonha" na figura 2.

Figura 2
O meme "Inbonha"

A disseminação do meme nas mídias sociais em geral (ou seja, fora do grupo particular do Facebook) - ou seja, sua viralização - ocorreu principalmente quando duas histórias sobre o assunto foram publicadas no site Buzzfeed. A primeira foi sobre a garota que escreveu errado os nomes dos personagens (Evangelista, 2016bEvangelista, R. (2016b). Esta é a Alice, a menina que criou a "Inbonha." Retrieved from https://www.buzzfeed.com/raphaelevangelista/esta-e-a-alice-a-menina-que-criou-a-inbonha?utm_term=.qd934Lpavz#.vbjM9xoD5K
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), e a outra era sobre as repercussões do meme em outras comunidades on-line (Evangelista, 2016aEvangelista, R. (2016a). Até a Mônica de verdade se rendeu à "Inbonha." Retrieved from https://www.buzzfeed.com/raphaelevangelista/ate-a-monica-de-verdade-se-rendeu-a-inbonha?utm_term=.bvP3zbPpG1#.payDBwKoma
https://www.buzzfeed.com/raphaelevangeli...
). O Gráfico 1 ilustra que a busca pelo termo "Inbonha" no Google atingiu o seu pico em setembro de 2016, o mesmo mês em que as histórias foram publicadas. Dessa forma, a imagem de Inbonha viralizou, se tornando bastante conhecida não só na comunidade onde surgiu pela primeira vez, mas também na internet em geral, constituindo assim um meme emergente. Esse meme emergente (Wiggins & Bowers, 2014Wiggins, B. E., & Bowers, G. B. (2014). Memes as genre: A structurational analysis of the memescape. New Media & Society, 17(11), 1886-1906. doi:10.1177/1461444814535194
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) carregava um repertório (Blikstein, 2016Blikstein, I. (2016). Técnicas de Comunicação Escrita. São Paulo, SP: Contexto.) que refletia a subcultura do grupo LDRV: irônico, lúdico e centrado em questões atuais da cultura pop e práticas subculturais queer (Declercq, 2017Declercq, M. (2017). Como o LDRV se tornou a espinha dorsal do Brasil memético. Retrieved from https://www.vice.com/pt_br/article/kz3dz9/como-o-ldrv-se-tornou-a-espinha-dorsal-do-brasil-memetico
https://www.vice.com/pt_br/article/kz3dz...
). No entanto, depois que a imagem de Inbonha se tornou viral, diferentes manifestações desse meme começaram a aparecer.

Gráfico 1
Pesquisa de tendências para o termo "Inbonha"

Nota: O gráfico indica o pico de popularidade (100) e a proporção de pesquisas.


A Figura 3 fornece um exemplo das modificações intertextuais do meme, onde a imagem só pode ser entendida se o público tiver conhecimento de três memes emergentes diferentes, ou mensagens virais, que foram combinadas para formar essa imagem. O primeiro é Inbonha, como o título do meme (a parte escrita) sugere dizendo: "Em uma escala de 1 a 12, qual é o seu nível de Inbonha hoje?". O segundo é "Em uma escala de 1 a X". Esse meme refere-se à prática viral de justaposição de imagens de celebridades ou outras figuras bem conhecidas retratando diferentes emoções ou sentimentos e atribuindo números a cada imagem para provocar uma resposta nos receptores da imagem (On a scale of 1 to X, 2012On a Scale of 1 to X. (2012). Retrieved from http://knowyourmeme.com/memes/on-a-scale-of-1-to-x
http://knowyourmeme.com/memes/on-a-scale...
). O terceiro meme emergente que é referido na imagem é "Mônicas Deformadas em Muros de Escolinhas" (Metropoles, 2016Metropoles. (2016). Perfil reúne desenhos bizarros da Turma da Mônica em muros de escolas. Retrieved from https://www.metropoles.com/colunas-blogs/pipocando/perfil-reune-desenhos-bizarros-da-turma-da-monica-em-muros-de-escolas
https://www.metropoles.com/colunas-blogs...
), que se refere a uma página do Facebook (Mônicas deformadas em muros de escolinhas, 2018Mônicas Deformadas em Muros de Escolinhas. (2018). Retrieved from https://www.facebook.com/monicasdeformadas/
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) dedicada exclusivamente à divulgação de imagens da Mônica que não a retratam com precisão (pintadas principalmente nas paredes de escolas). Ao fundir completamente esses três memes emergentes, o meme recém-criado juntou-se a diferentes repertórios. O público entende que esse meme altamente intertextual requer o conhecimento de que o meme emergente de Inbonha levará necessariamente a uma descaracterização da Mônica. Em segundo lugar, a escala que provoca reações pressupõe diferentes versões do personagem Mônica. Finalmente, ao usar as Mônicas mal-desenhadas, o meme cria congruência com o repertório cultural proveniente da ideia de Inbonha (infantil, malfeita e errada).

Figura 3
Exemplo de intertextualidade

Assim, para entender esse último meme, o leitor deve ter conhecimento prévio de memes emergentes e outros. Assim, há dois pontos críticos a serem abordados. Primeiro, o meme emergente carrega um repertório que deriva do ambiente vernáculo em que foi criado. Segundo, as modificações que acontecem intertextualmente à medida que o meme é disseminado adicionam repertórios diferentes à mensagem. Elas transformam o objeto em uma complexa rede de significados, que, para serem entendidos, exigem diferentes tipos de conhecimento por parte dos receptores.

O segundo meme analisado por este artigo é o "Chola Mais", que é uma animação 3D mal-projetada de um personagem chamado Cebolinha celebrando em um vídeo sua vitória contra Mônica tendo como música de fundo um remix de um anime japonês (Chola mais/Cwy mowe, 2016Chola Mais / Cwy Mowe. (2016). Retrieved from http://knowyourmeme.com/memes/chola-mais-cwy-mowe
http://knowyourmeme.com/memes/chola-mais...
), o qual é retratado na Figura 4. O Gráfico 2 mostra as tendências de pesquisa para o termo "Chola Mais". Como o gráfico indica, o pico foi em meados do ano 2015, quando protestos contra a ex-presidente brasileira Dilma Roussef, que se seguiram a uma onda de manifestações nas ruas brasileiras (Castells, 2012Castells, M. (2012). Redes de Indignação e Esperança. Rio de Janeiro, RJ: Zahar.; Rosenthal, 2014Rosenthal, B. (2014). Brand image co-creation and individual identity extension in online environments: A Facebook investigation. Escola de Administração de Empresas de São Paulo. Fundação Getulio Vargas. Retrieved from http://bibliotecadigital.fgv.br/dspace/handle/10438/11581
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), estavam acontecendo em todo o País, em que os manifestantes estavam pedindo seu impeachment.

Figura 4
O meme Chola Mais

Gráfico 2
Tendências para a pesquisa do termo "Chola Mais"

Nota: O gráfico indica o pico de popularidade (100) e a proporção de pesquisas.


Uma segunda pesquisa no Twitter mostra que o meme é modificado em relação ao repertório que ele reflete expressando dois temas: futebol e política. Em relação ao futebol, modificações no meme ocorrem quando um time de futebol tem uma vitória crítica. Como ilustra a Figura 5, o meme indica que a vitória do time deve fazer os torcedores do time rival "chorarem mais", já que a vitória foi um evento irreversível, e a única alternativa para os perdedores é lamentarem sua derrota. O segundo contexto é o político. O meme Chola Mais tem sido usado principalmente por movimentos de direita no Brasil, que protestaram contra as políticas e líderes do Partido dos Trabalhadores, concentrando-se principalmente em uma operação conduzida pela Polícia Federal Brasileira para investigar os políticos do Partido dos Trabalhadores e outros partidos envolvidos em escândalos de corrupção (Gomes, 2016Gomes, M. A. de M. (2016). Crítica à cobertura midiática da Operação Lava Jato. Revista Brasileira de Ciências Criminais, (122), 229-253.).

Figura 5
O meme Chola Mais aplicado no contexto do futebol

Um uso exemplar desse meme acontece quando os políticos são representados. Uma figura encontrada no Twitter, por exemplo, retrata uma imagem macro (meme emergente) do político brasileiro Jair Bolsonaro, cujos pontos de vista se conectam a notáveis demandas da direita, como a oposição a políticas públicas que aumentam os direitos dos homossexuais, bissexuais ou trans, como o direito ao casamento homossexual ou financiamento público para processos de transição de gênero, ou a demanda pela criação de leis mais rigorosas para punir criminosos (como mais tempo de sentença) (Grespan & Goellner, 2011Grespan, C. L., & Goellner, S. V. (2011). "Querem, na escola, transformar seu filho de 6 a 8 anos em homossexual": Sexualidade, educação e a potência do discurso heteronormativo. FACED, 19(1), 103-122. doi:10.9771/2317-1219rf.v0i19.5251
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; Lins, Filho, & Silva, 2016Lins, R., Filho, D. F., & Silva, L. (2016). A redução da maioridade penal diminui a violência? Evidências de um estudo comparado 1. Opiniao Publica, 22(1), 118-139. doi:10.1590/1807-0191201622118
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). No meme, há o rosto do político, juntamente com a legenda "Chola mais, esquerdistas", uma referência ao sucesso de Jair Bolsonaro nas urnas e nas mídias sociais (Bretas, 2017Bretas, V. (2017). Bolsonaro cresce para 2018 e se aproxima de Lula, diz pesquisa. Retrieved from https://exame.abril.com.br/brasil/bolsonaro-cresce-para-2018-e-se-aproxima-de-lula-diz-pesquisa/
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). Uma mensagem semelhante à transmitida depois dos jogos de futebol está sendo passada: à medida que a popularidade desse político em particular cresce, seus oponentes só podem "chorar" porque a vitória é irreversível.

Nós apresentamos uma breve conclusão sobre o meme Chola Mais. Mesmo que não seja possível determinar o grupo particular no qual esse meme se originou, ligar o meme ao contexto pode fornecer pistas sobre os repertórios que ele carrega. Os memes Chola Mais foram disseminados principalmente em dois contextos: a onda de protestos contra o governo em 2015 (o pico) e piadas sobre futebol. Portanto, esse meme particular envolve diferentes repertórios em torno de dois assuntos diferentes. No entanto, o que a Figura 5 e as macros de imagem política têm em comum é a mensagem agressiva de humilhação ("Você deveria estar chorando, você perdeu") que o meme retrata. Esse meme apresenta justaposição de elementos engraçados, inocentes ou fofos com mensagens agressivas, que, como visto nas sessões anteriores, é uma das principais características dos memes da internet (Horta, 2015Horta, N. B. (2015). O meme como linguagem da internet: Uma perspectiva semiótica (Master's thesis). Universidade de Brasília. Retrieved from http://repositorio.unb.br/handle/10482/18420
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; Shifman, 2014Shifman, L. (2014). Memes in digital culture. Cambridge, MA: MIT Press.), como também acontece no meme Bert is Evil. No entanto, nesse caso, o meme retrata uma mensagem direta a ser usada em interações on-line, isto é, como forma de impor uma ideologia pelo grupo "vencedor".

Os memes Inbonha e Chola Mais têm algumas características em comum. Em primeiro lugar, ambos descaracterizam personagens brasileiros amados, que são mal-desenhados ou retratados com seus nomes errados (ou ambos). Os personagens também são colocados em situações incomuns, subvertendo assim o seu significado - algo que também é encontrado em outros memes (Horta, 2015Horta, N. B. (2015). O meme como linguagem da internet: Uma perspectiva semiótica (Master's thesis). Universidade de Brasília. Retrieved from http://repositorio.unb.br/handle/10482/18420
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; Shifman, 2014Shifman, L. (2014). Memes in digital culture. Cambridge, MA: MIT Press.; Wiggins & Bowers, 2014Wiggins, B. E., & Bowers, G. B. (2014). Memes as genre: A structurational analysis of the memescape. New Media & Society, 17(11), 1886-1906. doi:10.1177/1461444814535194
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). Além disso, o uso de personagens infantis para retratar situações que não estão relacionadas ao universo infantil mantém seu caráter provocador. Finalmente, ambos carregam mensagens que exigem que um repertório específico seja compreendido e conectado intertextualmente para fornecer argumentos que serão entendidos por públicos específicos envolvidos em conversas particulares (Arvidsson & Caliandro, 2015Arvidsson, A., & Caliandro, A. (2015). Brand public. Journal of Consumer Research, 42(5), 727-748. doi:10.1093/jcr/ucv053
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).

DISCUSSÃO E CONCLUSÕES

No que se refere à pesquisa existente sobre memes da internet, que investigamos por meio da análise dos dois exemplos de casos fornecidos, sugerimos que a dinâmica desses objetos, tanto em relação à sua produção quanto à sua circulação, acontece como ilustrado na Figura 6. No primeiro passo, memes são criados dentro de um ambiente on-line "local", como um grupo no Facebook, um fórum de discussão ou uma comunidade de interesse, que nomeamos como coletividades de consumidores, que são principalmente comunidades on-line com traços subculturais. Esses cenários criam práticas e rituais culturais e comunitários específicos, que se refletem em uma tradição vernacular (Howard, 2008aHoward, R. G. (2008). The vernacular web of participatory me dia. Critical Studies in Media Communication, 25(5), 490-513. doi:10.1080/15295030802468065
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). Como tal, as experiências, normas e vocabulários que se desenvolvem nessa "localidade" digital tornam-se repertórios compartilhados entre seus participantes, que se manifestam e são perpetuados pela vernacularidade que também se cria ali (Blikstein, 2016Blikstein, I. (2016). Técnicas de Comunicação Escrita. São Paulo, SP: Contexto.).

Figura 6
Um esquema que explica a dinâmica dos memes da internet

Numa segunda etapa, o conteúdo que é criado e utilizado nesses grupos carregará alguns dos repertórios linguísticos e culturais dos consumidores que lá participam. Uma vez que esses conteúdos são disseminados por membros desses grupos para um público mais amplo, eles exportam significados que não são necessariamente compreendidos por outros grupos de consumidores ou outros públicos (Arvidsson & Caliandro, 2015Arvidsson, A., & Caliandro, A. (2015). Brand public. Journal of Consumer Research, 42(5), 727-748. doi:10.1093/jcr/ucv053
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). Em outras palavras, eles carregarão os repertórios que foram desenvolvidos dentro dessas comunidades por meio de vocabulários vernaculares. Uma vez que o meme começa a ser disseminado e se torna viral, ou, como Wiggins e Bowers (2014)Wiggins, B. E., & Bowers, G. B. (2014). Memes as genre: A structurational analysis of the memescape. New Media & Society, 17(11), 1886-1906. doi:10.1177/1461444814535194
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descrevem, torna-se um meme emergente, esse repertório também se espalha, sendo "explicado" a outros grupos por atores da rede, como Buzzfeed, Vice Magazine ou a plataforma Know Your Meme. Esse processo geralmente acompanha o pico das pesquisas relacionadas ao meme. Esse processo é importante porque amplificará a compreensão do repertório dessa comunidade particular para outros públicos, proporcionando uma tradução em massa do significado do meme emergente. Esse é um elemento importante que auxilia na viralização de memes emergentes.

Em um terceiro passo, a intertextualidade torna-se proeminente, com outros grupos inserindo diferentes significados e referências no meme à medida que o disseminam para diferentes públicos on-line (Arvidsson & Caliandro, 2015Arvidsson, A., & Caliandro, A. (2015). Brand public. Journal of Consumer Research, 42(5), 727-748. doi:10.1093/jcr/ucv053
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). No entanto, os memes ainda carregam parte dos significados que lhes foram conferidos pelos repertórios vernaculares dos consumidores em um determinado subgrupo on-line. Nesse processo, a natureza intertextual dos memes fundirá diferentes repertórios carregados por diferentes memes emergentes, exigindo assim que o público tenha uma compreensão mais tácita das imagens ou quadros justapostos. Diferentes repertórios traduzidos por diferentes representações visuais ou linguísticas serão conectados, provocando respostas originais do público. A intertextualidade sairá dos processos virais, que devem necessariamente precedê-la; os processos proporcionarão as pistas para o público reagir aos repertórios carregados pelos memes.

Um último ponto fundamento a ser abordado é o uso de marcas como elementos de memes emergentes. Além de ser um elemento cultural difundido na cultura popular brasileira, a Turma da Mônica é uma marca que engloba mais do que apenas a série de quadrinhos. Por exemplo, ela é usada em vários produtos licenciados. Estudos anteriores também entenderam marcas como ícones culturais (Holt, 2004Holt, D. B. (2004). How brands become icons: the principles of cultural branding. Boston, MA: Harvard Business School Press.). Dessa forma, as marcas tornaram-se elementos da cultura popular que, na era da internet, carregam seus próprios significados, os quais podem ser modificados pelos consumidores. A forma como os consumidores interpretam e se relacionam com esses ícones culturais em seus ambientes "locais" também é um elemento importante na criação de seus repertórios.

Implicações para a pesquisa em comportamento do consumidor e teoria e prática em Marketing

De certa forma, é surpreendente que a disseminação dos memes da internet tanto na cultura on-line como nos estudos de comunicação não se reflita na mesma proporção nos estudos sobre consumidores e Marketing. Isso pode ser em parte devido à relativa novidade do fenômeno comparada com o longo histórico de publicação de pesquisas acadêmicas da área (Nooney & Portwood-Stacer, 2014Nooney, L., & Portwood-Stacer, L. (2014). One does not simply: An introduction to the special issue on memes. Journal of Visual Culture, 13(3), 248-252. doi:10.1177/1470412914551351
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). Uma outra possível razão para o fenômeno ter sido ignorado é que só recentemente estudos sobre consumidores e Marketing demostraram interesse em investigar fenômenos relacionados à linguagem e suas complexidades, ou a virada linguística em geral (Thompson et al., 2013Thompson, C. J., Arnould, E. J., & Giesler, M. (2013). Discursivity, difference, and disruption: Genealogical reflections on the consumer culture theory heteroglossia. Marketing Theory, 13(2), 149-174. doi:10.1177/1470593113477889
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). Uma última possível explicação é que pesquisadores que conduzem estudos sobre consumidores e Marketing ainda podem ter dificuldade para identificar como associar memes da internet com questões mais estabelecidas nessas áreas. Até o momento, eles parecem interessados em estudar os memes para aprimorar a compreensão sobre os mecanismos subjacentes da viralidade (por exemplo, por meio da elaboração de modelos epidemiológicos de contágio; Bauckhage, 2011Bauckhage, C. (2011). Insights into internet memes. Fifth International AAAI Conference on Weblogs and Social Media. Retrieved from https://www.aaai.org/ocs/index.php/ICWSM/ICWSM11/paper/viewPaper/2757
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; Guadagno et al., 2013Guadagno, R. E., Rempala, D. M., Murphy, S. & Okdie, B. M. (2013). What makes a video go viral? An analysis of emotional contagion and Internet memes. Computers in Human Behavior, 29(6), 2312-2319.) e as lógicas da produção cultural em ambientes on-line (Knobel & Lankshear, 2007Knobel, M. & Lankshear, C. (2007). Online memes, affinities, and cultural production. In C. Lankshear, M: Knobel, C. Bigum & M. Pters (Eds.), A new literacies sampler (pp. 199-228). New York, NY: Peter Lang Publishing.; Nissenbaum & Shifman, 2017Nissenbaum, A. & Shifman, L. (2017). Internet memes as contested cultural capital: The case of 4chain's/b/board. New Media & Society 19(4), 483-501.). O nosso estudo fornece duas contribuições principais. Em primeiro lugar, ele conecta a pesquisa de memes da internet com enfoque na viralidade com a pesquisa com enfoque na produção cultural. O modelo fornecido na Figura 6 explica como a produção cultural precede e segue a viralidade. Ao fazê-lo, esclarece a lógica e as interdependências intertemporais entre esses dois conceitos e os fluxos de estudos relacionados. Em segundo lugar, apresenta uma nova maneira de conectar o fenômeno dos memes com as pesquisas em comportamento do consumidor e Marketing. Nomeadamente, este estudo argumenta que os memes da internet também são cruciais para investigar comunidades on-line de consumidores, onde as conexões sociais são derivadas de afinidades em cenários vernaculares e práticas expressivas (em nosso contexto, o fato de compartilhar memes em comum).

Em relação ao uso de memes da internet nos estudos sobre consumidores e Marketing para melhor compreender os mecanismos da viralidade on-line, o nosso trabalho estabelece duas contribuições. Como a ideia de "viral" adentrou o mundo do Marketing, tornando-se um modelo de Marketing (Holt, 2004Holt, D. B. (2004). How brands become icons: the principles of cultural branding. Boston, MA: Harvard Business School Press.), a retórica de Marketing tem refletido sobre o problema da "agência" do conteúdo viral (Miles, 2014Miles, C. (2014). The rhetoric of managed contagion: Metaphor and agency in the discourse of viral marketing. Marketing Theory, 14(1), 3-18. doi:10.1177/1470593113506433
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): se a viralidade de qualquer conteúdo é explicada pela dinâmica de rede e interações on-line gerando picos de interesses em uma rede, as ações dos profissionais de Marketing tenderão necessariamente a ser reativas. No entanto, memes, como objetos que são portadores de significado, poderiam ser preditores de possíveis modas, tendências e linguagens que se tornarão virais on-line. À medida que os profissionais de Marketing lutam para entender o que é "cool" e a viralidade do "cool" (Warren & Campbell, 2014Warren, K. & Campbell, M. C. (2014). What makes things cool? How autonomy influences perceived coolness. Journal of Consumer Research 41(82), 543-563.), os memes poderiam ser um artefato interessante para acessar os repertórios vernaculares das comunidades em que emergem. Eles poderiam permitir que fossem feitas previsões e planejamento estratégico levando em conta o "significado" do que é "legal" e como essa capacidade de ser "legal" entrará em conversas.

Um segundo ponto é como os memes, baseados nos significados que carregam, têm direcionalidade (Wiggins, 2016Wiggins, B. E., & Bowers, G. B. (2014). Memes as genre: A structurational analysis of the memescape. New Media & Society, 17(11), 1886-1906. doi:10.1177/1461444814535194
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). Nesse sentido, os significados não são neutros; na verdade, são objetos que atuam como provocadores (Horta, 2015Horta, N. B. (2015). O meme como linguagem da internet: Uma perspectiva semiótica (Master's thesis). Universidade de Brasília. Retrieved from http://repositorio.unb.br/handle/10482/18420
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; Shifman, 2014Shifman, L. (2014). Memes in digital culture. Cambridge, MA: MIT Press.), mas os repertórios ligados a eles têm um público específico. Memes representam algo, sejam eles objetos para passar uma mensagem contra um grupo ideologicamente oposto ou funcionando simplesmente "pela zoeira", isto é, gerando perturbações e risos (Phillips, 2015Phillips, W. (2015). This is why we can't have nice things: Mapping the relationship between online trolling and mainstream culture. Cambridge, MA: MIT Press.).

Em relação ao uso de memes da internet nos estudos sobre consumidores e Marketing para melhor compreender os processos de produção cultural dentro de ambientes on-line, este estudo mostra que os memes são potenciais portadores de significados e repertórios vernaculares entre comunidades fechadas e abertas de consumidores (Arvidsson & Caliandro, 2015Arvidsson, A., & Caliandro, A. (2015). Brand public. Journal of Consumer Research, 42(5), 727-748. doi:10.1093/jcr/ucv053
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). Arvidsson e Caliandro (2015)Arvidsson, A., & Caliandro, A. (2015). Brand public. Journal of Consumer Research, 42(5), 727-748. doi:10.1093/jcr/ucv053
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propõem a ideia de fóruns públicos de marcas ou de consumidores que estão vagamente conectados a marcas por meio de mediações, como hashtags. Considerando como os memes se juntam aos repertórios vernáculos criados em diferentes comunidades, eles promulgam esses diferentes repertórios intertextualmente. Arvidsson e Caliando (2015)Arvidsson, A., & Caliandro, A. (2015). Brand public. Journal of Consumer Research, 42(5), 727-748. doi:10.1093/jcr/ucv053
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propõem que eles são dispositivos de mediação na medida em que são objetos carregando esses significados, conectando diferentes repertórios de grupos específicos e transmitindo direcionalidades (Wiggins, 2016Wiggins, B. E. (2016). Crimea River: Directionality in memes from the Russia - Ukraine conflict. International Journal of Communication, 10, 451-485.) e possibilidades de ruptura.

LIMITAÇÕES E ORIENTAÇÕES PARA ESTUDOS FUTUROS

Este estudo contribui na investigação da associação do fenômeno em expansão dos memes da internet com a pesquisa em comportamento do consumidor e Marketing, principalmente por esclarecer as conexões entre viralidade e produção cultural on-line e abordar o papel das práticas expressivas compartilhadas em coletividades de consumidores on-line. No entanto, limitamos nossa análise empírica a uma única região geocultural, o Brasil, e a dois casos específicos de memes da internet. A fim de promover a transferibilidade dos achados, sugerimos que estudos futuros explorem mais regiões geoculturais e outros tipos de memes. Além disso, enquanto este estudo lança luz sobre o uso de memes para fortalecer e expressar conexões comunitárias entre os consumidores, sugerimos que estudos futuros aprofundem a investigação sobre os vínculos gerados entre memes específicos e coletividades de consumidores on-line.

A seguir, apresentamos algumas vias teóricas que poderiam ser percorridas. Primeiro, a questão da materialidade (Dant, 2005Dant, T. (2005). Materiality and society. Berkshire, UK: Open University Press.; Latour, 2007Latour, B. (2007). Reassembling the social: An introduction to actor-network theory. Hampshire, UK: Oxford University Press.), investigando memes como artefatos materiais que têm agência por eles mesmos. Em segundo lugar, estudar memes sob a ótica da teoria retórica, considerando sua função (Miller, 1984Miller, C. R. (1984). Genre as social action. Quarterly Journal of Speech, 70(2), 151-167. doi:10.1080/00335638409383686
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) e sua interação com a internet como meio (Lanham, 1993Lanham, R. A. (1993). The electronic word: Democracy, technology, and the arts. Chicago, IL: The University of Chicago Press., 2006Lanham, R. A. (2006). The economics of attention: Style and substance in the age of information. Chicago, IL: University of Chicago Press.). Finalmente, considerar os memes como objetos performativos (Harju & Huovinen, 2015Harju, A. A., & Huovinen, A. (2015). Fashionably voluptuous: Normative femininity and resistant performative tactics in fatshion blogs. Journal of Marketing Management, 31(15-16), 1602-1625. doi:10.1080/0267257X.2015.1066837
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; Thompson & Üstüner, 2015Thompson, C. J., & Üstüner, T. (2015). Women skating on the edge: Marketplace performances as ideological edgework. Journal of Consumer Research, 42(2), 235-265. doi:10.1093/jcr/ucv013
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) que têm uma função linguística e refletem tensões que desafiam/reificam estruturas de poder encontradas dentro das coletividades de consumidores predominantemente on-line.

  • NOTA DA RAE
    Uma versão preliminar deste artigo foi apresentada na International Social Networks Conference (ISONEC), promovida pela Fundação Getulio Vargas, Escola de Administração de Empresas de São Paulo em 2017, São Paulo, Brasil.
  • Versão traduzida

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Editado por

Avaliado pelo sistema double blind review. Editora Científica: Eliane Brito

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    10 Jul 2019
  • Data do Fascículo
    May-Jun 2019

Histórico

  • Recebido
    26 Fev 2018
  • Aceito
    18 Out 2018
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