Acessibilidade / Reportar erro

Das empresas multinacionais ao sistema transacional

ARTIGOS

Das empresas multinacionais ao sistema transacional* * Extraído de Meister, Albert. L'Inflation créatrice. Trad. João Vicente de Abreu Neto e Roberto Venosa. 1. ed. Paris, Presses Universitaires de France, 1975. cap. 1, p. 27-31/44-7.

Albert Meister

Maître Assistant na École des Hautes Études en Sciences Sociales, Paris, França

Por uma questão de método, seria conveniente colocar, de início, a questão do caráter verdadeiramente multinacional das empresas assim denominadas e verificar se a ênfase em multinacional não serve para mascarar o imperialismo dos países de origem dessas empresas, de cujos interesses estariam a serviço. Afinal, a) a direção central dessas empresas encontra-se localizada nesses países de origem (Estados Unidos, em particular), além de ser composta, na maioria das vezes, de cidadãos desses mesmos países; b) a centralização das decisões limita a autonomia das filiais estrangeiras. Apesar das multinacionais americanas especularem com o dólar, são raros os casos em que essas empresas se opõem aos acordos militares ou comerciais entre os Estados. Colocar essas questões em termos de multinacionalidade não esclarece o debate, tendo em vista os laços de lealdade que unem tais empresas aos países de origem, e podendo-se mesmo observar a formação de vínculos entre elas, a partir de uma nacionalidade comum. Em conclusão, como declarava um antigo dirigente de multinacional, não haveria, com base nesses argumentos, senão duas autênticas firmas multinacionais: O Vaticano e a Cruz Vermelha.

É necessário, pois, abandonar esse debate. Partindo da constatação evidente de que essas firmas ignoram as realidades nacionais e ultrapassam as barreiras e instituições dos Estados, devemos colocar-nos ao nível do sistema que elas constituem, o qual é verdadeiramente transnacional, graças às relações mantidas com as instituições e os dirigentes nacionais (dos quais elas procuram mais a complacência que a proteção). Invisível, não institucionalizado e sem doutrina, esse sistema não possui uma ambição supranacional: a ONU, por exemplo, pertence ao passado.

Perguntar se as empresas multinacionais se afastaram ou não das suas origens e vínculos nacionais faz pouco sentido, pois, ainda uma vez, o sistema que elas articulam é transnacional. Assim, uma empresa, a ITT, contribuindo para a queda do socialismo chileno, permanece profundamente ligada às suas origens e à política americana, e serve, ao mesmo tempo, de consolidação do sistema transnacional, pois a lição dada em Santiago deve ser compreendida em Lima, em Bangkok, em Praga e em Nairobi; em resumo, em todos os lugares onde existe a necessidade de ordem e de paz social, para o bem dos negócios.

Dois fatos devem ainda ser sublinhados: primeiro é preciso lembrar que foi somente a partir da metade da década de 1960 que outros países, além dos Estados Unidos, tiveram acesso a um nível de desenvolvimento suscetível de gerar sociedades multinacionais, obviamente grupos de dimensão internacional, como a Nestlé ou a Unilever que já existiam antes, não obstante esses grupos constituírem exceções em economias ainda caracterizadas por uma fraca concentração capitalista. A partir dos anos 60, os grandes grupos americanos não são mais os únicos a investir no estrangeiro e pode-se falar de empresas multinacionais de nacionalidades diferentes, mesmo que as maiores - e a maioria - ainda sejam americanas. O fenômeno da empresa multinacional aparece, portanto, a partir de um certo estágio de desenvolvimento das forças e dos aparelhos de produção, marcado pela predominância do capital sobre os outros fatores de produção. Concentração capitalista quer dizer concentração de capitais e de meios (organização, homens, conhecimentos, etc.) destinados a rentabilizá-los, o que vem se realizando tanto nas economias capitalistas quanto nos países socialistas avançados. É este mesmo fenômeno que nos autoriza a falar de conjunto ocidental, em -oposição aos países menos desenvolvidos e, portanto, periféricos. A inclusão das empresas de países socialistas nesse conjunto resulta dos seguintes fatores: o triunfo do modelo ocidental de organização do trabalho e da noção ocidental de progresso, e a unificação ideológica produzida a partir dos pressupostos de racionalidade, de management científico, de rentabilidade máxima dos fatores de produção e, em particular, do mais escasso dentre eles, o capital. Tentarei mostrar como essas idéias deixaram em segundo plano, de um lado, as ideologias sociais que pretendiam fazer da empresa muito mais do que uma simples unidade de produção, e de outro, as ideologias socialistas que submetem as decisões empresariais às prioridades de uma planificação democrática. Lembremo-nos que os construtores dos impérios industriais e financeiros não foram inibidos por qualquer consideração de tipo moral ou ideológica e que foram apoiados pelos governos, geralmente de direita, da maioria dos países desenvolvidos. A linguagem realista e otimista de uns e outros foi admiravelmente compreendida pelos governantes dos países socialistas, preocupados de modo crescente com a procura de bens de consumo e interessados na dinamização do planejamento. A encampação de empresas estrangeiras, a participação na tomada de decisões, as diretorias mistas, as associações de produção, as joint ventures, o desaparecimento da distinção entre setor público e privado, o desenvolvimento de firmas de economia mista, toda essa trama do sistema transnacional não seria tecida tão facilmente se as empresas européias não tivessem alcançado o nível das americanas e se a unificação ideológica não tivesse substituído as velhas considerações nacionalistas e doutrinárias nelo realismo das dependências múltiplas.

O dossiê sobre o poderio crescente das empresas multinacionais avoluma-se de forma contínua e não seria nossa tarefa atualizá-lo agora. Não é, entretanto, inútil lembrar alguns fatos, tais como: no Ocidente, 1.000 a 2.000 empresas fornecem mais de 75% da produção; nos Estados Unidos, menos de 200 empresas possuem mais de 60% do capital nacional; na França, onde a concentração é bem menos aguda, 0,4% das empresas, isto é, 800 empresas, asseguram 37% da produção total. Da mesma forma, a vocação internacional é atributo de um número restrito de empresas. Na Inglaterra, 165 empresas detêm 80% dos investimentos ingleses no estrangeiro; na Alemanha, 82 empresas controlam 70% do investimento alemão no exterior; nos Estados Unidos, 190 empresas são responsáveis por 3/4 do investimento realizado no exterior.1 1 Grapin, Jacqueline. Paris, Le Monde, 5 juin 1974.

O crescimento dessas empresas só pode acentuar-se. A regra é a eliminação gradual dos competidores mais fracos, até que se realize, para cada produto, uma estrutura oligopolista composta de algumas grandes sociedades, seu número não ultrapassando, em geral, uma meia dúzia. Atualmente, quatro a cinco empresas importantes partilham 50% a 80% da produção dos manufaturados".2 2 Levinson, Charles. L'Inflation mondiale et les firmes multinationales. Paris, Seuil, 1973. 252 p. As alianças entre cartéis e os acordos de participação multiplicam-se por vezes com a aquiescência e a ajuda dos governos - como ocorre na siderurgia, onde as sociedades européias, japonesas e americanas já dividiram o mercado. Por outro lado, o tamanho das empresas lhes permitirá prescindir até mesmo da ajuda estatal; ao Estado, elas se limitariam a pedir que deixasse seu campo livre, da mesma maneira que os industriais do século passado reivindicavam o poder de agir sem restrições e solicitavam a desarticulação das associações operárias e das organizações de oposição. Apoiadas em esquemas de relações públicas e até mesmo fazendo parte do todo estatal, as empresas multinacionais quase sempre obtêm muito mais vantagens.

A procura de capitais deverá suscitar a criação de várias instituições financeiras, resultantes da associação entre o sistema bancário e as grandes empresas. No Japão, os grandes conglomerados possuem sua própria cadeia de bancos. Na Alemanha, 70% das ações das indústrias são controladas ou administradas pelos bancos privados. As multinacionais financeiras concluem entre si acordos de participação e dominam cada vez mais a cena mundial.

Os setores de produção mais capitalizados - química, plásticos, eletrônica - são também os mais concentrados. Na Alemanha, graças às fusões e à compra das pequenas empresas, as três ramificações da famosa I. G. Farben - Bayer, BASF e Hoechst -, ligadas entre si por acordos múltiplos, reconstituem, em ritmo acelerado, o antigo império desaparecido. Como os encargos salariais incidem cada vez menos sobre os custos de produção, as indústrias químicas japonesas e hindus investem nos países avançados (Europa e América), apesar dos altos salários.

Esses exemplos nos mostram que as grandes empresas tendem a se liberar dos seus laços nacionais; o que nos. levaria mesmo a questionar a existência atual de um imperialismo americano.

1. A PENETRAÇÃO DAS TRANSNACIONAIS NAS ECONOMIAS SOCIALISTAS

Se a essência das firmas multinacionais consiste em se liberar dos vínculos nacionais, facilmente admitiremos que elas desconsiderem as diferenças ideológicas e que se aliem de bom grado às empresas socialistas.

Este raciocínio, no entanto, é falso, pois, a rigor, não existindo mais empresas organizadas segundo os princípios socialistas, torna-se fácil para as firmas ocidentais se aliarem às suas correspondentes socialistas, uma vez que estas últimas estão estruturadas segundo as mesmas diretrizes administrativas; a Harvard Business School e similares são, hoje em dia, extremamente populares nos países socialistas.

Não pretendo, de modo algum, revirar velhos baús a fim de estabelecer quais seriam os princípios socialistas de gestão de empresas; limitar-me-ei apenas à constatação das semelhanças entre as empresas socialistas e suas irmãs ocidentais: quase nenhuma diferença nos organogramas; os mesmos controles de produção e da cadência de trabalho; sistemas de remuneração e de relações industriais semelhantes; as mesmas preocupações com a acumulação e com a rentabilidade; estratificação social idêntica, separando colarinhos brancos de um lado e operários de outro. Sob esses aspectos, nem sequer as empresas autogeridas iugoslavas apresentam diferenças significativas, apesar de terem sido formalmente concebidas para a prática da democracia industrial.3 3 Cf. Meister, Albert. Où va l'autogestion yougoslave? Paris, Anthropos, 1970. p. 386.

Claro está que, nas empresas socialistas, tanto o planejamento quanto a alocação de recursos são muito mais centralizados. No entanto, os controles estão diminuindo cada vez mais e a gerência dessas empresas vem adquirindo uma maior margem de manobra. Daí, a popularidade das idéias de organização "científica" do trabalho. Os insucessos de uma planificação rígida favorecem o intercâmbio e a colaboração com as homônimas ocidentais, bem como a adoção de métodos de gestão menos rígidos e mais eficazes, quando essas economias tiveram que responder a uma demanda maior e mais diferenciada de bens de consumo. Além disso, como as sociedades socialistas encontram-se em plena crise ideológica e tomam consciência de seu caráter de sociedades de classes, não existe qualquer impedimento para a colaboração com as empresas ocidentais.4 4 Pode-se duvidar de que essa colaboração venha ajudar a "edificação do socialismo", como acredita Nicolas Ceauscesco. Le Monde, Paris, 5-6 mai 1974.

Tanto de um lado quanto do outro, os valores são os mesmos: lucros, status, poder. Os gerentes das empresas ocidentais chegam até a invejar seus correspondentes socialistas, na medida em que estes últimos, pelo poder de que dispõem, pouco precisam se preocupar com as reações de partidos ou da oposição e mesmo dos sindicatos. Mais facilmente se negociam acordos, pois os políticos não interferem... e não é por acaso que as grandes empresas se entendem muito bem com os governos fortes e, em particular, com as ditaduras existentes nos países novos; a força se reconhece na força, os poderosos fazem o mesmo jogo. Devemos lembrar que a coexistência pacífica coincide com uma retomada da repressão aos contestadores e uma reafirmação da burocracia neo-stalinista, em particular na União Soviética. As evidências da boa entente se multiplicam: os Estados Unidos obtêm o apoio de Moscou, tanto quando dão cabo das veleidades de um jogo europeu organizado, como quando aniquilam o socialismo chileno, no qual o caráter democrático constituía uma heresia de grande porte, aos olhos dos dois grandes parceiros; para preservar o statu quo, a União Soviética encoraja Castro a se reconciliar com Washington, como também não faz segredo de sua preferência pela vitória de Giscard d'Estaign nas eleições francesas; enfim, não é absurdo pensar que os ocidentais tenham solicitado aos soviéticos uma ajuda para acalmar o apetite dos países produtores de petróleo durante a crise de 1973.

Fundamentados na prática ocidental, vêm-se multiplicando nestes últimos dez anos5 5 Década de 60. N.T. os acordos de cooperação entre multinacionais e firmas ou organismos financeiros do Leste, bem como se vêm formando associações com o fim de se transformarem em empresas capazes de aliar a exploração do know-how ocidental aos benefícios do baixo custo de mão-de-obra na Europa Oriental... Os móveis dinamarqueses provêm da Polônia, os eletrodomésticos austríacos vêm da Tchecoslováquia, os equipamentos sanitários italianos são manufaturados na Hungria; parte dos automóveis Renault é fabricada na Romênia e na Iugoslávia;6 6 A respeito, consultar o artigo de Michel Bosquet em Le Nouvel Observateur, 15oct. 1973. para burlar as leis que proíbem o lucro capitalista e a transferência de capitais para o estrangeiro, foram concebidos sofisticados sistemas, tais como a subvaloração do produto exportado.

Seguindo o exemplo do Chase Manhatan Bank, outros bancos estão abrindo filiais nos países do Leste; os bancos soviéticos, por sua vez, gozam de excelente reputação junto aos bancos ocidentais; a União Soviética possui uma instalação de montagem de veículos na Bélgica, refinarias de petróleo em Anvers e participação em sociedades francesas; a Polônia e a Hungria possuem empresas de mineração no Canadá e a Áustria está se tornando sede de várias" organizações ocidentais, ansiosas por negociarem com os países do Leste. O Comecon Investment Bank, organismo criado pelos países-membros da Comunidade Européia, já estuda o lançamento de emprunts no mercado internacional; as empresas iugoslavas autogeridas assinaram acordos a longo prazo com empresas estrangeiras e já é permitida a penetração do capital estrangeiro nas empresas iugoslavas; um dos maiores produtores de material bélico nos EUA, a General Dynamics, assinou um acordo de cooperação técnica que deverá resultar na fabricação de seus produtos na União Soviética, estando mesmo prevista a exportação dos produtos finais;7 7 Cf. Levinson, C. Le Monde, Paris, 8 jan. 1974. e, finalmente, como se tudo isto não bastasse, o International Institute of Applied Systems Analysis, sediado em Viena, e que tem como presidente um genro de Kossiguin, como diretor um professor de Harvard e, no seu quadro dirigente, representantes de países do Leste e Oeste, propõe-se à difusão das técnicas de gestão desenvolvidas pelas empresas ocidentais.8 8 Cf. Horowitz, I. L. Capitalism, communism and multinationalism. Society, (2):32-43,1974.

Para as empresas multinacionais, a União Soviética representa um mercado considerável, que poderá fornecer as matérias-primas e a energia de que as economias ocidentais e o Japão necessitam cada vez mais. Por sua vez, para a URSS, a cooperação internacional não apenas é necessária para seu desenvolvimento industrial e para responder à demanda de bens de consumo, mas, também, para melhorar a qualidade técnica de sua agricultura. O comportamento soviético ao longo da crise monetária, e as cautelas tomadas para não prejudicar a divisa americana são bons indicadores de sua vontade de cooperação; em contrapartida, a URSS já indicou que a reforma monetária internacional deverá ter seu aval, constituindo, assim, a porta pela qual ela entrará, quando julgar oportuno9 9 Nouvel Observateur, 27 aoüt 1973. .

Tanto esta porta aberta quanto os exemplos citados mostram a afinação entre os dois sistemas. Ainda que o parceiro mais constante seja o americano, nem assim a diplomacia soviética deixa de praticar uma abertura econômica aos demais países capitalistas, o que segue a lógica das transnacionais e visa não só os Estados-Nações como também as firmas; os soviéticos propõem ofertas de cooperação, com vantagens recíprocas para ambos. Os países socialistas, obedecendo a essa mesma lógica e a essa orquestração gigantesca, associam-se a firmas que têm interesses tanto em Israel quanto em países árabes, ou mesmo na Espanha ou na Hungria. Da mesma forma, a Polônia e a Áustria efetuaram investimentos comuns na Grécia. Somente os ideólogos mais idosos e saudosistas encontram ainda algo a dizer e se insurgem em situações como a de 1970, quando a Polônia forneceu um carregamento de carvão para ajudar o Governo espanhol a reduzir o impacto da greve dos mineiros nas Astúrias.

A longo prazo, pois, a cooperação está apenas se iniciando; as firmas "transideológicas"10 10 Expressão de um dos adeptos dessas empresas, Samuel Pizar. In: Le Monde, 1 sept. 1973. surgirão como instrumentos de aproximação Leste-Oeste e de fusão entre os dois imperialismos, no sistema transnacional.11 11 Cf. Meister, Albert. L 'Inflation créatrice. Paris, PUF, 1975. A curto prazo, entretanto, e para realizar tal programa, a demanda de investimentos se manterá no seu nível máximo, com as conseqüências inflacionárias decorrentes da sobretaxa imposta aos consumidores ocidentais, e/ou mediante políticas de subconsumo, impostas aos consumidores nos países de economia planificada.12 12 A sobretaxa ou poupança indireta, calculada para manter a taxa de investimentos, traduz-se também em subconsumo, uma vez que os investimentos obrigam a constantes revisões no plano financeiro. Teoricamente, os países de economia planificada têm maiores possibilidades para forçar a poupança, pois podem decidir parar a fabricação de produtos considerados supérfluos ou limitar a renda individual. Devemos lembrar sempre que tais medidas, características do crescimento nas economias socialistas, nos dias atuais dificilmente poderão ser postas em prática. O escalonamento dos rendimentos não tem sentido se não corresponder a níveis de consumo diferenciados, e é quase impossível evitar o escalonamento de rendimentos, uma vez que os estimulantes ideológicos perderam seus efeitos. A aproximação com o Ocidente e a penetração de modos ocidentais de consumo somente acentuarão a demanda destes bens e serviços, os quais deverão ser ofertados, pois a demanda emana das camadas sociais que detêm as faixas de renda mais elevadas e que são a garantia de produtividade das empresas. Não aumentar a gama de bens disponíveis ou diminuir o poder de compra desta camada social significará uma queda na produtividade das empresas (nas quais essas camadas são os executivos), o que os regimes socialistas não podem se permitir, tendo em vista os imperativos do crescimento. Da mesma maneira, não poderão ser atendidas somente as exigências de consumo dos grupos afins à classe dirigente, pois a democracia relativa e sobretudo a influência dos meios de comunicação provocaram novas demandas de bens de consumo. A incorporação nos preços - forma de poupança indireta - parece ser a única saída possível para equilibrar o planejamento financeiro e pode-se prever a emergência, nos países socialistas, de uma inflação semelhante á existente nos países capitalistas. O exemplo da liberalização econômica iugoslava, o enfraquecimento do caráter imperativo do controle centralizado e o abrandamento do fator ideológico (e, portanto, o crescimento da necessidade de incentivos materiais) devem ser elementos-chave para a compreensão destas questões. Acrescentemos que, a partir de 1974, os países da Comunidade Econômica Européia abandonaram a política de reajustes qüiqüenais dos preços, e adotaram reajustes conforme as leis do mercado mundial: tal medida de "preços realistas" deverá, necessariamente, recair sobre os consumidores.

  • 1 Grapin, Jacqueline. Paris, Le Monde, 5 juin 1974.
  • 2 Levinson, Charles. L'Inflation mondiale et les firmes multinationales. Paris, Seuil, 1973. 252 p.
  • 9 Nouvel Observateur, 27 aoüt 1973.
  • *
    Extraído de Meister, Albert.
    L'Inflation créatrice. Trad. João Vicente de Abreu Neto e Roberto Venosa. 1. ed. Paris, Presses Universitaires de France, 1975. cap. 1, p. 27-31/44-7.
  • 1
    Grapin, Jacqueline. Paris,
    Le Monde, 5 juin 1974.
  • 2
    Levinson, Charles.
    L'Inflation mondiale et les firmes multinationales. Paris, Seuil, 1973. 252 p.
  • 3
    Cf. Meister, Albert.
    Où va l'autogestion yougoslave? Paris, Anthropos, 1970. p. 386.
  • 4
    Pode-se duvidar de que essa colaboração venha ajudar a "edificação do socialismo", como acredita Nicolas Ceauscesco.
    Le Monde, Paris, 5-6 mai 1974.
  • 5
    Década de 60. N.T.
  • 6
    A respeito, consultar o artigo de Michel Bosquet em
    Le Nouvel Observateur, 15oct. 1973.
  • 7
    Cf. Levinson, C.
    Le Monde, Paris, 8 jan. 1974.
  • 8
    Cf. Horowitz, I. L. Capitalism, communism and multinationalism.
    Society, (2):32-43,1974.
  • 9
    Nouvel Observateur, 27 aoüt 1973.
  • 10
    Expressão de um dos adeptos dessas empresas, Samuel Pizar. In:
    Le Monde, 1 sept. 1973.
  • 11
    Cf. Meister, Albert.
    L 'Inflation créatrice. Paris, PUF, 1975.
  • 12
    A sobretaxa ou poupança indireta, calculada para manter a taxa de investimentos, traduz-se também em subconsumo, uma vez que os investimentos obrigam a constantes revisões no plano financeiro. Teoricamente, os países de economia planificada têm maiores possibilidades para forçar a poupança, pois podem decidir parar a fabricação de produtos considerados supérfluos ou limitar a renda individual. Devemos lembrar sempre que tais medidas, características do crescimento nas economias socialistas, nos dias atuais dificilmente poderão ser postas em prática. O escalonamento dos rendimentos não tem sentido se não corresponder a níveis de consumo diferenciados, e é quase impossível evitar o escalonamento de rendimentos, uma vez que os estimulantes ideológicos perderam seus efeitos. A aproximação com o Ocidente e a penetração de modos ocidentais de consumo somente acentuarão a demanda destes bens e serviços, os quais deverão ser ofertados, pois a demanda emana das camadas sociais que detêm as faixas de renda mais elevadas e que são a garantia de produtividade das empresas. Não aumentar a gama de bens disponíveis ou diminuir o poder de compra desta camada social significará uma queda na produtividade das empresas (nas quais essas camadas são os executivos), o que os regimes socialistas não podem se permitir, tendo em vista os imperativos do crescimento. Da mesma maneira, não poderão ser atendidas somente as exigências de consumo dos grupos afins à classe dirigente, pois a democracia relativa e sobretudo a influência dos meios de comunicação provocaram novas demandas de bens de consumo. A incorporação nos preços - forma de poupança indireta - parece ser a única saída possível para equilibrar o planejamento financeiro e pode-se prever a emergência, nos países socialistas, de uma inflação semelhante á existente nos países capitalistas. O exemplo da liberalização econômica iugoslava, o enfraquecimento do caráter imperativo do controle centralizado e o abrandamento do fator ideológico (e, portanto, o crescimento da necessidade de incentivos materiais) devem ser elementos-chave para a compreensão destas questões. Acrescentemos que, a partir de 1974, os países da Comunidade Econômica Européia abandonaram a política de reajustes qüiqüenais dos preços, e adotaram reajustes conforme as leis do mercado mundial: tal medida de "preços realistas" deverá, necessariamente, recair sobre os consumidores.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      08 Ago 2013
    • Data do Fascículo
      Set 1979
    Fundação Getulio Vargas, Escola de Administração de Empresas de S.Paulo Av 9 de Julho, 2029, 01313-902 S. Paulo - SP Brasil, Tel.: (55 11) 3799-7999, Fax: (55 11) 3799-7871 - São Paulo - SP - Brazil
    E-mail: rae@fgv.br