Acessibilidade / Reportar erro

O desenvolvimento e o administrador

FÓRUM DE OPINIÕES

O desenvolvimento e o administrador

"Prezada Sr.ta Yolanda F. Balcão

Redatora-Chefe da Revista de Administração de Emprêsas

"Em primeiro lugar desejo expressar a satisfação que tive ao ler o artigo publicado pelo Prof. ARY BOUZAN na RAE n.º 19, sob o título 'O Administrador de Emprêsas no Desenvolvimento do Brasil'. Quero também congratular-me com o ilustre professor pela brilhante exposição do problema do desenvolvimento.

"Antes de iniciar qualquer comentário sôbre o assunto, apresento-me como modesto estudante, quartanista de Ciências Econômicas da Faculdade de Ciências Políticas e Econômicas da P.U.C.R.S.. Esclareço, ainda, que trabalho no comércio (dois turnos) e estudo à noite; portanto, sobra-me pouco tempo para me dedicar a estudo mais profundo sôbre o desenvolvimento.

"Entretanto, dentro da limitação de meus conhecimentos sôbre o assunte, com relação ao início da industrialização brasileira, não pude compreender o que o autor quis dizer com 'uma espécie de industrialização compulsória. Nas palavras do autor: 'Dentro dêsse conjunto de normas, ocuparam lugar de destaque o sistema cambial e a tarifa alfandegária, a qual prestigiou o setor industrial de duas formas: pela concessão de taxas mais favoráveis para as importações de equipamentos e matérias-primas e pela proteção da produção nacional...'. Gostaria de ver esclarecida a matéria pois sinceramente não compreendi o que o autor quis dizer.

"O autor diz ainda que o desenvolvimento no Brasil durante a Segunda Grande Guerra se deveu aos sistemas cambiais e tarifários. Em parte concordo com êle. Entretanto, do meu ponto de vista, cabe uma observação: para mim o início do desenvolvimento e da industrialização no Brasil foi forçado. Forçado porque? Porque durante a Guerra o Brasil não podia importar bens e equipamentos de consumo, em virtude de os países que o abasteciam estarem empenhados na produção de materiais bélicos. Por isso o sistema cambial não exercia nenhuma influência sobre o problema de importação. Enquanto isso, os exportadores brasileiros continuavam a exportação de produtos primários e agrícolas, acumulando divisas sem poder usá-las nas importações. Assim, muitos começaram a investir no setor industrial privado, enquanto outros pressionavam o Governo para criar a indústria nacional. Ainda em decorrência do consumo interno e das exigências do público, o Govêrno viu-se na contingência de criar e apoiar as iniciativas privadas.

"É por essa razão que acho que o desenvolvimento brasileiro seja obra forçada. No Japão e na Rússia é de nosso conhecimento que o govêrno deliberou sobre o desenvolvimento e o tipo de política 'desenvolvimentista' que êsses países deveriam seguir. Sabemos, também, que outros países tiveram um sistema de desenvolvimento espontâneo; porém, êsse não é o caso do Brasil.

"No que diz respeito ao ponto principal, ou seja, à qualidade do administrador em si, estou inteiramente de acordo com o autor. O administrador, para acompanhar a evolução dos negócios atuais, deve, no mínimo, possuir conhecimentos de ordem econômica e social; caso contrário, estará fadado ao malôgro.

"Transmita meus agradecimentos ao autor pela brilhante explanação sobre o administrador e suas qualidades indispensáveis.

MARCOS ANTÔNIO VIEIRA

Porto Alegre, RS

Resposta:

"Agradeço ao acadêmico MARCOS ANTÔNIO VIEIRA a carta relacionada com o artigo 'O Administrador de Emprêsas no Desenvolvimento do Brasil'. O primeiro ponto nela levantado consiste num pedido de esclarecimento sôbre o sentido da expressão 'industrialização compulsória' usada no artigo.

"O que se quer dizer com essa expressão é básicamente o seguinte:

"1. Durante a Segunda Grande Guerra as importações de produtos manufaturados, matérias-primas e combustíveis foram sensivelmente comprimidas em decorrência da conversão para a produção bélica de grande parte da indústria americana e européia. Além disso, a própria insegurança nos transportes marítimos transformou-se em fator adicional que ajudou a diminuir as importações. Em conseqüência - e a despeito do fato de que dita compressão afetou também a produção industrial, dificultando a reposição de equipamentos velhos e a aquisição de novos, pela falta de combustíveis etc. - não há dúvida de que se criou uma situação altamente favorável à indústria nacional. Por um lado, o produtor estrangeiro ficou temporàriamente afastado; por outro, a renda nacional manteve-se em expansão, principalmente em decorrência do acentuado aumento nos preços das exportações brasileiras. Essas contingências acabaram por criar condições estimulantes à expansão industrial que caracterizou a economia brasileira na época.

"2...Além disso, como é sabido, em 1947, em vista do desequilíbrio do balanço de pagamento que já se fazia sentir, o govêrno necessitou optar por uma de duas alternativas: ou produzir uma depreciação cambial, ou introduzir um sistema de racionamento de câmbio. Como a primeira seria inflacionária (e já então a economia brasileira vivia intenso surto inflacionário que ganhou proporções mais acentuadas durante a Guerra), optou-se pela segunda. Daí o sistema de monopólio de câmbio administrado pela CEXIM, o qual, como se sabe, deu preferência às importações de bens de interêsse das indústrias. Em outras palavras: ao optar entre o produtor e o consumidor, o govêrno deu preferência ao primeiro, orientando o sistema cambial de maneira a assegurar a preferência para as importações necessárias à indústria.

"3. No nôvo sistema cambial pôsto em vigor em 1953, através da Instrução 70 (esquema OSWALDO ARANHA), as importações de interêsse da indústria continuaram a receber tratamento preferencial através de colocação entre as primeiras categorias de importação.

"4. Ê preciso compreender que, até 1957, o Brasil praticamente não dispunha de sistema tarifário capaz de estimular a industrialização. A lei em vigor até essa época, por ser de natureza 'específica' e não ad-valorem, tornou-se obsoleta em conseqüência da inflação. Isso explica a preocupação então existente de fazer com que o sistema cambial fôsse uma espécie de híbrido de câmbio e tarifa. Com a 'lei de tarifas', posta em vigor em 1957, o sistema cambial tornou-se menos importante no tocante aos estímulos à indústria, reservando-se essa tarefa à nova lei.

"Foi êsse conjunto de medidas - aqui descrito sumariamente - que exerceu papel decisivo para a expansão industrial do após-guerra, além do próprio conflito mundial, que indiscutivelmente produziu impacto profundo naquela expansão. A isso chamamos - talvez à falta de expressão mais adequada - industrialização compulsória.

"Quero crer que os demais pontos abordados na carta tenham sido esclarecidos ou comentados na síntese acima.

"Manifesto, finalmente, meu entusiasmo pelo interêsse do acadêmico pela matéria tratada e pela disposição em solicitar esclarecimentos a pontos que a seu ver não estavam totalmente claros.

ARY BOUZAN"

São Paulo, SP

UMA SUGESTÃO

"Sr.ta Yolanda F. Balcão

"Redatora-Chefe da Revista de Administração de Emprêsas

"Aplacando o dispositivo contemporizador que temos em nós e varando a avalanche de coisas a fazer, estou-me comunicando com V. S.ª para breve diálogo sôbre o óbvio e mesmo sôbre o transcendental.

"Duas razões me levaram a êsse ato de heroísmo: (a) o Editorial do n.º 19 da RAE, em que V. S.ª diz ser parca a correspondência do leitor; (b) o artigo do mesmo exemplar: 'Programação Linear ou Programação Matemática (Uma Exposição Não-Matemática)'.

"Sôbre o Editorial, o que me cativou foi o fato de não ter sido êle escrito por um computador eletrônico, ou mesmo por uma máquina de escrever, dessas traquejadas que, com o tempo, passam a produzir sozinhas. Percebe-se que por trás do Editorial há alguém de espírito que analisa, duvida, deseja e tira conclusões de maneira humana; nao um simples mecanismo de redigir.

"O artigo 'Programação Linear ou Matemática', por outro lado, achei-o uma 'delicia'. Simples, bem estruturado e ilustrado; preenche justamente uma necessidade que eu vinha tendo.

"CAUCHY, ilustre matemático, dizia imaginar o céu como um lugar onde se passasse o dia todo a se resolverem problemas matemáticos bem 'bolados' e a discutir questões motivadoras e de gênio. O artigo fica aquém dêsses limites, mas elevou-me a um céu particular dêsse gênero: o céudas-coisas que-nos-agradam.

"Como pode ver a autora do Editorial, apreciadores da Revista há, mas são como as corujas - prestam uma atenção... e não falam. O diálogo também há, mas sui gerteris: um 'diálogo monologal' (ou 'monólogo dialogal'?).

"Terminando, gostaria de sugerir aos editores da Revista de Administração de Emprêsas que a tornassem uma publicação mais atraente, isto é, que despertasse a atenção e motivasse à leitura. Não fôsse eu vacinado leitor contra - se me permitem - 'apresentações desajeitadas' e não teria lido o de que tanto gostei. Mas sou fanático leitor dos índices das publicações, apesar das 'caras feias' que tenham.

"Acontece que a RAE é considerada por pessoal leigo' como eu, 'Revista do Govêrno', ou 'publicação oficial'. No Brasil isso significa 'impressos paulificantes', E, no entanto, não o é. É revista bem conduzida, bem redigida e bem revisada; com artigos inteligentes. Porque não fazer

o que chamo de 'a revisão do definitivo', transformando a atual RAE na 'falada RAE'? AS publicações áridas podem tornar-se 'glamourosas', como não?! Como exemplo do que digo, posso citar o que vem fazendo um corajoso do gênero, o Prof. SAN GIORGIO. Comparem-se os livros antigos de Matemática Ginasial dêsse professor com a sua moderna 'Matemática 1' que, em especial, é uma obra-prima de impressão, como deve ser a apresentação de assuntos sérios, matemáticos, áridos. Em cada letra, símbolo, há graça, estímulo, motivação.

"Com pedidos de escusas pelas assertivas e com votos de continuidade no acêrto e revisão no que falte aprimorar nessa admirável Revista, sou

Eng.º MANOEL VALENTE BARBAS"

MONTREAL - Montagem e Representação Industrial São Paulo, SP

Resposta:

"Ao prezado leitor que, saindo de seu silêncio, se decidiu a escrever-nos para comentar favoràvelmente sobre o Editorial da RAE n.º 19 e a publicação da tradução do artigo - já clássico - de ROBERT DORFMAN, desde logo desejamos agradecer a atenção 'corujal' e a manifestação 'heróica'; valeram ambos - o Editorial e a reprodução do artigo - só pela simpatia das explicações para o silêncio do leitor.

"Em resposta à sugestão de que tornemos a apresentação da Revista mais 'glamourosa' devemos dizer que - ao contrário talvez do que possa parecer - temos tido a preocupação de tornar a apresentação da RAE menos 'pesada', pois bem sabemos que seu conteúdo é necessária' mente árido e especializado, exigindo do leitor não só a atenção, mas também a concentração da coruja.

"Essa preocupação tem sido constante, apesar de nunca antes têrmos ouvido ressalvas ao formato, ao leiaute e à impressão da Revista, e de têrmos verificado, em inquérito levado a efeito há cêrca de dois anos, que, dentre 73 leitores entrevistados, 62 acharam a apresentação da RAE de muito boa a excelente e, dos demais, 1 a achou regular e 10 não opinaram a respeito.

"É fácilmente perceptível que há limites - numa publicação do tipo da RAE - para o nível de 'glamourização' na apresentação: podemos ilustrar os artigos por meio de gráficos, tabelas, quadros, mapas e figuras, como efetivamente fazemos, mas não podemos - sempre, pelo menos - lançar mão, como na RAE n.º 17, de histórias resumidas do Tio Patinhas. Por mais que se force a imaginação, dificilmente se pode ver de que forma o Pato Donald - ou 'glamourização' semelhante - poderia permitir compreensão mais rápida e maior atração de atenção para. artigo sôbre a teoria das filas ou a análise das variações no lucro bruto sôbre vendas.

"Guardamos, porém, a sugestão feita. Ela servirá para que, ainda com mais afinco, procuremos amenizar a apresentação da RAE até que ela não possa, de forma alguma, confundir-se com 'publicação paulificante'.

A REDAÇÃO"

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    13 Jul 2015
  • Data do Fascículo
    Dez 1966
Fundação Getulio Vargas, Escola de Administração de Empresas de S.Paulo Av 9 de Julho, 2029, 01313-902 S. Paulo - SP Brasil, Tel.: (55 11) 3799-7999, Fax: (55 11) 3799-7871 - São Paulo - SP - Brazil
E-mail: rae@fgv.br