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A emprêsa familiar

ARTIGOS

A emprêsa familiar

Robert G. Donnelley

Do First National City Bank of Chicago e da R. R. Donnelley and Sons Company

"O exame de vida e das obras dos grandes líderes demonstra que nada deveram à sorte, mas à oportunidade que lhes foi oferecida... Sem a oportunidade, a capacidade teria sido desperdiçada e carente de capacidade a oportunidade teria sido vã." - N. MAQUIAVEL.

Neste artigo consideraremos familiar a emprêsa que tenha estado ligada a uma família pelo menos durante duas gerações e com ligações familiares que exerçam influência sôbre as diretrizes empresariais, os interêsses e objetivos da família. Tal relação pode ser identificada quando um ou mais dos seguintes fatores estiverem presentes:

• A relação familiar é um fator, dentre outros, na determinação da sucessão administrativa.

• Esposas ou filhos do atual ou de antigos diretores tiverem assento no Conselho de Administração.

• Os valores institucionais importantes da emprêsa estão identificados com a família, seja por meio de publicações formais da emprêsa, seja através das tradições da organização.

• As ações de um membro da família exercem influência, ou pelo menos acredita-se que exerçam, sôbre a reputação da emprêsa, independentemente de sua participação formal nos quadros administrativos da mesma.

• Os parentes sentem-se obrigados a possuir ações da emprêsa por razões que não são exclusivamente financeiras, particularmente quando a emprêsa incorra em prejuízos.

• A posição ocupada pelo membro da família na emprêsa influenciará sua situação familiar.

• Um membro da família deverá relacionar-se claramente com a emprêsa a fim de determinar sua própria vida profissional.

Importância da Emprêsa Familiar

Aproximadamente 20% das quinhentas maiores emprêsas listadas pela revista Fortune evidenciam importantes ligações familiares, seja, com respeito à propriedade de ações, seja no que diz respeito à administração.

Em vários setores industriais, inclusive produtos químicos, farmacêuticos, têxteis, corretagem de cereais, processamento de carne, bancos de investimento, vidros, distribuição de bebidas e conexos, gráficas, agências de propaganda e instituições varejistas, as emprêsas ligadas a grupos familiares desempenham um papel que, se não chega a ser de domínio, é pelo menos de grande importância. Encontramos entre elas empreendimentos de grande sucesso como Du Pont, Seagrams, Cargill, Corning Glass Upjohn, Firestone Tire and Rubber Company, Winn-Dixie Department Stores, Joseph Magnin, Cabot Inc., e Lykes Brothers Steamship.

Um survey conduzido pela revista Fortune em 1955, englobando 175 das maiores emprêsas norte-americanas, revelou que cêrca de 55% incluíam parentes exercendo cargos administrativos na mesma firma.

Um estudo baseado no levantamento da situação de aproximadamente 8.000 administradores, conduzido pelos professores W. LLOYD WARNER e JAMES C. ABEGGLEN (Big Business Leaders, Nova Iorque, Harper 8B Brothers, 1955), mostrou que dois dentre cinco administradores eram filhos de detentores de altas posições administrativas, e três dentre cinco eram filhos de proprietários de grandes emprêsas e ocupavam cargos nas firmas de seus pais. Cumpre destacar que os pesquisadores em questão descobriram que a proporção de filhos de acionistas majoritários ocupando cargos nestas mesmas emprêsas refletiam um aumento com relação a uma pesquisa do mesmo gênero realizada vinte e quatro anos antes. Os professores WARNER e ABEGGLEN também observaram um declínio no número de filhos ocupando cargos de presidentes ou diretor superintendente nas mesmas emprêsas de seus pais, mas por outro lado verificaram que tal diminuição era mais do que compensada pelo aumento de filhos ocupando cargos de vice-presidentes e outros níveis imediatamente abaixo, do que podia ser encontrado entre os indivíduos da geração passada.

***

• Seria a administração familiar contrária aos princípios fundamentais da tradição empresarial americana que defende a competição livre e a igualdade de oportunidades e a tese de que o melhor homem deve ocupar o cargo mais elevado?

• O valor atribuído a uma administração de tipo familiar seria ilusório, e o produto de racionalizações para justificar os interêsses das famílias envolvidas?

• A influência familiar contrariaria os preceitos de uma administração profissionalizada?

• As complexidades e as exigências da vida empresarial moderna impediriam definitivamente que a família continuasse a tentar perpetuar a influência familiar sôbre a vida da emprêsa?

Dúvidas como as citadas sobre a eficácia, para não questionar da moralidade da administração familiar, constituem exemplos típicos da atitude predominante entre homens de negócio, consultores e professores de administração. Nalgumas emprêsas o interêsse familiar é fonte de muitas fraquezas da organização. Mas se a simples presença de membros de uma família constitui por si a indicação de má administração, é uma proposição aberta ao debate. Na verdade seria suficiente que se observasse o sucesso de algumas emprêsas familiares, para se poder questionar a validade do sistema de punição-recompensa que permeia a atividade administrativa das emprêsas não familiares.

Neste artigo tentarei analisar desapaixonadamente as emprêsas de tipo familiar e tentarei enumerar algumas vantagens e desvantagens, esperando que possam servir de orientação para os membros da comunidade empresarial que desejem entender de maneira mais adequada a natureza da emprêsa de tipo familiar.

Espero que o artigo seja de especial interêsse a todos aquêles que são empregados de tal tipo de emprêsa, ou que estejam em vias de aceitar cargos, ou que simplesmente já detenham posições administrativas em emprêsas familiares.

Pelo fato de que as fraquezas de uma emprêsa podem ser os motivos da vitalidade de outras, o melhor que um observador pode fazer é auxiliar os que de qualquer maneira participem das atividades de emprêsas familiares a adquirir uma compreensão da situação em que estão envolvidos e que lhes possibilite o entendimento das situações para que possam elaborar os cursos de ação a serem seguidos.

Minhas observações são baseadas num estudo de 15 emprêsas familiares bem sucedidas, apoiadas em entrevistas individuais com membros das famílias em posições administrativas e curtos homens de negócios e professores que se têm interessado pelo problema.

FRAQUEZAS A EVITAR

Consideremos primeiramente o lado negativo da questão, tomando como exemplo casos reais e posteriormente examinaremos as situações nas quais houve sucesso. Entre as fraquezas da administração familiar acreditamos serem as mais importantes:

• Conflitos entre os interêsses da família e os da emprêsa.

• Falta de disciplina com relação à destinação dos lucros e ao desempenho nos vários setores da organização.

• Morosidade nas reações às novas condições de competição impostas pelo mercado.

Desenvolvimento de nepotismo que não é contrabalançado por padrões objetivos de desempenho ou por sistemas adequados para avaliação de mérito de administradores.

Conflitos de Interêsse

Na emprêsa familiar, a família quase sempre detém o controle acionário e as posições administrativas de relevância para poder estabelecer os objetivos da organização e tentar a satisfação de suas aspirações, mesmo que êstes não coincidam obrigatoriamente com os interêsses da emprêsa. Por outro lado os interêsses e valores opostos dos membros de uma emprêsa "aberta" exercem controle ou condicionam os interêsses e valores do indivíduo bem como de seus familiares. Desta forma tende a desenvolver-se a liderança administrativa e perpetua-se a ênfase de valores institucionais que se sobrepõe aos valores puramente individuais através de sistemas formais de controle e incentivos.

É evidente que tal situação na emprêsa de tipo "aberto" nem sempre conduz ao equilíbrio. Algumas vêzes, a organização acabará por subjugar o indivíduo bem como sua família. O conceito popular de "homem de organização" (organization man) com sua esposa e filhos "organizacionais", constitui um bom exemplo dêsse perigo. Tal domínio poderá afetar diretamente o interesse público, como ficou patenteado no caso de "fixação de preços" que envolveu a General Electric e a Westinghouse, e outros produtores de equipamento eletrônico. Enquanto a empresa "aberta" pode ter seus problemas, pelo menos existe a possibilidade de que o mecanismo organizacional imponha aos seus membros um senso de responsabilidade com relação aos dirigentes da organização.

Numa emprêsa familiar, a ênfase sôbre os aspectos tipicamente organizacionais não é inerente à estrutura da emprêsa, pelo menos no que diz respeito às relações entre os membros do grupo familiar. O equilíbrio entre os interesses da família e da emprêsa é habitualmente de natureza psicológica, originando-se no sentido de responsabilidade pessoal da família como um todo para com a companhia. O fato de que as emprêsas familiares mais bem sucedidas desenvolveram refinados sistemas de restrições às prerrogativas familiares, em muitos casos apoiado em rígidas tradições da própria família, não elide o fato de que para cada caso, as restrições tem de ser inicialmente opostas pelos próprios membros da família. E. I. DU PONT de Nemours & Company, Inc., considerada quase universalmente como um paradigma de organização bem administrada poderá servir de exemplo:

Apesar dos membros da família Du Pont possuírem parte substancial das ações da companhia, e, além disso, serem membros ativos da administração da emprêsa elaborando suas principais diretrizes, as relações familiares não têm sido a única razão para obtenção de promoções dentro da organização. A restrição à prerrogativa familiar teve origem quando PIERRE DU PONT rejeitou deliberadamente em 1910 a "cristalizada e tradicional atitude de que a emprêsa era administrada pela família e que era um dever familiar administrar a emprêsa... PIERRE nomeou membros da família para posições importantes, mas apenas depois de terem dado provas de suas capacidades administrativas".(1 1 ) ALFRED D. CHANDLER, JR., Strategy and Structure, Cambridge, Massachusetts: Massachusetts Institute of Technology Press, 1962, pág. 64. )

Porém, em organizações não tão bem sucedidas como a Du Pont, a imunidade contra as restrições de natureza organizacional faz com que importantes necessidades empresariais sejam obstaculizadas e mesmo frustradas por interêsses da família. Esta situação pode conduzir a um dos mais amplamente divulgados problemas das emprêsas familiares, inclusive a falta de capital, falta de discrição na administração financeira, diretrizes errôneas,, falta de disciplina na aplicação dos lucros, não utilização de pessoas dotadas de talento administrativo pelo simples fato de não pertencerem ao círculo familiar, nepotismo e o que é mais grave, conflitos familiares.

Êsses abuses são de certa forma esperados numa emprêsa familiar, particularmente quando a família não logrou desenvolver uma atitude de responsabilidade com relação à companhia que possui. Diversamente do sistema de valores predominante numa companhia de tipo "aberto", que estabelece de maneira "formal" a autoridade de determinada pessoa, bem como a sua responsabilidade, status e a correspondente recompensa financeira com base na competência demonstrada na consecução dos objetivos da emprêsa, as normas familiares comumente enfatizarão a necessidade de prover às exigências da comunidade familiar. Na confusão de valores que resultará em tais situações, as necessidades da companhia poderão ceder lugar às necessidades da família. Tal situação teve lugar na Cole Hardware Company* (o nome dessa emprêsa bem como das subseqüentes designadas por um asterisco são disfarces, mas tanto as emprêsas como os indivíduos são reais).

Levando em consideração suas obrigações para com outros membros da família, Peter Cole, presidente e diretor comercial da companhia, sentiu-se obrigado a nomear seus irmãos e cunhados para ocupar vários cargos na companhia, apesar de não serem administradores competentes. "O correto seria não nomeá-los, mss não posso agir desta maneira com os meus próprios irmãos. Além do mais se meu cunhado não se empregar nesta empresa, terei que arrumar uma outra forma de sustentá-lo."(2 (2 ) C.ROLAND CHRISTENSEN, Management Sucession in Small and Growing Enterprises, Boston, Division of Research, Harvard Business School,1953, pág. 175. )

A obrigação expressa por Cole com relação aos seus parentes era frontalmente oposta à atitude comum do empregador, cujo senso de responsabilidade o obriga a recompensar o bom, e punir o mau desempenho. No caso da Companhia Cole, o presidente ignorou as necessidades da emprêsa, que se faziam sentir através de um competente grupo de administradores, para resolver um problema familiar. Esta confusão dos interêsses da família e da emprêsa constitui também fonte de outros problemas em emprêsas familiares.

Em tais situações a companhia é vista como o tescuro da família, e como resultado os problemas de natureza financeira podem revestir-se de um caráter tão reservado como os problemas referentes às rendas e bens de família, asfixiando o desenvolvimento de mecanismos de controle financeiro e de técnicas de planejamento necessários e adequados o que abre caminho para que se perpetuem os métodos ineficientes e as diretrizes se tornem obscuras. Citemos um exemplo:

Numa grande indústria da costa Atlântica, propriedade de uma família, acabou-se por excluir de todos aquêles que não fossem membros da família, qualquer informação referente à posição financeira da emprêsa, isto porque os interêsses financeiros da companhia estavam profundamente relacionados com os interêsses da família proprietária. Esta medida era tão inflexível que o próprio tesoureiro ignorava a posição financeira da emprêsa, pois não era membro da família. Tal situação não permitia que o tesoureiro desempenhasse as funções fundamentais e básicas inerentes ao seu cargo.

Falta de Disciplina com Relação à Destinação dos Lucros

Outro problema encontrado em emprêsas familiares, mas também comum a outras emprêsas que são controladas por pequenos grupos, é a ausência de disciplina com relação à destinação dos lucros. Da mesma forma que a emprêsa formada por pequenos grupos, a familiar tende a concentrar-se em minúcias como na qualidade do produto, exageros no que diz respeito a melhorias na fábrica e na renovação de equipamento, em afazeres cívicos em vendas e na consolidação do prestígio adquirido, e no cultivo de relações pessoais que excedem os limites das contribuições que êsses vários fatores podem oferecer para que se atinja a lucratividade a longo prazo como condição indispensável para a sobrevivência da organização. Tal ênfase pode levar a sistemas frouxos de controle de custos e outras práticas contábeis igualmente inadequadas, ou à má vontade dos administradores para que adotem as medidas corretivas necessárias para que a contabilidade possa indicar que "certas extravagâncias" são despropositadas.

Contudo, o impacto dêsse problema é difícil de ser expresso estatisticamente, e dois administradores de bancos de Chicago afirmaram ser "os bons sistemas contábeis" e "a presteza em agir com vistas a corrigir um curso de ação quando os custos se apresentam excessivamente altos" as principais diferenças entre as emprêsas familiares bem e mal sucedidas. E não é impertinente observar que uma comparação recente entre um grupo de pequenas emprêsas, das quais 80% eram bastante "fechadas", com outras do mesmo tamanho, todavia "abertas", revelaram para as do primeiro grupo margens de lucro menores, cêrca de metade da margem apresentada pelas do segundo grupo. Sendo as emprêsas familiares, de maneira geral, mais conservadoras do que as emprêsas "abertas" nos seus relatorios financeiros, e por motivos competitivos e fiscais tentam sonegar lucros nos seus relatórios financeiros das mais diversas maneiras, conclui-se pela suspeição com relação às conclusões apresentadas por tal tipo de pesquisa. Mas existe algo a considerar sobre os administradores de emprêsas familiares que poderão questionar da consistência de sua disciplina com relação à destinação dos lucros.

Morosidade na Reformulação de Diretrizes Mercadológicas

Excessivo envolvimento com os interêsses familiares podem ser empecilhos para que uma emprêsa utilize todas as vantagens que as mudanças de mercado possam lhe oferecer, ou simplesmente para que maximize as oportunidades de crescimento. Tal atitude pode ser ilustrada pelo caso da Howard Wine Company*:

A fim de poder atender a um mercado nacional em crescimento para a sua linha de produtos, a companhia necessitava de um aumento de capital. Apesar do crescimento da companhia ter sido capaz de vir cobrir mais do que o aumento de capital projetado, a família Howard opôs-se à medida, simplesmente porque "sentiam" não ser conveniente que pessoas de fora (os novos subscritores de ações), viessem a participar dos negócios familiares.

Quando uma família se identifica intimamente com um determinado produto ou com uma função tradicionalmente desempenhada pela sua emprêsa, outro problema poderá criar-se, ou seja, a companhia tornar-se-á vulnerável aos efeitos das modificações de mercado. Foi o que ocorreu com a Hollowell Glove Company*.

Durante anos o pai havia treinado seu filho para produzir num alto padrão de qualidade um determinado tipo de luva. A despeito das mudanças impostas pela moda, e que levaram o tipo de luva a se tornar absolutamente inaceitável do ponto de vista mercadológico, o filho foi incapaz de dirigir a firma e adaptá-la às novas condições da moda e do mercado. Neste caso, felizmente, o filho manteve as esperanças de que os consumidores retornassem ao velho estilo e acreditou que "qualquer modificação introduzida no produto acabaria por lesar a reputação de alta qualidade da companhia que o pai consolidara com grandes sacrifícios".

Mas esse problema não é comum a tôdas as emprêsas familiares, pois alguns dos administradores e professores de administração entrevistados mencionaram companhias familiares bem sucedidas por "suas firmes diretrizes para definição de sua linha de produtos e nos esforços desenvolvidos para implementação das referidas diretrizes". Isto não eclipsou o fato de que muitos puderam constatar grande debilidade nos esforços mercadológicos das emprêsas familiares. Segundo o presidente de um importante banco de Chicago:

"Tenho a impressão de que as companhias de menor sucesso, são razoàvelmente eficientes na esfera de produção. Normalmente, seus problemas surgem na área de mercadização e no desenvolvimento de novos produtos, bem como no aperfeiçoamento de sua linha atual de produção. Conseqüentemente tais companhias tendem a ficar para trás dos demais competidores e a perder mercado. A recuperação de uma posição competitiva que se deteriorou é na verdade um processo lento e difícil, que habitualmente não pode ser realizado pela mesma administração que permitiu que a determinação se concretizasse. "

Nepotismo Excessivo

Problema mais notório da emprêsa familiar é o nepotismo, que de acordo com o verbête correspondente tirado de um dicionário da língua inglêsa é "a promoção de parentes, mais por causa das relações de parentesco do que por mérito". Tanto já foi escrito sôbre o assunto que é perigoso sequer abordar o problema nas discussões que têm lugar no âmbito de emprêsas familiares. Como bem comentou a revista Fortune: "O fato que por si só se impõe à consideração é que as exigências do mercado em breve eliminarão as firmas que entregam sua administração a parentes incompetentes."(3 (3 ) PERRIN STRYKER, "Would You Hire Your Son?", março de 1957, pág. 228. ) Todavia, tôda emprêsa identificada com uma família terá de preocupar-se com o favoritismo que tende a desenvolver-se nas suas diretrizes de pessoal, vez que a opinião pública suspeita quase automaticamente ser o nepotismo a regra na maioria dessas emprêsas.

Onde o nepotismo é praticado, acabam por impor-se os valores da família, e os critérios para participação na atividade empresarial deixam de levar em consideração a competência profissional. Quando isto ocorrer, as oportunidades que poderão ser eventualmente oferecidas a pessoas que não fazem parte do círculo familiar correrão o risco da recusa, o que colocará a emprêsa numa posição desvantajosa com relação aos seus competidores que disporão de uma faixa mais ampla para recrutar o seu pessoal.

Ao mesmo tempo o nepotismo enfraquece as posições dos atuais administradores, forçando-os a carregar o fardo da incompetência dos protegidos e a realizar as tarefas que não são por êstes desempenhadas. De maior gravidade é o fato do nepotismo conceder maior importância às "questões de família" do que à "realidade" no tratamento dos assuntos empresariais. Quando isto acontecer, a orientação da emprêsa, para a realização de tarefas específicas por parte de seus administradores, será abolida, e as perspectivas de sobrevivência da companhia a longo prazo estarão inevitàvelmente ameaçadas.

O tipo de pensamento que gera o nepotismo também conduz à formação de grupos em oposição no interior da organização, a nosso ver o problema mais sério das emprêsas familiares. Discussões e grandes diferenças de opinião não são peculiares às emprêsas familiares, mas o mecanismo da herança poderá gerar poderosos interêsses minoritários e divergências que uma vez concretizados, provocarão explosões emocionais em todos os membros da organização de conseqüências imprevisíveis.

A identificação da emprêsa, da tradição familiar e do interêsse peculiar de proprietário faz com que cada membro da família se considere o porta-voz da emprêsa, com direito a decidir sôbre diretrizes. Acontece que muitos dos parentes sentir-se-ão na mesma posição e possuindo o mesmo direito, senão o dever de decidir. Conseqüentemente assistimos ao paradoxo de que as manifestações de autoridade provenientes dos ocupantes de cargos são obstaculizadas por outros membros em posição hierárquica inferior, ou simplesmente sem nenhuma função na organização formal da emprêsa. É c caso em que as diretrizes ditadas pelo presidente são questionadas pelo diretor superintendente.

Quando temos outros abusos além do nepotismo, os conflitos potenciais de uma emprêsa de tipo familiar podem desencadear-se. Quando o nepotismo impera numa organização o sistema de avaliação e recompensa baseia-se preferencialmente nas relações familiares e apenas secundàriamente na capacidade o que diminui a resistência organizacional para enfrentar as pressões internas. Cada decisão passa a assumir um caráter subjetivo e carrega-se de teor emocional sempre vinculado ao "problema familiar", ao invés de ser uma solução fundamentada em padrões objetivos de contribuição aos fins colimados pela emprêsa. Na Everett Hardware Manufacturing Company * temos a seguinte situação:

Os dois principais diretores Peter e Paul Everett concordaram em tratar seus filhos da mesma forma, apesar da maior capacidade demonstrada por um dos rapazes. Quando os pais faleceram, as operações da emprêsa foram paralisadas pois nenhuma das partes da família, sucessores dos ex-diretores, permitiu-se que a outra exercesse qualquer forma de controle sôbre as atividades da firma. Sendo a emprêsa tratada como

herança

e não como

responsabilidade

familiar, os pais não se ocuparam com a elaboração de um critério para julgar as queixas de seus respectivos filhos. Tal situação chegou ao impasse quando se desfez a harmonia até aquêle momento reinante na família.

VANTAGENS A USUFRUIR

Embora problemas peculiares existam nas empresas familiares, não se deve menosprezar as importantes vantagens que poderão ser obtidas a partir da utilização adequada da vitalidade existente no relacionamento familiar. Afinal de contas o interesse familiar é idêntico a qualquer outro fator de competição humana que poderá interferir com os objetivos empresarias. A Lei de Parkinson, para tomar um exemplo, descreve uma situação burocrática comum, na qual um administrador satisfará suas próprias necessidades de prestígio adicionando ao seu corpo de funcionários empregados supérfluos. A situação em que bs operários deliberadamente diminuem a produção apesar da existência, dentro da companhia, de um sistema formal de incentivos e de avaliação de mérito é um exemplo bastante convincente da vitalidade das forças puramente humanas num escalão inferior da atividade empresarial.

Contudo quando o interêsse é controlado no interior da emprêsa familiar e a família é capaz de equacionar os seus interêsses a longo prazo com os interêsses da emprêsa no mesmo período de tempo, consegue-se obter uma rara e preciosa harmonia entre os diversos valores normalmente em oposição nas relações entre indivíduos e organizações.

Esta unidade de propósitos é reforçada, implementada, e perpetuada pela tradição, pelo orgulho e pela identificação da família com a companhia, e transforma-se num fator intangível no sucesso de muitas emprêsas familiares.

Constitui também a base de tôdas as demais vantagens que possam ser encontradas na emprêsa de tipo familiar.

Citaríamos as seguintes, como sendo as principais:

• Disponibilidade de recursos administrativos e financeiros obtidos graças ao sacrifício familiar.

• Relacionamento favorável da emprêsa com a comunidade empresarial e com a sociedade como um todo devido ao respeito inspirado pela família proprietária.

• Uma estrutura interna caracterizada pela lealdade e pela dedicação.

• Identificação de proprietários e administradores num único grupo, realmente interessado nos destinos da companhia.

• Sensibilidade às responsabilidades sociais pela necessidade de manter o prestígio da família.

• Coerência e continuidade das diretrizes administrativas e dos objetivos da firma.

O Sacrifício Pessoal

É paradoxal que o interêsse familiar, fonte de debilidade financeira em muitas emprêsas, possa em outras circunstâncias transformar-se no principal fator de vitalidade financeira. Diversas emprêsas familiares têm sido consolidades à base de sacrifícios pessoais e dividendos exíguos, e o orgulho e a lealdade dos membros da família foram os responsáveis pela manutenção da emprêsa durante períodos de grandes dificuldades quando as considerações sôbre lucros e prejuízos poderiam ter conduzido simplesmente ao encerramento das atividades. Segundo um famoso historiador da atividade empresarial americana, foram os fatores anteriormente listados que permitiram às primeiras famílias proprietárias, anteriores a Weyerhaeuser, sustentar cêrca de quarenta anos de perdas, para que a emprêsa pudesse tornar-se um gigante industrial.

A extensão dessa lealdade é evidente nas reminiscências de uma esposa sôbre as lutas iniciais que se encontram no princípio da vida de outro grande líder industrial:

"Nossa situação sempre melhoraria nos próximos cinco anos. Sempre que quis trocar nossa mobília meu marido dizia: Não agora. Estamos precisando comprar uma nova máquina."

Em outras situações o orgulho e a identificação da família com a companhia obrigaram a que a firma honrasse compromissos que excediam a obrigação estritamente legal. Isto é o que tem levado muitas emprêsas falidas a saldar os débitos de suas emprêsas já inexistentes. Numa importante companhia, a família proprietária pagou com os seus próprios recursos as obrigações para com seus empregados durante um período de grandes prejuízos.

Por vêzes, uma família abastada não só empresta seu apoio financeiro à emprêsa, como também transfere administradores capacitados de outras emprêsas do mesmo grupe para auxiliar a que se encontra em dificuldades para solucionar seus problemas. Em vários dos casos estudados, especialmente nas emprêsas bastante "fechadas", a transferência de recursos de outras emprêsas para a que se encontra em dificuldades chega a ser uma prática habitual. Tomemos o exemplo da Roger Distributing Company *:

Por muitos anos esta companhia expandiu-se pelo oferecimento de serviços contábeis e de assessoria sobre mercadização. Porém a maior parte de seu faturamento estava ligado a uma única conta. Nas transformações do pós-guerra, com a passagem para um nôvo sistema de contabilização, a companhia passou a ter sérios problemas para poder continuar servindo o seu principal cliente.

Se tais problemas persistissem levariam a emprêsa a uma queda substancial de sua receita, além do reflexo negativo que projetaria sobre a tradicional imagem da companhia. A solução seria encontrada pela contratação de serviços especializados, que no caso, seriam vendidos por outra emprêsa, propriedade da família Roger. Em tal situação a família proprietária da emprêsa de consultoria em questão encarregou-se de tomar todas as medidas a fim de evitar que a solução viesse a ser propiciada por um competidor, no caso, a emprêsa da família Roger.

Muito se tem criticado que administradores de emprêsas familiares, ao invés de obterem, simplesmente herdam seus cargos. Pouco crédito, porém, tem-se dado ao administrador familiar que introduz ordem numa emprêsa confusa e desorganizada, ou que não tem grandes probabilidades de sobrevivência, a fim de atrair para a organização ordenada e restabelecida nas suas perspectivas de sucesso, o administrador profissional competente que possa oferecer sua valiosa contribuição. Basta deixar que o caso da Horwitz Machine Company * fale por si mesmo. A emprêsa está localizada no meio-oeste e dedica-se à fabricação de equipamento de calefação.

Nessa emprêsa, o presidente, que não era membro da família, tudo fêz para dilapidá-la a fim de poder obter o controle do que seria então a "massa falida" e "reerguêla" em seu próprio benefício. Isto ocorreu apesar do presidente ter como parte de sua remuneração o recebimento de ações ordinárias e sem nenhuma consideração para com os empregados que perderiam seus empregos, além dos prejuízos que eram causados à comunidade. Após substancial investimento, os membros da família conseguiram enfraquecer o presidente, e como não era possível atrair nenhum profissional realmente competente para gerir uma emprêsa em situação tão precária, um dos membros da família decidiu assumir o espinhoso cargo, pois considerava um sacrifício a ser feito como parte de suas "responsabilidades familiares".

Reputação Valiosa

Na conclusão de seu artigo sobre a família Rothschild o Time afirmava: "... para enfrentar o futuro dispunham de uma vantagem oriunda do passado, o mito dos Rothschilds, que era o seu mais valioso ativo."(4 (4 ) 20 de dezembro de 1963, pág. 74. )

A reputação de uma família pode não apenas exercer uma influência favorável às relações entre a emprêsa e a comunidade, mas ainda exercer um impacto direto e claro nas próprias operações da companhia. Em vários casos de luta entre emprêsas de uma mesma indústria, a reputação da família proprietária é um fator importante para obtenção de empréstimos de bancos locais. Apesar da incerteza envolvida em tais tipos de transação, os bancos acreditam que seus riscos são diminuídos por causa do passado respeitável da família.

As ligações familiares também podem ser de importância para que se crie o clima de confiança necessário à própria existência de uma emprêsa, particularmente nas situações em que os pontos em disputa são controversos e as demais companhias envolvidas não estão protegidas por uma administração competente, ou por pareceres de firmas de consultoria importantes ou ainda por sanções legais contra a perda de confiança. Um campo dinâmico e incerto, com uma" infinidade de riscos, como é o ramo dos bancos de investimento, constitue um exemplo dos mais adequados do que acabamos de afirmar. Os diversos bancos de investimento de Nova Iorque estão ligados a famílias, o que lhes permite uma grande flexibilidade no estabelecimento de associações para investimento em áreas onde o retorno sobre o investimento costuma ser elevado e a competição ainda não se estruturou claramente.

Nalguns casos o benefício oriundo de uma relação familiar pode assumir aspecto muito sutil. Nas áreas de atividade onde as relações informais são decisivas para a realização de transações, a identificação da emprêsa com uma família respeitada pode influenciar de maneira direta as próprias atividades de mercadização. Uma emprêsa de corretagem do tipo "fechado", por exemplo, pode conservar clientes antigos ou atrair novos devido à sua identificação com uma família ilustre no mundo dos negócios.

Tal relação poderá desempenhar grande importância em instâncias em que todos os demais fatores são semelhantes ou em que os resultados dos serviços ofertados são intangíveis.

Lealdade dos Empregados

O valer de uma relação familiar não se limita ao papel desempenhado pela família nas atividades da companhia e nas suas relações com o público. O envolvimento da família com a atividade empresarial poderá exercer influência na própria organização interna da firma. A administração familiar pode evitar excessiva mudança nos quadros administrativos, o que tem efeito particularmente desastroso para as pequenas emprêsas, e ainda assegurar-se de que a capacidade competitiva da firma continuará inalterada.

A atividade empresarial nos últimos anos tem assistido a um agravamento de problema de rotação de mão-de-obra altamente qualificada (executive turn-over). Uma em: prêsa de consultoria da cidade de Nova Iorque estima entre 75.000 e 100.000 o número de administradores de nível médio e alto, que mudam de emprêgo anualmente. As proporções dêsse turn-over levou um autor ao seguinte comentário:

"Embora não se possa demonstrar em dólares e em centavos ou numa declaração de lucros e perdas, o turn-over de administradores é... um dos custos ocultosi mais elevados a onerar a moderna empresa."(5 (5 ) JUDITH DOLGINS, "A Good Man is Hard to Keep"", Dun's Review and Modern Industry, maio de 1963, segundo citação de The Executive, agosto de 1963, pág. 21. )

Aquilo que simplesmente custa caro para a grande ou média emprêsa poderá ser ruinoso para a pequena, onde o turn-over de administradores abala a própria estrutura administrativa da organização e põe em risco sua capacidade competitiva. Um administrador que não seja ligado à família proprietária permanecerá numa pequena emprêsa familiar apenas enquanto isto lhe convier. Se encontrar uma oportunidade que atenda melhor aos seus interesses, abandonará seu cargo imediatamente. Se se associar a uma companhia localizada neutra área, representará uma grande perda devido ao tempo e às despesas incorridas para o seu treinamento, recursos que são, geralmente, escassos na pequena empresa. Muito provàvelmente o administrador em questão irá para uma emprêsa concorrente ou iniciará o seu próprio negócio, o que sempre redundará em grande ameaça para o seu antigo empregador.

Diversamente da grande emprêsa, a pequena não desfruta da segurança proporcionada pelo tamanho ou pelas vantagens trazidas por um grande programa de pesquisa e desenvolvimento de novos produtos. Normalmente, a estratégia competitiva da pequena emprêsa baseia-se na sua capacidade para oferecer certos serviços de maneira mais adequada ou mais rápidamente do que as grandes emprêsas. Habitualmente os recursos de uma emprêsa pequena são constituídos de uma técnica especial ou de características de produto que não podem ser patenteados. Quando um de seus administradores se transfere para um concorrente, a emprêsa pequena poderá assistir à utilização de suas técnicas ou de seus produtos para o comprometimento de sua situação, e sua posição na indústria sèriamente ameaçada.

O administrador que é membro da família, ou que mantém com esta qualquer tipo de vínculo já procederá de outra maneira, pois estará imune à tentação de buscar "melhores" oportunidades. Uma vez tomada a decisão de trabalhar na emprêsa da família, suas expectativas, treinamento e a própria pressão familiar o incorporarão à emprêsa. Se um parente fôr procurar emprêgo noutras firmas no mesmo ramo de atividade, suas ligações familiares levarão os concorrentes a olhá-lo com suspeita, o que se torna outro fator a restringir as suas possibilidades de empregar-se fora da emprêsa da família.

Ao longo da vida da organização a sucessão de administradores que são membros da família e que se revelem competentes acaba por criar um sentimento de grande lealdade para com a firma. A despeito da tendência encontradiça entre vários observadores de escarnecer o paternalismo, muitas emprêsas familiares aparentemente acreditam que os parentes são de grande auxílio para tratar com os empregados na função de relações industriais, a julgar pelo número de casos em que os parentes são colocados como "homens" de Relações Industriais. Tal afirmação encontra apoio num artigo da revista Fortune que versa sôbre os prós e contras da emissão de parentes. Ao observar que algumas companhias consideram a presença de membros da família uma vantagem, o artigo cita Charles Heinz, então vice-presidente de relações industriais da H. J. Heinz Company ao dizer que "ser da família Heinz o ajudava na criação de um clima mais favorável nas negociações com os empregados".(6 (6 ) PERRIN STRYKER, op. cit., pág. 228. )

Nalgumas emprêsas familiares a lealdade dos empregados e dos administradores que não são parentes da família proprietária é considerada como altamente significativa. Ao contrário do que acontece com os administradores profissionais, que tendem a deixar de ser objeto da lealdade dos empregados da organização por ocasião de sua aposentadoria, quando se trata de uma administração exercida por membros da família, o que assistimos é uma transferência de lealdade de pai ao filho que o sucede. Por vêzes, essa lealdade é tão grande que os empregados se empenharão para manter o controle familiar. No caso de uma pequena indústria, do ramo metalúrgico, os próprios empregados insistiram para que o filho do proprietário e presidente fôsse treinado para assumir a presidência porque não desejavam que "intrusos" dirigissem e possuíssem a emprêsa.

Administradores e Proprietários: um só Grupo

Quando uma família identifica estreitamente os seus melhores interêsses com o que é mais conveniente para a emprêsa, esta usufruirá dos grandes benefícios de proprietários e administradores terem seus interêsses e objetivos unificados. Esta reciprocidade tem sido considerada o ponto mais defensável para os planos de remunerar administradores com ações da própria emprêsa que administram.

A convicção de que os administradores devem ser também proprietários está tão arreigada entre os administradores "familiares" que devido a sua lealdade às tradições familiares, acabam por eliminar os interêsses imediatistas de vender suas ações num momento oportuno para considerar apenas os interêsses da companhia a longo prazo. Por isso tornam-se extremamente relutantes em vender suas partes na emprêsa da família.

Dada a influência que exercem como proprietários os administradores "familiares" poderão ser menos sensíveis às críticas fundamentadas em desempenho desfavorável a curto prazo, para terem a liberdade de focalizar os objetivos a prazo mais longo. Vários administradores "familiares" debatem largamente problemas de suas emprêsas, quando considerações a curto prazo os levariam à manutenção' do statu quo e a atitudes e diretrizes mais conservadoras. Muitos administradores atribuem os esforços iniciais realizados por suas emprêsas no setor de "Pesquisa e Desenvolvimento" à capacidade demonstrada para buscar objetivos a longo prazo, abandonando o comodismo de posições mais imediatistas.(7 (7 ) Vide ARNOLD C. COOPER, "R & D Is More Efficient in Small Companies", in Harvard Business Review, maio-junho de 1964, pág. 75. )

Nalguns casos, como nos dois exemplos dados a seguir, o apoio de um grupo leal de acionistas capacitou as companhias em questão a tomar atitudes decisivas para sua vitalidade e dinamismo a longo prazo.

Segundo o presidente da Hopwell Fabricated Material Company*, foi a lealdade o principal fator para que se tomasse a decisão de adotar uma campanha nacional de mercadização que possibilitou à emprêsa o domínio do mercado. "No início, o projeto exigiu gastos anuais que igualmente a terça parte das vendas no mesmo período de tempo. Sem o apoio substancial dos acionistas os diretores seriam forçados à adoção de diretrizes muito menos ousadas."

O presidente da Wray New England Printing Company* pensava que o controle acionário por parte da família era peça essencial para que sua companhia fôsse os paz de entrar agressivamente no campo da "renovação tecnológica", sem que se consultassem prèviamente os sindicatos envolvidos na modificação. Tal direito foi reconhecido pelos sindicatos apenas depois de uma grande greve que foi tão onerosa a curto prazo que o proprietário-administrador estava convencido de que a companhia teria cedido, não fôsse o apoio dos acionistas, na sua maior parte constituída por membros da família. "Sabíamos que a família acreditava como nós, e estava disposta a correr o risco", dizia um administrador não ligado à família relatando os acontecimentos. "Se os acionistas não fossem da famfila proprietária, teríamos sido forçados a agir de outra maneira, pois não poderíamos correr o risco de perdas tão grandes."

A presença de um interêsse familiar respeitável poderá exercer relevante influência noutros setores. Nas emprêsas onde a ligação familiar se faz sentir principalmente pela posse de ações, o conhecimento de que existem acionistas realmente interessados, que detêm parte suficiente das ações para assegurar o controle, poderá levar os responsáveis pela administração da emprêsa a refletirem mais demoradamente sôbre as suas responsabilidades para com os acionistas. Isto assume grande importância em nossos dias quando a administração "profissionalizada" é cada vez mais imune ao controle dos acionistas, pelo fato das ações se dispersarem entre um sem-número de possuidor res. Uma concentração de ações na mão de uma só pessoa ou de um grupo relativamente pequeno assegura uma ação mais cuidadosa por parte dos administradores.

Quando tal controle está em mãos de uma família a proteção oferecida aos interêsses da companhia é ainda maior porque o acionista será menos propenso a vender suas ações quando surgirem dificuldades.

Além dessas vantagens singulares, muitos administradores acreditam que as companhias de tipo familiar beneficiam-se, como outras emprêsas em que o capital não é muito disperso, de uma flexibilidade maior do que as encontradiças nas emprêsas "abertas". Embora esta vantagem pareça mais facilmente atribuível ao tipo de organização centralizada que surge quase inevitàvelmente nas emprêsas familiares, diversos administradores "familiares" dão exemplos específicos, em que a capacidade para tomar decisões mais rápidas a respeito de questões importantes resultou em grandes lucros a longo prazo. Por causa dessa flexibilidade uma companhia de processamento de carne foi capaz de comprar uma fábrica maior e mais moderna para as suas operações, decorrendo apenas seis horas entre a tomada da decisão e a realização da compra, o que lhe permitiu entrar no mercado de processamento de carne no momento oportuno.

Mas essa flexibilidade nem sempre é uma vantagem, particularmente quando interfere com os bons princípios de administração. Um administrador de uma emprêsa do ramo têxtil observou que "quando uma família domina uma firma, poderá levar ao aparecimento de um grupo de administradores subservientes, e um Conselho de Administração igualmente cativo, o que impede se proceda a uma revisão crítica das decisões". Concorde com a mesma opinião o administrador de uma emprêsa, que fabrica papel, de propriedade familiar, manifestou-se nos seguintes têrmos: "A influência de nossa família pode permitir que os administradores ajam mais rapidamente, mas sempre que isto tem acontecido, os resultados se mostraram desastrosos. "

Da mesma forma que outras organizações "fechadas" a emprêsa familiar poderá usufruir das vantagens da discrição. Reconhecendo que uma discrição excessiva, chegando ao segrêdo puro e simples, pode impedir as ações de uma administração eficiente, muitos administradores acham que a restrição de informações sôbre as operações de uma companhia pode constituir-se numa grande vantagem para a competição. Uma empresa, outrora propriedade familiar, fundamentava suas decisões no sentido de continuar sendo "fechada" em parte devido "à diminuta capacidade de um grande número de acionistas para poderem avaliar os efeitos das ações da companhia, particularmente no que dizia respeito à sua capacidade competitiva", que era indiscutivelmente uma realidade palpável quando tais avaliações eram feitas por um grupo mais restrito.

Nalgumas emprêsas familiares, como os exemplos a seguir c demonstram, a capacidade para restringir o fluxo de informações é considerada de vital importância.

Durante dez anos a Lambrecht Machinery Company * aumentou seu tamanho de um quarto para dois terços com relação à sua principal concorrente. "Se nossa concorrente tivesse percebido o quão rapidamente crescíamos", dizia o presidente, "teria sido capaz de impedir uma taxa de crescimento tão elevada. Sabiam que estávamos construindo novas fábricas, mas não dispondo de nossos relatórios financeiros, não poderiam avaliar quão grande era o progresso que estávamos obtendo."

Sensibilidade às Responsabilidades Sociais

O orgulho e a identificação familiar com os interêsses de uma firma podem fazer com que a administração seja mais sensível às responsabilidades sociais e desta forma contribuir para o fortalecimento da emprêsa a longo prazo.

As rígidas considerações sôbre lucratividade inerentes às organizações empresariais é indiscutivelmente um fator de importância. Mas quando deixa de ser limitado por outras considerações, de natureza diversa, poderá conduzir a ações que nem sempre são do melhor interêsse da comunidade.

Quando um empregado é solicitado a participar de ações que possam ferir o interêsse público, poderá encontrarse em posição insustentável para seguir o seu próprio julgamento, porque simplesmente teria de sacrificar o seu emprego e a segurança de sua família. Mas devido ao nome da família, a administração de uma emprêsa familiar, pelo menos esta foi a opinião de vários administradores entrevistados, será menos capaz de justificar atos contrários aos melhores interêsses da comunidade. Atitudes como a que segue não são de todo incomuns:

"Como poderia explicar a meu filho o escândalo implícito no conluio para fixação de preços?", indagava um fabricante de papel. "Tal situação seria altamente prejudicial à reputação de minha família e ao prestígio da companhia."

Como para outras vantagens relacionadas, a importância de se possuir um nome de família associado a uma emprêsa é de difícil aferição em têrmos quantitativos. Enquanto vários executivos entrevistados concordaram de maneira geral sôbre a vantagem potencial de associar família com emprêsa, quase todos observaram que a atualização destas vantagens dependerá exclusivamente da própria família. "Eu tratei com muitas famílias", dizia um tesoureiro de uma grande emprêsa têxtil, "que pautavam suas ações pelo código de ética dos ladrões, o que era meridianamente refletido pelas atividades de suas emprêsas."

Vários administradores prontificaram-se a declarar que; a vantagem de possuir um nome de família associada a uma emprêsa perde importância em nossos dias. "Há vinte anos", comentava o presidente de uma grande emprêsa de equipamentos industriais, "eu concordaria inteiramente com a tese de que a sensibilidade para com as responsabilidades sociais era um dos fortes da emprêsa familiar, mas hoje quase tôdas as firmas reconhecem a importância de desfrutar de boa reputação na comunidade."

Apesar destas qualificações permanece a evidência de que as emprêsas familiares, devido ao envolvimento familiar, tendem de maneira geral a ponderar os aspectos sociais de suas decisões mais demoradamente do que as companhias "abertas".

Coerência e Continuidade das Diretrizes Administrativas

Uma vantagem extraordinária que uma sucessão de administradores familiares capazes pode fornecer a uma emprêsa é a coerência e um sentido profundo dos objetivos da companhia. Ambos os fatores parecem ter importância crescente numa sociedade onde a mudança e a ruptura com as instituições tradicionais constituem o comportamento habitual.

Tôda companhia tende a ter um certo número de "mitos" ou tradições que tem a função de preservar objetives e capacidades que lhe são peculiares. Quando uma administração composta de familiares assume a responsabilidade pelos destinos da organização os "mitos" importantes são consideràvelmente fortalecidos pela ação da família porque cada diretriz transforma-se num vínculo que remonta às próprias origens da companhia. Neste caso, o administrador familiar exerce o papel catalizador de unir o presente e o passado da organização.

Enquanto a contribuição mais importante do administrador familiar nestas situações possa ser intangível, a presença da família pode ser o elemento decisivo para capacitar a emprêsa a aumentar as proporções de suas operações, inclusive entrando em novos setores de atividade sem que as modificações decorrentes venham romper os valores organizacionais já consolidados, ou seja, a unidade essencial da emprêsa. Exemplificando:

O principal dirigente de uma grande emprêsa industrial acredita que a existência de uma administração familiar tradicional auxiliou em muito sua organização a preservar sua tradicional insistência na qualidade dos produtos fabricados, a despeito da crescente mecanização dos processos industriais. O fundador da emprêsa criou a reputação de qualidade "artesanal" para a organização e a sucessão administrativa tendo sempre sido feita por tradição familiar, permitiu se perpetuasse a mesma dedicação à qualidade que era característica do fundador.

O efeito da identificação entre uma família e a capacidade de uma emprêsa modificar-se sem perder a sua unidade essencial também foi observada por um tesoureiro, que todavia não pertencia à família proprietária. Desde o fim da Segunda Guerra Mundial a emprêsa crescia rápidamente através da compra de outras no mesmo ramo industrial. Apesar do crescimento vertiginoso o tesoureiro continua a acreditar que o senso de unidade fornecido pela família proprietária e que também ocupa os principais cargos administrativos no grupo, que se dedica ao ramo têxtil há já três gerações, tem impedido que se estabeleça uma confusão organizacional das mais drásticas, pela diversidade das várias emprêsas que têm sido incorporadas ao longo dos últimos vinte anos. "Apesar de nosso crescimento e da absorção de muitas firmas com características bastante diversas, os postulados administrativos tradicionais continuam inabalados graças ao respeito que todos devotam aos membros da família. "que se encontram à frente do grupo."

A associação de uma família a uma emprêsa pode influenciar não apenas a organização interna mas ultrapassar os umbrais da companhia e atingir o mercado, conferindo à organização características peculiares que lhe são de grande valia no processo competitivo.

O presidente de uma companhia siderúrgica observava que a administração familiar pode revestir-se de grande importância para consolidar o valor do "serviço pessoal". Quando uma emprêsa é criada com base no valor do "serviço pessoal" (que freqüentemente está ligado às atividades pessoais do proprietário fundador), suas possibilidades para expansão são limitadas. Porém a utilização de outros membros da família pode possibilitar a expansão pois no primeiro caso ela estaria fatalmente limitada às capacidades de um único homem, e na emprêsa familiar, através da sucessão administrativa efetuada dentro do círculo familiar, as habilidades peculiares ao proprietário fundador e que respondem pela privilegiada posição da firma em face aos seus competidores, acaba também por transferir-se. A importância que uma emprêsa da Nova Inglaterra, que opera no ramo de restaurantes, confere ã administração familiar em todos os apelos de «uas campanhas de propaganda e promoção, está indiscutivelmente baseada no pensamento acima exposto.

Em vários casos que pudemos observar a administração familiar parece ter constituído o elemento decisivo para a criação de uma "imagem" favorável da emprêsa. A Findaly Art Gallery orgulha-se de poder exibir uma experiência de "três gerações no ramo da arte"; a Oscar Mayer Company, que em 1963 vendeu 279 milhões de dólares, mostra sua preocupação com a qualidade de seus produtos, fazendo referência à administração familiar no seu slogan: "Uma tradição de qualidade da nossa para a sua família." Uso semelhante da tradição acabou por desenvolver-se num série de anúncios da H. J. Heinz Company. Nos textos o próprio Henry Heinz, presidente do Conselho de Administração, apela para que a emprêsa mantenha as orientações de seu avô referente à utilização de ingredientes da melhor qualidade. A tradição da administração familiar e a habilidade do apêlo de Henry Heinz ao mencionar esta tradição tiveram como resultado o reiôrço da reputação de qualidade dos produtos da emprêsa aos olhos do público.

O administrador familiar pode também levar outras vantagens sôbre o administrador profissional. Entre elas podemos observar a dedicação, a experiência, acesso a todos os setores da companhia e a imunidade contra as pressões intra-organizacionais.

Uma resposta comum a todos os que foram entrevistados foi que muitos filhos e outros membros da família tendem a trabalhar com mais afinco, a serem mais entusiastas e mais leais à companhia do que os administradores profissionais. Pelo fato de terem sido criados no ambiente da emprêsa poderão também adquirir extensos conhecimentos a respeito da emprêsa antes que assumam os cargos que lhe estão destinados. Uma vez empossados contarão com maior boa-vontade por parte dos administradores mais antigos e que ocupam os cargos mais altos, para convido e transmissão de experiências. Finalmente as pesscaída família poderão desenvolver suas capacidades administrativas sem temer estejam ameaçando posições de outrem. Um supervisor da família proprietária dizia: "Pelo fato de ser da família, posso estabelecer o ritmo de trabalho que achar conveniente, sem que pensem que esteja tentando adular o chefe." Per tôdas estas razões, um elemento da família, desde que interessado na companhia, poderá encontrar grandes possibilidades na sua emprêsa para desenvolver ao máximo suas habilidades como administrador.

PRECAUÇÕES A TOMAR

Acredito ter conseguido demonstrar que a participação de famílias na vida empresarial não constitui obrigatoriamente uma fonte de fraquezas. Aquilo que eventualmente é a fraqueza de uma firma, quando tratada por uma administração competente, pode transformar-se num ponto de grande vitalidade. Mas a experiência das organizações onde a participação familiar se constituiu em fonte de sucessos indica que isto só ocorre quando:

• A família entender que os seus objetivos pessoais podem ser atingidos apenas se também fôr assegurado o sucesso da emprêsa a longo têrmo.

• Os administradores familiares estiveram dispostos a estabelecer diretrizes e restrições formais a fim de assegurar a participação familiar apenas na medida em que esta contribua para o fortalecimento da emprêsa a longo prazo. A história de várias das firmas mais importantes demonstra que suas atuais posições são em grande parte atribuíveis ao reconhecimento da importância das duas condições enumeradas. Porém o sucesso muitas vêzes é turvado por uma crise da família ou da emprêsa. Em muitos casos, a harmonia se restabelece apenas com a demissão de um membro da família. Noutros, resultam do crescimento da companhia que obriga a família a enfrentar as necessidades da firma. Paradoxalmente, renunciando a parte do controle que exercia sôbre a organização, a família acabava por fortalecer a sua própria posição de liderança e ao mesmo tempo, aumentava as possibilidades empresariais de operações lucrativas.

Controle do Favoritismo

Para assegurar um equilíbrio sadio entre os interêsses da emprêsa e os da família os administradores da maioria das emprêsas familiares bem sucedidas delimitam claramente o alcance das tradicionais prerrogativas da família e as necessidades de liberdade de ação dos administradores. Embora reconheçam que a participação familiar possa conferir a alguns parentes o direito de solicitar cargos, muitas destas firmas acabaram por assegurar, através de estabelecimento de restrições formais, bem como devido a tradições informais, uma limitação ao favoritismo, de forma que tais solicitações não venham a predominar. Temos aqui um caso típico:

A Thompson Manufacturing Company* é uma grande emprêsa no ramo da mecânica pesada. Seus administradores que são da família que detém o controle acionário, defendem a posição de que alguma participação da família na administração da emprêsa é de importância para o fortalecimento da unidade interna da organização. Esta vantagem intangível é apoiada, além do mais, por todas as considerações de ordem prática. Através do controle acionário os vários ramos da família detêm a maior parte do capital e os Thompsons acreditam que alguma participação familiar na administração faz com que os votos resultantes da propriedade das ações sejam utilizados em favor dos melhores interêsses da companhia. Por estas razões, as ligações de tipo familiar devem ser objeto de cuidadoso exame para a admissão de administradores e para sua posterior promoção no quadro da emprêsa.

Mas esta consideração não tem predominado porque os administradores vinculados à família acreditam que o direito de administrar deverá ser obtido pelos membros da família pelos mesmos caminhos que normalmente seguem os administradores profissionais. "O nome da família poderá trazê-lo às portas da companhia", nctava um presidente, "mas o restante dependerá exclusivamente dêle". Para assegurar que êsses procedimentos se tornem habituais, a companhia estabelecerá diretrizes explícitas em situações em que filhos de acionistas estejam envolvidos, e tôda a supervisão, bem como os processos de avaliação de mérito estarão sob o controle de pessoas não ligadas à família, não se permitindo ao pai nem solicitar informações sobre o desempenho de seu filho.

Em conformidade com esta diretriz de pessoal, a companhia ainda exercerá controle sôbre os interêsses familiares. A maioria dos diretores não pertence à família Thompson, embora a administração encoraje todos os ramos da família, inclusive os que não detêm cargos na emprêsa, a fazer com que sua parcela de ações esteja representada no Conselho de Administração. Quando há um problema empresarial que também envolva interêsses da família, como remuneração de administradores ou provimento de novos cargos administrativos, os diretores que não pertencem à família desempenham papel relevante a fim de garantir que as necessidades da emprêsa sejam atendidas a despeito de eventuais conflitos com os interêsses da família.

Embora se concedam alguns privilégios à família, os proprietários que também detêm posições na gestão da Thompson Manufacturing Company, reconhecem a necessidade de aceitar limitações às prerrogativas familiares para poder obter uma administração mais forte e eficaz.

Devido à sua disposição em agir de tal maneira, a firma ascendeu a uma posição de domínio no seu setor industrial, onde os desmandos familiares têm constituído a regra.

Barreiras ao "Empreguismo"

Na Companhia Thompson não existem restrições especiais ao emprêgo de pessoas da família além dos critérios gerais estabelecidos para a admissão de qualquer outra pessca que preencha um pedido de emprêgo. O essencial é que os requisitos fundamentais para o preenchimento do cargo sejam plenamente satisfeitos. Dentre as companhias estudadas a Thompson foi na verdade uma exceção. Várias das emprêsas familiares que reconhecem a importância da limitação das prerrogativas familiares tendem a ser mais restritivas nas suas diretrizes para admissão de pessoal. Algumas emprêsas familiares chegaram a adotar a diretriz de simplesmente não empregar familiares.

O valor de uma diretriz tão rígida é sempre incerto. Em geral, a tendência para que se abram exceções a regras contra a admissão de parentes é mais notória onde, paradoxalmente, as regras são as mais estritas. Em tais casos, onde a família detém o controle acionário, as regras são infringidas na medida em que a família decide considerar os interêsses familiares em detrimento dos interêsses empresariais. Nas situações típicas, as famílias tentam limitar, mas não eliminar o emprêgo de parentes.

Nalgumas companhias, as restrições ao emprêgo reduzemse a alguns casos de parentesco e à idade. Muitas famílias excluem tàcitamente genros, noras, cunhados e cunhadas, bem como sogros e sogras, apesar de muitas destas emprêsas terem tido experiências extremamente favoráveis com parentes. Noutras companhias estudadas a firma é administrada pelo filho mais velho do último presidente.

Isto sugere que a primogenitura existe em algumas companhias. O fato dos filhos terem o mesmo nome que seu:: pais, pode encontrar explicação nas expectativas da família para que os filhos de ex-presidentes assumam os cargos outrora exercidos por seus pais.

Certas companhias exigem que os membros da família que desejem assumir cargos administrativos tenham condições superiores àquelas exigidas de administradores profissio-, nais aspirantes ao mesmo cargo. Uma tradicional emprêsa familiar da Nova Inglaterra, estabelece que ura parente só poderá ocupar cargo na referida emprêsa após "receber convite" dos atuais administradores. Outras exigem que os parentes obtenham sucesso administrativo em emprêsas que não fazem parte do grupo como credencial para sua admissão.

Exemplo de tal diretriz é a Pillsbury Company, onde o presidente do Conselho de Administração, PHILIP W. PILLSBURY, afirma: "Tenho como princípio não admitir meus filhos em minha emprêsa, a menos que tenham desenvolvido suas capacidades fora desta emprêsa, por um período de vários anos de carreira bem sucedida". Defendendo posição idêntica o administrador de um banco "familiar" diz que tal tipo de exigência faz com que o parente que aspira a um cargo na emprêsa de sua família, adquira uma grande experiência empresarial e o auxilia no desenvolvimento de um sentimento de segurança.

A Companhia Thompson é típica no uso de uma segunda abordagem ao problema da limitação das prerrogativas familiares. Os administradores esperam que a administração de tipo familiar seja mantida, sem, todavia, chegar a restringir a participação de parentes nos quadros administrativos da emprêsa, ou sem pressioná-los a que integram

o referido quadro. A administração é particularmente cuidadosa em não pressionar familiares a que entrem na emprêsa. A família auxilia seus membros que se interessam por iniciar carreiras fora da emprêsa, e pelo fato das ações da companhia serem vendidas em Bolsas de Valores, não terão o angustiante problema de ver a sua segurança financeira, bem como a de seus familiares, passar ao controle de outrem.

Não havendo restrições ao emprêgo de parentes na Companhia Thompson, os administradores que são da família dão grande importância aos problemas de treinamento de administradores e de desenvolvimento de critérios objetivos para a avaliação de mérito dos parentes que entram na emprêsa. Se bem que algumas emprêsas familiares estabeleçam um programa especial para o treinamento de parentes, os Thompsons são tratados da mesma forma que os administradores profissionais que pertencem ao quadro da companhia. Participam das reuniões promovidas dentro do programa de treinamento de administradores e são solicitados a percorrer todos os escalões administrativos, iniciando pelos inferiores, como todos os demais administradores.

Incentivos ao Bom Desempenho

O estabelecimento de critérios imparciais para medição do desempenho de parentes não constitui características exclusiva das grandes emprêsas familiares, como a Companhia Thompson. Uma emprêsa familiar que opera como atacadista, submete os seus parentes a contratos, fazendo desta forma que sua remuneração dependa exclusivamente de suas capacidades enquanto vendedores.

Abordagem semelhante pode ser observada numa emprêsa que se dedica à fabricação de artigos esportivos, onde. o filho do presidente tornou-se responsável pelo desenvolvimento de uma nova linha de produtos. O projeto propiciou ao filho adquirisse uma grande experiência e ao mesmo tempo serviu para verificar a sua competência nas várias fases da operação. Noutra emprêsa familiar, tendo falecido o proprietário, os curadores dos bens do herdeiro foram encarregados de emitir parecer sobre a sua capacidade como administrador, tão logo fôsse atingida a maioridade. Nc caso da avaliação do herdeiro ser desfavorávél, os curadores deveriam vender os bens, ou seja, a própria emprêsa.

Avaliação de Administradores

Apesar da variação nos métodos empregados a maioria das emprêsas bem sucedidas entendem que os melhores interêsses, tanto das firmas como das famílias exigem grande objetividade no treinamento de administradores que sejam membros da família. Esta objetividade torna-se particularmente importante para a companhia porque os empregados tendem a transmitir ao público em geral, aos consumidores e a todos os demais setores que mantém relações com a emprêsa os vªcios e virtudes do chefe da organização.

Do ponto de vista do parente que está sendo avaliado, a objetividade poderá inclusive evitar que outros membros da família, por questões não ligadas ao interêsse da emprêsa, venham a desmerecê-lo em seus julgamentos. HENRY FORD concedia a seu filho Edsel poucas oportunidades de exercer influência nos afazeres da companhia porque julgava-o desprovido de "dureza" necessária para ser um bom administrador. A história demonstrou que a Ford Motor Company havia superado a fase da "dureza" administrativa do velho Ford e, naquela altura, o estilo administrativo do filho âdsel era exatamente o que a companhia necessitava.

Conseqüentemente, a avaliação objetiva pode permitir que o parente a ser avaliado seja mais autêntico, ao invés de ser apenas a "segunda edição" de seu predecessor, o que ao final beneficiará tanto os administradores envolvidos como a emprêsa. Finalmente, quando o parente é obrigado a "conquistar" o seu cargo, suas próprias dúvidas e inseguranças a respeito de suas capacidades diminuem, o desafio representado per uma carreira dentro da emprêsa se apresenta de maneira estimulante e sadia, e os seus problemas em conseguir aceitação e confiança por parte dos demais participantes da organização são reduzidos a um mínimo.

Ao mesmo tempo que adotam diretrizes limitando as prerrogativas familiares, emprêsas mais lúcidas, como a Thompson, há pouco analisada, dão grande importância a medidas que visem a atrair e treinar administradores que não pertençam ao círculo familiar. Na Thompson tal diretriz foi implementada quando as pressões inerentes ao crescimento da emprêsa acabaram por convencer a família da impossibilidade de preencher todos os cargos que se criavam com pessoas da família. Normalmente, os administradores não pertencentes ao círculo familiar excedem os membros da família Thompson na administração de alto nível da companhia, além de estarem representados no Comitê Diretor. Os administradores profissionais encontram participação através de um sistema de recebimento de ações como parte de sua remuneração, a tal ponto que muitos administradores enriqueceram trabalhando para a companhia. No passado pessoas estranhas à família chegaram à presidência da emprêsa. Tais disposições por parteda família proprietária asseguram uma boa administração para a companhia, independentemente da capacidade administrativa das pessoas da família. Também se explica parcialmente por que a reputação da companhia na indústria em que opera, é a de que constitui "um bom local de trabalho".

A disposição da família proprietária em "abrir" as posições administrativas de alto nível da emprêsa a administradores profissionais parece constituir um atributo da maioria das emprêsas familiares que se tem mostrado longevas. Três dos últimos cinco presidentes de uma emprêsa industrial que já existe há cinco gerações e que conta com um capital de 300 milhões de dólares, não eram da família proprietária. Situação semelhante pode ser encontrada num banco familiar que foi estudado, bem como em muitas emprêsas tradicionais que constituíram objeto de nosso levantamento. Quando as oportunidades são oferecidas a todos os empregados da companhia, independentemente de relações familiares, a emprêsa familiar não terá maiores problemas para atrair administradores realmente capazes.

CONCLUSÃO

O consenso geral é de que, quando família e emprêsa estão mesclados, o resultado é sempre uma atividade empresarial de menor eficiência. Mas um exame mais detido do assunto sugere que esta crença pode não encontrar fundamentos. Ignora-se o fato de que a prática administrativa eficiente se baseia no entendimento do relacionamento entre pessoas na medida em que afetam a vida de qualquer organização. Onde tal entendimento estiver presente, a emprêsa familiar tenderá a desenvolver procedimentos e tradições organizacionais, que se tornaram proverbiais e se beneficiarão dos valores da interação entre a vida familiar e a atividade empresarial e que se constituem numa grande vantagem a longo prazo tanto aos interêsses da companhia como da família proprietária.

O sucesso de muitas emprêsas familiares indica que a ignorância das relações envolvidas e não a participação pura e simples da família é o fator decisivo a ditar o sucesso ou o fracasso de tais firmas. Entender a contribuição que uma família pode oferecer para o fortalecimento da companhia a longo prazo, analisar os pontos fracos existentes e implementar os mecanismos de controle empresarial a fim de restringir êstes problemas, são alguns aspectos do problema enfrentado pelo administrador que trabalha numa emprêsa de tipo familiar.

Nota da Redação: Traduzido do inglês por Carlos Osmar Bertero e publicado mediante autorização da Harvard Business Review, Vol. 42, n.º 4, julho-agôsto de 1964, onde foi originalmente publicado.

  • 1) ALFRED D. CHANDLER, JR., Strategy and Structure, Cambridge, Massachusetts: Massachusetts Institute of Technology Press, 1962, pág. 64.
  • (2) C.ROLAND CHRISTENSEN, Management Sucession in Small and Growing Enterprises, Boston, Division of Research, Harvard Business School,1953, pág. 175.
  • (3) PERRIN STRYKER, "Would You Hire Your Son?", março de 1957, pág. 228.
  • (5) JUDITH DOLGINS, "A Good Man is Hard to Keep"", Dun's Review and Modern Industry, maio de 1963, segundo citação de The Executive, agosto de 1963, pág. 21.
  • 1
    ) ALFRED D. CHANDLER, JR.,
    Strategy and Structure, Cambridge, Massachusetts:
    Massachusetts Institute of Technology Press, 1962, pág. 64.
  • (2
    ) C.ROLAND CHRISTENSEN,
    Management Sucession in Small and Growing Enterprises, Boston, Division of Research,
    Harvard Business School,1953, pág. 175.
  • (3
    ) PERRIN STRYKER, "Would You Hire Your Son?", março de 1957, pág. 228.
  • (4
    ) 20 de dezembro de 1963, pág. 74.
  • (5
    ) JUDITH DOLGINS, "A Good Man is Hard to Keep"",
    Dun's Review and Modern Industry, maio de 1963, segundo citação de
    The Executive, agosto de 1963, pág. 21.
  • (6
    ) PERRIN STRYKER,
    op. cit., pág. 228.
  • (7
    ) Vide ARNOLD C. COOPER, "R & D Is More Efficient in Small Companies", in
    Harvard Business Review, maio-junho de 1964, pág. 75.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      06 Jul 2015
    • Data do Fascículo
      Jun 1967
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