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Custo indireto de fabricação aplicado

ARTIGOS

Custo indireto de fabricação aplicado

Ivan de Sá Motta

Professor-adjunto do Departamento de Métodos Quantitativos da Escola de Administração de Emprêsas de São Paulo, da Fundação Getúlio Vargas

"Um dos fatos mais importantes que pode e deve ser conhecido num projeto industrial é seu provável custo unitário de produção." MURRAY D. BRYCE

O objetivo dêste trabalho é definir, em primeiro lugar, quantitativamente, conceitos modernos de Contabilidade do Custo da Produção, que, sem êsse tratamento, são de difícil aplicação. Essa poderia ser a razão principal pela qual os assuntos aqui tratados são pràticamente desconhecidos da literatura brasileira sôbre o custo da produção industrial.

Visa ainda, a uma ilustração gráfica dêsses mesmos conceitos com o propósito de torná-los ainda mais compreensíveis. Para o leitor familiarizado com os gráficos da linha reta, esta é uma visualização de grande efeito prático. Ademais, todos êsses conceitos são ilustrados por meio de um exemplo numérico, o qual é também apresentado graficamente.

Por último se fará uma discussão sucinta dos critérios para a aplicação dos custos indiretos de fabricação. Embora da maior importância, êsse assunto será aqui tratado sucintamente porque é, por si só, suficiente para constituir um trabalho em si mesmo. A simbologia e a terminologia que se seguem são apresentados com o objetivo de facilitar o tratamento quantitativo dos conceitos.

Da importância prática dos conceitos aqui tratados, poder-se-ia dizer que permitem ao administrador conhecer na realidade seu custo industrial a tempo de poder fixar preços de venda e de manter sua administração contábil e financeira em dia, além de permitir o controle dos custos da produção.

A seguir, é apresentada a conceituação de custo indireto que orientará melhor o leitor menos informado sôbre o assunto.

CONCEITO DE CUSTO INDIRETO

O custo de fabricação se compõe de três elementos de custo: o material direto, a mão-de-obra direta e o custo indireto de fabricação. Material direto é aquêle cuja transformação pela mão-de-obra direta leva ao produto acabado. Mão-de-obra direta, como acaba de ser dito, é a que transforma o material direto no produto acabado. Todos os demais custos de fabricação são por exclusão indiretos. Incluem como parcelas principais: materiais indiretos, salários indiretos, encargos sociais, depreciação, luz e força etc.. Os custos diretos são custos de produto, que são conhecidos quando o produto está pronto. Os custos indiretos são custos de período de tempo, conhecidos ao fim de um determinado período, que é normalmente de um mês. Portanto, os custos indiretos não são conhecidos ao término do produto e o que se objetiva com a aplicação de métodos para obtenção do custo indireto é exatamente tornar possível sua alocação entre vários produtos fabricados por uma emprêsa ou simplesmente para um único produto. Sem o conhecimento do custo indireto qualquer procedimento posterior, que em última instância visa a apurar o custo de fabricação, seria impossível.

Deve ainda acrescentar-se a estas considerações preliminares que a aplicação do custo indireto é feita a priori, baseada em estimativas derivadas de um orçamento. A aplicação dos custos indiretos de fabricação pode ser feita na prática contábil, independentemente da existência, ou não, de um sistema de custos-padrão.

Quando a emprêsa adota um sistema de custos-padrão ela faz, inclusive, aplicação dos custos indiretos porque o coeficiente de aplicação dos custos indiretos de fabricação aplicados é uma forma de padrão de preço para os custos indiretos de fabricação; assim sendo, a variação de aplicação é efetivamente uma variação de preço para os custos indiretos de fabricação.

Esta observação é destinada aos leitores familiarizados com a teoria do custo-padrão, que não constitui, evidentemente, o objeto do presente trabalho. Os leitores não familiarizados com a teoria do custo-padrão poderão passar por cima desta observação que tem por escopo dar uma visão de conjunto, localizando êste artigo no quadro geral da Contabilidade Industrial. Mesmo assim, a observação que segue, informará melhor o leitor mais interessado.

O custo-padrão é o custo que o produto deveria ter em condições de fabricação pré-definidas. Por isso mesmo, também pode ser determinado a priori, tal qual o coeficiente de aplicação do custo indireto aplicado. O custo de fabricação-padrão se compõe igualmente de três parcelas básicas:

• material direto-padrão derivado das especificações e desenhos do produto;

• mão-de-obra direta-padrão derivada de estudos de tempos e movimentos;

• uso indireto de fabricação-padrão derivado da aplicação feita com base na mão-de-obra direta-padrão.

ANÁLISE DAS VARIAÇÕES

Através das fórmulas que definem as variações dos custos indiretos de fabricação, a variação de aplicação dos custos indiretos de fabricação pode ser analisada em função de duas componentes, isto é, duas variações que somadas uma a outra constituem a variação de aplicação.

Essa separação ou análise é de grande valor prático: permite identificar as causas da variação total e encontrar a sua explicação. Assim, por exemplo, vemos que a variação de orçamento dos custos indiretos de fabricação deriva do fato de se orçar, para um dado nível do volume de produção, custos indiretos diferentes daquele em que a emprêsa realmente incorreu. Já a variação da capacidade é devida a um êrro de orçamento da capacidade de produção, isto é, a emprêsa produziu mais ou menos o que se havia orçado, em têrmos de unidades contábeis de produção. O valor prático dessa análise está em ajudar o administrador de emprêsa responsável pela feitura do orçamento, a identificar os erros cometidos com a sua própria origem e assim, poder fazer melhores orçamentos no futuro.

O conhecimento do custo indireto de fabricação aplicado, conforme já se salientou anteriormente, permite o conhecimento do custo de fabricação no mesmo momento em que a fabricação termina, não sendo necessário esperar até o fim do mês, quando são conhecidos os custos indiretos de fabricação efetivos.

SIMBOLOGIA E TERMINOLOGIA DOS CUSTOS INDIRETOS DE FABRICAÇÃO

O leitor encontrará a seguir a simbologia que propomos para tratamento do problema dos custos e que será utilizada ao longo do artigo.

CIFO = custos indiretos de fabricação orçados.

Os custos indiretos de fabricação são evidentemente orçados para um período subseqüente àquele em que se está fazendo o orçamento porque no período em questão os custos efetivos serão conhecidos no fim do mês.

PO = produção orçada, medida em uma das possíveis unidades de medida contábil da produção.

Mais adiante indicamos algumas das possíveis unidades de medida contábil da produção, ou bases de aplicação mais citadas na literatura.

= CACIFA = coeficiente de aplicação dos custos indiretos de fabricação aplicados.

Êsse coeficiente é obtido dividindo-se os custos indiretos de fabricação orçados pela produção orçada. Êle é válido para o mesmo período de tempo para o qual foi feito o orçamento.

CIFOF = custos indiretos de fabricação orçados fixos.

CIFOV - custos indiretos de fabricação orçados variáveis.

Chamamos orçamento flexível àquele em que se faz separadamente um orçamento para os custos fixos e outro orçamento para os custos variáveis. No caso dos custos indiretos de fabricação orçados variáveis fazem-se orçamentos diferentes para os diferentes níveis do volume da produção.

= CIFOVU = custos indiretos de fabricação orçada variável unitário.

O custo indireto de fabricação orçado variável unitário é obtido pela divisão do custo indireto de fabricação orçado variável pela produção orçada.

PE = produção efetiva.

A produção efetiva é a que foi realmente obtida no período orçamentário em questão e é medida nas mesmas unidades em que se mede a produção orçada.

CIFA = custos indiretos de fabricação aplicados.

Os custos indiretos de fabricação aplicados são obtidos pela multiplicação do coeficiente de aplicação dos custos indiretos de fabricação aplicado, também chamado "alfa", pela produção efetiva do período.

CIFE = custos indiretos de fabricação efetivos.

Os custos indiretos de fabricação efetivos são aquêles em que a emprêsa realmente incorreu no período de tempo em questão, normalmente um mês.

CIFOPE = CIFOF + CIFOVPE = custo indireto de fabricação orçado para a produção efetiva.

Os custos indiretos de fabricação orçados variáveis para a produção efetiva são obtidos pela multiplicação do unitário pela produção efetiva do período em questão, e correspondem ao orçamento se fôsse possível conhecer antecipadamente a produção efetiva.

DEFINIÇÃO DAS VARIAÇÕES

I.Δ A o é devido a êrro de orçamento monetário. Orça-se CIFO e obtém-se CIFE. Se o orçamento fôr corrigido, tem-se CIFE = CIFO e nesse caso Δ O = O.

II.Δ C é devido a êrro de orçamento de produção. Orçase PO e obtém-se PE. Se fôr corrigido o orçamento da produção, isto é, se PE = PO, nesse caso ΔC = O, isto é, CIFA = CIFO.

Realmente, vamos mostrar que ΔC = (PE-PO) (α-β)

Apresentando-se ΔC sob a forma acima, é fácil ver que se PE = PO, então ΔC = O.

No ponto PE = PO tem-se CIFOPO = α PO

levando êsse valor em C:

como queríamos demonstrar.

III.Δ A é devido à composição de Δ O e Δ C. Se ΔC = OC tem-se Δ A - O.

Efetivamente, se ΔO = O, então CIFE = CIFO e se ΔC = O, então CIFA = CIFO, isto é, se a ΔO = O e Δ C = O temos

CIFO = CIFE = CIFA e, portanto, também Δ A = O.

Acertando o numerador da fórmula

= isto é, acertando o orçamento, teremos:

ΔO = O

Acertando o denominador, isto é, o orçamento da produção, teremos:

PE = PO e ΔC = O.

Acertando ambos, taremos:

Δ A = O

A se explica, pois, em têrmos das variações monetárias, orçamentárias Δ O e produtivas Δ C.

No triângulo DBG têm-se:

GRAFICO DO EXEMPLO NUMÉRICO

O exemplo numérico seguinte mostra como é feita, na prática, a análise da variação dos custos indiretos de fabricação e a sua representação gráfica.

CUSTOS INDIRETOS DE FABRICAÇÃO (ORÇADOS, APLICADOS, EFETIVOS) - ANALISE E INTERPRETAÇÃO

Enunciado: (Todos os números são expressos em milhares de novos cruzeiros) 1 cruzeiro nôvo = 1000 cruzeiros antigos Em fins de 1966 foi feito o seguinte orçamento para 1961:

• Custos indiretos de fabricação orçados fixos $800.

• Produção orçada 100 unidades.

• Custos indiretos de fabricação orçados para a produção orçada $1.200.

Em 31 de Dezembro de 1967 verificou-se que, efetivamente, foram obtidos os seguintes resultados em 1961:

• Produção efetiva 120 unidades.

• Custos indiretos de fabricação efetivos $1.300.

SOLUÇÃO DO EXEMPLO NUMÉRICO

Identifiquemos os símbolos adotados com os números do exemplo.

CIFOPO para a produção orçada = $ 1200

PO = produção orçada =100 unidades

CIFOF = custos indiretos de fabricação orçados fixos = = $800

CIFOV = $1200 - $800 = $400 para a produção de 100 unidades

PE = produção efetiva no ano de 1966 = 120 unidades

Podemos também verificar que

Verificamos, ainda, que

CIFOF

Segue-se a representação gráfica do exemplo numérico.

No gráfico II estão representadas nas abscissas as unidades de medida contábeis da produção, quaisquer que sejam elas, dentre as citadas nas páginas que se seguem.


Nas ordenadas estão representados em cruzeiros, os custos indiretos de fabricação orçados fixos e variáveis e os custos indiretos de fabricação aplicados, bem como a produção efetiva e os custos indiretos de fabricação efetivos correspondentes.

Nota-se que, quando a produção efetiva é maior dc que a orçada, a variação de capacidade é positiva, e negativa no caso inverso.

Este gráfico é análogo ao do "ponto de equilíbrio", no qual as ordenadas são os custos totais de produção, e não apenas os indiretos de fabricação, como no caso presente.

APÊNDICE

Bases da Medida Contábil da Produção para Aplicação dos Custos Indiretos de Fabricação

• São as seguintes as mais citadas na literatura:

• Custo do material direto.

• Hora-Homem Direta.

• Unidades de Produção.

• Custo de mão-de-obra direta.

• Custo do material direto + custo da mão-de-obra direta.

• Hora-Máquina Direta.

As características de uma boa base são as seguintes:

• Ser de fácil cálculo.

• Ser de obtenção econômica.

• Ter relação direta com o fator tempo, ao qual está associada a maioria dos custos indiretos de fabricação.

• Ser calculada em base departamental (centro de custo).

• Ser fácilmente reajustável às variações dos fatores que a determinaram.

1. Custo do material direto - Expresso em porcentagem

Desvantagem: não leva em consideração o tempo.

Exemplo:

Aplicabilidade:

Materiais diretos de aproximadamente o mesmo valor e consumidos no tempo, a uma razão uniforme.

2. Horas de mão-de-obra direta.

Desvantagem: na inflação exige constante reajuste.

Aplicabilidade:

Quando o trabalho manual é predominante sôbre o trabalho mecânico.

A mão-de-obra remunerada à base de NCr$/h., a que produz mais u/h., produz igualmente menos h/u e, portanto, recebe menos CIFA/u uma vez que o CIFA é aplicado proporcionalmente ao número de horas. Em outras palavras, o operário que leva menos tempo no produto onera o mesmo com menor carga de CIFA.

3. Unidade de produção.

Aplicabilidade:

Produção de um só tipo de produto, caso em que é aplicável com simplicidade.

Desvantagens:

Quando mais de um produto é fabricado, torna-se complicado, necessitando ponderação de média. Ainda, tôdas as ordens de produção levam o mesmo CIFA unitário, quando há ordens que levam mais tempo, não havendo proporcionalmente ao número de unidades produzidas.

No cálculo das unidades produzidas, é necessário levar em consideração o conceito de produção equivalente, utilizado nos processos de produção por processo.

4. Custo de mão-de-obra direta.

Aplicabilidade:

Tal método de medir a produção é aplicável quando a mão-de-obra direta é paga à razão uniforme e não há grandes variações no tempo em um mesmo tipo de produção. O elemento predominante da produção deve ser o trabalho manual.

Êsse método é mais aplicável quando cada centro de produção tem o seu próprio CACIFA, pois, em geral, em cada centro de produção a maioria da mão-de-obra recebe aproximadamente a mesma remuneração pelo mesmo tempo de serviço.

5. Custo do material direto mais custo de mão-de-obra direta.

Não apresenta qualquer vantagem e tem a desvantagem de combinar fatores heterogêneos.

6. Base: Máquina/Hora.

Aplicabilidade:

Quando o trabalho mecânico fôr predominante sôbre o trabalho manual. Em centros de produção com máquinas de igual capacidade.

Desvantagens:

Muito trabalho para determinar Máquina/hora por ordem de produção. Deve-se calcular um CACIFA para cada grupo de máquinas de mesma capacidade, senão não se obtêm resultados coerentes.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    03 Jul 2015
  • Data do Fascículo
    Mar 1968
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