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Direito e empresa: juízo arbitral

INFORME TRIMESTRAL

Direito e empresa: juízo arbitral

Ary Oswaldo Mattos Filho

Tem-se como válido o preceito segundo o qual a Justiça deverá ser rápida e eficiente para que venha a produzir os efeitos sociais que dela se espera. Em outras palavras, pretende-se que o Poder Judiciário, a quem cabe resolver os conflitos que lhe são apresentados, seja rápido e eficiente em suas decisões; bem como que estas dêem segurança aos demais membros da coletividade para pauta rem suas ações, Se este, entretanto, é o objetivo e ideal a ser atingido, pode ser dito, sem receio de se cometer injustiça, que estamos exatamente longe de tal meta. É fato constatado diariamente que a atuação do Poder Judiciário é lenta, burocratizada, cara e, portanto, ineficiente.

Nas relações entre empresas, de outro lado, não J podem estas ficar à espera, que normalmente ultrapassa a três anos, para terem seus conflitos resolvidos. Isto porque, se a razão de apelar ao Poder Judiciário for vital, quando a decisão surgir a empresa poderá já ter sucumbido pela demora. Entretanto, se a lentidão e ineficiência são razões para se tentar evitar conflitos o mais que se possa, de outro lado, tal não implica que, vez por outra, H este forçosamente aparecerá e terá que ser resolvido.

Com vista a tal dilema, o Ministério da Justiça publi cou anteprojeto de lei que dispõe sobre a arbitragem, com a finalidade de receber sugestões e subsídios que visem o seu aperfeiçoamento. Se aprovado pelo Congresso Nacional, após seu envio ao Poder Legislativo, será aperfeiçoado instrumento hoje já existente, que permitirá obviar os graves inconvenientes apresentados pela atual estrutura e sistemátia de decisão do Poder Judiciário brasileiro.

No caso do anteprojeto, o juízo arbitral será exercido por pessoas nomeadas pelas partes que tenham interesses conflitantes, sendo este o ". . .juiz de fato e de direito e a decisão que proferir não fica sujeita a recurso, salvo se o contrário convencionarem as partes..." (art. 10). Os procedimentos adotados pelo árbitro serão aqueles estabelecidos pelas partes, ou delegar ao árbitro a utilização de normas que julgue boas, ou, se achar conveniente, adotar normas já existentes e utilizadas por instituições especializadas. Assim, o método para se chegar à decisão é escolhido pelas partes envolvidas no conflito, ou delegadas ao árbitro. Uma vez que este decida, sua sentença será final, sendo que de sua decisão será gerado título para execução específica mediante ação própria. Com tal procedimento, ficará muito obviado o procedimento judicial para se saber a quem cabe o direito e, a partir deste ponto, executar o direito já declarado. Ou seja, o instrumental que provavelmente será colocado à disposição dos que tenham conflitos a resolver será de extrema valia no que diz respeito à rapidez na obtenção de decisão.

O único ponto relevante a ser levantado é o que aponta dúvidas quanto à constitucionalidade do anteprojeto, uma vez que a Constituição Federal brasileira, em seu art. 153, § 4.º, impede que seja excluído da apreciação do Poder Judiciário qualquer lesão ao direito individual. Restaria, portanto, saber da extensão da proibição constitucional, para resultar da inconstitucionalidade ou não de tão útil e rápido meio de solução de conflitos.

Creio que a melhor razão encontra o Prof. J. Renato Correia Freire, que, no estudo que elaborou e enviou ao Ministério da Justiça, concluiu que:

"Em que pese à existência de substancial oposição, que certamente se levantará quanto ao assunto, somos de opinião que o preceito constitucional não inibe, nem contraria, e muito menos impede, o procedimento arbitral, tal qual previsto no anteprojeto, e até mesmo com as modificações sugeridas, para que o mesmo tenha o efeito de sentença judicial. Isto porque os árbitros, ao conhecerem da controvérsia, não estão fazendo mais do que exercer uma função delegada do Poder Judiciário. Ademais, o direito individual não estará infringido, já que o executado, com exceção do reexame da substância do laudo, terá sempre a possibilidade de recorrer ao juiz togado, na oposição de seus embargos, e, ainda que o mesmo tenha os efeitos de sentença, terá o mesmo a possibilidade de solicitar ao Judiciário a sua anulação, se o mesmo não obedecer os rigores técnicos da forma processual. Só não poderá ver reexaminada a substância do laudo, mas, quanto a isto, exerceu plenamente seu direito, através de um contrato dentro do campo abrangente da própria Constituição, que o permite assim agir. Assiste razão, portanto, a doutrina que denomina o laudo como titulo esecutive giudiziali impropri' (Carnelutti), ou com 'atti contratualli giudiziali' (Paolo d'Onofrio), ou ainda parajudiciais, como o nosso Anselmo de Castro."

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    28 Jun 2013
  • Data do Fascículo
    Set 1981
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