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Ensaios de sociologia do desenvolvimento

RESENHA BIBLIOGRÁFICA

Ensaios de sociologia do desenvolvimento

Por Luiz Pereira. São Paulo, Livraria Pioneira Editora, 1970. 158 p.

O autor nos adverte em sua nota prévia que os quatro textos do livro têm a intenção de "servir como obra didática, tanto pela informação como pela provocação de reflexões críticas em face das interpretações neles formuladas". Vejamos os textos:

1. "História e planificação". Trata-se de uma contribuição ao que seria sociologia do planejamento. Assim, o autor procura caracterizar o planejamento como processo social, estabelecer as conexões entre política e planejamento e identificar as diferentes formas de planejamento. Isto êle faz através da utilização de categorias-chave da sociologia estrutural e da sociologia sistemática. Mostra que como categoria histórica, o planejamento só pode ser percebido no quadro da sociologia estrutural e que no âmbito da sociologia sistemática pode-se chegar a tipologias. Chega, assim, a uma tipologia do planejamento a partir de um tipo mais amplo: o controle social. Tenta, em seguida, inserir a tipologia dentro das preocupações teóricas da sociologia estrutural e, aí, poderíamos perguntar se a didática não se faz em detrimento do método. Mas é através dela que o autor nos mostra, muito bem, que uma determinada concepção sobre planejamento implica numa determinada visão de política e de Estado, bem como da história e esta, por sua vez, numa concepção da teoria do conhecimento. Distinguem-se, didàticamente, três correntes principais: realismo, idealismo e materialismo dialético. O autor apresenta, então, as posições de cada uma dessas correntes nos quatro diferentes níveis acima mencionados; e, finalmente, a identificação das diferentes formas de planejamento, nas diferentes fases do desenvolvimento capitalista.

2. "Caracterização do subdesenvolvimento". Nesse ensaio, o subdesenvolvimento é considerado como categoria histórica. O autor apresenta três conjuntos de caracterizações econômicas do subdesenvolvimento: a tendência estruturalista representada por Celso Furtado, Raymond Barre e Elias Gannagé; a tendência dinâmica representada por Ragnar Nurkse e Gunnar Myrdal; finalmente, a tendência marxista representada por Charles Bettelheim e Gunder Frank. Através de comparações e uma análise crítica, mostra as insuficiências analíticas de certas tendências. Aqui, a didática enriquece o processo analítico do autor e o subdesenvolvimento aparece como "produto da dinâmica interna da realização do tipo macroestrutural capitalista" (p. 95).

3. "Urbanização sociopática e tensões sociais na América Latina". Nesse ensaio, o autor procura mostrar que a instabilidade política é inerente às formações subdesenvolvidas. A concepção de instabilidade política do autor é insatisfatória (cf. por exemplo, pág. 80), pois sacrifica o conteúdo à forma e a qualidade à quantidade. Mais instabilidade política na América Latina, com suas formas específicas, não significa que instabilidade política não exista em um grau maior nos Estados Unidos, por exemplo. Somente aqui ela se manifesta com formas diferentes. A França teria sido subdesenvolvida durante a IV República? A menos que politica se refira ao nível institucional e se fale em desenvolvimento político, tão divulgado entre os cientistas sociais, sobretudo norte-americanos. Mas essa é uma visão funcionalista e, por conseguinte, limitada da política que, aliás,

o autor não tem em outras partes de seus ensaios. Mas, não deixa de mostrar as diferentes concepções de instabilidade política e seu papel no processo de subdesenvolvimento-desenvolvimento, este relacionado dinamicamente (e esquematicamente) com o processo de urbanização. Finalmente, o autor tenta responder à pergunta "o que entender por desenvolvimento do tipo macroestrutural capitalista?" (p. 114 e segs.). Sua crítica a Gunder Frank parece-me bastante justa (p. 118).

4. "Brasil: etapa contemporânea". Tratase de um texto preparado para o público alemão, e é válido dizer que o público brasileiro também aproveitará de sua leitura. Aqui, o autor conclui que "o destino do capitalismo no Brasil está ligado, desde 1964, ao êxito ou fracasso da realização do desenvolvimento associado ou interdependente a que o Estado serve instrumentalmente como agente político e econômico" (p. 158).

Estamos, portanto, diante de ensaios bastante úteis, principalmente ao público especializado. Pois se deve dizer que não se trata de leitura fácil, principalmente para os que não estão habituados com um determinado tipo de terminologia. Ainda mais que a complexidade do assunto leva o autor a constantes esquematizações, cujo perigo êle não ignora. A outro nível pode-se lamentar certas fórmulas artificiais, compreensíveis no âmbito das ciências sociais brasileiras no momento atual, pois elas tornam o simples mais complexo e, às vezes, podem conduzir-nos a erros (a competição subentende, em geral, obediência a certas regras; assim competição política é limitativo do conceito clássico marxista). Compreenda-se o autor e diga-se que os objetivos apresentados na nota prévia estão justificados.

BRÁS JOSÉ ARAÚJO

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    28 Maio 2015
  • Data do Fascículo
    Jun 1971
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