Acessibilidade / Reportar erro

Neoliberalismo e envelhecimento ativo: O papel dos programas empresariais de preparação para aposentadoria

RESUMO

Objetivo:

Analisar a relação entre a ascensão dos programas de preparação para a aposentadoria (PPA) e as transformações no ambiente ideológico das organizações associadas ao advento do espírito do capitalismo neoliberal.

Originalidade/valor:

Poucos estudos da literatura brasileira abordaram a difusão dos PPA a partir de perspectivas críticas e, em especial, no ambiente empresarial. A maioria das pesquisas abordou instituições públicas. Em relação à literatura internacional, o texto inova ao associar a ascensão da ideia de envelhecimento ativo à tese do novo espírito do capitalismo, desenvolvida por Luc Boltanski e Ève Chiapello. Diferentemente dos estudos internacionais existentes, a análise enfoca os PPA como instrumentos de difusão da ordem dominante na esfera organizacional.

Design/metodologia/abordagem:

Para a consecução dos objetivos propostos, uma pesquisa qualitativa foi realizada. Obtiveram-se os dados com nove informantes de cinco consultorias que atuam na estruturação de PPA empresariais e com duas empresas que estruturaram seus programas recentemente. Foi realizada uma análise de conteúdo temática.

Resultados:

Os resultados revelam que os PPA elaborados promovem concepções de envelhecimento ativo consoantes com o novo espírito do capitalismo e com as alterações nas formas de organização do trabalho impulsionadas pelo neoliberalismo, o que possibilitou conceituar os PPA como um objeto que incorpora e facilita a difusão do envelhecimento ativo e a construção de uma aposentadoria em atividade. O estudo avança na compreensão das implicações dos novos discursos sobre a velhice para as organizações e estimula uma compreensão mais crítica dos PPA nas organizações públicas e privadas.

Palavras-chave:
aposentadoria; envelhecimento ativo; planejamento para aposentadoria; discursos neoliberais; organizações

ABSTRACT

Purpose:

To analyze the relationship between the rise of the retirement preparation programs (RPP) and the transformations in the ideological environment of organizations associated with the advent of the spirit of neoliberal capitalism.

Originality/value:

Few studies of Brazilian literature have addressed the dissemination of RPP from critical perspectives and, especially, in the business environment. Most of the research has addressed public institutions. Concerning international literature, the article innovates by associating the rise of the idea of active aging with the thesis of the new spirit of capitalism, developed by Luc Boltanski and Ève Chiapello. Unlike existing international studies, the analysis focuses on RPP as instruments for disseminating the dominant order in the organizational sphere.

Design/methodology/approach:

To meet the proposed objectives, qualitative research was carried out. Data were collected from nine informants from five consultancies that work in the structuring of corporate RPP and two companies that have recently structured their programs. A thematic content analysis was performed.

Findings:

The results reveal that the developed RPP promote conceptions of active aging in line with the new spirit of capitalism and changes in the forms of work organization driven by neoliberalism, which made it possible to conceptualize RPP as an object that incorporates and facilitates the diffusion of active aging and constructing an active retirement. The study advances in the understanding of the implications of new discourses on old age for organizations and stimulates a more critical comprehensionof RPP in public and private organizations.

Keywords:
retirement; active aging; planning for retirement; neoliberal discourses; organizations

INTRODUÇÃO

Nos últimos anos, tem crescido o número de empresas públicas e privadas que desenvolvem programas de preparação para aposentadoria (PPA) (Pinto et al., 2019Pinto, B. O. S, Coelho-Júnior, J. B. L, & Carreteiro, T. C. O. C. (2019). Aposentadoria no Brasil: Uma reflexão sobre os horizontes da população produtiva. Brazilian Journal of Production Engineering, 5(2), 20–30. https://periodicos.ufes.br/bjpe/article/view/V05N02_3/pdf
https://periodicos.ufes.br/bjpe/article/...
). Esses programas propõem que a transição para aposentadoria é um momento delicado na vida dos funcionários e buscam apoiá-los. Esses instrumentos têm sido estudados por acadêmicos de diversas áreas, como a administração, gerontologia e a psicologia, e a partir de diferentes enfoques. A maioria dos estudos na literatura brasileira aborda relatos de experiências desenvolvidas em instituições públicas, sobretudo nas universidades, avaliando a satisfação dos participantes e a qualidade dos programas (Pazzim & Marin, 2016Pazzim, T. A., & Marin, A. (2016). Programas de Preparação para Aposentadoria: Revisão sistemática da literatura nacional. Revista Brasileira de Orientação Profissional, 17(1), 91–101. http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1679-33902016000100010&lng=pt&tlng=pt
http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?scr...
). As pesquisas desenvolvidas têm um caráter normativo, pois defendem a relevância desses programas com base em tendências demográficas, prescrevem diretrizes para sua a implementação ou buscam avaliar a sua efetividade (França, 1992França, L. H. (1992). Terceira idade: O trabalho social com idosos no Sesc e os programas de preparação para aposentadoria nas empresas. Revista de Administração Pública, 26(3), 174–181. https://bibliotecadigital.fgv.br/ojs/index.php/rap/article/view/8788
https://bibliotecadigital.fgv.br/ojs/ind...
; França & Soares, 2009França, L. H. F. P., & Soares, D. H. P. (2009). Preparação para a aposentadoria como parte da educação ao longo da vida. Psicologia: Ciência e Profissão, 29(4), 738–751. https://doi.org/10.1590/S1414-98932009000400007
https://doi.org/10.1590/S1414-9893200900...
; Muniz, 1997Muniz, J. A. (1997). PPA: Programa de Preparação para o Amanhã. Revista Estudos de Psicologia, 2, 198–204. https://doi.org/10.1590/S1413-294X1997000100012
https://doi.org/10.1590/S1413-294X199700...
; Seidl et al., 2018Seidl, J., Leandro-França, C., & Murta, S. G. (2018). Avaliação de impacto e suporte de um curso de preparação para aposentadoria. Revista Psicologia: Organizações e Trabalho, 18(4), 494–502. http://dx.doi.org/10.17652/rpot/2018.4.14732
http://dx.doi.org/10.17652/rpot/2018.4.1...
; Silva & Helal, 2019Silva, R.A., & Helal, D. H. (2019). Ageismo nas organizações: Questões para debate. Revista de Administração IMED, 9(1), 187–197. https://doi.org/10.18256/2237-7956.2019.v9i1.3167
https://doi.org/10.18256/2237-7956.2019....
).

Poucos esforços foram despendidos para compreender a difusão dos PPA e seus efeitos de forma mais crítica, em especial por parte dos pesquisadores brasileiros. A fim de preencher essa lacuna, o artigo analisa a relação entre a ascensão desses programas e as transformações recentes no ambiente das organizações associados com o neoliberalismo. Toma-se como base o influente trabalho desenvolvido por Boltanski e Chiapello (2009)Boltanski, L., & Chiapello, E. (2009). O novo espírito do capitalismo. WMF Martins Fontes. sobre o novo espírito do capitalismo. A escolha dessa abordagem se justifica pela ênfase dada à ideia de atividade como base ideológica do neoliberalismo, que facilita a construção de conexões ainda não exploradas com a literatura sobre o envelhecimento ativo.

Esforços feitos na literatura internacional, em trabalhos como os de Asquith (2009)Asquith, N. L. (2009). Positive ageing, neoliberalism and Australian sociology. Journal of Sociology, 45(3), 255–269. https://doi.org/10.1177/1440783309335650
https://doi.org/10.1177/1440783309335650...
, Rudman (2006Rudman, D. L. (2006). Shaping the active, autonomous and responsible modern retiree: An analysis of discursive technologies and their links with neo-liberal political rationality. Ageing & Society, 26(2), 181–201. https://doi.org/10.1017/S0144686X05004253
https://doi.org/10.1017/S0144686X0500425...
, 2015Rudman, D. L. (2015). Embodying positive aging and neoliberal rationality: Talking about the aging body within narratives of retirement. Journal of Aging Studies, 34, 10–20. https://doi.org/10.1016/j.jaging.2015.03.005
https://doi.org/10.1016/j.jaging.2015.03...
) e Shimoni (2018)Shimoni, S. (2018). “Third age” under neoliberalism: From risky subjects to human capital. Journal of Aging Studies, 47, 39–48. https://doi.org/10.1016/j.jaging.2018.10.004
https://doi.org/10.1016/j.jaging.2018.10...
, buscaram compreender as dinâmicas discursivas do capitalismo e os sentidos associados aos processos de aposentadoria de forma crítica (Hansen, 2016Hansen, M. P. (2016). Non-normative critique: Foucault and pragmatic sociology as tactical re-politicization. European Journal of Social Theory, 19(1), 127–145. https://doi.org/10.1177/1368431014562705
https://doi.org/10.1177/1368431014562705...
), e tiveram como base outras visões sobre o neoliberalismo.

Utilizando a noção de governamentalidade de Foucault (1991)Foucault, M. (1991). Governmentality. In G. Burchell, C. Gordon, & P. Miller (Ed.), The Foucault effect: Studies in governmentality, with two lectures by and an interview with Michel Foucault (pp. 87–104). University of Chicago Press., por exemplo, Rudman (2006)Rudman, D. L. (2006). Shaping the active, autonomous and responsible modern retiree: An analysis of discursive technologies and their links with neo-liberal political rationality. Ageing & Society, 26(2), 181–201. https://doi.org/10.1017/S0144686X05004253
https://doi.org/10.1017/S0144686X0500425...
analisou como os ideais neoliberais de aposentadoria operam como tecnologias do self, que tendem a moldar as subjetividades dos aposentados. Em relação a esses estudos, o trabalho traz dois avanços significativos. Primeiramente, ele indica a relevância da análise sobre o novo espírito do capitalismo de Boltanski e Chiapello (2009)Boltanski, L., & Chiapello, E. (2009). O novo espírito do capitalismo. WMF Martins Fontes. como base para a compreensão sobre as concepções dominantes sobre o envelhecimento no neoliberalismo, destacando, particularmente, a relevância dessa análise sobre o valor da atividade no ethos de nosso tempo. Um segundo ponto é que, em geral, as análises da literatura internacional abordam a relação das concepções de envelhecimento ao neoliberalismo, não tratando da questão específica da difusão dos PPA. Estes são conceituados com base na ideia de “objeto” desenvolvida por Boltanski e Thévenot (2006)Boltanski, L., & Thévenot, L. (2006). On justification: Economies of worth. Princeton University Press., o que possibilitou compreender as implicações organizacionais dessas transformações.

O estudo traz ainda contribuições empíricas relevantes, uma vez que poucos estudos foram realizados sobre o desenvolvimento de PPA em empresas privadas que operam no país (Bernardinelli, 2020Bernardinelli, 2020). O sentido social da velhice e do envelhecimento nos programas de preparação para aposentadoria de grandes empresas brasileiras. [Dissertação de mestrado não publicada]. Universidade Federal de São Carlos. https://repositorio.ufscar.br/handle/ufscar/13400
https://repositorio.ufscar.br/handle/ufs...
; França et al., 2014França, L. H. F. P., Nalin, C. P., Brito, A. R. S., Amorim, S. M., Rangel, T., & Ekman, N. C. (2014). A percepção dos gestores brasileiros sobre os programas de preparação para a aposentadoria. Estudos Interdisciplinares sobre o Envelhecimento, 19(3), 879–898. https://doi.org/10.22456/2316-2171.50434
https://doi.org/10.22456/2316-2171.50434...
; Pazzim & Marin, 2016Pazzim, T. A., & Marin, A. (2016). Programas de Preparação para Aposentadoria: Revisão sistemática da literatura nacional. Revista Brasileira de Orientação Profissional, 17(1), 91–101. http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1679-33902016000100010&lng=pt&tlng=pt
http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?scr...
). O foco da pesquisa foram consultorias que atuam na estruturação de PPA, que operam como importantes intermediários no mercado. Também foram feitos levantamentos complementares em empresas privadas que implementaram esses instrumentos.

Apresenta-se a seguir o debate sobre as influências do neoliberalismo em políticas e práticas que lidam com o envelhecimento nas organizações, e verifica-se como os PPA se configuram como objetos operacionais dessas ações. Na sequência, são descritos os procedimentos metodológicos adotados e os resultados do levantamento realizado. Na parte final do texto, os resultados obtidos são discutidos, e apontam-se as limitações e a necessidade de pesquisas futuras.

NEOLIBERALISMO E ENVELHECIMENTO ATIVO

Ao longo das últimas décadas, diversos estudos têm associado transformações na dinâmica cultural do capitalismo com mudanças na forma como a aposentadoria e o envelhecimento são compreendidos. De acordo com essas pesquisas, as formas de racionalidade política do neoliberalismo impulsionam visões idealizadas acerca da aposentadoria e do envelhecimento, operando como tecnologias de construção dos indivíduos (Pack et al., 2019Pack, R., Hand, C., Rudman, D. L., & Huot, S. (2019). Governing the ageing body: Explicating the negotiation of “positive” ageing in daily life. Ageing and Society, 39(9), 2085–2108. https://doi.org/10.1017/S0144686X18000442
https://doi.org/10.1017/S0144686X1800044...
; Polivka, 2011Polivka, L. (2011). Neoliberalism and postmodern cultures of aging. Journal of Applied Gerontology, 30(2), 173–184.; Rudman, 2006Rudman, D. L. (2006). Shaping the active, autonomous and responsible modern retiree: An analysis of discursive technologies and their links with neo-liberal political rationality. Ageing & Society, 26(2), 181–201. https://doi.org/10.1017/S0144686X05004253
https://doi.org/10.1017/S0144686X0500425...
, 2015Rudman, D. L. (2015). Embodying positive aging and neoliberal rationality: Talking about the aging body within narratives of retirement. Journal of Aging Studies, 34, 10–20. https://doi.org/10.1016/j.jaging.2015.03.005
https://doi.org/10.1016/j.jaging.2015.03...
; Shimoni, 2018Shimoni, S. (2018). “Third age” under neoliberalism: From risky subjects to human capital. Journal of Aging Studies, 47, 39–48. https://doi.org/10.1016/j.jaging.2018.10.004
https://doi.org/10.1016/j.jaging.2018.10...
; Van Dyk, 2014Van Dyk, S. (2014). The appraisal of difference: Critical gerontology and the active-ageing-paradigm. Journal of Aging Studies, 31, 93–103.). A contextualização dos discursos adquire importância em face de tais questionamentos (Costa et al., 2011Costa, A. M., Barros, D. F., & Carvalho, J. L. F. (2011). A dimensão histórica dos discursos acerca do empreendedor e do empreendedorismo. Revista de Administração Contemporânea, 15(2), 179–197. https://doi.org/10.1590/S1415-65552011000200002
https://doi.org/10.1590/S1415-6555201100...
) que enquadram o envelhecimento como um processo em que os indivíduos podem e devem administrar a própria vida e o envelhecimento com responsabilidade (Katz, 2001, 2002Katz, S. (2001/2002). Growing older without aging? Positive aging, antiageism, and antiaging. Generations.).

Esses discursos alteraram as compreensões acerca do envelhecimento e da aposentadoria em relação aos do período geralmente denominado de capitalismo industrial. O processo de aposentadoria nesse período era predominantemente negativo, uma vez que ele representava o fim do engajamento no trabalho assalariado, que era altamente valorizado. O envelhecimento era associado ainda à desatualização e à perda de capacidade de trabalho e de eficiência, correspondendo a uma espécie de morte social, em uma cultura fortemente economicista (Achenbaum, 2005Achenbaum, W. A. (2005). Ageing and changing: International historical perspectives on ageing. In J. L. Malcolm (Ed.), The Cambridge handbook of age and ageing (pp. 21–30). Cambridge University Press. https://doi.org/10.1017/CBO9780511610714.004
https://doi.org/10.1017/CBO9780511610714...
; Boltanski & Chiapello, 2005Boltanski, L., & Chiapello, E. (2005). The new spirit of capitalism. International Journal of Politics, Culture, and Society, 18(3, 4), 161–188.). Contudo, esse período envolveu a instituição de importantes garantias para os mais velhos e aposentados. A regulação do trabalho pelo Estado e a própria dinâmica empresarial possibilitavam o estabelecimento de vínculos formais e de carreiras estruturadas que propiciavam certa estabilidade no mercado para os mais velhos. A ação redistributiva do Estado, amparada no conceito de solidariedade entre as gerações, deu ainda base para a construção de sistemas de previdência social, que garantiam certo grau de conforto material aos aposentados. No Brasil, o processo de construção e consolidação dessas políticas ocorreu de maneira relativamente tardia e, por vezes, acabou em ampliações das desigualdades sociais existentes no país (Debert et al., 2020Debert, G. G., Guimarães, N. A., & Hirata, H. (2020). Ageing and social inequalities: The case of Brazil. Retraite et Societe, 84(2), 97–120. https://www.cairn-int.info/journal-retraite-et-societe-2020-2-page-97.htm
https://www.cairn-int.info/journal-retra...
).

A transição para o neoliberalismo trouxe profundas transformações nos sentidos sociais da aposentadoria e do envelhecimento e nas garantias instituídas para os trabalhadores mais velhos. A valorização do trabalho assalariado do capitalismo industrial é deslocada para a valorização da atividade no capitalismo neoliberal (Boltanski & Chiapello, 2009Boltanski, L., & Chiapello, E. (2009). O novo espírito do capitalismo. WMF Martins Fontes.). O que importa é que as pessoas se mantenham ativas, o que pode implicar o engajamento em atividades administradas por conta própria, podendo ser economicamente produtivas ou não (Boudiny & Mortelmans, 2011Boudiny, K., & Mortelmans, D. (2011). A critical perspective: Towards a broader understanding of “active ageing”. Electronic Journal of Applied Psychology, 7(1), 8–14.). A diversidade de atividades e a flexibilidade das pessoas são valorizadas, e aqueles que ficam presos a um ofício ou uma qualificação tendem a ser desvalorizados. Essa concepção é similar à descrita por outros autores, como Katz (2000)Katz, S. (2000). Busy bodies: Activity, aging, and the management of everyday life. Journal of Aging Studies, 14(2), 135–152. https://doi.org/10.1016/S0890-4065(00)80008-0
https://doi.org/10.1016/S0890-4065(00)80...
, que aponta que a aposentadoria passa a ser vista como ocupada, criativa, saudável e móvel, e Blaikie (1999)Blaikie, A. (1999). Ageing and popular culture. Cambridge University Press., para quem a velhice deixou de ser vista como um período de isolamento, dependência e passividade para se tornar um tempo de oportunidades, produtividade e libertação, representando a transição para uma nova vida com novas perspectivas. Segundo Debert (1997)Debert, G. G. (1997). A invenção da terceira idade e a rearticulação de formas de consumo e demandas políticas. Rev. bras. Ci. Soc., 12(34)., a construção da “terceira idade” é um processo crescente de socialização da gestão da velhice, que autoriza modos específicos de gestão que implicam um afastamento da noção de velhice como uma fonte de miséria e dependência para uma visão da velhice como fonte de recursos, que envolve uma responsabilidade individual.

As formas de governança neoliberais produzem uma tendência de privatização, individualização e responsabilização que minam crescentemente as garantias instituídas aos aposentados no capitalismo industrial (Rudman, 2006Rudman, D. L. (2006). Shaping the active, autonomous and responsible modern retiree: An analysis of discursive technologies and their links with neo-liberal political rationality. Ageing & Society, 26(2), 181–201. https://doi.org/10.1017/S0144686X05004253
https://doi.org/10.1017/S0144686X0500425...
; Pack et al., 2019Pack, R., Hand, C., Rudman, D. L., & Huot, S. (2019). Governing the ageing body: Explicating the negotiation of “positive” ageing in daily life. Ageing and Society, 39(9), 2085–2108. https://doi.org/10.1017/S0144686X18000442
https://doi.org/10.1017/S0144686X1800044...
). Verificam-se uma crescente deslegitimação e pressões por reformas e pela privatização da previdência pública, com a capacidade de se sustentar durante a aposentadoria passando a ser uma responsabilidade cada vez mais individualizada e dependente do planejamento financeiro (Bernardinelli, 2020Bernardinelli, 2020). O sentido social da velhice e do envelhecimento nos programas de preparação para aposentadoria de grandes empresas brasileiras. [Dissertação de mestrado não publicada]. Universidade Federal de São Carlos. https://repositorio.ufscar.br/handle/ufscar/13400
https://repositorio.ufscar.br/handle/ufs...
; Kemp & Denton, 2003Kemp, C. L., & Denton, M. (2003). The allocation of responsibility for later life: Canadian reflections on the roles of individuals, government, employers and families. Ageing & Society, 23 737–760. http://dx.doi.org/10.1017/S0144686X03001363
http://dx.doi.org/10.1017/S0144686X03001...
; Rudman, 2006Rudman, D. L. (2006). Shaping the active, autonomous and responsible modern retiree: An analysis of discursive technologies and their links with neo-liberal political rationality. Ageing & Society, 26(2), 181–201. https://doi.org/10.1017/S0144686X05004253
https://doi.org/10.1017/S0144686X0500425...
; Soulé, 2019Soulé, F. V. (2019). Old age in the Brazilian business press: New cultural sensibilities in a financialized economy. Revista Organizações & Sociedade, 26(91), 729–749. https://doi.org/10.1590/1984-9260916
https://doi.org/10.1590/1984-9260916...
).

A empresa se torna mais instável, e a concepção de carreira se transforma, ganhando força a ideia de empregabilidade, segundo a qual é obrigação dos trabalhadores a manutenção dos próprios empregos. Essa tendência faz parte de um contexto mais amplo de transferência de responsabilidades do capital e do Estado para os próprios trabalhadores (Helal & Rocha, 2011Helal, D. H., & Rocha, M. (2011). O discurso da empregabilidade: o que pensam a academia e o mundo empresarial. Cadernos EBAPE.BR, 9(1), 139–154.). A partir dessa ótica, uma aposentadoria malsucedida seria justamente a que envolve inatividade, vulnerabilidade e dependência da solidariedade social, enquanto a positiva envolveria independência, planejamento e autonomia calcados na atividade (Shimoni, 2018Shimoni, S. (2018). “Third age” under neoliberalism: From risky subjects to human capital. Journal of Aging Studies, 47, 39–48. https://doi.org/10.1016/j.jaging.2018.10.004
https://doi.org/10.1016/j.jaging.2018.10...
).

As transformações ideológicas sobre a concepção do envelhecimento combinam-se ainda com transformações na organização do trabalho, gerando uma tendência de rompimento do padrão de ocupação de um cargo full time sucedido de uma aposentadoria inativa por um trabalho flexível e uma aposentadoria ativa (Phillipson, 2019Phillipson, C. (2019). “Fuller” or “extended” working lives? Critical perspectives on changing transitions from work to retirement. Ageing & Society, 39(3), 629–650.; Van Dalen & Henkens, 2002Van Dalen, H. P., & Henkens, K. (2002). Early retirement reform: Can it work? Will it work? Ageing & Society, 22(2), 209–231. https://doi.org/10.1017/S0144686X02008656
https://doi.org/10.1017/S0144686X0200865...
). A alteração do sentido social da velhice abre espaço para que a transição da aposentadoria não seja total e abrupta. Entretanto, há uma tendência de reposicionamento dos mais velhos em trabalhos do centro (core) para trabalhos não padronizados na periferia das organizações (Beehr & Bennet, 2013Beehr, T. A., & Bennett, M. M. (2013). Working after retirement: Features of bridge employment and research directions. Work, Aging and Retirement, 1(1), 112–128. Gilleard & Higgs, 2000Gilleard, C., & Higgs, P. (2000). Cultures of ageing: Self, citizen and the body. Routledge.; Phillipson, 2019Phillipson, C. (2019). “Fuller” or “extended” working lives? Critical perspectives on changing transitions from work to retirement. Ageing & Society, 39(3), 629–650.). Brooke et al. (2012)Brooke, E., Taylor, P., McLoughlin, P., & Biase, T. D. (2012). Managing the working body: Active ageing and limits to the “flexible” firm. Ageing & Society, 33(8), 1295–1314. https://doi.org/10.1017/S0144686X12000426
https://doi.org/10.1017/S0144686X1200042...
apontam para uma tendência de deslocamento dos mais velhos para atividades indiretamente relacionadas à produtividade, como posições de treinamento, mentoria e apoio para os trabalhadores mais jovens e vistos como mais ativos. Por sua vez, Lyon et al. (1998)Lyon, P., Hallier, J., & Glover, I. (1998). Divestment or investment? The contradictions of HRM in relation to older employees. Human Resource Management Journal, 8(1), 56–66. https://doi.org/10.1111/j.1748-8583.1998.tb00159.x
https://doi.org/10.1111/j.1748-8583.1998...
indicam que a opção pela demissão de funcionários mais velhos tem sido frequente desde meados dos anos 1970, no âmbito de reestruturações das organizações. Essa situação tende a ser mais comum em países com menores garantias instituídas na organização do trabalho e para grupos sociais com trajetórias laborais instáveis e com nível de remuneração mais baixo (Hofäcker, 2014Hofäcker, D. (2014). In line or at odds with active ageing policies? Exploring patterns of retirement preferences in Europe. Ageing & Society, 35, 2015, 1529–1556. https://psycnet.apa.org/doi/10.1017/S0144686X1400035X
https://psycnet.apa.org/doi/10.1017/S014...
).

Embora o discurso seja de flexibilidade e de aposentadoria ativa, a prática mostra que os profissionais mais velhos enfrentam várias barreiras para que possam se recolocar no mercado ou mesmo empreender (Borges & Magalhães, 2011Borges, C. de C., & Magalhães, A. S. (2011). Laços intergeracionais no contexto contemporâneo. Estudos de Psicologia, 16(2), 171–177. https://webarchive.nla.gov.au/awa/20110811173333/http://pandora.nla.gov.au/pan/51365/20110812-0020/ojs.lib.swin.edu.au/index.php/ejap/article/view/232/242.html
https://webarchive.nla.gov.au/awa/201108...
; Costa et al., 2011Costa, A. M., Barros, D. F., & Carvalho, J. L. F. (2011). A dimensão histórica dos discursos acerca do empreendedor e do empreendedorismo. Revista de Administração Contemporânea, 15(2), 179–197. https://doi.org/10.1590/S1415-65552011000200002
https://doi.org/10.1590/S1415-6555201100...
; Fernandes-Eloi et al., 2019Fernandes-Eloi, J., Lima, M. E. G., & Silva, A. M. S. (2019). Reinserção de idosos no mercado de trabalho: uma etnografia de tela do filme Um Sr. Estagiário. Pensando Famílias, 23(1), 199–212. http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1679-494X2019000100015&lng=pt&tlng=pt
http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?scr...
; Freire & Muritiba, 2012Freire e Muritiba. (2012). O Empreendedorismo na Terceira Idade: Uma alternativa sustentável à crise da previdência social? Revista de Carreiras e Pessoas, 2(2).). O ageísmo organizacional, definido como um conjunto de atitudes negativas ou positivas perante o envelhecimento e a força de trabalho dos mais velhos, desfavorece a inclusão desses indivíduos e a permanência deles no mercado de trabalho (Siqueira-Brito et al., 2017Siqueira-Brito, A. R., França, L. H. F. P., & Valentini, F. (2017). Análise fatorial confirmatória da Escala de Ageismo no Contexto Organizacional. Avaliação Psicológica, 15(3), 337–345. http://dx.doi.org/10.15689/ap.2016.1503.06
http://dx.doi.org/10.15689/ap.2016.1503....
). De acordo com Silva e Helal (2019)Silva, R.A., & Helal, D. H. (2019). Ageismo nas organizações: Questões para debate. Revista de Administração IMED, 9(1), 187–197. https://doi.org/10.18256/2237-7956.2019.v9i1.3167
https://doi.org/10.18256/2237-7956.2019....
, essas dificuldades tendem a ser reforçadas por polí ticas institucionais que, muitas vezes, acabam por auxiliar na estigmatização da pessoa idosa, estereotipando-os e reduzindo as oportunidades no mercado de trabalho.

A seguir, discute-se como os PPA promovem o discurso da aposentadoria ativa nas organizações.

OS PROGRAMAS DE PREPARAÇÃO PARA A APOSENTADORIA COMO OBJETOS DE OPERACIONALIZAÇÃO IDEOLÓGICA

As transformações discursivas associadas ao advento do neoliberalismo têm consequências objetivas nas organizações que podem ser compreendidas por meio da ideia de objeto apresentada por Boltanski e Thévenot (2006)Boltanski, L., & Thévenot, L. (2006). On justification: Economies of worth. Princeton University Press.. Nessa visão, os arranjos sociais envolvem tanto atores humanos quanto o ambiente material e os dispositivos técnicos e burocráticos com que interagem ao atuarem. Eles podem ser tanto regras, códigos, programas formais, ferramentas e técnicas de gestão quanto máquinas e outros aparatos tecnológicos (Boltanski & Thévenot, 2006, p. 142Boltanski, L., & Thévenot, L. (2006). On justification: Economies of worth. Princeton University Press.). Os objetos não são neutros, estando adequados a diferentes concepções e códigos que têm implicações para as formas como sua presença afeta a dinâmica social (Latour, 2005Latour, B. (2005). Reassembling the social-an introduction to actor-network-theory: An introduction to actor-network theory. Oxford U P.).

As concepções dos objetos podem ser mais ou menos compatíveis com os arranjos sociais nos quais eles estão inseridos. Quando eles possuem harmonia com as lógicas e concepções de organização social existentes, tornam-se mecanismos importantes de reprodução dessa lógica. Quando são dissonantes em relação às lógicas operantes, tendem a ser rejeitados e substituídos (Boisard & Letablier, 1989Boisard, P., & Letablier, M. T. (1989). Um compromis d’innovation entre tradition et standardisation dans l’industrie laitière. In L. Boltanski, L. Thevenot, & Desrosieres, A. (Eds.), Justesse et justice dans le travail (pp. 210–218). Presse Universitaire de France.; Boltanski & Thévenot, 2006Boltanski, L., & Thévenot, L. (2006). On justification: Economies of worth. Princeton University Press.). Os objetos também podem ser influenciados por múltiplas lógicas, contribuindo para a sua conciliação em situações mais gerais ou mais específicas (Boltanski & Thévenot, 2006Boltanski, L., & Thévenot, L. (2006). On justification: Economies of worth. Princeton University Press.; Girard & Stark, 2003Girard, M., & Stark, D. (2003). Heterarchies of value in Manhattan-based new media firms. Theory, Culture & Society, 20(3), 77–105. https://doi.org/10.1177/02632764030203006
https://doi.org/10.1177/0263276403020300...
). Os objetos facilitam a estabilização dos arranjos sociais, ajudando a criar rotinas que estruturam as formas de avaliação e de tomada de decisão (Boltanski & Thévenot, 2006, p. 17Boltanski, L., & Thévenot, L. (2006). On justification: Economies of worth. Princeton University Press.) e tendem a produzir novas estruturas formais e objetos de gestão (Boltanski & Chiapello, 2009Boltanski, L., & Chiapello, E. (2009). O novo espírito do capitalismo. WMF Martins Fontes.).

É justamente no contexto da transição para o neoliberalismo que ganha sentido a estruturação de PPA, que passam a ser uma ferramenta para promover novas formas de interação com os funcionários no momento da aposentadoria. O neoliberalismo encoraja os indivíduos a fazer investimentos no presente para obter retornos futuros (Mendes, 2013Mendes, F. R. (2013). Active ageing: A right or a duty? Health Sociology Review, 22(2), 174–185. https://doi.org/10.5172/hesr.2013.22.2.174
https://doi.org/10.5172/hesr.2013.22.2.1...
; Rottenberg, 2017Rottenberg, C. (2017). Neoliberal feminism and the future of human capital. Signs: Journal of Women in Culture and Society, 42(2), 329–348.; Shimoni, 2018Shimoni, S. (2018). “Third age” under neoliberalism: From risky subjects to human capital. Journal of Aging Studies, 47, 39–48. https://doi.org/10.1016/j.jaging.2018.10.004
https://doi.org/10.1016/j.jaging.2018.10...
; Soulé, 2019Soulé, F. V. (2019). Old age in the Brazilian business press: New cultural sensibilities in a financialized economy. Revista Organizações & Sociedade, 26(91), 729–749. https://doi.org/10.1590/1984-9260916
https://doi.org/10.1590/1984-9260916...
; Van Dyk, 2014Van Dyk, S. (2014). The appraisal of difference: Critical gerontology and the active-ageing-paradigm. Journal of Aging Studies, 31, 93–103.). Sua formalização impulsiona essa lógica, propiciando que os funcionários assumam a responsabilidade e o controle acerca da sua aposentadoria. Tal concepção ainda sugere que o fim do trabalho assalariado não deve ser visto como uma espécie de morte social, como era na cultura economicista do capitalismo industrial. Incentiva-se a reflexão dos funcionários para que eles pensem em como aproveitar seu tempo após a aposentadoria de forma produtiva, empreendedora e feliz (Muniz, 1997Muniz, J. A. (1997). PPA: Programa de Preparação para o Amanhã. Revista Estudos de Psicologia, 2, 198–204. https://doi.org/10.1590/S1413-294X1997000100012
https://doi.org/10.1590/S1413-294X199700...
). Os PPA facilitam, portanto, a difusão do envelhecimento ativo a partir dos discursos neoliberais acerca do envelhecimento e da aposentadoria.

A seguir, os procedimentos adotados na pesquisa sobre esses objetos são detalhados.

MÉTODO

Trata-se de pesquisa de natureza qualitativa que teve como objetivos analisar, investigar e incorporar os significados e as interpretações atribuídos aos atores envolvidos no fenômeno estudado, e compreender como este está relacionado ao ambiente em que ocorre (Martins, 2012Martins, R. A. (2012). Abordagens quantitativa e qualitativa. In P. A. C. Miguel (Coord.), Metodologia de pesquisa em engenharia de produção e gestão de operações (2a ed.) 47–62. Elsevier.). Considera-se que os dados qualitativos permitem analisar em profundidade as concepções da velhice e do envelhecimento relatadas por profissionais responsáveis por PPA (Flick, 2004Flick, U. (2004). Uma introdução à pesquisa qualitativa (2a ed.). Bookman.; Nicolaci-da-Costa, 2007Nicolaci-da-Costa, A. M. (2007). O campo da pesquisa qualitativa e o Método de Explicitação do Discurso Subjacente (MEDS). Psicologia: Reflexão e Crítica, 20(1), 65–73. https://doi.org/10.1590/S0102-79722007000100009
https://doi.org/10.1590/S0102-7972200700...
).

Coleta de dados

O levantamento dos dados foi realizado junto às consultorias que ocupam posição intermediária nos mercados, concentrando informações e experiências sobre a implantação desses programas e constituindo-se como informantes-chave (Donadone, 2000Donadone, J.C. (2000). Imprensa de negócios, dinâmica social e os gurus gerenciais. I Encontro Nacional de Estudos Organizacionais. Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Administração.). As consultorias estão sediadas no estado de São Paulo, mas prestam serviços em toda as regiões do Brasil. De forma complementar, a fim de enriquecer as análises e controlar vieses que a posição dos consultores pudesse gerar, duas empresas que haviam contratado o programa de PPA de duas das consultorias também foram abordadas.

A seleção das consultorias se deu pela busca on-line por empresas que incluíam tais serviços prestados em seus portfólios, encontrados por meio de palavras-chave como “programa de preparação para aposentadoria”, “pós-aposentadoria” e “plano de aposentadoria”. Recorreu-se também à indicação dos próprios entrevistados (snowball). O primeiro contato com as consultorias foi via e-mail. Com as empresas que retornaram aceitando participar da pesquisa, agendou-se uma reunião on-line ou presencial, de acordo com a preferência dos entrevistados.

Os dados foram coletados via entrevistas semiestruturadas com os responsáveis pelos PPA. Utilizou-se um roteiro semiestruturado composto por três seções: 1. identificação e dados gerais da consultoria; 2. estrutura dos programas no que concerne aos PPA implementados em empresas, aos participantes, aos conteúdos abordados e ao formato dos programas; e 3. questões acerca da concepção de velhice e envelhecimento subjacente aos PPA.

As entrevistas foram realizadas com nove especialistas das consultorias. Esses profissionais possuíam formações em administração e engenharia. Economistas, psicólogas e assistentes sociais também foram identificados. Os entrevistados tinham pós-graduação ou especialização ou algum treinamento de coaching. As consultorias engajadas na elaboração dos programas desenvolviam outras funções além dos PPA, sendo normalmente consultorias de recursos humanos ou transição de carreira. As principais características das consultorias podem ser visualizadas na Tabela 1.

Tabela 1
Perfil dos entrevistados

As empresas que implementaram PPA foram selecionadas voluntariamente por meio da indicação das consultorias. Entrevistaram-se os membros de duas empresas. Realizaram-se as entrevistas com os responsáveis pela contratação do programa, o gerente de recursos humanos e a analista de gestão de pessoas.

Análise dos dados

As entrevistas foram gravadas, transcritas e analisadas a partir da técnica de análise de conteúdo proposta por Bardin (2011)Bardin, L. (2011). Análise de conteúdo (L. A. Reto & A. Pinheiro, Trad.). Edições 70., que envolveu uma pré-análise, a exploração do material e o tratamento dos resultados. Realizou-se a análise temática (Gioia et al., 2012Gioia, D. A., Corley, K. G., & Hamilton, A. L. (2012). Seeking qualitative rigor in inductive research: Notes on the Gioia methodology. Organizational Research Methods, 16(1), 15–31. https://doi.org/10.1177/1094428112452151
https://doi.org/10.1177/1094428112452151...
), o que, após a preparação do material, ele foi explorado e codificado com o apoio de uma planilha eletrônica. A codificação dos dados combinou uma estratégia dedutiva, em que as categorias foram definidas a partir do referencial teórico, e teve também um componente indutivo, abarcando questões não previstas e que surgiram nas entrevistas. A sistematização dos dados resultou em três grandes temas: 1. a caracterização das consultorias e de seus clientes, o que incluiu categorias como nome, data de fundação, histórico da atuação com PPA, entre outras; 2. a estrutura dos programas, que incluiu o público-alvo dos programas (cargos, gêneros e outras características dos participantes), os conteúdos abordados e a ocorrência de práticas como o bridge employment, o retorno ao mercado de trabalho e a gestão do conhecimento de acordo com os diferentes perfis e demandas de clientes e ao longo do tempo; e 3. os contextos e as concepções de velhice, envelhecimento e aposentadoria subjacentes aos programas.

RESULTADOS

Nesta seção, apresentam-se os resultados das entrevistas com as consultorias. Inicialmente, apresentamos os focos de atuação das consultorias e tratamos do contexto básico em que os PPA foram implementados nas empresas analisadas. Em seguida, apresentamos os principais clientes e públicos-alvo dos programas, e os principais temas e estruturas dos PPA.

Os PPA nas empresas investigadas

A maioria das consultorias identificadas iniciou suas atividades a partir do ano 2000, e os entrevistados relatam que a implementação dos PPA se intensificou de 2012 a 2019. Dentre as cinco consultorias entrevistadas, apenas uma (consultoria C) é especializada na área do envelhecimento, atuan do na assessoria e consultoria em outras vertentes dessa área, mas tendo os PPA como seu serviço principal. Uma dessas consultorias (consultoria E) é uma plataforma que oferece oportunidades de trabalho para pessoas com 50 anos ou mais, porém, atualmente, também vem desenvolvendo PPA. As demais empresas também têm outros focos de atuação, sendo uma especializada em outplacement (consultoria D), uma em sustentabilidade corporativa (consultoria A) e outra (consultoria B) em Treinamentos Experiencial ao Ar Livre (Teal).

Quanto às empresas que implementaram os PPA, nota-se que ambas o fizeram recentemente, sobretudo entre 2016 e 2019, por causa de problemas com o desligamento de funcionários mais velhos. Fundada em 1927, a primeira empresa entrevistada se caracteriza como uma indústria do segmento petroquímico, atuando na produção e na comercialização de coque calcinado de petróleo e produtos correlatos, e na geração e venda de energia. Tem seu quadro acionário composto igualitariamente pela Petróleo Brasileiro S.A. (Petrobras) e pela Universal Empreendimentos e Participações Ltda. A empresa desenvolveu seu PPA no ano de 2018, quando enfrentava um desafio de sucessão em sua liderança por conta do longo tempo no ramo.

A segunda é uma empresa portuguesa que está há 20 anos no Brasil. Ela surgiu como uma empresa estatal, mas foi privatizada e atua no setor elétrico. Fundada em 1996, a empresa implementou seu PPA em 2016 e o ampliou em 2018 e 2020. A relevância do PPA está associada ao longo tempo de vínculo dos funcionários com a empresa. Ao aderir esse programa, a empresa incentivava de forma respeitosa os colaboradores, muitas vezes já aposentados, a se desligar.

Principais clientes e público-alvo dos programas

O público-alvo das consultorias brasileiras são principalmente empresas privadas, em especial grandes empresas nacionais, sobretudo familiares ou multinacionais. Nas empresas multinacionais, de acordo com um dos entrevistados da consultoria D, os programas geralmente decorrem de políticas existentes e pensadas no contexto dos países-sede. Nas organizações familiares, adere-se aos programas mediante problemas de sucessão e dilemas com a gestão do conhecimento.

De acordo com os entrevistados das consultorias B e D, há um movimento recente de as organizações públicas demandarem serviços de elaboração desses programas pelas consultorias, especificamente a partir de 2019. Na visão dos entrevistados, isso está associado a mudanças políticas e processos de privatização das empresas, que comumente envolvem reestruturações e demissões.

As entrevistas apontaram que os funcionários que aderem aos PPA são predominantemente do gênero masculino, principalmente no setor privado. De acordo com um dos entrevistados da consultoria C, essa predominância masculina é ainda mais acentuada quando os PPA são para os cargos mais altos. No que concerne ao gênero, a diferença entre as organizações privadas e as públicas está, na visão desse entrevistado, associada à baixa presença de mulheres em altos cargos em empresas particulares. O entrevistado aponta ainda que, em organizações privadas industriais, há uma prevalência geral de funcionários do sexo masculino.

Ainda que os consultores indiquem que a demanda das empresas se concentre em cargos-chave e na alta gerência, a maioria das consultorias desenvolve programas voltados a todos os cargos. A exceção foi a consultoria D, que atua exclusivamente na alta gerência. Os programas voltados a esse público normalmente envolvem um atendimento individualizado, enquanto os demais cargos participam do programa em grupo.

Um dos entrevistados da consultoria C aponta que, quando “a empresa procura para cargos mais altos, são normalmente programas de coach. Mas o ideal é quando a empresa consegue fazer dois grupos com os diferentes cargos”. Além disso, como aponta outro entrevistado da mesma consultoria, quanto maior o nível hierárquico, “mais complicado o desligamento, pois a pessoa se descuida de criar uma identidade própria, e, portanto, a demanda e a necessidade são maiores”. De acordo com um integrante da consultoria B, algumas “consultorias dão preferência aos altos cargos, outras preferem grupos mistos. Mas, se puder optar, opte pelos [funcionários do] ‘chão de fábrica’, pois a abordagem [deles] é mais simples e eles usufruem de menor conhecimento no assunto, sendo mais necessário”. Os entrevistados indicam, portanto, que ambos os PPA são relevantes para funcionários de diversos níveis hierárquicos das empresas.

A compreensão das empresas sobre a idade dos funcionários mais velhos variou significativamente. Algumas empresas consideram que funcionários acima dos 45 anos são atendidos pelos programas, enquanto outras indicam que atendem, sobretudo, aqueles com mais de 60 anos. Para o entrevistado da empresa no setor elétrico e o da consultoria B, normalmente pessoas mais velhas são mais valorizadas em cargos mais altos de gestão. Isso transmite para os demais funcionários um senso de experiência e respeito, características que os funcionários mais novos levariam mais tempo para conquistar. Nos cargos operacionais, uma idade mais elevada seria um fator negativo, especialmente em cargos que demandam força física e velocidade. A partir da análise dos principais clientes e do público-alvo das consultorias, conclui-se que existem diferentes concepções da velhice nas inúmeras classificações profissionais e grupos sociais.

Em geral, as empresas associam o programa a uma forma de gratidão pelos anos dos funcionários dedicados ao trabalho. Os PPA tornam o processo de aposentadoria, que por vezes envolve uma demissão, mais transparente e são vistos pelas empresas como uma forma de evitar processos trabalhistas e conflitos jurídicos, e de promover a aposentadoria de funcionários mais velhos.

As entrevistas indicam que as empresas têm considerado a necessidade de preparar seus colaboradores para essa etapa da vida por causa do aumento da longevidade. De acordo com o entrevistado da consultoria D:

As empresas começam a perceber essa necessidade, com um olhar mais humano, uma questão social. Além disso, eles estão percebendo uma perda de talentos e competências, sendo que os PPA podem envolver formas de reaproveitamento desses talentos. Com isso, as empresas vêm se sensibilizando mais ao tema, ainda mais porque precisam renovar o quadro de funcionários, oxigenar, entrar na onda da inovação, trazer uma diversidade maior de perfis para a empresa e assim tratar desse funcionário mais antigo de uma forma diferente, não necessariamente apenas aposentando, mas de uma maneira mais proativa e humanizada.

Nota-se que os PPA podem operar como uma forma de suavizar o desligamento de funcionários mais velhos. Ao mesmo tempo, com as novas demandas do aumento da longevidade e a complexidade de adaptação da aposentadoria, que engloba outros aspectos além do econômico, os programas também contribuem para sensibilizar e promover a reflexão dos funcionários sobre suas trajetórias e os caminhos a serem seguidos.

É interessante tratar da visão dos entrevistados sobre o papel das políticas públicas que estabelecem a obrigatoriedade do PPA pelas organizações, como a Política Nacional do Idoso (PNI) de 1994 e o Estatuto da Pessoa Idosa de 2003. A maioria dos informantes tem um olhar crítico sobre essas políticas, indicando a existência de uma falta de conexão entre elas e o interesse das empresas em aderir aos programas. Alguns dos entrevistados nem mesmo sabiam da existência delas. Na visão de entrevistados das consultorias, as leis que mais influenciam a adesão aos PPA são as trabalhistas. Isso tem a ver com o efeito de os PPA serem formas de suavizar as demissões, o que contribui para reduzir riscos de processos trabalhistas. No caso das organizações públicas, em específico para os PPA das universidades, essas leis (PNI e Estatuto da Pessoa Idosa) parecem ter uma relação mais próxima com a adesão aos programas.

Estrutura e principais temas dos programas

Outro foco da análise referiu-se aos conteúdos abordados e às formas dos PPA. Um dos entrevistados (consultoria B) apontou que a estrutura dos programas passou por alterações ao longo dos anos. Inicialmente, tratava-se de iniciativas interdisciplinares, abordando diferentes dimensões do processo de aposentadoria e envelhecimento: “Tinha que ter um médico para falar de saúde, um nutricionista para abordar alimentação, advogado para falar da previdência, entre outros profissionais. Mas isso, financeiramente, era inviável para as empresas”. Atualmente, os programas não têm uma estrutura fixa nem regras de aplicação. Eles são vinculados a uma concepção e ao tratamento profissional de acordo com as demandas das empresas contratantes e dos funcionários participantes. Em geral, os funcionários participam das iniciativas um ou dois anos antes de se aposentarem. Os programas são customizados conforme os cargos e gêneros dos participantes, e oferecidos tanto para grupos quanto para indivíduos.

De modo geral, os programas contam com no mínimo oito horas, podendo ser de 16 horas em dois dias, oito encontros de quatro horas, entre outros formatos. Nesses períodos, realizam-se palestras, workshops e dinâmicas em grupos. Ao final dos programas, existe, por parte dos participantes, uma devolutiva que pode ser realizada em forma de questionário ou por meio da opinião deles em roda de conversa.

Em geral, os conteúdos focam os seguintes aspectos: 1. planejamento financeiro, 2. empreendedorismo, 3. saúde integral e 4. projeto de vida. Os conteúdos que enfatizam aspectos econômicos da velhice foram destacados pelos entrevistados. A ideia de abordar o planejamento financeiro se associa à narrativa da responsabilidade privada dos funcionários em lidar com seu futuro econômico, partindo do pressuposto da insuficiência da previdência social brasileira para propiciar uma velhice confortável.

Já a ideia de empreendedorismo foi fortemente associada com a manutenção de uma vida econômica ativa após a aposentadoria. Pressupõe-se que o fim da carreira não precisaria corresponder ao fim da atividade econômica e que os conhecimentos e as experiências acumulados pelos participantes têm o potencial de alavancar atividades empreendedoras. Segundo alguns entrevistados, enfatizam-se o “renascimento” de sonhos do passado e as verdadeiras vocações dos aposentados. Os programas tratam ainda de outras formas de recolocação do aposentado no mercado de trabalho, como o bridge employment, que dá a oportunidade de o funcionário prolongar a vida profissional por meio de vínculos temporários e flexibilizados. Esse tipo de tratamento é mais comum para funcionários de posições hierárquicas mais altas ou com competências raras nas empresas.

Ainda que o fator econômico tenha tido destaque nos programas das consultorias, a saúde integral e o projeto de vida também foram temas relevante para o planejamento da aposentadoria. A atividade aqui ganha caráter de movimento físico, busca de interesses cotidianos e de participação social. Os temas associados à saúde integral dos participantes englobam o bem-estar físico, psicológico e social, estimulando o autocuidado do corpo, com uma boa alimentação e práticas de atividade física; o autocuidado social, com a mudança de status e a importância dos relacionamentos, como amizades e o ciclo familiar; e, por fim, o autocuidado mental, com boas horas de sono e tempo de lazer. Outros temas que possibilitem agregar qualidade na nova rotina também são tratados, como a espiritualidade, o retorno ao lar, a gestão do tempo livre etc.

Para evitar alguns entraves logo no começo do programa, há uma palestra voltada à sensibilização do próprio indivíduo sobre o seu processo de envelhecimento e a importância do PPA. Os entrevistados mencionaram essa palestra como uma das mais importantes, pois, normalmente, é nela que muitos funcionários decidem aderir ao PPA, além de influenciar outras pessoas a participar. Nesse momento, muitos funcionários compreendem o programa como um benefício e não como uma ameaça de demissão, como é mencionado por um dos entrevistados:

Muitas pessoas não queriam participar, o famoso programa “pé na cova”, porém com o tempo essa perspectiva muda, porque percebem que o programa quer sensibilizar para o processo e não é uma ameaça, mas sim mostrar para o indivíduo que ele deve se apropriar do próprio projeto de vida. Após a palestra de sensibilização, os funcionários sensibilizam outros a participarem do programa.

Os consultores apontam que muitos dos funcionários interpretam o programa como “pé na cova”, um “programa dos velhinhos” ou um programa de demissão, conotações relacionadas a estereótipos antigos da aposentadoria inativa. Essa perspectiva tende a mudar entre os que aderem ao programa. Essas expressões podem ser associadas ao ageísmo, visão que associa negativamente as habilidades profissionais com a idade cronológica.

DISCUSSÃO

Os achados da pesquisa empírica podem ser relacionados com a literatura revisada sobre os efeitos na concepção dominante de velhice, envelhecimento e aposentadoria associada ao neoliberalismo. Com base na noção de objeto desenvolvida por Boltanski e Thévenot (2006)Boltanski, L., & Thévenot, L. (2006). On justification: Economies of worth. Princeton University Press., é possível abordar a formalização dos PPA como uma forma de materializar crenças vinculadas ao ambiente ideológico nas organizações. Não se trata, portanto, de estruturas formais neutras, mas de dispositivos, de objetos, que incorporam crenças e se articulam com discursos do panorama ideológico e que contribuem para sua reprodução. A lógica fundamental com que esse objeto se harmoniza é a que Boltanski e Chiapello (2009)Boltanski, L., & Chiapello, E. (2009). O novo espírito do capitalismo. WMF Martins Fontes. denominam de regime de justificação de projetos, que tem como valor superior comum a atividade.

O fato de essa lógica estar de certa forma impressa na gênese desses programas, sendo reproduzida por eles, não significa que isso ocorra de maneira inequívoca. Como aponta Thévenot (2001)Thévenot, L. (2001). Organized complexity: Conventions of coordination and the composition of economic arrangements. European Journal of Social Theory, 4(4), 405–425. https://doi.org/10.1177/13684310122225235
https://doi.org/10.1177/1368431012222523...
, a realidade organizacional é marcada por sua complexidade, que está associada à multiplicidade de lógicas que propiciam a coordenação. Por isso, as práticas associadas aos PPA podem, em certos contextos, destoar da ênfase na atividade e da lógica comercial que ganha influência com o neoliberalismo. Os dados levantados indicam, por exemplo, que o ageísmo pode ser visto a partir da ótica dos regimes de justificação como decorrência da interpretação do envelhecimento industrial, que ainda está presente e contribui para que os PPA sejam interpretados como programas de quem está com o “pé na cova”. Como também apontam Siqueira-Brito et al. (2017)Siqueira-Brito, A. R., França, L. H. F. P., & Valentini, F. (2017). Análise fatorial confirmatória da Escala de Ageismo no Contexto Organizacional. Avaliação Psicológica, 15(3), 337–345. http://dx.doi.org/10.15689/ap.2016.1503.06
http://dx.doi.org/10.15689/ap.2016.1503....
e Silva e Helal (2019)Silva, R.A., & Helal, D. H. (2019). Ageismo nas organizações: Questões para debate. Revista de Administração IMED, 9(1), 187–197. https://doi.org/10.18256/2237-7956.2019.v9i1.3167
https://doi.org/10.18256/2237-7956.2019....
, esses preconceitos ainda ocorrem de forma naturalizada nas organizações e influenciam a forma de as pessoas encararem a aposentadoria, assim como a contratação, a inserção e a permanência do profissional mais velho dentro das organizações. Entretanto, nossos dados também indicam que essa realidade tem se transformado, ficando clara a influência estrutural das lógicas comerciais e de projeto nos sentidos organizacionais moldados pelos PPA.

Um elemento importante dessa associação é a sugestão implícita, nesses programas, de um outro momento da vida, no qual a atividade deve ser mantida e novas realizações podem ocorrer e, portanto, demandam planejamento. Essa ideia se opõe às concepções dominantes no capitalismo industrial, que valorizavam o trabalho assalariado e os vínculos organizacionais formais, o que tornava o fim da carreira como algo extremamente negativo. Na configuração ideológica que Boltanski e Chiapello (2009)Boltanski, L., & Chiapello, E. (2009). O novo espírito do capitalismo. WMF Martins Fontes. denominam de novo espírito do capitalismo, o que passa a importar não é o trabalho assalariado e o vínculo formal em si, mas a manutenção das atividades sociais e econômicas. Como a vida não acaba com o fim do trabalho assalariado, ela precisa ser planejada.

Ainda que a construção dos projetos de vida seja aberta a aspectos não econômicos e propicie a reflexão, nota-se, nos conteúdos comumente abordados nos PPA, uma ênfase econômica. Destacam-se nas entrevistas as referências aos temas do empreendedorismo e do planejamento financeiro.

Como apontam Costa et al. (2011)Costa, A. M., Barros, D. F., & Carvalho, J. L. F. (2011). A dimensão histórica dos discursos acerca do empreendedor e do empreendedorismo. Revista de Administração Contemporânea, 15(2), 179–197. https://doi.org/10.1590/S1415-65552011000200002
https://doi.org/10.1590/S1415-6555201100...
, a ideia de empreendedorismo está profundamente associada com a ideologia neoliberal, consistindo em uma matriz de conduta baseada no investimento e na produção de riqueza abstrata por meios autônomos. Como indicam algumas entrevistas, essa ideia pode ser articulada com a perseguição de uma vocação que pode ter sido deixada de lado ao longo da carreira. Já o planejamento financeiro sugere que os cidadãos não devem contar com o Estado e com políticas públicas baseadas na ideia de solidariedade intergeracional incorporadas na previdência social.

Como aponta Soulé (2019)Soulé, F. V. (2019). Old age in the Brazilian business press: New cultural sensibilities in a financialized economy. Revista Organizações & Sociedade, 26(91), 729–749. https://doi.org/10.1590/1984-9260916
https://doi.org/10.1590/1984-9260916...
, trata-se da promoção de uma cultura de investimento e poupança que converge para os interesses dos atores do mercado financeiro e de capitais. Por meio de algumas palestras realizadas alguns anos antes da aposentadoria, os PPA contribuem para difundir crenças econômicas profundamente vinculadas ao neoliberalismo. Como aponta Rudman (2006)Rudman, D. L. (2006). Shaping the active, autonomous and responsible modern retiree: An analysis of discursive technologies and their links with neo-liberal political rationality. Ageing & Society, 26(2), 181–201. https://doi.org/10.1017/S0144686X05004253
https://doi.org/10.1017/S0144686X0500425...
, promove-se uma falsa sensação de liberdade, como se os aposentados pudessem percorrer o caminho que quisessem quando, na verdade, este, muitas vezes, é moralmente imposto. Impulsiona-se a tendência de privatização, individualização e responsabilização que minam os direitos do trabalho instituídos no capitalismo industrial (Bernardinelli, 2020Bernardinelli, 2020). O sentido social da velhice e do envelhecimento nos programas de preparação para aposentadoria de grandes empresas brasileiras. [Dissertação de mestrado não publicada]. Universidade Federal de São Carlos. https://repositorio.ufscar.br/handle/ufscar/13400
https://repositorio.ufscar.br/handle/ufs...
; Kemp & Denton, 2003Kemp, C. L., & Denton, M. (2003). The allocation of responsibility for later life: Canadian reflections on the roles of individuals, government, employers and families. Ageing & Society, 23 737–760. http://dx.doi.org/10.1017/S0144686X03001363
http://dx.doi.org/10.1017/S0144686X03001...
; Pack et al., 2019Pack, R., Hand, C., Rudman, D. L., & Huot, S. (2019). Governing the ageing body: Explicating the negotiation of “positive” ageing in daily life. Ageing and Society, 39(9), 2085–2108. https://doi.org/10.1017/S0144686X18000442
https://doi.org/10.1017/S0144686X1800044...
; Rudman, 2006Rudman, D. L. (2006). Shaping the active, autonomous and responsible modern retiree: An analysis of discursive technologies and their links with neo-liberal political rationality. Ageing & Society, 26(2), 181–201. https://doi.org/10.1017/S0144686X05004253
https://doi.org/10.1017/S0144686X0500425...
; Soulé, 2019Soulé, F. V. (2019). Old age in the Brazilian business press: New cultural sensibilities in a financialized economy. Revista Organizações & Sociedade, 26(91), 729–749. https://doi.org/10.1590/1984-9260916
https://doi.org/10.1590/1984-9260916...
) e legitimam reformas como as que propõem uma crescente privatização da previdência pública.

Outros aspectos identificados no contexto da implementação dos PPA podem estar vinculados às recentes transformações nas formas de organização do trabalho. Os modelos de organização que ganham força com a ascensão do neoliberalismo caracterizam-se pela constituição de empresas cada vez mais enxutas e especializadas (Boltanski & Chiapello, 2009Boltanski, L., & Chiapello, E. (2009). O novo espírito do capitalismo. WMF Martins Fontes.; Duarte, 2020Duarte, R. M. (2020). O espírito do capitalismo brasileiro retratado em conteúdos populares de gestão empresarial nas mídias digitais: Modelos de empresa e formas de mobilização nos textos de influenciadores de LinkedIn. [Dissertação de mestrado não publicada]. Universidade Federal de São Carlos. https://repositorio.ufscar.br/handle/ufscar/12666
https://repositorio.ufscar.br/handle/ufs...
). Isso demanda reestruturações que tendem a reduzir o escopo da empresa e implicam demissões e crescente terceirização das atividades.

Os funcionários mais velhos são comumente alvos das iniciativas de downsizing, o que está associado a conflitos intergeracionais no interior das organizações e à própria ideia de que, muitas vezes, os mais velhos tendem a ser menos ativos que os mais novos. Essa tendência também pode ser vista como consequência do enfraquecimento da lógica doméstica, com base na qual se valorizam os mais velhos e experientes em detrimento dos mais novos, em decorrência da ascensão da lógica por projetos na cultura das organizações, conforme apontam Boltanski e Chiapello (2009)Boltanski, L., & Chiapello, E. (2009). O novo espírito do capitalismo. WMF Martins Fontes..

As entrevistas indicam, entretanto, que essa transformação impacta de maneira bem menos intensa os cargos mais elevados, em que a senioridade mantém seu valor. Em todo caso, verificamos que os PPA operam como uma forma de pacificar conflitos organizacionais ao “humanizarem” as demissões de funcionários mais velhos e de nível operacional, de modo a torná-las mais graduais e previsíveis. Essa “humanização” da demissão no contexto de reestruturações é particularmente relevante em organizações do setor privado, suavizando a demissão de funcionários que comumente são antigos e, por vezes, respeitados nas organizações. Como observado neste estudo, os PPA são usados para reduzir riscos de processos trabalhistas para as organizações, o que faz com que os entrevistados associem sua difusão mais com a legislação trabalhista do que com as políticas sociais voltadas aos idosos.

A opção pela flexibilização do vínculo contratual por meio do bridge employment é um outro indicativo importante do vínculo dos PPA com a forma de justificação por projetos, com a possibilidade de prolongar a vida profissional por meio de vínculos temporários e flexibilizados (Kim & Feldman, 2000Kim, S., & Feldman, D. (2000). Working in retirement: The antecedents of bridge employment and its consequences for quality of Life in retirement. Academy of management Journal, 43(6),1195–1210.; Rhum, 1990Rhum, C. (1990) Bridge jobs and partial retirement. Journal of labor Economics, 8(4) 482–501.). A flexibilização foi considerada mais comum para funcionários de posições hierárquicas mais altas ou com competências raras nas empresas investigadas. Nesse caso, flexibilizam-se as relações de trabalho dos funcionários mais velhos, propiciando uma transição mais gradual nos casos em que eles detêm conhecimentos importantes para a manutenção da organização, o que vincula os PPA à gestão do conhecimento. Com isso, ainda que o vínculo profissional seja mantido, os mais velhos são transferidos para posições organizacionais mais marginais, conforme indica a literatura internacional (Beehr & Bennet, 2013Beehr, T. A., & Bennett, M. M. (2013). Working after retirement: Features of bridge employment and research directions. Work, Aging and Retirement, 1(1), 112–128.; Brooke et al., 2012Brooke, E., Taylor, P., McLoughlin, P., & Biase, T. D. (2012). Managing the working body: Active ageing and limits to the “flexible” firm. Ageing & Society, 33(8), 1295–1314. https://doi.org/10.1017/S0144686X12000426
https://doi.org/10.1017/S0144686X1200042...
; Phillipson, 2019Phillipson, C. (2019). “Fuller” or “extended” working lives? Critical perspectives on changing transitions from work to retirement. Ageing & Society, 39(3), 629–650.) Em todo caso, as práticas de bridge employment parecem ter uma influência relativamente restrita no Brasil, o que pode estar associado às características da legislação trabalhista nacional. Essa é uma proposição a ser analisada em outras pesquisas empíricas. Se ela estiver correta, é de se esperar que as reformas e flexibilizações trabalhistas recentemente aprovadas no país impulsionem a difusão dessas práticas de contratação.

É interessante notar que, tanto na literatura quanto nas entrevistas, destaca-se o papel das organizações públicas na difusão dos PPA no Brasil (Bernardinelli, 2020Bernardinelli, 2020). O sentido social da velhice e do envelhecimento nos programas de preparação para aposentadoria de grandes empresas brasileiras. [Dissertação de mestrado não publicada]. Universidade Federal de São Carlos. https://repositorio.ufscar.br/handle/ufscar/13400
https://repositorio.ufscar.br/handle/ufs...
). Seria possível deduzir que a implementação dos PPA no setor público seria um reflexo de uma administração de pessoas mais humanizada? Os PPA do setor público também não operariam como um objeto importante de reforma e de enxugamento das estruturas estatais? Avaliamos que as respostas a essas questões dependem de pesquisas mais aprofundadas e críticas sobre a gênese e o uso desse instrumento no setor público. Também é pertinente considerar que a privatização de empresas públicas teve um papel fundamental de impulsionar o modelo neoliberal de empresa no Brasil (Grün, 2015Grün, R. (2015). Decifra-me ou te devoro: O Brasil e a dominação financeira. Alameda.; Matsuda & Donadone, 2015Matsuda, P. M., & Donadone, J. C. (2015). A mudança da carreira dos dirigentes após o processo de privatização: Estudo de caso no setor elétrico paulista. Gestão & Produção, 22(2), 419–430. https://doi.org/10.1590/0104-530X2057-15
https://doi.org/10.1590/0104-530X2057-15...
; Pedroso Neto, 2012Pedroso Neto, A. J. (2012). A privatização de uma empresa: Uma ação econômica enraizada nas relações sociais. Caderno CRH, 25(66), 391–408. https://doi.org/10.1590/S0103-49792012000300002
https://doi.org/10.1590/S0103-4979201200...
). A visão de alguns entrevistados de que os processos de privatização em curso na economia brasileira estariam aumentando a demanda por consultorias em PPA reforça essa proposição, que pode ser analisada em pesquisas futuras.

Os resultados desta pesquisa indicam que a concepção social da velhice e, consequentemente, da aposentadoria dentro dos PPA de empresas brasileiras está em sintonia com as expectativas geradas pelo novo espírito do capitalismo. Em linha com esses objetivos, a construção discursiva da aposentadoria está consistente com a perspectiva do envelhecimento ativo e os achados de Boltanski e Chiapello (2009)Boltanski, L., & Chiapello, E. (2009). O novo espírito do capitalismo. WMF Martins Fontes., transcendendo as particularidades a partir da noção de atividade e enfatizando a aposentadoria como uma etapa de novas oportunidades.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Esta pesquisa analisou a relação entre a ascensão dos PPA e as transformações no ambiente das organizações associadas à escalada do novo espírito do capitalismo. Essa articulação possibilitou aprofundar a compreensão sobre visões idealizadas acerca do envelhecimento e a aposentadoria, o que possibilitou também conceituar os PPA como um objeto que incorpora e facilita a difusão dessas concepções nas organizações. A pesquisa contribuiu para o avanço dessa literatura e impulsionou uma compreensão mais crítica dos PPA nas organizações públicas e privadas.

Os discursos neoliberais valorizam as “atividades”, sejam elas econômicas ou não. Mas, para isso, é importante que exista a gestão individual da aposentadoria. Os PPA são uma ferramenta que impulsionam esse processo e tendem a reproduzir os discursos acerca do envelhecimento de forma complexa e, por vezes, ambígua.

Como vimos nos resultados, algumas empresas aderem aos PPA por causa de problemas com a demissão de funcionários mais velhos ou problemas advindos na sucessão de funcionários-chave. Esses programas difundem novas expectativas para a vida pós-aposentadoria, legitimando o desligamento de funcionários mais velhos e redescobrindo novas formas de trabalho, como é o caso do bridge employment.

Como limitação da pesquisa, devem-se considerar a seleção voluntária das empresas entrevistadas, que foram nossa principal fonte de dados, e a realização de um número relativamente baixo de entrevistas, ainda que com atores intermediários bem posicionados. Apesar disso, avaliamos que a pesquisa evidenciou de forma bastante clara as tendências investigadas.

Nossa sugestão é que a trilha aqui estabelecida seja seguida em estudos futuros. Julgamos importante também considerar indivíduos que não têm condições de se planejar para aposentadoria e que a ascensão dos discursos neoliberais, que restringem o papel do Estado no cuidado da aposentadoria e, consequentemente, da velhice, pode ter consequências drásticas em termos da ampliação das desigualdades sociais.

REFERENCES

  • Achenbaum, W. A. (2005). Ageing and changing: International historical perspectives on ageing. In J. L. Malcolm (Ed.), The Cambridge handbook of age and ageing (pp. 21–30). Cambridge University Press. https://doi.org/10.1017/CBO9780511610714.004
    » https://doi.org/10.1017/CBO9780511610714.004
  • Asquith, N. L. (2009). Positive ageing, neoliberalism and Australian sociology. Journal of Sociology, 45(3), 255–269. https://doi.org/10.1177/1440783309335650
    » https://doi.org/10.1177/1440783309335650
  • Bardin, L. (2011). Análise de conteúdo (L. A. Reto & A. Pinheiro, Trad.). Edições 70.
  • Beehr, T. A., & Bennett, M. M. (2013). Working after retirement: Features of bridge employment and research directions. Work, Aging and Retirement, 1(1), 112–128.
  • Bernardinelli, 2020). O sentido social da velhice e do envelhecimento nos programas de preparação para aposentadoria de grandes empresas brasileiras [Dissertação de mestrado não publicada]. Universidade Federal de São Carlos. https://repositorio.ufscar.br/handle/ufscar/13400
    » https://repositorio.ufscar.br/handle/ufscar/13400
  • Blaikie, A. (1999). Ageing and popular culture Cambridge University Press.
  • Boisard, P., & Letablier, M. T. (1989). Um compromis d’innovation entre tradition et standardisation dans l’industrie laitière. In L. Boltanski, L. Thevenot, & Desrosieres, A. (Eds.), Justesse et justice dans le travail (pp. 210–218). Presse Universitaire de France.
  • Boltanski, L., & Chiapello, E. (2009). O novo espírito do capitalismo WMF Martins Fontes.
  • Boltanski, L., & Chiapello, E. (2005). The new spirit of capitalism. International Journal of Politics, Culture, and Society, 18(3, 4), 161–188.
  • Boltanski, L., & Thévenot, L. (2006). On justification: Economies of worth Princeton University Press.
  • Borges, C. de C., & Magalhães, A. S. (2011). Laços intergeracionais no contexto contemporâneo. Estudos de Psicologia, 16(2), 171–177. https://webarchive.nla.gov.au/awa/20110811173333/http://pandora.nla.gov.au/pan/51365/20110812-0020/ojs.lib.swin.edu.au/index.php/ejap/article/view/232/242.html
    » https://webarchive.nla.gov.au/awa/20110811173333/http://pandora.nla.gov.au/pan/51365/20110812-0020/ojs.lib.swin.edu.au/index.php/ejap/article/view/232/242.html
  • Boudiny, K., & Mortelmans, D. (2011). A critical perspective: Towards a broader understanding of “active ageing”. Electronic Journal of Applied Psychology, 7(1), 8–14.
  • Brooke, E., Taylor, P., McLoughlin, P., & Biase, T. D. (2012). Managing the working body: Active ageing and limits to the “flexible” firm. Ageing & Society, 33(8), 1295–1314. https://doi.org/10.1017/S0144686X12000426
    » https://doi.org/10.1017/S0144686X12000426
  • Costa, A. M., Barros, D. F., & Carvalho, J. L. F. (2011). A dimensão histórica dos discursos acerca do empreendedor e do empreendedorismo. Revista de Administração Contemporânea, 15(2), 179–197. https://doi.org/10.1590/S1415-65552011000200002
    » https://doi.org/10.1590/S1415-65552011000200002
  • Debert, G. G., Guimarães, N. A., & Hirata, H. (2020). Ageing and social inequalities: The case of Brazil. Retraite et Societe, 84(2), 97–120. https://www.cairn-int.info/journal-retraite-et-societe-2020-2-page-97.htm
    » https://www.cairn-int.info/journal-retraite-et-societe-2020-2-page-97.htm
  • Debert, G. G. (1997). A invenção da terceira idade e a rearticulação de formas de consumo e demandas políticas. Rev. bras. Ci. Soc., 12(34).
  • Donadone, J.C. (2000). Imprensa de negócios, dinâmica social e os gurus gerenciais. I Encontro Nacional de Estudos Organizacionais Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Administração.
  • Duarte, R. M. (2020). O espírito do capitalismo brasileiro retratado em conteúdos populares de gestão empresarial nas mídias digitais: Modelos de empresa e formas de mobilização nos textos de influenciadores de LinkedIn [Dissertação de mestrado não publicada]. Universidade Federal de São Carlos. https://repositorio.ufscar.br/handle/ufscar/12666
    » https://repositorio.ufscar.br/handle/ufscar/12666
  • Fernandes-Eloi, J., Lima, M. E. G., & Silva, A. M. S. (2019). Reinserção de idosos no mercado de trabalho: uma etnografia de tela do filme Um Sr. Estagiário. Pensando Famílias, 23(1), 199–212. http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1679-494X2019000100015&lng=pt&tlng=pt
    » http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1679-494X2019000100015&lng=pt&tlng=pt
  • Flick, U. (2004). Uma introdução à pesquisa qualitativa (2a ed.). Bookman.
  • Freire e Muritiba. (2012). O Empreendedorismo na Terceira Idade: Uma alternativa sustentável à crise da previdência social? Revista de Carreiras e Pessoas, 2(2).
  • Foucault, M. (1991). Governmentality. In G. Burchell, C. Gordon, & P. Miller (Ed.), The Foucault effect: Studies in governmentality, with two lectures by and an interview with Michel Foucault (pp. 87–104). University of Chicago Press.
  • França, L. H. (1992). Terceira idade: O trabalho social com idosos no Sesc e os programas de preparação para aposentadoria nas empresas. Revista de Administração Pública, 26(3), 174–181. https://bibliotecadigital.fgv.br/ojs/index.php/rap/article/view/8788
    » https://bibliotecadigital.fgv.br/ojs/index.php/rap/article/view/8788
  • França, L. H. F. P., Nalin, C. P., Brito, A. R. S., Amorim, S. M., Rangel, T., & Ekman, N. C. (2014). A percepção dos gestores brasileiros sobre os programas de preparação para a aposentadoria. Estudos Interdisciplinares sobre o Envelhecimento, 19(3), 879–898. https://doi.org/10.22456/2316-2171.50434
    » https://doi.org/10.22456/2316-2171.50434
  • França, L. H. F. P., & Soares, D. H. P. (2009). Preparação para a aposentadoria como parte da educação ao longo da vida. Psicologia: Ciência e Profissão, 29(4), 738–751. https://doi.org/10.1590/S1414-98932009000400007
    » https://doi.org/10.1590/S1414-98932009000400007
  • Gilleard, C., & Higgs, P. (2000). Cultures of ageing: Self, citizen and the body Routledge.
  • Gioia, D. A., Corley, K. G., & Hamilton, A. L. (2012). Seeking qualitative rigor in inductive research: Notes on the Gioia methodology. Organizational Research Methods, 16(1), 15–31. https://doi.org/10.1177/1094428112452151
    » https://doi.org/10.1177/1094428112452151
  • Girard, M., & Stark, D. (2003). Heterarchies of value in Manhattan-based new media firms. Theory, Culture & Society, 20(3), 77–105. https://doi.org/10.1177/02632764030203006
    » https://doi.org/10.1177/02632764030203006
  • Grün, R. (2015). Decifra-me ou te devoro: O Brasil e a dominação financeira Alameda.
  • Hansen, M. P. (2016). Non-normative critique: Foucault and pragmatic sociology as tactical re-politicization. European Journal of Social Theory, 19(1), 127–145. https://doi.org/10.1177/1368431014562705
    » https://doi.org/10.1177/1368431014562705
  • Helal, D. H., & Rocha, M. (2011). O discurso da empregabilidade: o que pensam a academia e o mundo empresarial. Cadernos EBAPE.BR, 9(1), 139–154.
  • Hofäcker, D. (2014). In line or at odds with active ageing policies? Exploring patterns of retirement preferences in Europe. Ageing & Society, 35, 2015, 1529–1556. https://psycnet.apa.org/doi/10.1017/S0144686X1400035X
    » https://psycnet.apa.org/doi/10.1017/S0144686X1400035X
  • Katz, S. (2001/2002). Growing older without aging? Positive aging, antiageism, and antiaging. Generations.
  • Katz, S. (2000). Busy bodies: Activity, aging, and the management of everyday life. Journal of Aging Studies, 14(2), 135–152. https://doi.org/10.1016/S0890-4065(00)80008-0
    » https://doi.org/10.1016/S0890-4065(00)80008-0
  • Kemp, C. L., & Denton, M. (2003). The allocation of responsibility for later life: Canadian reflections on the roles of individuals, government, employers and families. Ageing & Society, 23 737–760. http://dx.doi.org/10.1017/S0144686X03001363
    » http://dx.doi.org/10.1017/S0144686X03001363
  • Kim, S., & Feldman, D. (2000). Working in retirement: The antecedents of bridge employment and its consequences for quality of Life in retirement. Academy of management Journal, 43(6),1195–1210.
  • Latour, B. (2005). Reassembling the social-an introduction to actor-network-theory: An introduction to actor-network theory Oxford U P.
  • Lyon, P., Hallier, J., & Glover, I. (1998). Divestment or investment? The contradictions of HRM in relation to older employees. Human Resource Management Journal, 8(1), 56–66. https://doi.org/10.1111/j.1748-8583.1998.tb00159.x
    » https://doi.org/10.1111/j.1748-8583.1998.tb00159.x
  • Martins, R. A. (2012). Abordagens quantitativa e qualitativa. In P. A. C. Miguel (Coord.), Metodologia de pesquisa em engenharia de produção e gestão de operações (2a ed.) 47–62. Elsevier.
  • Matsuda, P. M., & Donadone, J. C. (2015). A mudança da carreira dos dirigentes após o processo de privatização: Estudo de caso no setor elétrico paulista. Gestão & Produção, 22(2), 419–430. https://doi.org/10.1590/0104-530X2057-15
    » https://doi.org/10.1590/0104-530X2057-15
  • Mendes, F. R. (2013). Active ageing: A right or a duty? Health Sociology Review, 22(2), 174–185. https://doi.org/10.5172/hesr.2013.22.2.174
    » https://doi.org/10.5172/hesr.2013.22.2.174
  • Muniz, J. A. (1997). PPA: Programa de Preparação para o Amanhã. Revista Estudos de Psicologia, 2, 198–204. https://doi.org/10.1590/S1413-294X1997000100012
    » https://doi.org/10.1590/S1413-294X1997000100012
  • Nicolaci-da-Costa, A. M. (2007). O campo da pesquisa qualitativa e o Método de Explicitação do Discurso Subjacente (MEDS). Psicologia: Reflexão e Crítica, 20(1), 65–73. https://doi.org/10.1590/S0102-79722007000100009
    » https://doi.org/10.1590/S0102-79722007000100009
  • Pack, R., Hand, C., Rudman, D. L., & Huot, S. (2019). Governing the ageing body: Explicating the negotiation of “positive” ageing in daily life. Ageing and Society, 39(9), 2085–2108. https://doi.org/10.1017/S0144686X18000442
    » https://doi.org/10.1017/S0144686X18000442
  • Pazzim, T. A., & Marin, A. (2016). Programas de Preparação para Aposentadoria: Revisão sistemática da literatura nacional. Revista Brasileira de Orientação Profissional, 17(1), 91–101. http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1679-33902016000100010&lng=pt&tlng=pt
    » http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1679-33902016000100010&lng=pt&tlng=pt
  • Pedroso Neto, A. J. (2012). A privatização de uma empresa: Uma ação econômica enraizada nas relações sociais. Caderno CRH, 25(66), 391–408. https://doi.org/10.1590/S0103-49792012000300002
    » https://doi.org/10.1590/S0103-49792012000300002
  • Phillipson, C. (2019). “Fuller” or “extended” working lives? Critical perspectives on changing transitions from work to retirement. Ageing & Society, 39(3), 629–650.
  • Pinto, B. O. S, Coelho-Júnior, J. B. L, & Carreteiro, T. C. O. C. (2019). Aposentadoria no Brasil: Uma reflexão sobre os horizontes da população produtiva. Brazilian Journal of Production Engineering, 5(2), 20–30. https://periodicos.ufes.br/bjpe/article/view/V05N02_3/pdf
    » https://periodicos.ufes.br/bjpe/article/view/V05N02_3/pdf
  • Polivka, L. (2011). Neoliberalism and postmodern cultures of aging. Journal of Applied Gerontology, 30(2), 173–184.
  • Rhum, C. (1990) Bridge jobs and partial retirement. Journal of labor Economics, 8(4) 482–501.
  • Rottenberg, C. (2017). Neoliberal feminism and the future of human capital. Signs: Journal of Women in Culture and Society, 42(2), 329–348.
  • Rudman, D. L. (2006). Shaping the active, autonomous and responsible modern retiree: An analysis of discursive technologies and their links with neo-liberal political rationality. Ageing & Society, 26(2), 181–201. https://doi.org/10.1017/S0144686X05004253
    » https://doi.org/10.1017/S0144686X05004253
  • Rudman, D. L. (2015). Embodying positive aging and neoliberal rationality: Talking about the aging body within narratives of retirement. Journal of Aging Studies, 34, 10–20. https://doi.org/10.1016/j.jaging.2015.03.005
    » https://doi.org/10.1016/j.jaging.2015.03.005
  • Seidl, J., Leandro-França, C., & Murta, S. G. (2018). Avaliação de impacto e suporte de um curso de preparação para aposentadoria. Revista Psicologia: Organizações e Trabalho, 18(4), 494–502. http://dx.doi.org/10.17652/rpot/2018.4.14732
    » http://dx.doi.org/10.17652/rpot/2018.4.14732
  • Shimoni, S. (2018). “Third age” under neoliberalism: From risky subjects to human capital. Journal of Aging Studies, 47, 39–48. https://doi.org/10.1016/j.jaging.2018.10.004
    » https://doi.org/10.1016/j.jaging.2018.10.004
  • Silva, R.A., & Helal, D. H. (2019). Ageismo nas organizações: Questões para debate. Revista de Administração IMED, 9(1), 187–197. https://doi.org/10.18256/2237-7956.2019.v9i1.3167
    » https://doi.org/10.18256/2237-7956.2019.v9i1.3167
  • Siqueira-Brito, A. R., França, L. H. F. P., & Valentini, F. (2017). Análise fatorial confirmatória da Escala de Ageismo no Contexto Organizacional. Avaliação Psicológica, 15(3), 337–345. http://dx.doi.org/10.15689/ap.2016.1503.06
    » http://dx.doi.org/10.15689/ap.2016.1503.06
  • Soulé, F. V. (2019). Old age in the Brazilian business press: New cultural sensibilities in a financialized economy. Revista Organizações & Sociedade, 26(91), 729–749. https://doi.org/10.1590/1984-9260916
    » https://doi.org/10.1590/1984-9260916
  • Thévenot, L. (2001). Organized complexity: Conventions of coordination and the composition of economic arrangements. European Journal of Social Theory, 4(4), 405–425. https://doi.org/10.1177/13684310122225235
    » https://doi.org/10.1177/13684310122225235
  • Van Dyk, S. (2014). The appraisal of difference: Critical gerontology and the active-ageing-paradigm. Journal of Aging Studies, 31, 93–103.
  • Van Dalen, H. P., & Henkens, K. (2002). Early retirement reform: Can it work? Will it work? Ageing & Society, 22(2), 209–231. https://doi.org/10.1017/S0144686X02008656
    » https://doi.org/10.1017/S0144686X02008656

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    16 Jan 2023
  • Data do Fascículo
    2023

Histórico

  • Recebido
    21 Maio 2021
  • Aceito
    01 Fev 2022
Editora Mackenzie; Universidade Presbiteriana Mackenzie Rua da Consolação, 896, Edifício Rev. Modesto Carvalhosa, Térreo - Coordenação da RAM, Consolação - São Paulo - SP - Brasil - cep 01302-907 - São Paulo - SP - Brazil
E-mail: revista.adm@mackenzie.br