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O screening ultra-sonográfico da oligoidramnia diminui ou aumenta a morbidade?

PANORAMA INTERNACIONAL

OBSTETRÍCIA

O screening ultra-sonográfico da oligoidramnia diminui ou aumenta a morbidade?

Seizo Miyadahira; Marcelo Zugaib

Nas últimas duas décadas a avaliação do volume de líquido amniótico (LA) tem-se constituído em um componente crítico nos cuidados pré-natais e na assistência ao parto. A avaliação ultra-sonográfica é, indubitavelmente, mandatória em uma infinidade de situações de anormalidades na gestação (doenças maternas e/ou intercorrências gestacionais), utilizando-se de critérios classificatórios que evoluíram com o tempo. Em 1984, Chamberlain et al1. demonstraram que a mortalidade perinatal elevava de 13 vezes quando ocorria a oligoidramnia, cujo diagnóstico baseava-se na constatação de maior bolsão de LA menor que 2,0 cm. Por isso, esse valor foi incorporado na avaliação do perfil biofísico fetal (PBF) por Manning et al., em 1985, como marcador crônico do bem-estar fetal. Posteriormente, em 1987, Phelan et al. propuseram a avaliação semi-quantitativa do volume de LA (somatória das medidas verticais dos maiores bolsões de quatro quadrantes da cavidade amniótica), cabendo a Rutherford et al.2, do mesmo grupo e no mesmo ano, a classificação do volume de LA segundo o critério estabelecido. A partir disso, houve grande aderência a essa técnica que ficou conhecida como ILA (índice de líquido amniótico), incorporada também ao PBF por alguns serviços enquanto outros mantiveram o critério de maior bolsão<2,0 cm. Em estudo (537 casos) publicado em 2004, Magann et al.3 constataram que com a técnica do ILA identifica-se o dobro de casos com oligoidramnia e, por conseqüência, ocorre o dobro de casos de indução do parto e de cesáreas por sofrimento fetal, quando comparado com a técnica do maior bolsão, sem haver vantagens nos resultados neonatais. Em contraposição a esse trabalho, Morris et al. 4, 2003, apresentam um estudo prospectivo, cego e observacional, com 1584 mulheres com idade gestacional de 40 semanas ou mais e encontram 7,9% de oligoidramnia pela técnica do ILA e 1,4% pelo maior bolsão. No grupo identificado pelo ILA, a morbidade neonatal foi significativamente menor. Entretanto, a incidência de cesáreas e a taxa de falsos positivos foram maiores no grupo do ILA. Argüindo sobre esses dados, Moore, 2004, preconiza o uso do maior bolsão <2,0 cm para se indicar o término da gravidez e aconselha o uso do ILA quando uma alta sensibilidade para o diagnóstico de oligoidramnia for desejável para ensejar nova avaliação, mas não para se adotar condutas resolutivas.

Comentário

Muito pertinentes essas recentes observações que são consentâneas com as vivenciadas no cotidiano de um Serviço Universitário de assistência às gestações de alto risco. Não obstante nele sejam utilizados os critérios de Rutherford et al., 1987, aconselha-se que a oligoidramnia diagnosticada (ILA<5,0) deva ser incorporada e interpretada à luz de todo o contexto clínico e de exames complementares da gestante antes de se tomar condutas resolutivas. Na prematuridade, condutas conservadoras podem ser adotadas e a resolução pode ser postergada para idades gestacionais mais seguras. No pós-datismo, a resolução obstétrica vincula-se muito às condições cervicais, cuja favorabilidade indica indução do parto, quando factível. Em contrapartida, a oligoidramnia grave (ILA<3,0 cm) tem conotação patológica importante e, após a viabilidade fetal, condutas de resolução devem ser indicadas.

Referências

1. Chamberlain PF, Manning FA, Morrison I, Harman CR, Lange IR. Ultrasound evaluation of amniotic fluid volume. II. The relationship of increased amniotic fluid volume to perinatal outcome. Am J Obstet Gynecol 1984; 150:250-4.

2. Rutherford SE, Phelan JP, Smith CV, Jacobs N. The four quadrant assessment of amniotic fluid volume: an adjunct to antepartum fetal heart rate testing. Obstet Gynecol 1987; 70:353-6.

3. Magann EF, Doherty DA, Field K, Chauhan SP, Muffey PE, Morrison JC. Biophysical profile with amniotic fluid volume assessment. Obstet Gynecol 2004; 104:5-10.

4. Morris JM, Thompson K, Smithey J, Gaffney G, Cooke I, Chamberlain P, et al. The usefulness of ultrasound assessment of amniotic fluid in predicting adverse outcome in prolonged pregnancy: a prospective blinded observational study. Br J Obstet Gynecol 2003; 110:989-94.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    14 Jan 2005
  • Data do Fascículo
    Dez 2004
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